Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
63/16.7GBCLD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: INÁCIO MONTEIRO
Descritores: MEIOS DE PROVA NECESÁRIOS À DESCOBERTA DA VERDADE
NULIDADE
ARGUIÇÃO
Data do Acordão: 02/21/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - C.RAINHA - JL CRIMINAL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.120.º E 340.º DO CPP
Sumário: I – Finda a produção de prova, a bem da descoberta da verdade material e boa decisão da causa, perante a ausência do arguido na audiência de julgamento e a constatação de que o agente de autoridade que lavrou e assinou o auto não tinha presenciado os factos, impunha-se que, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, se desse cumprimento ao art. 340.º do CPP.

II - Para ser sindicável tal questão, com o fundamento da audição dos agentes de autoridade que fiscalizaram o arguido, se tornar necessário à descoberta da verdade material e boa decisão da causa, só por via da nulidade da sentença recorrida, nos termos dos arts. 120.º, n.º 2, al. d), e 379.º, n.º 1, al. c), ambos do CPP.

III - Nesta conformidade, não tendo sido arguida a nulidade no acto, não poderá ser sindicável a agora questão suscitada por via do recurso directo.

Decisão Texto Integral:










Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra:

I- Relatório
No processo supra identificado foi julgado o arguido A... , nascido em 28.01.1963, em (...) , filho de (...) e de (...) , residente na Rua (...) , pela prática, como autor material, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3.º, n.º 1 e 2, do DL 2/98 de 3/1, pelos factos de fls. 70, do qual foi absolvido.
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Inconformado recorreu o Ministério Público, o qual pugna pela condenação do arguido, formulando as seguintes conclusões:
«A) Na sentença ora recorrida e proferida foram dados como não provados os seguintes factos:
1. No dia 09.02.2016, pelas 06:30h, na estrada nacional n.º 360, freguesia de Nadadouro, Caldas da Rainha, o arguido, de forma voluntária e em plena via pública, conduzia o veículo automóvel com a matrícula x (...) .
2. Agiu deliberadamente, com intenção de conduzir, sem causa justificativa, aquela viatura, não obstante saber que era imprescindível e necessário ser titular de documento que o habilitasse a guiar veículos motorizados na via pública, emitido e passado pelas entidades ou autoridades oficiais competentes.
3. Agiu ainda livre, esclarecida e lucidamente, com a perfeita consciência de que a sua conduta era proibida e punida por lei.
B) Como se extrai do confronto da matéria supra, no dia 09.02.2017, A... não era possuidor de carta de condução, nem de outro título que o habilitasse a conduzir veículos automóveis.
A questão aqui em apreço prende-se com a prova do facto elencado em 1. Ou seja, de saber se, na data mencionada, o arguido conduziu, ou não, um veículo automóvel.
C) Os presentes autos tiveram início com o auto de notícia, junto a fls. 2, no qual se relata que o arguido foi visto a conduzir, por militar da GNR de Caldas da Rainha, facto pelo qual foi detido e elaborado o expediente que deu início aos presentes autos.
Sucede que, B... o, indicado como autuante, uma vez ouvido em declarações, relatou que no dia em causa se encontrava a elaborar expediente e que elaborou e assinou o auto de notícia com base nos relatos transmitidos pelos seus colegas, e não presenciou os factos aí relatos.
D) E, em consequência, foi dado como não provado que o arguido tivesse conduzido na data mencionada, absolveu-o da prática do crime pelo qual vinha acusado.
E) O auto é um documento autêntico e consideram-se provados os factos materiais que dele constam, enquanto a sua autenticidade e veracidade do conteúdo não for posta em causa - artigos 363.º, n.º 2 do C. Ci. e 169.º, do CPP).
F) Sucede que a testemunha indicada em tal auto como agente autuante, em sede de ADJ declarou não ter presenciado os factos, tendo elaborado o auto com base nos relatos dos seus colegas.
G) Assim, não pode ser atribuída a força probatória de documento autêntico quando os factos relatados no auto foram transmitidos por terceiro e não presenciados pelo seu signatário.
H) Apesar do procedimento do OPC ser censurável e da circunstância de um facto inverídico constar do auto de notícia poderá acarretar a irregularidade de tal auto ou maxime a sua nulidade, tal não exime o Juiz de cumprir todos os princípios que impõe o direito processual penal e ainda menos de cumprir o seu poder - dever de perseguir a verdade material, produzindo todas as provas possíveis e necessárias à descoberta da verdade material e à prolação de uma sentença justa.
I) O artigo 340.º, do CPP consagra o princípio da investigação ou da verdade material. Tal princípio, implica, que, o juiz, a bem da verdade material, tenha uma posição activa na produção de prova que julgue necessária e, oficiosamente ou a requerimento, produza todos os meios de prova que considere necessários, admissíveis e adequados.
J) Entendemos, assim, que, por força do princípio mencionado, a reunião e produção das provas necessárias, não cabe apenas ao MP, tendo também o Juiz o dever de, oficiosamente, mandar produzir todas as provas que se lhe afigurem necessárias para esclarecer os factos e atingir a verdade material subjacente.
K) Concluímos, que uma vez que a testemunha arrolada pelo MP (sendo aquela identificada como sendo o agente autuante) não tinha conhecimento directo dos factos em causa, estava o Juiz obrigado a tentar obter tal prova, diligenciando pela identificação e audição dos agentes policiais que terão presenciado os factos.
L) Não o tendo feito e absolvendo o arguido sem que produzisse toda a prova possível e útil para a descoberta da verdade material, consideramos que a decisão ora recorrida viola o disposto pelo artigo 340.º, do CPP e, como tal, encontra-se ferida de nulidade, nos termos do preceituado pelos artigos 120.º, n.º 2 d) e 379.°, n.º 1 c), ambos do CPP».
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Notificado o arguido nos termos do art. 413.º, n.º 1, do CPP não respondeu.
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Nesta instância, os autos tiveram vista do Ex.mo Senhor Procurador-geral Adjunto, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, o qual emitiu douto parecer no sentido de que não tendo sido a testemunha ouvida que procedeu à fiscalização do arguido e o conduziu ao posto da GNR, o tribunal devia ter ouvido os agentes que procederam a esta diligência, nos termos do art. 340.º, do CPP, pelo que deve ser declarada nula a decisão e ordenar-se a reabertura da audiência, para aqueles efeitos, merecendo desta forma provimento o recurso.
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Notificado o arguido, nos termos do art. 417.º, n.º 2, do CPP não respondeu.
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Foi cumprido o art. 418.º, do CPP, e uma vez colhidos os vistos legais, indo os autos à conferência, cumpre decidir.
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Vejamos pois a factualidade apurada pelo tribunal e respectiva motivação
A) Factos provados:
«1. Em 10.02.2016 o arguido não era titular de carta de condução de veículos automóveis.
2. Em 19.03.2017, nada consta do CRC do arguido.
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B)Factos não provados:
1. No dia 09.02.2016, pelas 06:30h, na estrada nacional n.º 360, freguesia de Nadadouro, Caldas da Rainha, o arguido, de forma voluntária e em plena via pública, conduzia o veículo automóvel com a matrícula x (...) .
2. Agiu deliberadamente, com intenção de conduzir, sem causa justificativa, aquela viatura, não obstante saber que era imprescindível e necessário ser titular de documento que o habilitasse a guiar veículos motorizados na via pública, emitido e passado pelas entidades ou autoridades oficiais competentes.
3. Agiu ainda livre, esclarecida e lucidamente, com a perfeita consciência de que a sua conduta era proibida e punida por lei.
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C) Motivação da decisão de facto:
O tribunal fundou a sua convicção, com base na análise e conjugação da prova produzida e examinada em audiência, designadamente no teor do depoimento da testemunha inquirida e documentos juntos autos, livremente apreciados segundo as regras de experiência e livre convicção do julgador, nos termos previstos no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
Assim, o julgamento realizou-se na ausência do arguido nos termos previstos no artigo 333.º, n.º 1 e 2.º do CPP.
Ouvida em declarações a testemunha B... , militar da GNR, subscritor do auto de notícia que deu origem aos presentes autos, referiu o mesmo que, embora tenha subscrito o auto de notícia e o expediente ao mesmo referente, não presenciou os factos descritos na acusação. Esclareceu que, por determinação superior, e encontrando-se a GNR a realizar uma operação STOP, lhe foi atribuída exclusivamente aquela função de elaborar expediente e lavrar os autos de notícia por infracção.
Esclareceu que se manteve no posto daquela Guarda, onde os seus colegas trouxeram o arguido, com a indicação de que o mesmo havia conduzido, não era portador de carta de condução, informação que obtiveram mediante consulta à base de dados do IMT e que, com base nessa informação elaborou o auto de notícia a que respeitam os autos.
Assim, na falta de declarações do arguido, atenta a declaração do agente autuante de que o auto de notícia foi elaborado com base nas declarações dos seus colegas, a que nenhuma referência é feita no auto de notícia, não tendo por si sido presenciados, não pode o tribunal atender ao seu conteúdo para dar como provados os factos imputados ao arguido.
Com efeito, não é pela circunstância de determinado facto estar relatado num auto de notícia que o mesmo deve ser considerado provado, pois se assim fosse nem sequer seria necessária a audição de testemunhas (e mesmo a realização de julgamentos), verificando-se ainda uma inadmissível inversão do ónus da prova. Aliás, conforme se pode ler em Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 5 de Janeiro de 2011, o auto de notícia é um documento intra-processual, não fazendo prova plena relativamente aos factos que descreve. Por outras palavras, «o auto de notícia faz fé em juízo da respectiva diligência de prova, mas não tem a força probatória reforçada instituída pelo art. 169.º, n.º 1, do CPP» (in www.dgsi.pt – Proc. 280/09.6TAVCD.P1).
Como salienta Paulo Pinto de Albuquerque, no seu Comentário do Código de Processo Penal, 3.ª ed., em anotação ao art.º 243.º, pág. 642, o auto de notícia vale como documento autêntico quando levantado por autoridade judiciária, órgão de polícia criminal ou outra entidade policial que presenciou o crime, fazendo prova dos factos materiais nele constantes (artigos 363.º, n.º 2 do C. Ci. e 169.º, do CPP). Portanto, não tem qualquer força probatória o auto elaborado por um agente de autoridade, que não tenha presenciado a infracção, mas tenha procedido a inquérito prévio sobre a matéria nele relatada, nem o auto elaborado por um agente de autoridade que mencione as declarações de uma testemunha, mas já tem força probatória o auto elaborado por um agente de autoridade que presenciou a infracção e a descreveu no auto, podendo esse auto fundamentar a sentença, mesmo que o seu autor tenha falecido antes da audiência.”. Nesse sentido, também Ac. RE, de 20.12.2012, disponível em www.dgsi.pt.
Desta forma, não se pode dar como provado que o arguido tenha conduzido o veículo de matrícula x (...) , na Estrada Nacional nº 360, em Nadadouro, Caldas da Rainha, no dia 09.02.2016, pelas 06:30h.
Quanto ao facto de o arguido não ser titular de carta de condução, atentou-se na informação prestada pelo IMT, junta a fls. 17.
No que respeita aos antecedentes criminais do arguido, atendeu o tribunal ao certificado de registo criminal de fls. 91».
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II - O Direito
As conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o âmbito do recurso.
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, as quais deve conhecer e decidir sempre que os autos reúnam os elementos necessários para tal.

Questão a decidir:
Apreciar se o tribunal, que julgou o arguido faltoso devidamente notificado na ausência, por considerar não ser absolutamente indispensável a sua presença, tendo ouvido apenas a testemunha, oferecida na acusação, que se limitou a levantar o auto de notícia, que serviu de fundamento à absolvição, omitiu diligências de prova, devendo designadamente ouvir os agentes de autoridade que procederam à fiscalização e à condução do condutor ao posto da GNR, sob pena de violação do art. 340.º, do CPP e se tal omissão constitui omissão que se traduz em nulidade da sentença.

Apreciando:
Antes de mais, para melhor se perceber a questão suscitada no recurso, importa ter em conta que o auto de notícia, do qual consta que o arguido conduzia o veículo automóvel com a matrícula x (...) , foi levantado pela testemunha B... , que depôs em julgamento, que não presenciou os factos, mas pelo que lhe disseram os colegas que procediam a uma operação STOP e que apresentaram o arguido detido no posto da GNR.
E pelo facto da testemunha que depôs não ter presenciado os factos, designadamente o acto de condução, com inerentes repercussões no valor probatório do auto de notícia e nas suas declarações, que tiveram origem a informação dos colegas que procediam à operação STOP, a senhora juíza absolveu o arguido.
Aliás, é o que consta da motivação, quanto à razão de ciência da testemunha, nos seguintes termos:
«Ouvida em declarações a testemunha B... , militar da GNR, subscritor do auto de notícia que deu origem aos presentes autos, referiu o mesmo que, embora tenha subscrito o auto de notícia e o expediente ao mesmo referente, não presenciou os factos descritos na acusação. Esclareceu que, por determinação superior, e encontrando-se a GNR a realizar uma operação STOP, lhe foi atribuída exclusivamente aquela função de elaborar expediente e lavrar os autos de notícia por infracção.
Esclareceu que se manteve no posto daquela Guarda, onde os seus colegas trouxeram o arguido, com a indicação de que o mesmo havia conduzido, não era portador de carta de condução, informação que obtiveram mediante consulta à base de dados do IMT e que, com base nessa informação elaborou o auto de notícia a que respeitam os autos».
E reagindo em sede de recurso, pretende agora ancorar-se o Ministério Público, na violação do art. 340.º, do CPP, como fundamento da sua motivação.
E fundamenta a sua pretensão, discordando da absolvição, por a senhora juíza não se ter socorrido de tal preceito, ao não ouvir os agentes de autoridade que presenciaram os factos, por se tornar necessário à descoberta da verdade material e boa decisão da causa, encontrando-se assim ferida de nulidade a sentença recorrida, nos termos dos art. 120.º, n.º 2, al. d) e 379.°, n.º 1, al. c), ambos do CPP.
Tendo faltado o arguido à audiência de julgamento, o qual se encontrava devidamente notificado e tendo a senhora juíza considerado que não se afigurava indispensável a sua presença, o mesmo decorreu na sua ausência, nos termos do art. 333.º, n.ºs 1 e 2, do CPP.
E em audiência de julgamento foi ouvida a única testemunha oferecida pelo Ministério Público B... , conforme consta da acta da sessão de 2/4/2017, constante de fls. 92 a 94, a qual declarou que não presenciou os factos constantes do auto de notícia, embora o tenha lavrado por ordem hierárquica.
Finda a produção de prova, a bem da descoberta da verdade material e boa decisão da causa, perante a ausência do arguido na audiência de julgamento e a constatação de que o agente de autoridade que lavrou e assinou o auto não tinha presenciado os factos, impunha-se que oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público se desse cumprimento ao art. 340.º, do CPP, ordenando a comparência do arguido ou dos agentes que procederam à operação STOP e conduziram o arguido ao posto da GNR.
Ora, o Ministério Público que deduziu a acusação e ofereceu a prova que bem entendeu e foi ouvida nada requereu, sendo certo que lhe cabia fazer prova dos factos, por obediência do princípio do acusatório que domina o processo criminal, nos termos do art. 32.º, n.º 5, da CRP.
Incumbia-lhe em primeira linha sustentar a acusação e por isso devia ter diligenciado por colmatar a falha da própria acusação que ofereceu a testemunha que não presenciou os factos, requerendo a audição dos agentes de autoridade que presenciaram os factos e o conduziram o arguido ao posto da GNR para ser levantado o auto de notícia ou diligenciar pela comparência do arguido em audiência de julgamento.
Porém, nada fez e negligenciou a sustentação da matéria acusatória em termos de prova.
Por outro lado, também se impunha à senhora juíza, perante os dados constantes do processo e as declarações da testemunha B... , que oficiosamente ordenasse a comparência do arguido que inicialmente na acta considerou “não se afigurar indispensável” para esclarecer se naquele dia conduzia ou não o veículo, sem estar habilitado ou para os mesmo efeitos ordenasse a notificação dos agentes que procederam à fiscalização do mesmo. 
 E dizemos que se impunham tais cuidados tanto ao Ministério Público, como à senhora juíza face aos elementos indiciários existentes nos autos e às vicissitudes que os autos enfermam também pela parte do OPC, como sejam:
- Os factos ocorreram no dia 9/2/2016, às 6.30h e o auto de notícia foi levantado pelas 7.30h, do qual consta a identificação do arguido e assinado pela testemunha B... , conforme fls. 2 e 3.
- A constituição de arguido, com identificação completa foi feita no dia 9/2/2016, pelas 7.30h, assinado pela testemunha B... e o arguido, conforme fls. 4.
- O boletim individual de detido foi lavrado no dia 9/2/2016, pelas 7.30h, assinado pela testemunha B... e o arguido, conforme fls. 9 e 10.
- A notificação de comparência no Ministério Público para o dia 10/2/2016, pelas 10h, foi assinada pela testemunha B... e o arguido, conforme fls. 11.
- Em 10/2/2016, foi lavrado auto de suspensão provisória do processo que o arguido declarou aceitar, por 4 meses, mediante a obrigação de entregar 300,00€ à APAV ou prestar 30 horas de trabalho comunitário.
- Em 15/2/2016 o Ministério Público propõe 30h de trabalho a favor da comunidade, conforme consta de fls. 21 a 26.
- Em 17/3/2016, a senhora juíza concorda com a suspensão provisória do processo, conforme fls. 36.
- Em 15/9/2016 o Ministério Público profere despacho de incumprimento das obrigações impostas, conforme fls. 66.
 - Em 21/9/2016 o Ministério Público deduz acusação do arguido, oferecendo como prova documental a constante dos autos e a testemunha B... .
Ora, perante tal factualidade processual impunha-se que o tribunal a quo apurasse se o arguido no dia 9/2/2016 conduzia ou não o veículo automóvel com a matrícula x (...) .
Porém, quer o Ministério Público, quer a senhora juíza nada fizeram, deitando mão ao art. 340.º, do CPP, como aliás se impunha, para comprovar este facto, sobre o qual apenas poderiam depor os agentes de autoridade que procederam à fiscalização do arguido ou até o arguido por confissão.
E não o tendo feito oficiosamente a senhora juíza, tal omissão não pode ser suprida agora sem mais pela via directa do recurso interposto.
Para ser sindicável tal questão, com o fundamento da audição dos agentes de autoridade que fiscalizaram o arguido, se tornar necessário à descoberta da verdade material e boa decisão da causa, só por via da nulidade da sentença recorrida, nos termos dos art. 120.º, n.º 2, al. d) e 379.°, n.º 1, al. c), ambos do CPP, como resulta da motivação de recurso e da conclusão vertida na al. L).
E não tendo sido decidida oficiosamente a audição das testemunhas em causa, restava ao Ministério Público, requerer tal diligência, alegando precisamente que se reputava essencial para a descoberta da verdade e depois reagir ao despacho que recaísse sobre o indeferimento.
Porém, como resulta do art. 120.º, n.º 3, al. a), do CPP, a reacção sobre o despacho que indefere o requerimento sobre diligências de prova suplementares essenciais para a descoberta da verdade, deve ser feita através da arguição de nulidade e tratando-se de nulidade a que o interessado assista, deve ser arguida antes do acto terminar.
Nesta conformidade não tendo sido arguida a nulidade no acto, não poderá ser sindicável a agora questão suscitada por via do recurso directo.
Neste sentido, acompanhamos, entre outros a jurisprudência do Ac. do TRG de 27/4/2009 - Proc. 12/03.2TAFAF.G1, relatado pro Cruz Bucho, in www.dgsi.pt/jtrg e Ac. do TRP de 12/2/2014 - Proc. 93/08.2GASJP.P1, relatado por Neto Moura, in www.dgsi.pt/jtrp.
Em conclusão: Se resultar da discussão de audiência de julgamento que determinado meio de prova, não oferecido nos autos com a acusação ou a contestação, o tribunal oficiosamente ou a requerimento deve ordenar a sua produção, desde que se revele necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, sendo que a omissão de tal diligência probatória que podia/devia ser ordenada, oficiosamente ou a requerimento, não poderá ser sindicável por via do recurso directo e constituindo uma nulidade, a mesma dependente de arguição, nos termos do art. 120.º, n.º 2, al. d) e 3, al. a), do CPP.
Nestes termos, improcederá necessariamente o recurso interposto.
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III - Decisão:
Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra, negar provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público.
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Sem custas, por delas estar isento.
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NB: O acórdão foi elaborado pelo relator e revisto pelos seus signatários, nos termos do art. 94.º, n.º 2 do CPP. 
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Coimbra, 21 de Fevereiro de 2018
Inácio Monteiro (relator)
Alice Santos (adjunta)