Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
13/12.0GCACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: OLGA MAURÍCIO
Descritores: PROCESSO SUMÁRIO
AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO
JULGAMENTO NA AUSÊNCIA DO ARGUIDO
Data do Acordão: 01/16/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE ALCOBAÇA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: ALTERADA
Legislação Nacional: ARTIGO 385º Nº 3 A) CPP
Sumário: No âmbito do processo sumário, tendo o arguido sido libertado, depois da detenção, com a advertência para comparecer em tribunal a fim de ser julgado e de que a audiência se realizará, mesmo que não compareça, sendo representado por defensor, a realização do julgamento pode ocorrer na sua ausência.
Decisão Texto Integral: RELATÓRIO

1.
Nos presentes autos foi o arguido A... condenado na pena de 90 dias de multa pela prática, em 20-1-2012, de um crime de desobediência, dos artigos 69º, nº 1, al. c), e 2, e 348º, nº 1, al. a), ambos do Código Penal, e em 150 dias de multa pela prática, em 20-1-2012, de dois crimes de injúria agravada, dos artigos 181º, nº 1, e 184º, com referência ao artigo 132º, nº 2, al. l), do mesmo diploma.
Feito o cúmulo jurídico, foi aplicada ao arguido a pena única de 200 dias de multa, à taxa diária de € 6,00.
Mais foi o arguido condenado na pena de proibição de conduzir qualquer veículo motorizado pelo período de 7 meses.
Quanto ao mais foi absolvido.

2.
Inconformado, o arguido recorreu, retirando da motivação as seguintes conclusões:
«a) Vem o recorrente apresentar recurso relativamente à douta sentença que condenou o mesmo pelos crimes de desobediência e de injúrias agravadas, com a pena única em cúmulo jurídico de 200 dias de multa à razão de € 6,00, para um total de € 1.200,00, bem como a sanção de inibição de condução de 7 meses, mas também do douto despacho do Tribunal a quo que indeferiu a pretensão do ora Recorrente relativa à nulidade dos actos praticados em audiência de discussão e julgamento.
b) Entende o recorrente que a audiência de discussão e julgamento da presente causa ficou ferida de nulidade, nos termos do artigo 119.º c) CPP, porquanto, de acordo com o artigo 332.º/1 CPP, é obrigatória a sua presença.
c) Todavia, entendeu o douto tribunal a quo que não existia causa de nulidade, porquanto o artigo 333.º CPP permitia a realização da audiência sem a presença do mesmo.
d) Todavia, foi igualmente invocada a nulidade da realização da audiência de discussão e julgamento, nos termos do artigo 120º/1 d), na medida em que o arguido não foi ouvido, e por violação do artigo 333º/1 CPP, na medida em que não foram tomadas as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência.
e) Tal foi igualmente indeferido.
f) Todavia, entende o recorrente que, salvo melhor opinião, mal andou o douto tribunal a quo ao indeferir tais pretensões.
g) É que, de acordo com os elementos constantes do processo, não fica demonstrado que tenham sido tomadas todas as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a comparência do arguido, de acordo com o artigo 333.º CPP.
h) Assim, e como em tantos outros casos, deveria o tribunal ter providenciado pela detenção do arguido para apresentação.
i) Isto porque, apesar de se tratar de um processo sumário, certo é que há certos e determinados direitos que devem ser precavidos, nomeadamente o direito de defesa do arguido.
j) Ora, tendo em conta o alegado estado de embriaguez a que o douto tribunal a quo se refere, aliado ao desconhecimento e desorientação nestas situações do homem médio, certo é que o tribunal deveria ter providenciado pela detenção e apresentação do arguido em julgamento, a fim de o mesmo se pronunciar sobre os factos.
k) Aliás, não é por ser processo sumário que os direitos de defesa do arguido se encontram diminuídos.
I) Porém, certo é que se torna muito difícil ao arguido fazer-se valer dos mesmos. Seja porque os defensores oficiosos não se encontram devidamente preparados, seja porque o próprio processo, dadas as limitações temporais, não permitem grande liberdade ao arguido.
m) No entanto, tal não significa que a lei pretenda diminuir ou menosprezar o direito de defesa do arguido. Antes pelo contrário. É certamente nestas situações que o tribunal mais cautelas deve ter em "tomar as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência".
n) E quando a lei fala nestas "medidas" não se cinge apenas à notificação. Notificação essa que o arguido pode nem perceber cabalmente a que diz respeito.
o) Não. Estas "medidas" passam precisamente por garantir que o arguido comparece em tribunal. Por um lado para assegurar a referida defesa, por outro para garantir a vertente pedagógica e reformatória do processo penal. Para que o arguido não pense no processo penal e suas cominações como algo abstracto.
p) Assim, entende o recorrente que, sendo a sua presença obrigatória, pelo supra referido, a realização da audiência sem a mesma fere de nulidade todos os actos praticados, pelo que sempre deverá a douta decisão de indeferimento da nulidade requerida ser revogada e substituída por outra que defira tal pretensão, considerando todo o processado em audiência de julgamento como nulo e obrigando a realizar novo julgamento, com a respectiva marcação de data.
q) Caso assim e não entenda, o que apenas por mera hipótese se admite, sempre se dirá que, ainda assim, sempre estaria tal diligência e actos feridos de nulidade, na medida em que, as declarações do arguido são essenciais para a descoberta material da verdade, porquanto trariam a lume factos que não foram apresentados na acusação, bem como testemunhas de tais factos, nomeadamente que o arguido se não encontrava a conduzir o veículo quando foi abordado pelas autoridades policiais, razão pela qual o crime de desobediência nunca teria existido, pois não estando arguido a conduzir qualquer veículo, não poderiam as mesmas obrigá-lo a realizar qualquer teste de alcoolémia.
r) Ora, na medida em que tal não foi sequer possível de apresentar, pela ausência do arguido à audiência de discussão e julgamento, sempre se reputaria que a sua presença seria essencial para a descoberta da verdade, pelo que o douto tribunal nunca a poderia ter dispensado.
s) Assim, tal afigura-se como nulidade processual, nos termos do artigo 120º/1 d) CPP, razão pela qual a douta decisão de indeferimento de que ora se recorre é ilegal, devendo assim ser revogada e substituída por outra que defira a nulidade requerida, com a consequente realização de novo julgamento, mediante marcação de data para o efeito.
Ainda que assim se não entenda o que apenas por mera hipótese se admite, sempre se dirá que:
t) Vem o recorrente condenado por dois crimes de injúrias agravadas.
u) Porém, de acordo com os factos provados a expressão utilizada foi "vocês são uns merdas. não valem nada".
v) Ora, salvo o devido respeito, e ainda que se tratassem de agentes da autoridade, certo é que, face ao contexto socio-cultural da zona, bem como ao indivíduos envolvidos serem de sexo masculino, tais palavras não podem, sem mais considerar-se como "ofensivas da honra ou consideração".
w) Ainda que se diga que a propagação de tal vocabulário deve ser combatida, certo é que tais expressões se encontram a ser proferidas com maior frequência, sem o intuito marcadamente ofensivo que tinham há diversos anos atrás.
x) A consequente vulgarização de tais termos, sendo actualmente outros considerados de muita gravidade e altamente ofensivos, por comparação, obriga à constante actualização dos vocábulos generalizantes da lei.
y) De facto, o que há anos era considerado injúria, hoje é desprezível, nomeadamente expressões como "filho da mãe".
z) Assim também o serão as referidas expressões alegadamente proferidas pelo recorrente.
aa) Mais, é conhecimento público e generalizado que entre homens e enquanto "expressão de caserna", "és um merdas" não é ofensivo da honra ou consideração de alguém, ao ponto da criminalização. Ou seja, é frequente, apesar de toda a disciplina a que se está habituado, que ao nível da Guarda Nacional Republicana expressões como "és um merdas, não vales nada" sejam frequentemente "arremessadas" sem que os seus interlocutores se sintam "gravemente feridos na sua honra ou consideração".
bb) Assim, apesar da gravidade do desrespeito pela autoridade que tal conduta pudesse representar, a mesma estava já a ser punida pelo crime de desobediência.
cc) Tal implica que as expressões proferidas não são suficientes para que qualquer um dos guardas ficasse "gravemente ofendido na sua honra ou consideração".
dd) Razão pela qual deve a referida decisão ser revogada e substituída por outra que absolva o recorrente dos crimes de injúrias agravadas.
Caso assim e não entenda, o que apenas por mera hipótese se admite, sempre se dirá que:
ee) Mal andou o douto tribunal a quo, salvo melhor opinião, ao condenar o ora recorrente em 200 dias de multa, pelos crimes cometidos.
ff) De facto, aos crimes de injúrias agravadas corresponde uma pena de prisão de 2 a 4 meses, ou de multa de 20 a 180 dias.
gg) Por seu turno, o crime de desobediência é punido com pena de prisão até 1 ano ou multa até 120 dias.
hh) Ora, tendo em conta os antecedentes do recorrente, um crime de injúrias, compreende-se o agravamento de tal pena.
ii) Porém, certo é que a condição psicológica em que alegadamente se encontrava, alcoolismo, bem como o estado de desorientação e confusão, assim como a inexistência de antecedentes criminais ligados ao alcoolismo, ou a "crimes graves", sempre teria de relevar para a atenuação da pena.
jj) Mais, as injúrias não foram alegadamente proferidas individualmente, mas sim num conjunto, o que significa que, ainda que os ofendidos pudessem ser dois, sempre teria de ser tratado com uma expressão individual.
kk) Por outro lado, ao nível das injúrias a expressão foi "relativamente leve", tendo em conta a actual situação linguística da sociedade.
II) Assim, sempre deveria ser considerado que, em cúmulo jurídico, nunca poderia o recorrente ser condenado em mais que 100 dias de multa, à referida razão diária de € 6,00, para um total de € 600,00.
mm) Por outro lado, a sanção acessória é manifestamente desproporcional, tendo em conta que o limite mínimo é de 3 meses.
nn) Ora, tendo em conta que, efectivamente, a condenação deve ter um efeito dissuasor e pedagógico, com vista a evitar o pensamento que "é melhor não ser apanhado", certo é que uma punição de 4 meses serviria tal propósito, de forma adequada e não excessiva.
oo) Assim, sempre deverá tal decisão condenatória ser revogada e substituída por outra que condene o recorrente em cúmulo jurídico em 100 dias de multa à razão diária de € 6,00, bem como a uma sanção acessória de 4 meses de inibição de condução».

3.
O recurso foi admitido.

4.
O Ministério Público respondeu, defendendo a manutenção do decidido.

Nos mesmos termos se pronunciou o Exmº P.G.A. junto desta relação.

Foi cumprido o disposto no nº 2 do art. 417º do C.P.P..

5.
Proferido despacho preliminar foram colhidos os vistos legais.
Realizada a conferência cumpre decidir.
*

FACTOS PROVADOS

6.
Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos:
«1 - No dia 20 de Janeiro de 2012, pelas 3.00 horas, o arguido A..., conduzia o veículo automóvel, ligeiro de passageiros, de matrícula … , na Avenida … , em Pataias, área deste Concelho e Comarca de Alcobaça.
2 - Nessa altura, na sequência de uma acção de fiscalização de trânsito efectuada por uma patrulha da G.N.R. de Pataias, constituída pelo Cabo B... e pelo Guarda C..., estes ordenaram ao arguido A... que se submetesse ao exame de pesquisa de álcool no sangue e que, se assim não fizesse, incorreria na prática de um crime de desobediência.
3 - Não obstante o descrito em 2º, o arguido A... disse ao Cabo B... e pelo Guarda C... “que não soprava, nem iria fazer teste nenhum.”.
4 - O arguido A... bem sabia que ao conduzir veículos na estrada estava obrigado a submeter-se às provas estabelecidas para a detecção de álcool no sangue e de que, se assim, não fizesse, incorreria na prática de um crime de desobediência e, mesmo assim, quis recusar-se a fazê-lo.
5 - Bem sabia que a ordem que lhe fora dada provinha de autoridade competente e que, apesar de advertido das consequências dos seus actos, o arguido manteve o propósito em não se submeter ao exame de detecção de álcool no sangue.
6 - Face ao descrito em 1º a 5º, foi dada voz de detenção ao arguido A..., para ser conduzido ao Posto da G.N.R. de Pataias.
7 - Na altura do referido em 6º, o arguido A... dirigiu-se ao Cabo B... e ao Guarda C..., que sabia serem militares da G.N.R., e disse-lhes:
- “Ides ver o que vos vai acontecer; mais tardes ides pagar isto bem pago, ides ver; vou-vos entalar aos dois; quero a vossa identificação.”.
8 - Conduzido sob detenção ao Posto da G.N.R. de Pataias, no interior deste, o arguido A... voltou a dirigir-se ao Cabo B... e ao Guarda C... e disse-lhes:
- “Vocês são uns merdas, não valem nada, eu não sou nenhum criminoso.”.
9 - Ao actuar da forma descrita em 8º, agiu o arguido A... com pleno conhecimento de que as expressões que proferiu e dirigiu aos ao Cabo B... e ao Guarda C... eram adequadas e susceptíveis de atingir, como atingiram aquele na sua honra e consideração que lhes são devidas.
10 - Bem sabia o arguido A... que o Cabo B... e ao Guarda C... eram militares da Guarda Nacional Republicana e que estes, ao actuar da forma supra descrita, haviam praticado actos para os quais tinham competência e sabia, de igual modo, que os mesmos tinham actuado no exercício das suas funções.
11 - O arguido A... actuou sempre de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas descritas condutas eram censuradas, proibidas e punidas por lei penal.
MAIS SE PROVOU:
12 - O arguido foi anteriormente condenado:
- por decisão de 25.1.2008, transitada em 14/02/2008, pela prática em 01.01.2008 de 4 (quatro) crimes de injúria agravada, p.p. pelos art.ºs 181.º e 184.º e 132.º n.º 2 al. j), do CP, na pena de 120 dias de multa à razão diária de € 5,00, que perfaz o montante total de € 600,00, no âmbito do proc. sumário n.º 3/08.7GBABF, 2.º juízo, do Tribunal Judicial de Albufeira. Tendo a pena sido declarada extinta pelo pagamento efectuado a 27.03.2008;
- por decisão de 04.02.2008, transitada em 10/09/2008, pela prática em 20.02.2007 de um crime de desobediência, p.p. pelo art.º 348.º, do CP, na pena de 70 dias de multa à razão diária de € 6,00, que perfaz o montante total de € 420,00, e na sanção acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 5 meses, no âmbito do proc. comum singular n.º 119/07.7GTLRA, do tribunal judicial de Nazaré. Tendo a pena acessória sido declarada extinta pelo cumprimento em 23.02.2009 e a pena de multa sido declarada extinta pelo pagamento em 28.12.2009;
13 - O arguido assinalou no TIR ser empresário.
14 - O arguido não compareceu em audiência».

7.
E foram julgados não provados quaisquer outros factos com relevância para a causa, nomeadamente:
«a) que ao actuar da forma descrita em 7º, agiu ainda o arguido A... com pleno conhecimento de que as expressões que proferiu e dirigiu ao Cabo B... e ao Guarda C... eram meio adequado a produzir-lhes, como produziram, receio, medo, temor e inquietação pela eventual instauração de processo crime ou processo disciplinar contra os mesmos, sendo certo que, com as suas condutas, pretendia precisamente incutir-lhes medo e dar-lhes a atender que lhes faria mal».

8.
O tribunal recorrido motivou a sua decisão sobre os factos provados e não provados nos seguintes termos:
«… para prova do descrito de 1. a 6. dos factos provados, atentei no auto de noticia de fls. 2 e 2v.º, conjugadamente com a análise crítica das declarações das testemunhas B... e C… , ambos militares da GNR, que tomaram conta da ocorrência, abordaram o arguido após o terem visto a conduzir a viatura fazendo uma travagem brusca em frente ao multibanco, tendo-o então abordado e sendo o arguido o condutor e solicitaram que efectuasse o teste de despistagem do álcool o que ele recusou e então advertiram-no de que incorria em desobediência caso não acedesse em efectuar o teste; mais explicaram ao tribunal o circunstancialismo em que abordaram o arguido e postura deste quando o abordaram, que o arguido proferiu as expressões referidas em 3., 7. e 8., mais confirmando que não haveria dúvidas de que os militares em causa estavam no exercício das suas funções tanto mais que se encontravam devidamente fardados. Todas as testemunhas depuseram de forma clara e coerente merecedoras de credibilidade.
Para prova do descrito em 4) atendi às regras de experiência comum concretizadas no concreto comportamento exteriorizado, uma vez que a condução é actividade complexa em que o ser humano actua conscientemente. Para prova do descrito em 7) a 10) atendi igualmente às regras de experiência comum concretizadas no concreto comportamento exteriorizado, uma vez que ao proferir as expressões em causa e dirigidas directamente a quem se encontrava devidamente fardado, não havendo dúvidas de que ali estava no exercício das suas funções, o ser humano actua conscientemente, bem sabendo que as expressões em causa eram adequadas e objectivamente injuriosas para aquele.
Para prova das condições económico-sociais e situação actual do arguido considerei o teor das suas declarações prestadas no TIR de fls. 4 e quanto à ausência à audiência de julgamento atentei no teor da acta da referida diligência de 20.01.2012.
Para prova dos antecedentes criminais atendi ao teor do certificado de registo criminal de fls. 22 ss, emitido a 20.01.2012».
*
*

DECISÃO

Como sabemos, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente (art. 412º, nº 1, in fine, do C.P.P., Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 2ª ed., III, 335 e jurisprudência uniforme do S.T.J. - cfr. acórdão do S.T.J. de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, pág. 196 e jurisprudência ali citada e Simas Santos / Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 5ª ed., pág. 74 e decisões ali referenciadas), sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios enumerados no art. 410º, nº 2, do mesmo Código.

Por via dessa delimitação são as seguintes as questões a decidir:
I – Nulidade decorrente da ausência do arguido a julgamento e da sua não audição
II – Impugnação do enquadramento legal dos factos provados
III – Impugnação das penas aplicadas

*

I – Nulidade decorrente da ausência do arguido a julgamento e da sua não audição

O arguido alega que foram violados os art. 332º, nº 1, do C.P.P., que impõe a presença do arguido na audiência e o seu direito de ser ouvido em julgamento, direitos estes inscritos nos seu direito de defesa, donde resulta o cometimento das nulidades previstas nos art. 119º, al. c), e 120º, nº 1, al. d), ambos do C.P.P.

O nº 1 do art. 332º do C.P.P. dispõe: «é obrigatória a presença do arguido na audiência, sem prejuízo do disposto nos nº 1 e 2 dos artigos 333º …».
Por seu turno, é a seguinte a redação dos nº 1 e 2 do art. 333º, subordinado à epígrafe “falta e julgamento na ausência do arguido notificado para a audiência”:
«1 - Se o arguido regularmente notificado não estiver presente na hora designada para o início da audiência, o presidente toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência e a audiência só é adiada se o tribunal considerar que é absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material a sua presença desde o início da audiência.
2 - Se o tribunal considerar que a audiência pode começar sem a presença do arguido, ou se a falta de arguido tiver como causa os impedimentos enunciados nos nº 2 a 4 do artigo 117.º, a audiência não é adiada, sendo inquiridas ou ouvidas as pessoas presentes pela ordem referida nas alíneas b) e c) do artigo 341.º, sem prejuízo da alteração que seja necessária efectuar no rol apresentado, e as suas declarações documentadas, aplicando-se sempre que necessário o disposto no n.º 6 do artigo 117.º».

Desta norma resulta que apesar da obrigatoriedade é possível realizar a audiência sem a presença do arguido desde que se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições:
1º - o arguido estar regularmente notificado para o julgamento;
2º - não se encontrar presente no dia e hora marcados para a audiência;
3º - o tribunal não considerar que a presença do arguido desde o início do julgamento é absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material.
Assim, o tribunal só deve tomar as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a comparência do arguido, nos termos do nº 1 do art. 333º do C.P.P., se considerar que a sua presença é absolutamente indispensável desde o início. Caso contrário o tribunal não tomará qualquer medida e a audiência realizar-se-á sem a presença do arguido.

Esta é a regra geral.

O processo sumário – forma processual aqui em causa -, tem, contudo, norma específica sobre a matéria, constante do nº 3 do art. 385º, aplicável aos casos em que o arguido é libertado depois da detenção, e que diz:
«3 - No caso de libertação nos termos dos números anteriores, o órgão de polícia criminal sujeita o arguido a termo de identidade e residência e notifica-o para comparecer perante o Ministério Público, no dia e hora que forem designados, para ser submetido:
a) A audiência de julgamento em processo sumário, com a advertência de que esta se realizará, mesmo que não compareça, sendo representado por defensor …».
No caso presente o arguido foi libertado depois da detenção e foi notificado nos exatos termos desta norma.
Não se verifica, portanto, qualquer nulidade decorrente de a audiência de julgamento se ter realizado sem a presença do arguido.

Ainda com base na mesma situação o arguido alega que a realização da audiência sem a sua presença violou, também, os seus direitos de defesa, uma vez que não foi ouvido e tinha direito a sê-lo.

O nº 5 do art. 32º da Constituição, para além de consagrar o princípio do acusatório como princípio estruturante do nosso processo criminal, diz que a audiência e os actos instrutórios que a lei determinar estão subordinados ao princípio do contraditório.
Eis a consagração do princípio da audiência, expressão do direito do cidadão à justiça, na medida em que confere a todo o participante processual o direito de, através da sua audição, influir na declaração do direito.
Este direito encontra-se genericamente atribuído ao arguido, no art. 61º, nº 1, al. b), do C.P.P., quando estabelece que o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo do direito de «ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente os afecte».
Audiência deriva de “audire”, ouvir, e o paradigma do direito de ser ouvido é, claro, a audiência de discussão e julgamento.
Para além do direito de audiência temos o direito de presença, que também integra o processo justo e equitativo, precisamente por ser, ainda, um direito de defesa. Este direito de presença, previsto na al. a) do nº 1 do art. 61º do C.P.P., consubstancia-se na possibilidade de o arguido estar presente aos actos processuais que directamente lhe disserem respeito.
Esta é a perspectiva à luz dos direitos do arguido.
Na perspectiva dos deveres, temos o seu reverso no seu nº 3, al. a), quando estabelece como dever do arguido o de comparecer perante o juiz, o Ministério Público ou perante os órgãos de polícia criminal sempre que para tal seja devidamente convocado.
É o direito de presença que dá ao arguido a possibilidade de tomar posição sobre o material probatório que for sendo coligido e que lhe faculta uma relação de imediação com os meios de prova e com a investigação.

É evidente, portanto, que o arguido tem o direito de estar presente em julgamento e tem o direito, ainda, de falar sobre qualquer questão que lhe diga respeito.
E tendo tais direitos o tribunal tem que os respeitar dando-lhe, consequentemente, a possibilidade de os exercer.
E o caso isso foi feito. O arguido foi notificado para comparecer tendo-lhe sido comunicado, ao mesmo tempo, das consequências da sua falta.
Ora, o arguido escolheu faltar.
Portanto, o não exercício dos direitos de audiência e de presença derivaram da opção tomada, livremente, pelo arguido e não de qualquer violação de lei cometida pelo tribunal recorrido.
*

II – Impugnação do enquadramento legal dos factos provados

O arguido alega, ainda, que as palavras que dirigiu aos agentes da autoridade não podem mais considerar-se como "ofensivas da honra ou consideração". Integram, antes, a linguagem corrente e, apesar de desrespeitosas, não podem fundamentar uma condenação.
Alega, também, que a expressão em causa foi uma só, proferida num conjunto, o que significa que, ainda que os ofendidos pudessem ser dois, sempre teria de ser tratado com uma expressão individual. Daqui conclui que o crime cometido foi um só.

Conforme ficou provado, no dia 20-1-2012, depois de ter sido detido por B... e C..., militares da GNR em exercício de funções, o arguido disse, dirigindo-se a ambos, «vocês são uns merdas, não valem nada, eu não sou nenhum criminoso».

A fundamentação de direito relativa ao caso concreto, constante da sentença recorrida, foi a seguinte: «Aferindo a expressão em função do concreto conteúdo, amplitude e extensão do bem jurídico protegido, informado pela concepção social dominante sobre o que razoavelmente se deve considerar ofensivo do bem jurídico, a conduta da arguida apresenta-se objectivamente típica e, por isso, não pode ser excluída da tutela penal».
*

O nº 1 do art. 26º da Constituição tutela, a par de outros direitos de personalidade, o direito ao bom nome e reputação, que «consiste essencialmente no direito de não ser ofendido ou lesado na sua honra, dignidade ou consideração social mediante imputação feita por outrem, bem como no direito de defender-se dessa ofensa e a obter a competente reparação …» Gomes Canotilho-Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 1º vol., anotação ao art. 26º..
Na lei ordinária a tutela da honra e consideração pessoais é garantida pelos art. 180º e 181º do Código Penal, que prevê e pune os crimes de difamação e injúria.
Dispõe o nº 1 do art. 181º do Código Penal que «quem injuriar outra pessoa, imputando-lhe factos, mesmo sob a forma de suspeita, ou dirigindo-lhe palavras, ofensivos da sua honra ou consideração, é punido com pena de prisão até 3 meses ou com pena de multa até 120 dias».
Por seu turno, o art. 184º eleva as penas previstas em metade, nos seus limites mínimo e máximo, quando a vítima for, nomeadamente, agente da autoridade no exercício das suas funções (art. 132º, nº 2, al. l), do Código Penal).

Sobre a honra diz Beleza dos Santos Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 92º, pág. 161 a 168. que «é aquele mínimo de condições, especialmente de natureza moral que são razoavelmente consideradas essenciais para que um indivíduo possa com legitimidade ter estima por si, pelo que é e vale. A consideração é aquele conjunto de requisitos que razoavelmente se deve julgar necessário a qualquer pessoa, de tal modo que a falta de algum desses requisitos possa expor essa pessoa à falta de consideração e ao desprezo público».
Então, o que se visa defender com a incriminação das ofensas à honra e consideração é o complexo que abrange quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a própria reputação ou consideração exterior, a imagem que têm dele.
Mas é claro que nem todos os juízos e imputações que revelem desconsideração são jurídico-penalmente punidos.
Sendo o direito penal a ultima ratio há que ver se o juízo emitido deve despoletar a intervenção do direito penal.
Aqui, como em muitas situações, o contexto é essencial, ou seja, há que analisar a situação no seu contexto – pois só assim ela pode ser correctamente analisada -, para se apurar se houve ou não crime.

Concordamos com o arguido quando diz que comportamentos desrespeitosos não significa comportamento ilícitos, ou seja, uma expressão pode ser desrespeitosa, grosseira, mas que isso não significa que a mesma deva ser tida como penalmente censurável e por isso entendemos que muitas das situações tidas como injuriosas ou difamatórias mais não são do que desrespeitosas.
As expressões de liberdade, onde a liberdade de linguagem se insere, caracterizam-se por uma estrutura marcadamente relacional: é por via dialógica e não pelo monólogo que elas se realizam. De forma mais ou menos ostensiva, todas elas se analisam em mecanismos essenciais de comunicação e intersubjectividade Acórdão da Relação do Porto de 22-11-2006, relatado pela srª desembargadora Maria do Carmo Silva Dias..
E a tensão há-de resolver-se ponderando toda a situação, os interesses em presença e fazendo intervir, ainda, os princípios da necessidade, proporcionalidade e adequação, pedra de toque da intervenção do direito penal.
A ponderação da situação é essencial, o episódio ofensivo não pode isolar-se, qual ilha separada do continente.
Atente-se no que diz Faria Costa sobre isto In Comentário Conimbricense do Código Penal, parte especial, tomo I, 1999, fls. 630/631.: «… o significado das palavras … tem um valor de uso. Valor que se aprecia, justamente, no contexto situacional …».
Sem cair na defesa da impunidade, este autor alerta para o facto de muitas vezes a situação retirar a determinada expressão a carga ofensiva que, à partida, poderia ter. Por isso, conclui, o facto não pode ser descontextualizado sob pena de, muitas vezes, se acolher e premiar um venire contra factum proprium.
Ou seja, se, em abstracto, determinadas palavras podem ser consideradas como ofensivas por alguns, já a sua análise no contexto em que foram ditas pode levar a concluir de forma diferente.
Por exemplo, havendo um diálogo de ofensas mútuas não é razoável, depois, ter como violadoras do direito à honra e consideração algumas das palavras proferidas em tal contexto.

Porém, no caso a expressão do arguido integra o âmbito de punição do crime de injúria, imputado.
A expressão «vocês são uns merdas …» será, em muitos casos, irrelevante, desde logo quando proferida num contexto em que este tipo de vocábulos seja usado pelos vários elementos em confronto.
No caso, porém, de agentes da autoridade no exercício da sua função de fiscalização o relevo daquela expressão altera-se, desde logo porque traduz a tentativa de menorização do trabalho que os ofendidos estavam a realizar e, tanto quanto resulta, de forma respeitosa e dentro dos limites das suas competências.

Entendemos, portanto, que o comportamento do arguido integra o crime pelo qual foi condenado.

Sobre a unidade ou pluralidade de crimes, não obstante a sentença recorrida não fundamentar o facto de ter condenado o arguido pela prática de dois crimes de injúria, a verdade é que o arguido cometeu, efetivamente, dois crimes de injúria.

Nos termos do nº 1 do art. 30º do Código Penal, que versa sobre o concurso de crimes e crime continuado, «o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente».
Acrescenta o nº 2 que «constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente».
Face a estas normas a expressão do arguido determinaria a prática de um só crime.
No entanto, e conforme resulta do nº 3, quando o crime ataque bens eminentemente pessoais, este número 2 não se aplica, caso em que o número de crimes será determinado pelo número de ofendidos.
No caso o bem violado foi, como se disse, a honra e consideração, pelo que o número de crimes cometidos coincide com o número de pessoas visadas.
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III – Impugnação das penas aplicadas

Finalmente o arguido insurge-se contra as penas aplicadas aos crimes de injúria, dizendo que a condição psicológica em que se encontrava e o seu estado de desorientação e confusão teriam de relevar para a atenuação da pena.
Para além disso a expressão ofensiva foi relativamente leve, tendo em conta a actual situação linguística da sociedade.

Por via do disposto nos art. 181º, nº 1, 184º e 132º, nº 2, al. l), do Código Penal, os crimes de injúria cometidos pelo arguido são puníveis com prisão de 45 dias a 4 meses e meio ou multa de 20 a 180 dias.

Nos termos do art. 40º, nº 1 e 2, do Código Penal, a pena, que não pode nunca ultrapassar a medida da culpa, visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
Depois os art. 70º e segs. do Código Penal estabelecem as regras da escolha e medida da pena.
Dos itens do art. 71º resulta que a medida da pena é dada pelas exigências de prevenção geral positiva. Depois, no âmbito desta moldura, a medida concreta da pena é encontrada em função das necessidades de prevenção especial de socialização do agente ou, sendo estas inexistentes, das necessidades de intimidação e de segurança individuais. Finalmente surge a culpa, que indica o limite máximo da pena que em caso algum pode ser ultrapassado em nome de exigências preventivas Anabela Rodrigues, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 12, nº 2, Abril-Junho de 2002, pág. 147 e segs..

Embora com parâmetros de análise imperativos, na fixação da pena o julgador goza de alguma margem de liberdade, de modo que o que há que analisar, quando o recurso se dirige contra a pena aplicada, é se os critérios fundamentais da culpa, da prevenção especial e geral e as demais circunstâncias que rodearam o crime - passadas, contemporâneas ou posteriores -, foram consideradas e se a pena encontrada é inadequada quanto à escolha ou desajustada quanto à duração. Ou seja, tida como boa a pena aplicada, para se proceder a qualquer alteração na sua duração terá o desajustamento que ser relevante, a pena terá que surgir como desproporcionado face à culpa e exigências de prevenção que se façam sentir.
Portanto, é suscetível de revista as operações de determinação ou do procedimento, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, a falta de indicação de factores relevantes, o desconhecimento pelo tribunal ou a errada aplicação dos princípios gerais de determinação. Relativamente à determinação do quantum exacto de pena será objecto de alteração se tiver ocorrido violação das regras da experiência ou a desproporção da quantificação efectuada. Desde que sejam observados os critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de actuação do julgador que é dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de censurar. Por isso o recurso não pode pretender apurar o “quantum” exacto da pena, salvo se existir uma desproporção da quantificação efectuada Sobre a questão, e a título exemplificativo, vejam-se os acórdãos do S.T.J. de 25-10-2006, processo 05P3635, relatado pelo sr. conselheiro Soreto de Barros, de 29-3-2007, processo 07P1034, relatado pelo sr. conselheiro Simas Santos, e de 14-5-2009, processo 19/08.3PSPRT, relatado pelo sr. conselheiro Raul Borges, e o da Relação do Porto de 2-6-2010, processo 60/09.9GNPRT, relatado pelo sr. desembargador Joaquim Gomes..

Ora, face ao caso e aos fundamentos avançados, entendemos que a pena se mostra desadequada, porque desproporcional à gravidade do caso.
É claro que se trata de agentes da autoridade no exercício das funções – o que determinou a agravação -, que há que garantir o respeito por tal função, socialmente essencial, mas isto não significa que se deva tratar uma qualquer destas situações exasperadamente.
Integrando a expressão proferida o crime imputado, entendemos, porém, que a gravidade não é de molde a situar as penas aplicadas a escassos 10 dias do máximo legal.

Assim, pela prática de cada um dos crimes de injúria, dos art. 181º e 184º do Código Penal, aplica-se ao arguido a pena de 70 dias de multa, à taxa diária de 6 €.

Dada a alteração de algumas das penas parcelares há, agora, que reformular o cúmulo jurídico aplicado ao arguido.

Nos termos do art. 77º, nº 1 e 2, do Código Penal, em caso de concurso de crimes é aplicada ao agente uma pena única, cujo limite máximo corresponde à soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar os 25 anos, sendo que o limite mínimo é igual à mais elevada pena concreta aplicada aos vários crimes em concurso.
No caso as penas a ter em conta são as seguintes: 90 dias de multa, pela prática de um crime de desobediência, e 70 dias de multa por cada um dos dois crimes de injúria.
Assim, o limite mínimo da pena única é de 90 dias e o limite máximo de 230 dias.

A pena conjunta deve ser encontrada quer atendendo aos critérios gerais de determinação da pena – culpa e prevenção -, quer atendendo ao critério especial fornecido pelo nº 1 do art. 77º, que diz deverem ser «considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente».
Tudo se passa, diz Figueiredo Dias, «como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é recondutível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade» sendo que «só no primeiro caso … será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta» Direito Penal Português-As Consequências Jurídicas do Crime, 2005, pág. 291..

O modelo de fixação da pena no concurso obriga a olhar para o conjunto, isto é, para os factos, para a sua conexão, e para a relação dos mesmos com a personalidade do seu agente. Por isso os critérios legais de determinação da pena conjunta são diferentes dos que determinam as penas parcelares por cada crime: agora há que abandonar a visão compartimentada, que esteve na base da construção da moldura, e atentar na unicidade do sujeito em julgamento. Fundamental agora é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação desse espaço de vida com a personalidade Acórdão do S.T.J. de 10-12-2009, proferido no processo 496/08.2GTABF.S1..
Ora, a visão conjunta deste pedaço de vida expõe uma situação de descontrolo manifesto, gerador de ilícitos sucessivos, que urge aqui relevar.

Assim temos por adequado fixar em 170 dias de multa a pena única.

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DISPOSITIVO

Pelos fundamentos expostos, e na procedência parcial do recurso, condena-se o arguido A... condenado na pena de 70 (setenta) dias de multa por cada um dos crimes de injúria agravada cometidos.
Feito o cúmulo jurídico, vai ele condenado na pena única de 170 (cento e setenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00.

Sem custas.


Elaborado em computador e revisto pela relatora, 1ª signatária – art. 94º, nº 2, do C.P.P.


Coimbra, 2013-01-16