Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
151/15.7JACBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ELISA SALES
Descritores: PASSAGEM DE MOEDA FALSA
TIPO OBJECTIVO
Data do Acordão: 11/29/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO - C.BRANCO - JL CRIMINAL - JUIZ 2
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 265.º, N.º 1, AL. A), DO CP
Sumário: I – Estando provado que o destino último da “nota” era a utilização como se verdadeira fosse, a circunstância de o arguido ter comunicado à pessoa a quem a entregou que a mesma era falsa não afasta a relevância da actuação, como modalidade da acção típica do crime de passagem de moeda falsa, p. e p. pelo artigo 265.º, n.º 1, al. a), do CP.

II – Com efeito, aquela norma não exige, como elemento constitutivo do referenciado crime, uma actividade enganadora do agente acerca da natureza da moeda que tenciona pôr em circulação.

Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

I - RELATÓRIO

No processo comum n.º 151/15.7JACBR supra identificado, após a realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença que decidiu:
A.CONDENAR o arguido A... , pela prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, de dois crimes de passagem de moeda falsa, previstos e puníveis pelo artigo 265°, n.º 1, al. a), do Código Penal, com referência ao artigo 255°, al. d), do mesmo diploma legal, na pena única de 1 (um) ano de prisão efectiva, em cúmulo jurídico das penas parcelares de nove meses de prisão, por cada um dos referidos crimes;
B.CONDENAR a arguida C... pela prática, em concurso real, de dois crimes de passagem de moeda falsa, previstos e puníveis pelos artigos 265oJ n.º 1, al. a) e 3, do Código Penal, com referência aos artigos 22°, n.ºs 1 e 2, al. a) e b) e 255°, al. d), do mesmo diploma legal, um em autoria material, na forma consumada, e outro em co-autoria material, na forma tentada, na pena única de 8 (oito) meses de prisão, substituída pela prestação de 240 (duzentas e quarenta) horas de prestação de trabalho a favor da instituição que vier a ser indicada pela Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, em cúmulo jurídico das penas parcelares de seis meses de prisão, pela prática do crime na forma consumada, e quatro meses de prisão, pela prática do crime na forma tentada;
C.CONDENAR a arguida B... pela prática, em concurso real, de dois crimes de passagem de moeda falsa, previstos e puníveis pelo artigo 265°, n.º 1, al. a), e 3, do Código Penal, com referência aos artigos 22°, n.ºs 1 e 2, al. a) e b) e 255°, al. d), do mesmo diploma legal, um em autoria material, na forma consumada, e outro em co-autoria material, na forma tentada, na pena única de 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano, acompanhada de regime de prova, que contemple, além do mais que for concretizado pela Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, no plano a elaborar oportunamente, os seguintes deveres e regras de conduta:

C1. obrigação de manter actividade profissional e/ou de formação durante o período da suspensão ou, pelo menos, não sendo a mesma possível, de efectuar um esforço válido, consistente e permanente nesse sentido;

C2. realizar reuniões com os técnicos da Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais ou com pessoa idónea por estes indicada, que sensibilizem a arguida para a necessidade de conformar o seu comportamento às regras de direito penal;

em cúmulo jurídico das penas parcelares de oito meses de prisão, pela prática do crime na forma consumada, e seis meses de prisão, pela prática do crime na forma tentada;
D.CONDENAR a arguida H... pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de passagem de moeda falsa, previsto e punível pelo artigo 265°, n.º 1, al. a), do Código Penal, com referência ao artigo 255°, al. d), do mesmo diploma legal, na pena de 8 (oito) meses de prisão, substituída pela prestação de 240 (duzentas e quarenta) horas de prestação de trabalho a favor da instituição que vier a ser indicada pela Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.

 


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O arguido A... por discordar da decisão proferida pela 1ª instância veio interpor o presente recurso, tendo extraído da motivação as seguintes conclusões:
A)  Por Sentença proferida em 7 de Dezembro de 2016 o Arguido, ora Recorrente, foi condenado, pela prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, de dois crimes de passagem de moeda falsa, previstos e puníveis pelo artigo 265.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, com referência ao artigo 255.º, alínea d) do mesmo diploma legal, na pena única de 1 ano de prisão efectiva, em cúmulo jurídico das penas parcelares de nove meses de prisão, por cada um dos referidos crimes.
B)  Operando o cúmulo jurídico, o Arguido foi condenado numa pena única de 1 ano de prisão efectiva;
C)  O presente Recurso tem por objecto a matéria constante da Sentença proferida nos presentes autos, quanto à dosimetria da pena e matéria de Direito (art.º 410.º, n.º 1 e 412.º, n.º 2 do CPP);
D)  Comecemos pela convicção do Tribunal e, o que nesta sede, se refere na Sentença:
E)  No caso concreto o douto Tribunal entendeu que “a circunstância de este (referindo-se ao aqui Recorrente) ter, tal como as arguidas C... e B... , comunicado à pessoa a quem entregou a nota que esta era falsa, não afasta a relevância da sua actuação, como modalidade da acção típica do crime pelo qual vem acusado, porquanto se provou que o destino último da mesma era ser utilizado como se fosse verdadeira.”
F) Consideramos, no entanto, que, o Recorrente ao ter advertido as co-arguidas expressamente, nas duas ocasiões, que as notas eram falsas o mesmo não pratica o crime em causa visto que, não se consome o elemento típico de “colocar em circulação como se fosse legítima ou intacta” e, por essa razão, cremos que o Recorrente devia ter sido absolvido da prática do crime em questão;
G)  Quanto à utilização a fazer das mesmas, essa só pode ter sido efectivamente provada pelas declarações da arguida C... e não do aqui Recorrente já que este, a partir do momento em que entrega as notas, perde o controlo do seu destino e o fim último da sua utilização;
H)  Não se pode considerar que o Recorrente, ao fazer tal entrega, após muita insistência da arguida C... , que este agiu com dolo directo, uma vez que o mesmo não “representou os factos que preenchem o tipo de crime (elemento intelectual ou cognitivo) e actuou com intenção de os realizar (elemento volitivo)”;
I) Neste âmbito, cremos que o douto Tribunal também deveria ter equacionado o tipo de dolo em causa visto que, em nosso entender, não se poderia classificar como dolo directo mas quando muito como dolo eventual, o que não foi feito;
J) Não pode afirmar-se que efectivamente o Recorrente tinha “o propósito último, concretizado, de que a mesma fosse colocada em circulação como se fosse legítima”;
K)  Até porque bastaria que as arguidas C... e B... não tivessem utilizado as citadas 2 notas com o intuito que o fizeram para que o crime não se tivesse consumado pois foram elas que sempre tiveram intenção de as colocar em circulação como se de notas falsas se tratassem;
L)  No caso concreto, considera-se que a pena aplicada peca por severidade visto que teve em única análise os anteriores antecedentes criminais do arguido;
M) É certo que o Recorrente possui já treze condenações anteriores mas cumpridas em data anterior à prática dos factos aqui vertidos;
N)  Tendo praticado o último crime no decurso do ano de 2009 e extinta a última pena aplicada, por cumprimento, em 12/8/2015;
O)  Da perspectiva da prevenção especial e do agente em si, militam a favor do Arguido:
    - No meio social onde reside o arguido relaciona-se com terceiros sem conflitos, pelo que não existe hostilidade para consigo, embora a sua imagem esteja associada a um modo de vida relacionado com a vida da noite;
   - Demonstra preocupação face à presente situação jurídica e ansiedade pelo impacto que a mesma pode representar para a sua vida futura;
   - No âmbito de acompanhamento realizado pela Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, na execução de penas que anteriormente lhe forma impostas, o arguido adoptou uma atitude de colaboração. - cfr. Relatório Social junto aos autos
   - Os crimes anteriormente praticados são de natureza jurídica diversa dos crimes aqui em causa;
P)  “Uma pena excessiva não cumpre as finalidades de prevenção geral, porque intolerável comunitariamente; não realiza as funções de prevenção especial, porque o agente não a aceita e tem-na por injusta, não exercendo uma função de emenda cívica, tornando-se um puro desperdício.” Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. n.º 08P2487 de 25/9/2008.
Q)  Pelo que, ao nível da dosimetria da pena, e caso se considere que o Recorrente praticou o crime em causa pelo simples facto de ter entregue as duas reproduções de notas às co-arguidas C... e B... , deverá ponderar-se a aplicação da execução da pena aplicada em regime de permanência na habitação ou de prisão por dias livres de modo a assegurar as finalidades de prevenção geral e especial que o caso possa requerer.

Termos em que e nos mais de Direito, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, por via dele, ser revogada a Sentença de 1.ª instância, absolvendo-se o Recorrente da prática do crime de que vem acusado ou, caso assim não se entenda, permitir que a execução da pena aplicada de 1 ano de prisão seja executada em regime de permanência na habitação com recurso a vigilância electrónica ou em regime de dias livres.


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Respondeu a Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal a quo defendendo a improcedência do recurso e, a consequente manutenção da condenação do arguido, nos precisos termos em que foi proferida.
Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no mesmo sentido.
Notificado o arguido, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 417º do CPP, não respondeu.

Os autos tiveram os vistos legais.


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II- FUNDAMENTAÇÃO

Da sentença recorrida consta o seguinte (por transcrição e a negrito a matéria relativa ao recorrente):

A. Factos Provados.

Da discussão da causa e com interesse para a respectiva decisão, resultaram provados os seguintes factos:

Da acusação

1. Em data não concretamente determinada, mas anterior ao dia 28 de Abril de 2015, no interior da residência do arguido A... , este deu à arguida C... uma reprodução de uma nota de 50 €, com o número de série X (...) , a qual tinha chegado à sua posse de forma não apurada, tendo aquele arguido esclarecido esta arguida que a mesma não era verdadeira.

2. Em dia não concretamente apurado, do mês de Abril de 2015, a arguida C... dirigiu-se à casa de E... , sita Rua (... ), a fim de aí se encontrar com a sua filha, a arguida B... , que aí se encontrava a pernoitar, com o então seu namorado D... .

3. Uma vez aí chegada, a arguida C... foi para o interior do quarto onde a arguida B... se encontrava a dormir e, sabendo que esta tinha grandes dificuldades económicas, pois não tinha qualquer rendimento, entregou-lhe a reprodução da nota de 50 €, que lhe havia sido dada pelo arguido A... . 

4. Alguns momentos depois, já na sala da referida residência, a arguida B... disse a E... , sua prima, que a sua mãe lhe havia acabado de entregar a reprodução da nota de 50 €.

5. Tendo a arguida C... afirmado "olha E... , a nota é falsa, mas nos dias que correm a gente tem de se saber desenrascar", esclarecendo ainda que tinha sido o arguido A... que lhe havia dado tal reprodução.

6. Pouco depois, as arguidas C... e B... abandonaram aquela residência, na companhia de D... .

7. No dia 28.04.2015, na posse de tal reprodução da nota de 50 €, a arguida B... dirigiu-se ao estabelecimento comercial denominado " (...) " e, depois, ao estabelecimento comercial denominado " (...) ", ambos sitos na Avenida (...) , nesta cidade, com intenção de proceder à sua entrega, solicitando que a destrocassem em notas de valor mais pequeno ou procedendo ao pagamento de uma compra de baixo valor.

8. Porém, a arguida B... acabou por desistir de tal propósito.

9. Mais tarde, nesse mesmo dia, a arguida B... encontrava-se na casa da arguida H... , mãe de D... , sita no Bairro (...) , em Castelo Branco.

10. Então, a arguida B... entregou a reprodução da nota de 50 € à arguida H... , esclarecendo-a que não se tratava de uma nota verdadeira, e pediu-lhe para proceder à passagem da mesma, o que esta aceitou.

11. Com tal intenção, a arguida H... saiu da sua residência e dirigiu-se ao supermercado " (...) ", sito na (...) , nesta cidade, onde solicitou a F... , funcionária de tal estabelecimento comercial, que lhe destrocasse a "nota" de 50 €. 

12. F... disse à arguida H... que não o poderia fazer, visto ser perto das 13 horas e ter já a caixa fechada.

13. A arguida H... dirigiu-se, então, à pastelaria " (...) ", também sita (...) , onde solicitou a G... que destrocasse a "nota" de 50 €.

14. Porém, este não a destrocou, por não ter notas que permitissem fazê-lo.

15. Então, pelas 12 horas e 50 minutos, a arguida H... dirigiu-se ao estabelecimento comercial denominado "Bar (...) ", sito na (...) .

16. Uma vez no seu interior, a arguida H... pediu a I... uma garrafa de litro de cerveja.

17. Pediu-lhe, ainda, que a guardasse e que mais tarde iria buscá-la.

18. I... cobrou pela garrafa de cerveja a quantia de 2,10 €, tendo a arguida H... entregue ao mesmo, para pagamento, a reprodução da nota de 50 €, recebendo de troco a quantia de 47,90 €, que guardou.

19. A arguida H... regressou a sua casa, local onde entregou os 47,90 € à arguida B... , que a recompensou com uma nota de 20 €, que logo lhe entregou.

20. A referida reprodução da nota foi obtida através de impressão policromática de jacto de tinta, a partir de uma nota de 50 € com o número de série X (...) .

21. A garrafa de cerveja acabou por ficar na posse dos proprietários do "Bar (...) ", por não ter sido entregue.

22. No dia 28 de Abril de 2015, a arguida B... dirigiu-se a casa da sua mãe, a arguida C... , sita na Rua (...) , na companhia de D... .

23. Aí chegada, a arguida B... pediu à arguida C... mais dinheiro, uma vez que já não tinha. 

24. A arguida C... disse-lhe que não tinha qualquer dinheiro consigo, tendo proposto que se deslocassem a casa do arguido A... , ali perto, para lhe pedirem que lhes desse mais uma reprodução de uma nota de 50 €.

25. As arguidas C... e B... deslocaram-se, então, à residência do arguido A... .

26. Uma vez no seu interior, as arguidas solicitaram-lhe que lhes entregasse mais uma reprodução de nota de 50 €.

27. O arguido A... concordou em dar-lhes mais uma reprodução de nota, tendo entregue à arguida B... uma reprodução de nota de 50 €.

28. A arguida C... regressou, então, a sua casa, enquanto a arguida B... e o D... regressaram a Castelo Branco.

29. Já em Castelo Branco, cerca das 15 horas, a arguida B... dirigiu-se à papelaria " (...) ", sita na Rua (...) , nesta cidade.

30. Aí, a arguida B... pediu um maço de cigarros de marca "Chesterfield", no valor de 4,10 €, tendo entregue, para pagamento, a reprodução da nota de 50 €.

31. Porém, J... , proprietária da referida papelaria, desconfiando da genuinidade da "nota", colocou a mesma na máquina que tem no seu estabelecimento para verificação da autenticidade de notas, tendo a mesma dado sinal de que se tratava de uma nota falsa.

32. Comunicou, então, à arguida B... que a nota não era verdadeira, tendo esta afirmado que tinham acabado de lha entregar, no supermercado (...) .

33. J... entregou a referida nota à arguida B... .

34. O arguido A... agiu de forma livre, deliberada e consciente, ao entregar, por duas vezes, diferentes reproduções de notas de 50 €, com o propósito de que estas fossem colocadas em circulação como se tratasse de notas legítimas, bem sabendo que não se tratava de notas verdadeiras e que, desse modo, colocava em crise a integridade/intangibilidade do sistema monetário oficial, prejudicando a fé pública do papel-­moeda.

35. A arguida C... agiu de forma livre, deliberada e consciente, ao entregar a reprodução da nota de 50 € com o número de série X (...) à arguida B... , com o propósito, concretizado, de que esta fosse colocada em circulação como se tratasse de nota legítima, bem sabendo que não se tratava de nota verdadeira e que, desse modo, colocava em crise a integridade/intangibilidade do sistema monetário oficial, prejudicando a fé pública do papel-moeda.

36. A arguida B... agiu de forma livre, deliberada e consciente, ao entregar a reprodução da nota de 50 € com o número de série X (...) , à arguida H... , com o propósito, concretizado, de que esta fosse colocada em circulação como se se tratasse de nota legítima, bem sabendo que não se tratava de nota verdadeira e que, desse modo, colocava em crise a integridade/intangibilidade do sistema monetário oficial, prejudicando a fé pública do papel-moeda.

37. A arguida H... agiu de forma livre, deliberada e consciente, ao entregar a reprodução da nota de 50 € com o número de série X (...) para pagamento da garrafa de cerveja, com o propósito, concretizado, de que esta fosse colocada em circulação como se tratasse de nota legítima, bem sabendo que não se tratava de nota verdadeira e que desse modo colocava em crise a integridade/intangibilidade do sistema monetário oficial, prejudicando a fé pública do papel-moeda.

38. A arguida B... agiu de forma livre, deliberada e consciente ao solicitar ao arguido A... que lhe entregasse uma reprodução de nota de 50 €, com o propósito de que esta fosse colocada em circulação como se tratasse de nota legítima, bem sabendo que não se tratava de nota verdadeira e que desse modo colocava em crise a integridade/intangibilidade do sistema monetário oficial, prejudicando a fé pública do papel-moeda. 

39. Mais tarde, a arguida B... animada da mesma intenção, livre, deliberada e consciente, de colocar em circulação a reprodução de nota, que lhe havia sido entregue pelo arguido A... , como se tratasse de nota legítima, bem sabendo que não se tratava de nota verdadeira e que desse modo colocava em crise a integridade/intangibilidade do sistema monetário oficial, prejudicando a fé pública do papel­-moeda, o que não conseguiu porque no acto da sua entrega J... se apercebeu que a mesma era falsa.

40. A arguida C... agiu de forma livre, deliberada e consciente ao sugerir à arguida B... que se deslocassem junto do arguido A... , para o convencerem a entregar a esta uma reprodução de nota de 50 €, tendo, de seguida, acompanhado a mesma a casa daquele e solicitado, conjuntamente com a arguida B... , que entregasse tal reprodução de nota, sempre com o propósito de que esta fosse colocada em circulação como se tratasse de nota legítima, bem sabendo que não se tratava de nota verdadeira e que, desse modo, colocava em crise a integridade/intangibilidade do sistema monetário oficial, prejudicando a fé pública do papel-­moeda.

41. Os arguidos bem sabiam que as suas descritas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.

- Outros factos relevantes

42. Os arguidos A... e C... confessaram, na audiência, os factos essenciais pelos quais vinham acusados.

- Da situação sócio-económica dos arguidos

43. A arguida C... nasceu no seio de uma família de modesta condição económica, sendo a terceira de quatro irmãos.

44. As suas vivências da infância e adolescência surgem marcadas pelas dificuldades financeiras da família, e pelos acentuados hábitos alcoólicos do pai, que foi uma figura maltratante, no contexto familiar.

45. Iniciou a escolaridade em idade própria, tendo completado o 5° ano.

46. As dificuldades económicas e a sua reduzida apetência para a formação, levaram-na a abandonar os estudos e a iniciar a vida profissional aos 13 anos, como operária fabril.

47. Mais tarde viria a trabalhar na agricultura e como empregada doméstica interna.

48. Está desempregada há cerca de dois anos, ocupando-se, pontualmente, em pequenos trabalhos indiferenciadas e no apoio aos cuidados de higiene a uma vizinha deficiente.

49. Recentemente passou a ser beneficiária do Rendimento Social de Inserção, no valor mensal de 180 €.

50. Contraiu casamento, por duas vezes, tendo nascido uma filha de cada um deles: a mais velha, actualmente com 37 anos, reside na Suécia e não mantém contacto com a arguida desde a separação dos pais, altura em que foi entregue aos cuidados da avó; a mais nova, actualmente com 19 anos, mantém contacto regular com a mãe, apesar de ter já vida independente.

51. Posteriormente, a arguida C... vivenciou outra relação afectiva que, tal como o segundo casamento, terá sido marcada por episódios de maus-tratos físicos e psicológicos, com várias separações/reconciliações antes do final das relações.

52. Actualmente reside sozinha, numa casa pertença da família de origem, localizada em (...) . Trata-se de uma habitação de tipologia T1, devidamente infra-estruturada e com razoáveis condições de habitabilidade.

53. No meio social em que reside, a arguida é considerada uma pessoa com um comportamento instável, nomeadamente no que se refere às relações de intimidade.

54. A forma utilitária que, de um modo geral, imprime aos relacionamentos interpessoais, contribui para a imagem socialmente negativa que detém e da qual, assumindo uma postura de vitimização, refere ter consciência.

55. A arguida verbaliza reconhecer actualmente a ilicitude dos factos destes autos, e compreender o prejuízo e dano para as eventuais vítimas. 

56. Verbaliza, ainda, vivenciar ansiedade gerada pelo processo e respectivas diligências e apreensão quanto ao desfecho do mesmo e consequências dele advenientes para a sua imagem no meio em que reside.

57. A arguida H... nasceu em Castelo Branco, sendo a segunda de 6 irmãos, tendo crescido no seio de uma família modesta, pautada pela normatividade das vivências intrafamiliares e com um adequado grau de integração social.

58. Iniciou a escolaridade na idade própria, tendo completado o 4.° ano de escolaridade.

59. A falta de interesse pela formação académica e a necessidade de ajudar a família nos cuidados aos irmãos mais novos, levaram-na ao abandono da escola com cerca de 13 anos de idade.

60. Mais tarde, trabalhou, durante cerca de 3/4 meses, numa padaria, onde a mãe estava empregada, após o que voltou às tarefas domésticas.

61. Para além da realização de uma formação em Geriatria, realizada há alguns anos, no "Centro de Formação Profissional do Instituto de Emprego e Formação Profissional", não regista quaisquer outras experiências de trabalho e/ou formação.

62. Aos 19 anos passou a viver em união de facto com aquele que refere ter sido o seu único companheiro, relação da qual nasceram quatro filhos, actualmente com 22, 19 e 17 (gémeos) anos de idade.

63. A relação, que durou cerca de 12 anos, foi marcada pelo alcoolismo e maus-tratos perpetrados pelo companheiro, que acabou por abandonar o agregado familiar.

64. Sem capacidade para fazer face ao sustento familiar, a arguida recorreu ao apoio estatal, tendo todos os filhos sido institucionalizados.

65. Actualmente, apenas, permanecem com medidas de acolhimento os filhos mais novos (gémeos), sendo que um deles recusa a intervenção, encontrando-se a residir com a mãe. Os filhos mais velhos têm já vida independente. 

66. Reside com o filho menor, em casa arrendada, de tipologia T3, devidamente infra­estruturada e localizada num bairro da cidade onde não se verificam problemáticas sociais ou de marginalidade significativas.

67. É beneficiária do Rendimento Social de Inserção, ao qual acresce o valor da prestação familiar do filho, no valor total aproximado de € 300,00 (trezentos euros) mensais.

68. Sinaliza alguns problemas de saúde, referindo ter atravessado períodos de depressão, nomeadamente após a institucionalização dos filhos, que exigiram intervenção clínica especializada e medicação. Actualmente considera estar mais estabilizada, mantendo o acompanhamento médico.

69. A arguida revela ser uma pessoa com limitações em termos comunicacionais e de competências pessoais e sociais, e com um estilo de funcionamento psicológico pobre e pouco diligente, o que se reflecte numa atitude pouco proactiva ao nível do seu projecto de vida.

70. No meio social em que reside, essas características pessoais são conhecidas, não havendo rejeição à sua presença.

71. As dificuldades da sua história de vida - relação conjugal marcada pela violência doméstica, institucionalização dos filhos, dificuldades económicas - e os problemas inerentes ao comportamento e situação jurídica do filho, contribuem para que seja acolhida com tolerância e beneficie do apoio de alguns elementos da comunidade, nomeadamente no que se refere a bens alimentares.

72. Confrontada com os factos destes autos, denota reconhecer a ilicitude dos mesmos e o dano para as eventuais vítimas.

73. Refere vivenciar ansiedade emergente do presente processo.

74. O arguido A... descende de uma família de modesta condição sócio­económica, composta pelos progenitores - o pai era canteiro e a mãe doméstica - e seis irmãos.

75. A dinâmica familiar caracterizou-se por alguma coesão e afectividade, embora condicionada pelos fracos recursos económicos.

76. O arguido frequentou a escolaridade em (...) , tendo completado a 4.a classe aos 13 anos.

77. Ingressou jovem no mundo do trabalho, registando um percurso laboral irregular, condicionado pela baixa escolaridade e reduzida qualificação profissional. Trabalhou, sobretudo, como manobrador de máquinas em trabalhos de construção civil e obras públicas, tendo trabalhado, também, vários anos como porteiro/segurança em bares e casas de diversão nocturna.

78. Contraiu matrimónio aos 18 anos com L... , de quem tem três filhas, todas maiores de idade e autónomas.

79. A separação do casal terá ocorrido no decurso do ano de 1998, tendo a cônjuge abandonado a casa morada de família acompanhada das filhas.

80. Posteriormente manteve nova relação afectiva com uma companheira, que veio a falecer, relacionamento que se prolongou por cerca de cinco anos e do qual descende uma filha, com 27 anos que reside na Inglaterra.

81. À data da prática dos factos dos presentes autos, A... encontrava-se em regime de liberdade condicional, concedida no âmbito da execução das penas que lhe foram impostas nos processos 28/09.SGHCTB e 39/12.3GAPNC.

82. Após beneficiar de liberdade condicional, o arguido fixou residência na morada indicada pelo Tribunal, na qual habita há vários anos e onde vive sozinho. Esta casa era propriedade dos seus pais e apresenta modestas condições de habitabilidade, carecendo de obras de recuperação e melhoramentos.

83. O arguido encontra-se actualmente desempregado; vai fazendo alguns biscates na limpeza de matas; anteriormente trabalhou para uma empresa de recolha de resíduos.

84. A... beneficia de algum suporte familiar dos irmãos residentes no Algarve, com os quais vai mantendo algum contacto pontual, sobretudo em alturas festivas do ano.

85. No meio social onde reside, o arguido relaciona-se com terceiros sem conflitos, pelo que não existe hostilidade para consigo, embora a sua imagem esteja associada a um modo de vida relacionado com a vida da noite.

86. A... demonstra preocupação face à presente situação jurídica e ansiedade pelo impacto que a mesma pode representar para a sua vida futura.

87. O arguido adopta uma postura de minimização da sua intervenção nos factos de que está acusado, atribuindo a responsabilidade do processo aos co-arguidos.

88. O arguido não revela capacidade de autocrítica face à sua conduta.

89. No âmbito do acompanhamento realizado pela Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, na execução de penas que anteriormente lhe foram impostas, o arguido adoptou uma atitude de colaboração.

90. A arguida B... residiu com os progenitores, até cerca dos 13 anos de idade, altura em que passou a residir com a sua irmã mais velha.

91. Aos 15 anos de idade passou a residir com um namorado, relacionamento do qual nasceu uma filha, quando aquela contava 16 anos de idade.

92. Após o nascimento da filha, que hoje possui 3 anos de idade, a relação terminou, tendo esta ficado aos cuidados do pai.

93. Nessa sequência, a arguida B... foi acolhida numa Instituição, em Lisboa, durante cerca de seis meses, de onde acabou por fugir e para onde não regressou por, entretanto, ter atingido a maioridade.

94. A arguida iniciou, entretanto, uma relação de namoro com outro rapaz, pernoitando ambos em casa de familiares do mesmo, sem carácter regular.

95. A arguida B... possui o 7.0 ano de escolaridade, após o que optou por deixar de estudar. 

96. Não trabalha, nem aufere rendimentos, recebendo a quantia mensal de 50 € a 100 €, que lhe é remetida pelo seu progenitor.

Dos antecedentes criminais

97. As arguidas H... e C... não possuem antecedentes criminais.

98. A arguida B... foi condenada pela prática, no dia 12.03.2016, de um crime de furto simples, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de 5 €, por sentença proferida em 29.03.2016, transitada em julgado em 28.04.2016, no processo 527/16.2PFLSB, que correu termos pela Instância Local- Secção de Pequena Criminalidade de Lisboa - J1.

99. O arguido A... foi condenado:

99.1. pela prática, em 10.08.1986, de um crime de furto qualificado, um crime de furto, um crime de ofensas corporais e um crime de dano, na pena única de 3 anos de prisão e 120 dias de prisão, substituída por igual tempo de multa, à taxa diária de 200$00, por acórdão proferido em 06.04.1990, no processo n.º 18/89, que correu termos pelo Tribunal de Círculo de Castelo Branco; a pena de multa foi extinta pelo cumprimento em 12.09.1991 e a pena de prisão foi extinta em 11.10.1993;

99.2. pela prática, em 09.09.1997, de um crime de ofensa à integridade física simples, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de 500$00, por sentença proferida em 24.06.1998, no processo n.º 63/98, que correu termos pelo 2.° Juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco;

99.3. pela prática, em 11.07.1998, de um crime de ofensa à integridade física simples e um crime de detenção de arma proibida, na pena única de 170 dias de multa, por sentença proferida em 14.03.2000, transitada em julgado em 29.03.2000, no processo n.º 248/99,que correu termos pelo 1.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco; a pena foi declarada extinta em 17.12.2002;

99.4. pela prática, em 01.11.1999, de um crime de condução ilegal, na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, por sentença proferida em 16.05.2001, transitada em julgado em 07.06.2001, no processo n.º 62/01, que correu termos pelo 2.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco; a pena foi declarada extinta pelo cumprimento em 31.01.2005;

99.5. pela prática, em 22.12.2001, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, um crime de condução sem habilitação legal, um crime de falsidade de depoimento ou declaração e de um crime de desobediência, na pena única de 1 ano e 10 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, por sentença proferida em 03.10.2002, transitada em julgado em 18.10.2002, no processo n.º 78/01.0PTCTB, que correu termos pelo 1.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco;

99.6. pela prática, em 31.05.2002, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 9 meses de prisão efectiva, por sentença proferida em 27.10.2004, transitada em julgado em 18.11.2004, no processo n.º 45/02.6GHCTB, que correu termos pelo 2.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco; a pena foi declarada extinta pelo cumprimento em 05.01.2007;

99.7. pela prática, em 05.10.2003, de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, na pena de 5 meses e 15 dias de prisão, substituída por 165 dias de multa, por sentença proferida em 13.02.2006, transitada em julgado em 13.02.2006, no processo n.º 122/03.6GHCTB, que correu termos pelo 3.º juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco; a pena foi declarada extinta pelo cumprimento em 28.06.2007;

99.8. pela prática, em 07.02.2009, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 12 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, por sentença proferida em 02.03.2009, transitada em julgado em 01.04.2009, no processo n.º 28/09.5GHCTB, que correu termos pelo 2.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco; por despacho transitado em 05.06.2013 a suspensão da pena foi revogada; a pena foi declarada extinta pelo cumprimento com efeitos reportados a 12.08.2015, tendo sido concedida a liberdade condicional ao arguido em 12.10.2014;

99.9. pela prática, em 28.02.2012, de um crime de condução sem habilitação legal e de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor pelo período de 12 meses, por sentença proferida em 03.10.2012, transitada em julgado em 13.12.2012, no processo n.º 39/12.3GAPNC, que correu termos pelo Tribunal Judicial de Penamacor; a pena foi declarada extinta pelo cumprimento com efeitos reportados a 12.08.2015, tendo sido concedida a liberdade condicional ao arguido em 12.10.2014;

99.10. pela prática, em 04.07.2008, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 8 meses de prisão efectiva, por sentença proferida em 23.07.2009, transitada em julgado em 14.04.2010, no processo n.º 137/08.8GHCTB, que correu termos pelo 2.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco;

99.11. pela prática, em 17.05.2009, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano, com regime de prova, com a condição de se inscrever em escola de condução, por sentença proferida em 27.05.2009, transitada em julgado em 26.06.2009, no processo n.º 51/09.0GTCTB, que correu termos pelo 3.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco; a pena foi declarada extinta em 09.09.2010;

99.12. pela prática, em 27.07.2008, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 7 meses de prisão, por sentença proferida em 02.07.2009, transitada em julgado em 12.01.2010, no processo n.º 157/08.2GHCTB, que correu termos pelo 1.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco;

99.13. em cúmulo jurídico das penas dos processos 137/08.8GHCTB, 157/08.2GHCTB e 28/09.5GHCTB, na pena única de 1 ano e 6 meses de prisão; foi concedida a liberdade condicional em 03.05.2011, até ao termo da pena, em 03.05.2012, data em que foi concedida a liberdade definitiva;

99.14. pela prática, em 04.07.2009, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 9 meses de prisão, por sentença proferida em 19.10.2010, transitada em julgado em 24.11.2010, no processo n.º 148/09.6GHCTB, que correu termos pelo 2.° juízo do Tribunal Judicial de Castelo Branco;

99.15. em cúmulo jurídico das penas dos processos 148/09.6GHCTB, 137/08.8GHCTB e 157/08.2GHCTB, na pena única de 1 ano e 4 meses de prisão, extinta pelo cumprimento em 03.05.2012.


*

B. Factos não provados. Não se provou que:

a) o referido em 1 tivesse ocorrido em data contemporânea do dia 28 de Abril de 2015;

b) o referido em 2 tivesse ocorrido, concretamente, no dia 28.04.2015, no decurso da manhã;

c) quando do referido em 12, F... tivesse receado que a nota não fosse verdadeira;

d) o referido em 22 tivesse ocorrido, concretamente, no dia 29 de Abril de 2015, ainda da parte da manhã;

e) quando do referido em 27, o arguido A... tivesse aberto a carteira e, puxando de uma reprodução de nota de 100 €, fez tenção de a entregar à arguida B... e que esta tivesse dito que preferia uma reprodução de nota de 50 €, pois seria mais fácil de destrocar;

f) quando referido em 32, a arguida B... tivesse dito, também, que não era possível que a nota fosse falsa e tivesse pedido a devolução da mesma, a fim de reclamar junto do supermercado (...) .


***

C. Motivação

O Tribunal formou a sua convicção com base na análise crítica e conjugada dos meios de prova produzidos, nomeadamente, na prova documental e pericial junta aos autos, em articulação com os depoimentos prestados na audiência de julgamento, tudo numa leitura conforme às regras da experiência comum.

Assim, os arguidos A... e C... quiseram prestar declarações na audiência, assumiram, no essencial e de forma praticamente coincidente (apesar de as declarações terem sido prestadas em separado), os factos que lhes são imputados, esclarecendo:

. o primeiro, ter alcançado que as arguidas C... e, na segunda situação, também B... , iriam utilizar as notas como sendo verdadeiras, bem como ter consciência de que a sua conduta é proibida pela lei penal; e

. a segunda, que comunicou ao arguido D... que iriam utilizar as notas (como se fossem verdadeiras) e ter pensado que talvez as conseguissem passar, sem ninguém se aperceber de que não eram verdadeiras.

A arguida H... compareceu na segunda sessão da audiência de julgamento e optou por não prestar declarações. A arguida B... , por seu turno, não compareceu na audiência.

No entanto, em sede de inquérito, ambas as arguidas foram inquiridas por magistrado do Ministério Público, na presença de defensor e advertidas de que caso não exercessem o direito ao silêncio, as declarações que prestassem poderiam ser utilizadas posteriormente, mesmo que não prestassem declarações na audiência ou fossem julgadas na ausência, as quais ficariam sujeita a livre apreciação, tudo em estrito cumprimento do disposto nos artigos 144.°, n.º 1 e 141.°, n.º 4, al. b), do Código de Processo Penal.

Nesta medida, tais declarações, documentadas de fls. 284 a 286 e de fls. 313 a 316, que foram lidas na audiência de julgamento, nos termos previstos no artigo 357.°, n.º 1, al. b), do Código de Processo Penal, podem ser valoradas pelo Tribunal, na sentença.

Assim, a arguida H... admitiu ter-se deslocado aos locais descritos na acusação pública para destrocar a reprodução de nota de 50 €. Pese embora tenha dito que a arguida B... não lhe comunicou que a nota era falsa, quando lhe solicitou que a destrocasse, verifica-se que:

 . reconheceu que se apercebeu da respectiva falsidade, por causa da sua coloração, e que, por isso, não foi posteriormente levantar a garrafa de cerveja que comprara com a mesma, por não querer ser apanhada por alguma autoridade que ali estivesse à sua espera;

. referiu estar arrependida do que fez e querer reparar o seu mal.

As declarações assim prestadas, em conjugação com os depoimentos testemunhais colhidos na audiência, evidenciam, pois, que a arguida H... estava perfeitamente ciente de que a nota que tentou destrocar e que, depois, utilizou para comprar uma cerveja no " (...) Bar', era falsa.

A arguida B... referiu em que circunstâncias lhe foi entregue a nota que entregou à mãe do seu então namorado, a arguida H... . Pese embora tenha referido que não a informou previamente da respectiva falsidade, verifica-se que lha entregou e que depois de esta regressar a casa, lhe deu uma nota autêntica, de 20 €, que a mesma recebera como troco daqueloutra.

Ora, tal actuação das arguidas, traduzida na entrega pela primeira, à segunda, de uma nota, para que a utilizasse/destrocasse e lhe trouxesse o troco, seguida da oferta de 20 €, não possui qualquer justificação lógica fora do contexto de estarmos perante a passagem de uma nota falsa, com conhecimento de ambas.

No que respeita ao circunstancialismo em que recebeu a primeira e segunda notas, as declarações da arguida B... foram contrariadas pelas dos arguidos A... e C... , prestadas na audiência de julgamento, que, como vimos, assumiram, no essencial, os factos pelos quais vêm acusados, pelo que nos mereceram maior credibilidade.

Valorámos, ainda, positivamente, os depoimentos testemunhais prestados na audiência de julgamento.

Assim, E... , prima da arguida B... , descreveu, de forma isenta, as circunstâncias em que presenciou a arguida C... a entregar a reprodução de uma nota de 50 € àquela, bem como o que lhe foi dito por esta, acerca do destino que lhe deu (entrega à mãe do seu namorado D... , que foi "apanhada").

F... , caixeira no supermercado " (...) " e G... , dono da pastelaria " (...) ", relataram, de modo desinteressado, as circunstâncias em que a arguida H... lhes solicitou que destrocassem a reprodução de uma nota de 50 € e o que sucedeu nessa sequência.

Do mesmo modo, I... , que à data dos factos trabalhava no "Bar (...) ", do qual a arguida H... era cliente habitual, deu-nos conta da compra efectuada por esta, com a reprodução de uma nota de 50 €, em que momento e por que motivo suspeitou da legitimidade na mesma e as diligências que realizou nessa sequência.

J... , dona da papelaria " (...) ", sita na Rua (...) , em Castelo Branco, narrou as circunstâncias em que a arguida B... lhe entregou uma reprodução de nota de 50 €, de que modo verificou que a mesma não era verdadeira e o que fez de seguida.

A prova por declarações foi devidamente conjugada com a prova documental reunida nos autos, nomeadamente:

. o auto de notícia de fls. 35 a 36, que descreve os motivos pelos quais a "PSP" se deslocou ao " (...) Bar", no dia 28.04.2015;

. os autos de apreensão e de avaliação de fls. 7/38 e 8/40, e a cópia da reprodução de nota de 50 €, de fls. 10/39), entregue no " (...) Bar";

. a factura simplificada de fls. 37 (cfr. cópia de fls. 9, mais legível), relativa à venda de uma "Litrosa Sagres", no montante de 2,10 €, no dia 28.04.2015, pelas 12h50m34s, no "Café (...) ";

. o auto de aditamento de fls. 15/68, que descreve os motivos pelos quais a "PSP" se deslocou à Livraria/Papelaria sita na Rua (...) , em Castelo Branco, no dia 28.04.2015; e

. o "relato de diligência externa" de fls. 192/193, no que concerne aos factos directamente percepcionados pelo inspector que o elaborou (deslocação a tais locais, acompanhado pela arguida B... ), excluindo a reprodução do que lhe foi transmitido pela arguida, nesse âmbito.

No que respeita às características da nota apreendida a fls. 7, atendemos, ainda, à reprodução da mesma, junta a fls. 229 e ao respectivo relatório pericial, de fls. 230, que as descreve de forma clara e coerente, atestando a sua falsidade.

Relativamente à data em que os factos descritos de 1 a 6 dos factos provados ocorreram, não decorreu da prova produzida que tivesse sido, concretamente, no dia 28.04.2015. Com efeito, do teor do auto de notícia de fls. 35/36 e do aditamento de fls. 15, decorre que as condutas das arguidas B... e H... , traduzidas na entrega das reproduções das notas a terceiro, ocorreram ambas no dia 28.04.2015, data em que a segunda nota foi entregue pelo arguido A... , à arguida B... .

Quanto à concreta data em que a primeira nota foi entregue pelo arguido A... à arguida C... e por esta à arguida B... , verifica-se que aqueles dois declararam que tal sucedeu uns dias antes da entrega da segunda nota, não sabendo, porém, concretizar, em que dia, facto que não decorreu de qualquer outro meio de prova produzido.

Nesta medida, apenas temos por demonstrado que tal sucedeu em dia não apurado do mês de Abril de 2015.

Por fim, no que respeita às condições de vida e antecedentes criminais dos arguidos, atendemos ao teor dos relatórios sociais de fls. 416/417, 433 a 435 e 439 a 441, às declarações prestadas pela arguida C... , que por força da relação de parentesco que possui com a arguida B... , conhece as condições de vida desta, bem como aos certificados de registo criminal de fls. 407 a 410 e 418 e ss.

Com efeito, a arguida B... não compareceu na audiência de julgamento, nem na entrevista agendada pela Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, com vista à realização de relatório social às suas condições de vida, pelo que não se logrou apurar as mesmas, por outra via, que não as declarações - espontâneas - da sua progenitora.


***

APRECIANDO

O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que os recorrentes extraem das respectivas motivações, de acordo com o estabelecido no artigo 412º, n.º 1 do CPP, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso.

In casu, o presente recurso versa apenas matéria de direito, a saber:

- a não verificação dos pressupostos do crime de passagem de moeda falsa, pelo que, no entender do recorrente, deveria ser absolvido;

- mas, se essa não for a apreciação deste Tribunal, pretende o recorrente que a execução da pena aplicada seja em regime de permanência na habitação ou de prisão por dias livres.


*

A-

Sustenta o recorrente que ao ter advertido as co-arguidas expressamente, nas duas ocasiões, que as notas eram falsas o mesmo não pratica o crime em causa visto que, não se consome o elemento típico de “colocar em circulação como se fosse legítima ou intacta”, pelo que deve ser absolvido.

E, quanto à utilização que foi feita das mesmas, a partir do momento em que entrega as notas, perde o controlo do seu destino e o fim último da sua utilização.

Foi o recorrente condenado pela prática de dois crimes de passagem de moeda falsa p. e p. pelo artigo 265°, n.º 1, al. a), do Código Penal, com referência ao artigo 255°, al. d) do mesmo diploma.

Comete este crime (na redacção anterior à Lei n.º 39/2016, de 19 Dez.) quem, por qualquer modo, incluindo a exposição à venda, passar ou puser em circulação:

a) Como legítima ou intacta, moeda falsa ou falsificada;

É punido, no caso da alínea a) com pena de prisão até cinco anos.

O crime de passagem de moeda falsa configura um crime material ou de resultado, que se consuma quando a moeda falsa penetra na esfera de disponibilidade do destinatário, sendo um delito de execução livre ou não vinculada; pode verificar-se por qualquer modo que, de uma perspectiva ex ante, se mostre idóneo para produzir o evento da entrada das peças contrafeitas na esfera de disposição do destinatário (cf. Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo II, pág. 775).

O bem jurídico protegido nos crimes de moeda falsa tem sido colocado, entre nós, quer na “confiança ou fé pública na moeda”(cf. Beleza dos Santos, in RLJ, 64.º, págs. 275-276, 290-291 e 305-307), quer na “segurança e funcionalidade (operacionalidade) do tráfego monetário ou em ambos”(cf. Almeida Costa, in Comentário Conimbricense do Código Penal, II, pág. 739), falando-se também na “pureza ou autenticidade do sistema monetário” ou, mais explicitamente, na “integridade ou intangibilidade do sistema monetário em si mesmo considerado” (cf. Comentário, II, pág. 749), no interesse público da genuinidade respectiva de que é garante e nele encabeça o banco emissor.

Para outros, os interesses económico-financeiros do Estado representam o bem jurídico a acautelar – cf. BMJ 460.º/570 –, porém o interesse a proteger com a incriminação é o daquela intangibilidade do sistema monetário, enquanto instrumento indispensável para a subsistência e desenvolvimento das sociedades modernas. – Ac. STJ de25-9-2008, no proc. 08P2487.

Tal como foi dado como provado, o arguido/recorrente entregou, por duas vezes, reproduções de notas de €50,00, às arguidas C... e B... (factos 1 e 27), com o propósito de que estas fossem colocadas em circulação como se tratasse de notas legítimas, bem sabendo que não se tratava de notas verdadeiras.

Considera o recorrente que tendo advertido as co-arguidas expressamente, nas duas ocasiões, de que as notas eram falsas, não se verifica o elemento típico objectivo da infracção em causa.

Porém, sem razão.

Como bem avaliou a sentença recorrida «A circunstância de o arguido ter comunicado à pessoa a quem entregou a nota que esta era falsa, não afasta a relevância da sua actuação, como modalidade da acção típica do crime pelo qual vem acusado, porquanto se provou que o destino último da mesma era ser utilizada como se fosse verdadeira».

Com efeito, a norma incriminadora do crime de passagem de moeda falsa não exige, como elemento constitutivo uma actividade enganadora do agente acerca da natureza da moeda que tenciona pôr em circulação. Não é necessário o intuito de enganar terceiros convencendo-os de que a moeda tem curso legal, quando bem sabe ser falsa ou falsificada.

Em função do exposto, mostrando-se preenchidos os elementos típicos do crime em causa, impunha-se a condenação do arguido/recorrente.


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B-

Alega o recorrente que a pena aplicada peca por severidade, visto que teve conta, em última análise, os seus antecedentes criminais.

E, assim, pugna para que a pena única de 1 ano aplicada seja executada em regime de permanência na habitação com recurso a vigilância electrónica ou, em regime por dias livres.

O crime de passagem de moeda falsa é punível, em abstracto, com prisão de 1 mês a 5 anos.

Por cada um dos dois crimes foi aplicada a pena parcelar de 9 meses e, em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 1 ano de prisão.

De harmonia com o disposto no artigo 71º do Código Penal a medida da pena, ou seja, a determinação das consequências do facto punível, é feita dentro dos limites da lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo ainda atender-se a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o mesmo.

Ora, dentro da moldura penal abstracta, as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime depõem a favor ou contra o agente são, designadamente:

- O grau de ilicitude do facto (o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação de deveres impostos ao agente);

- A intensidade do dolo ou negligência;

- Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

- As condições pessoais do agente e a sua situação económica;

- A conduta anterior ao facto e posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;

- A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

Deste modo, o juiz conforme a natureza do facto punível, a sua gravidade e a forma de execução, aplicando o direito, escolhe uma das várias possibilidades legalmente previstas.

Não pode apenas atender-se à culpa e à sua medida, impôs o legislador que a determinação concreta da pena seja feita também em função da prevenção. O que no entender do Prof. Figueiredo Dias “(…) é perfeitamente compreensível e justificável; através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências da prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária de punição do caso concreto e, consequentemente, à realização “in casu” das finalidades da pena. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente – limita de forma inultrapassável as exigências de prevenção” (cfr. Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime – Notícias editorial – pág. 215).

O Tribunal a quo na determinação da medida concreta da pena a aplicar ao arguido/recorrente, ponderou o seguinte:

No que concerne às exigências de prevenção geral, cabe levar em consideração que o tipo legal de crime cometido pelos arguidos, apesar de não ser de verificação muito frequente, provoca um certo alarme social, sobretudo em localidades de pequena e média dimensão, por pôr em causa a confiança do sistema monetário, bem essencial para toda a comunidade, por todos utilizado diariamente.

Nessa medida, as exigências de prevenção geral, não sendo especialmente elevadas, também não são irrelevantes.

As exigências de prevenção especial: no que concerne ao arguido A... , verifica-se que possui treze condenações, pela prática de crimes de furto qualificado, dano, ofensa à integridade física, detenção de arma proibida, condução de veículo em estado de embriaguez, condução sem habilitação legal, falsidade de depoimento ou de declaração, desobediência e resistência e coacção sobre funcionário, em penas de multa, prisão substituída por multa, prisão suspensa na sua execução e prisão efectiva – 99 dos factos provados.

Ainda assim, o arguido voltou a praticar factos criminosos, revelando, pois, que aquelas penas não lograram afastá-lo da prática de novos crimes, pelo que as exigências de prevenção especial se mostram elevadas.

O dolo com que o arguido actuou: directo, que é a modalidade de culpa mais intensa.

A ilicitude dos factos, dentro da gravidade pressuposta no crime em análise é pouco significativa.

Tudo visto e ponderado, julgamos adequado e proporcional condenar o arguido na pena de 9 meses de prisão, por cada um dos crimes cometidos (...) e, em cúmulo jurídico na pena única de 1 anos de prisão”.

Como verificamos da transcrição efectuada, a sentença recorrida sopesou todos aqueles factores com influência na medida concreta da pena.

E, contrariamente ao que pretendia o recorrente, não deveria fazer tábua rasa dos seus antecedentes criminais, ainda que nos presentes autos tivesse assumido a sua conduta.

Por outro lado, ponderou ainda o tribunal de 1ª instância sobre a possibilidade de substituir a pena única de prisão por multa ou por prestação de trabalho a favor da comunidade, assim como equacionou a possibilidade de suspensão da execução da pena, tendo afastado a aplicação de tais penas de substituição em função do vasto passado criminal do arguido, tendo concluído que as penas impostas não lograram a sua reintegração na sociedade, nem evitar que voltasse a praticar crimes, demonstrando que ainda não interiorizou a necessidade de adoptar um comportamento conforme ao direito penal, que tutela bens jurídicos essenciais à convivência comunitária.

Acresce que, ficou também afastada a possibilidade de a pena de prisão ser executada em regime de permanência na habitação, por dias livres ou de semidetenção, atenta a manifesta insuficiência e inadequação de tal regime para acautelar as finalidades da punição especial.

Com efeito, não só consideramos que ao praticar os factos em apreciação o arguido revela profunda indiferença pelas condenações e penas de prisão que anteriormente lhe foram impostas, como decorre dos factos provados supra analisados que o mesmo não soube aproveitar as penas não privativas da liberdade e a liberdade condicional de que beneficiou, para dar um novo rumo à sua vida.

A pena de prisão deverá, pois, ser executada em regime efectivo e permanente, por a tanto exigirem as finalidades de prevenção especial.

Nestes termos, concordando com a ponderação efectuada, também se nos afigura que a pena de prisão imposta deverá ser cumprida em regime efectivo.


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Improcede, pois, na totalidade a argumentação do recorrente.

*****

III- DECISÃO

Face ao exposto, acordam os juízes da secção criminal deste Tribunal da Relação em:

- Negar provimento ao recurso.

Custas a cargo do recorrente, fixando-se em 3 UCs a taxa de justiça.


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Coimbra, 29 de Novembro de 2017

Elisa Sales (relatora)

Maria Pilar de Oliveira (adjunta)