Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1716/11.1T3AVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ELISA SALES
Descritores: ATESTADO FALSO
ATESTADO OU CERTIFICADO PASSADO POR PSICÓLOGO
HABILITAÇÃO LEGAL PARA CONDUZIR
Data do Acordão: 03/11/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA (INSTÂNCIA LOCAL – SECÇÃO CRIMINAL – J2)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART. 260.º, N.ºS 1. 2 E 3, DO CP; ARTS. 12.º E 14.º DO DL N.º 313/2009, DE 27-10
Sumário: I - Não versando os relatórios elaborados e assinados por agentes, psicólogos, em exercício de funções em Centro de Avaliação médica e psicológica, as condições físicas e mentais de candidatos a condutores, mas incidindo tão só sobre as áreas perceptivo-cognitiva, psicomotora e psicossocial dos mesmos, fica indelevelmente afastado o preenchimento do tipo objectivo do crime p. e p. nos artigo 260.º, n.ºs 1 e 3, do CP.

II - Por um lado, como referido, tais documentos não visam condições físicas e mentais dos visados e, por outro, os psicólogos não integram o elenco subjectivo referido nos n.ºs 1 e 2 daquela norma.

Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra


I - RELATÓRIO

No processo comum n.º 1716/11.1T3AVR supra identificado, após a realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença que decidiu:

I. Condenar a arguida A... pela prática de 7 (sete) crimes de atestado falso, p. e p. no artigo 260.º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa por cada um dos crimes e na pena única de 600 (seiscentos) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz a quantia de € 4.200,00 (quatro mil e duzentos euros).

II. Condenar a arguida B... pela prática de 5 (cinco) crimes de atestado falso, p. e p. no artigo 260.º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa por cada um dos crimes e na pena única de 420 (quatrocentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz a quantia de € 2.940,00 (dois mil, novecentos e quarenta euros).

III. Absolver a arguida B... da prática de três crimes de atestado falso por que vinha acusada.

IV. Condenar a arguida C... pela prática de 4 (quatro) crimes de atestado falso, p. e p. no artigo 260.º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa por cada um dos crimes e na pena única de 350 (trezentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz a quantia de € 2.450,00 (dois mil quatrocentos e cinquenta euros).

V. Absolver a arguida C... da prática de um crime de atestado falso por que vinha acusada.

VI. Condenar o arguido D... pela prática de um (um) crime de atestado falso, p. e p. no artigo 260.º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), o que perfaz a quantia de € 840,00 (oitocentos e quarenta euros).

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Os arguidos, por discordarem da sentença proferida, interpuseram o presente recurso, tendo extraído das respectivas motivações as seguintes conclusões:

Nos presentes autos, não só ficou cabalmente provado que os arguidos não praticaram, nem podiam praticar, os crimes em que foram condenados, pelo contrário, fica cabalmente provado que os arguidos não praticaram qualquer crime enquadrável ou subsumível na previsão do art. 260.° do CP.

Pelo contrário, são tiradas conclusões e feitos raciocínios que não têm aderência à realidade da prova produzida e, por outro lado, não são valorados factos (exemplo dos exames médicos realizados no Delegado de Saúde) que por si só conduziriam, inelutavelmente, a outra solução.

Por último, por manifesta omissão, não foram ouvidas as entidades que possuem competência atribuída por Lei para averiguar da verificação ou não do eventual crime de atestado falso, nomeadamente a Inspecção-geral das Actividades em Saúde, do IMTT -Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, IP e, da Ordem dos Psicólogos.

Em conclusão, nos termos do já supra descrito e fundamentado, a sentença em recurso violou:

1º- O disposto na alínea a) do n.º 2 do art. 410.° do Código de Processo Penal porquanto, verifica-se uma manifesta insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. Pois, que da prova produzida não resultam provados os factos que a Mmª Juiz "a quo" pretende fazer valer como tal.

2º- O disposto na alínea c) do n.º 2 do art. 410.° do Código de Processo Penal porquanto, verifica-se a existência de erro notório na apreciação da prova. Pois, em momento algum foi referido pelas testemunhas que os arguidos praticaram e atestaram actos médicos. Por outro lado, apesar de todas as testemunhas terem confirmado que após a realização dos testes psicotécnicos foram fazer os testes médicos junto do Delegado de Saúde da área, tal não foi tido em consideração nem foi chamado aos factos provados.

3º- O disposto nos n.ºs 1 e 3 do art. 260.° do Código Penal porquanto, a atuação dos arguidos não pode ser subsumida a qualquer previsão legal prevista nestes números e artigo.

Termos em que e nos mais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença recorrida, absolvendo-se os arguidos, tudo com as legais consequências.

*
Respondeu a Magistrada do MºPº junto do tribunal a quo, defendendo a improcedência dos recursos.
Nesta instância a Ex.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no mesmo sentido.

Notificados nos termos e para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 417º do CPP, os arguidos responderam, reafirmando todo o expendido nas alegações de recurso.

Os autos tiveram os vistos legais.

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II- FUNDAMENTAÇÃO

Da sentença recorrida consta o seguinte (por transcrição):

Da prova produzida, resultaram os seguintes factos provados:

1. Durante pelo menos os anos de 2010 e 2011 os arguidos exerceram funções como psicólogos no Instituto de Investigação e Formação (...), Ltª (doravante x(...)), com sede na Avenida (...) Porto, e delegação na Rua (...) Aveiro.

2. O x(...) assume-se como entidade privada, para, nos termos do D.L. n.º 313/2009, de 27.10, em vigor à data dos factos, proceder às avaliações médicas e psicológicas legalmente exigidas para obtenção ou renovação de habilitação de condução do grupo 2, o qual abrange candidatos ou condutores de veículos da categoria C, C1+E, D1 e D1+E, bem como os condutores das categorias B e B+E que exercem funções em ambulâncias, veículos de bombeiros, de transporte de doentes, transporte escolar e de automóveis ligeiros de passageiros de aluguer.

3. No exercício daquelas funções, cabia aos arguidos proceder à realização das aludidas avaliações médicas e psicológicas, no âmbito das quais tinham de examinar os candidatos em diversas áreas, como se expõe:

a. Área perceptivo-cognitiva, avaliada mediante a realização de testes escritos psicotécnicos, tendentes a avaliar a inteligência, a atenção, a percepção e a memória dos examinados;

b. Área psicomotora, analisada através da realização de testes num reacciómetro, cuja função é apurar a capacidade de reacção dos examinados a estímulos visuais e auditivos, tendo em vista aferir a respectiva capacidade de destreza manual, de reacção e a coordenação motora;

c. Área psicossocial, avaliada numa entrevista individual com um psicólogo, com vista a aferir da maturidade psicológica, responsabilidade, estabilidade emocional e competências sociais;

d. Capacidade auditiva e visual.

4. Após a realização das avaliações psicológicas, os arguidos emitiam os respectivos relatórios de avaliação, qualificando os candidatos nas áreas supra referidas nos níveis inferior, médio inferior, médio, médio superior ou superior, concluindo pela sua aprovação ou não aprovação para obtenção ou renovação de habilitação legal para conduzir veículos pertencentes ao grupo 2.

5. Só após a aprovação nas avaliações psicológicas é que os candidatos podiam requerer, no prazo de 6 meses, a licença de aprendizagem para obtenção ou renovação de licença de condução de veículos do grupo 2.

6. Em dia não concretamente apurado do mês de Janeiro de 2010, J... , na qualidade de director da “Escola de Condução L... , Lta”, com sede na (...), em Anadia, e M... , sócio gerente da sociedade “ N... , Lta”, a qual explora a “Escola de Condução O... ”, com sede na (...), em Águeda, acordaram com P... , legal representante do x(...), que disponibilizavam as instalações das respetivas escolas de condução para que aí tivessem lugar as avaliações psicológicas dos candidatos a exame de condução para obtenção de habilitação de condução de veículos do grupo 2.

7. Nos termos acordados, os exames seriam realizados pelo menos uma vez por mês, a grupos compostos por um mínimo de seis candidatos, nas referidas escolas de condução, por psicólogos que exerciam funções no x(...).

8. Para se sujeitarem a avaliação psicológicas, os candidatos inscreviam-se na secretaria da respetiva escola de condução, pagando uma quantia entre € 50,00 e € 80,00, montantes que depois eram entregues ao x(...).

9. Assim, pelo menos entre Janeiro de 2010 e até pelos menos Junho de 2011, realizaram-se nas referidas escolas de condução “ L... ” e “ O... ” avaliações psicológicas a dezenas de candidatos.

10. Após a sua realização, os arguidos emitiam os respetivos relatórios de avaliação, assinando-os e remetendo-os posteriormente para as instalações das escolas de condução “ L... ” e “ O... ”.

11. Todos os candidatos a exame de condução para obtenção de habilitação de condução de veículos do grupo 2 foram sujeitos aos aludidos testes escritos de avaliação percetivo-cognitiva.

12. Sucede que pelo menos 17 candidatos não foram sujeitos a exame de avaliação das capacidades psicomotoras.

13. Ademais, pelo menos 4 candidatos não foram sujeitos a entrevista com um dos psicólogos do x(...) tendo em vista a avaliação das capacidades psicossociais.

14. Não obstante, nos relatórios de avaliação subscritos pelos arguidos, estes fizeram constar que todos os candidatos foram sujeitos àqueles três exames – testes escritos psicotécnicos, testes à capacidade motora e entrevista com o psicólogo.

15. Acresce que, embora todos os relatórios de avaliação estejam assinados pelos arguidos, a verdade é que os mesmos não intervieram na realização dos aludidos exames, pois que não orientaram, acompanharam ou supervisionaram os examinados.

16. Os arguidos ao subscreverem os aludidos relatórios de avaliação, atestaram que os examinados possuíam as capacidades exigidas para obterem aprovação, sem comprovarem se o teor de tais relatórios correspondiam ao real estado físico e mental dos mesmos.

Assim,

17. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 20.04.2010, I..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria D, contactou a escola de condução ” O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

18. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, I... inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

19. Nessa sequência, I... foi sujeito a avaliação psicológica em 20.04.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, testes à capacidade visual e auditiva, e uma entrevista individual com um individuo do sexo masculino, cuja identidade não foi possível apurar, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

20. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 233 a 248, do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida A... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais – a ainda às capacidades visual e auditiva, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria D”.

21. Pese embora o relatório se encontre assinado pela arguida A... , a mesma não teve intervenção no processo de avaliação de I... , pois não o acompanhou, orientou nem supervisionou a realização dos exames escritos, dos testes às capacidades auditivas nem tão pouco na entrevista individual.

22. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 10.05.2010, U..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C+E, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

23. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

24. Nessa sequência, foi sujeito a avaliação psicológica em 10.05.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, para aferição das capacidades cognitivas, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

25. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 218 a 220 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida A... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais – a ainda às capacidades visual e auditiva, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria D”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

26. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 14.06.2010, W..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria D, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

27. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

28. Nessa sequência, W... foi sujeita a avaliação psicológica em 14.06.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, para aferição das capacidades cognitivas, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

29. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 31 a 34 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida A... , esta fez constar que a examinada foi avaliada em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais, emitindo parecer no qual considerou a mesma “aprovada relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria D”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental da candidata.

30. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 14.06.2010, X... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria D, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

31. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

32. Nessa sequência, X... foi sujeito a avaliação psicológica em 14.06.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, para aferição das capacidades cognitivas, não tendo sido sujeita a exame às capacidades psico-motoras.

33. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 36 a 39 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida A... , esta fez constar que a examinada foi avaliada em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou a mesma “aprovada relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria D”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental da candidata.

34. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 05.07.2010, E..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria D, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

35. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

36. Nessa sequência, E... foi sujeito a avaliação psicológica em 05.07.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, não tendo sido sujeito a entrevista individual com um psicólogo, nem tão pouco a exame às capacidades psicomotoras.

37. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 26 a 29 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida A... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou a mesma “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria D”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

38. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 05.07.2010, Y..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C+E, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

39. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

40. Nessa sequência, Y... foi sujeito a avaliação psicológica em 05.07.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, para aferição das capacidades cognitivas, não tendo sido sujeita a exame às capacidades psicomotoras.

41. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 252 a 255 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida A... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou a mesma “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C+E”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

42. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 13.07.2010, V..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C+E, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

43. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

44. Nessa sequência, V... foi sujeito a avaliação psicológica em 13.07.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, não tendo sido sujeito a entrevista individual com o psicólogo do x(...) para aferição das capacidades psicossociais, nem tão pouco às capacidades psicomotoras.

45. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 247 a 250 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida A... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou a mesma “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C+E”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

46. Foi elaborado o relatório de avaliação psicológica referente a G... (junto aos autos a fls. 78 a 80 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida B... , esta fez constar que o examinado foi avaliado às capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C”.

47. Foi elaborado o relatório de avaliação psicológica referente a S... (junto aos autos a fls. 57 a 60 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida B... , esta fez constar que o examinado foi avaliado às capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C e C+E”.

48. Foi elaborado o relatório de avaliação psicológica referente a GG... (junto aos autos a fls. 62 a 65 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida B... , esta fez constar que a examinada foi avaliada às capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou a mesma “aprovada relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C e C+E”.

49. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 27.08.2010, T... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C e C+E, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

50. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

51. Nessa sequência, T... foi sujeito a avaliação psicológica em 27.08.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, não tendo sido sujeito a entrevista individual com psicólogo do x(...) para avaliação das capacidades psicossociais, nem tão pouco a exame às capacidades psicomotoras.

52. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 46 a 48 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida B... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou a mesma “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C e C+E”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

53. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 22.09.2010, H..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria D, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

54. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

55. Nessa sequência, H... foi sujeito a avaliação psicológica em 22.09.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e uma entrevista individual com um indivíduo do sexo feminino, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

56. Sucede que no relatório de avaliação psicológica respetivo (junto aos autos a fls. 128 a 131do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida B... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria D”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

57. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 30.09.2010, AA..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C e C+E, contactou a escola de condução “ L... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

58. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

59. Nessa sequência, AA... foi sujeito a avaliação psicológica em 30.09.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e um entrevista individual para aferição das capacidades psicossociais, não tendo sido sujeita a exame às capacidades psicomotoras.

60. Sucede que no relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 189 a 192 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida C... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C e C+E”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

61. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 06.10.2010, F..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

62. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

63. Nessa sequência, F... foi sujeito a avaliação psicológica em 06.10.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e uma entrevista individual para aferição das capacidades psicossociais, não tendo sido sujeita a exame às capacidades psicomotoras.

64. Sucede que no relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 82 a 87 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pelo arguido D... , este fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

65. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 05.07.2010, BB... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C+E, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

66. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

67. Nessa sequência, BB.. foi sujeito a avaliação psicológica em 18.10.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e uma entrevista individual, para aferição das capacidades psicossociais, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

68. Sucede que no relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 257 a 260 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida B... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C+E”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

69. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 11.11.2010, CC... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C e C+E, contactou a escola de condução “ L... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

70. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

71. Nessa sequência, CC... foi sujeito a avaliação psicológica em 11.11.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e uma entrevista individual com um individuo do sexo masculino, cuja identidade não foi possível apurar , não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

72. Sucede que no relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 209 a 212 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida B... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C e C+E”.

73. Pese embora o relatório se encontre assinado pela arguida B... , a mesma não teve intervenção no processo de avaliação de CC... , pois não o acompanhou, orientou nem supervisionou a realização dos exames escritos ou da entrevista individual, pelo que assinou o relatório atestando que o candidato possuía as capacidades para ser aprovado, sem comprovar se o respetivo conteúdo correspondia ao real estado físico e mental do mesmo.

74. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 22.10.2010, R..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C e C+E, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

75. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

76. Nessa sequência, R... foi sujeito a avaliação psicológica em 22.10.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e uma entrevista individual com um indivíduo do sexo masculino, cuja identidade não foi possível apurar, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

77. Sucede que no relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 115 a 117 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida B... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C e C+E”.

78. Pese embora o relatório se encontre assinado pela arguida B... , a mesma não teve intervenção no processo de avaliação de R... , pois não o acompanhou, orientou nem supervisionou a realização dos exames escritos ou da entrevista individual, pelo que assinou o relatório atestando que o candidato possuía as capacidades para ser aprovado, sem comprovar se o respetivo conteúdo correspondia ao real estado físico e mental do mesmo.

79. Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 15.12.2010, Z..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C e C+E, contactou a escola de condução “ L... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

80. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

81. Nessa sequência, foi sujeito a avaliação psicológica em 15.12.2010, no âmbito da qual realizou pelo menos testes escritos psicotécnicos.

82. No relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 193 a 195 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida C... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C e C+E”.

83. Em data não concretamente apurada do ano de 2011, anterior a 13.01.2011, DD... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C, contactou a escola de condução “ L... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

84. Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

85. Nessa sequência, DD... foi sujeito a avaliação psicológica em 13.01.2011, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos, não tendo sido sujeito a entrevista individual com um psicólogo do x(...), para aferição das capacidades psicossociais, nem tão pouco a exame às capacidades psicomotoras.

86. Sucede que no relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 196 a 199 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pelo arguido C... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

87. Em data não concretamente apurada do ano de 2011, anterior a 24.02.2011, EE... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C+E, contactou a escola de condução “ L... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

88. Nessa sequência, foi submetido a avaliação psicológica em 24.02.2011, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e uma entrevista individual com um individuo do sexo masculino, cuja identidade não podia apurar, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

89. Sucede que no relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 184 a 187 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pelo arguido C... , este fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C+E”.

90. Pese embora o relatório se encontre assinado pela arguida C... , a mesma não teve intervenção no processo de avaliação de EE... , pois que o não acompanhou, orientou em supervisionou na realização do exames escritos ou da entrevista individual, pelo que assinou o referido relatório atestando que o candidato tinha capacidades para ser aprovado, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

91. Em data não concretamente apurada do ano de 2011, anterior a 28.07.2011, FF... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C, contactou a escola de condução “ L... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

92. Nessa sequência, FF... foi sujeito a avaliação psicológica em 28.07.2011, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e uma entrevista individual por um individuo do sexo masculino, para aferição das capacidades psicossociais, não tendo sido sujeita a exame às capacidades psicomotoras.

93. Sucede que no relatório de avaliação psicológica (junto aos autos a fls. 213 a 216 do apenso 1, que aqui se dá por reproduzido), subscrito pela arguida C... , esta fez constar que o examinado foi avaliado em todas as áreas – capacidades perceptivo-cognitivas, motoras e psicossociais –, emitindo parecer no qual considerou o mesmo “aprovado relativamente à obtenção de habilitação legal para conduzir veículos da categoria C”, sem comprovar se o teor do relatório correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

94. Os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, subscrevendo relatórios de avaliação psicológica sem terem intervenção direta no processo de avaliação de candidatos.

95. Sabiam os arguidos que os relatórios se destinavam a certificar o estado físico e mental dos candidatos a exame para obtenção ou renovação de título de condução de veículos pertencentes ao grupo 2, e que apenas os poderiam emitir e subscrever após prévia comprovação de que tais candidatos se haviam efetivamente submetido a todos os testes legalmente exigidos.

96. Sabiam os arguidos que, por não terem sujeitado os candidatos a todos os exames legalmente exigidos, não podiam certificar que o conteúdo dos relatórios que subscreveram correspondiam à verdade dos factos neles constantes.

97. Os arguidos atuaram cientes que contribuíam para a elaboração de documentos que, para todos os efeitos, eram dados como regularmente emitidos e como atestando que os examinados ali identificados possuíam as capacidades físicas e mentais legalmente exigidas para se sujeitarem a exame de condução para obtenção ou renovação de licença de condução de veículos do grupo 2, bem sabendo que os aludidos relatórios de avaliação por si subscritos se destinavam a ser entregues a autoridades com vista a certificar a capacidade dos candidatos aos referidos exames.

98. Sabiam, pois, os arguidos que, ao actuarem do modo supra descritos atentavam contra a credibilidade, a segurança e a força probatória de tais relatórios, mormente no que toca ao estado de saúde física e mental dos examinados, que não foi avaliada, cientes que os mesmos eram essenciais no processo de obtenção ou renovação de licença de condução de veículos do grupo 2, pois que sem eles não seria possível obter ou renovar tais licenças.

99. Sabiam os arguidos que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

100. A arguida A... ganha cerca de € 1.000,00 mensais no x(...) e cerca de € 5.000,00 anuais pelas aulas que dá na faculdade, vive em casa própria, pagando de empréstimo à habitação € 400,00 e paga de empréstimo automóvel a quantia de €300,00.

101. Nos certificados de registo criminal dos arguidos nada consta.

*

Não se provaram outros factos com interesse para a causa, nomeadamente:

a) Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 27.08.2010, G..., porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

b) Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

c) Nessa sequência, G... foi sujeito a avaliação psicológica em 27.08.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos e uma entrevista individual com um indivíduo do sexo masculino, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

d) Não obstante ter elaborado o relatório referido em 46, B... não teve qualquer intervenção no processo de avaliação de G... , porquanto não o acompanhou, orientou ou supervisionou na realização dos testes, tendo assinado o relatório atestando que o candidato possuía as capacidades para ser aprovado, sem comprovar que o respetivo teor correspondia ao real estado físico e mental do candidato.

e) Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 27.08.2010, S... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C e C+E, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

f) Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

g) Nessa sequência, S... foi sujeito a avaliação psicológica em 27.08.2010, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos para aferição das capacidades perceptivo-cognitivas e uma entrevista individual com um indivíduo do sexo masculino, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

h) Não obstante ter elaborado o relatório referido em 47, B... não teve qualquer intervenção no processo de avaliação de G... , porquanto não o acompanhou, orientou ou supervisionou na realização dos testes, tendo assinado o relatório atestando que o candidato possuía as capacidades para ser aprovado, sem comprovar que o respetivo teor correspondia ao real estado físico e mental do candidato.

i) Em data não concretamente apurada do ano de 2010, anterior a 27.08.2010, GG... , porque pretendia obter habilitação de condução de veículos da categoria C e C+E, contactou a escola de condução “ O... ”, tendo aí sido informado que teria de submeter-se a avaliação psicológica, a qual podia ser realizada nas instalações da escola por psicólogos do x(...).

j) Tendo em vista sujeitar-se à avaliação psicológica, inscreveu-se naquela escola de condução, pagando uma quantia não concretamente apurada.

k) Nessa sequência, GG... foi sujeita a avaliação psicológica, no âmbito da qual realizou testes escritos psicotécnicos para aferição das capacidades perceptivo-cognitivas e uma entrevista individual com um indivíduo do sexo masculino, não tendo sido sujeito a exame às capacidades psicomotoras.

l) Não obstante ter elaborado o relatório referido em 48, B... não teve qualquer intervenção no processo de avaliação de GG... , porquanto não a acompanhou, orientou ou supervisionou na realização dos testes, tendo assinado o relatório atestando que o candidato possuía as capacidades para ser aprovado, sem comprovar que o respetivo teor correspondia ao real estado físico e mental do candidato.

m) Z... não realizou a entrevista individual com um psicólogo do x(...).

n) Z... não fez exame às capacidades psicomotoras.

o) A arguida ao elaborar o relatório indicado em 82, não comprovou se o teor do mesmo correspondia ou não ao real estado físico e mental do candidato.

**

MOTIVAÇÃO

Os factos dados como provados assentam numa apreciação crítica de global de toda a prova produzida no seu conjunto. Com efeito, conjugando a prova documental com a prova testemunhal não tivemos dúvidas em dar como provados os factos assentes.

Vejamos, então, em pormenor.

O arguido D... foi julgado na ausência e as arguidas C... e B... não prestaram declarações.

A arguida A... prestou declarações depois de terem sido ouvidas as testemunhas indicadas aos factos que lhe eram imputados. Assim, seguindo a mesma metodologia, apenas nos pronunciaremos quanto às suas declarações, depois de analisada a prova relativamente aos factos que lhe são imputados.

Resultou provado (facto 1) que os arguidos, durante os anos de 2010 e 2011, exerceram funções como psicólogos no Instituto de Investigação e Formação (...). Estes factos foram considerados provados tendo em consideração a informação do x(...) – Instituto de Investigação e Formação (...) junta aos autos a fls. 454 e 454, sendo certo que estes factos também foram confirmados pela arguida A... .

No que se refere à localização da sede do x(...), atendemos, à certidão permanente de fls. 325 a 327 e, no que concerne à delegação de Aveiro, mais uma vez atendemos às declarações da arguida A... .

Os documentos de fls. 93, 94 e 245 confirmam que os arguidos são psicólogos inscritos na Ordem dos Psicólogos.

O facto descrito em 2 foi considerado provado tendo por base a certidão permanente da sociedade x(...), junta aos autos a fls. 325 e 327, sendo certo que a arguida A... e as testemunhas J... , diretor da escola de condução “ L... ”, M... , dono da empresa “ N... , Ltª” e Q..., diretor da escola de condução “ O... ”, confirmaram que o x(...) procedia às avaliações psicológicas exigidas por lei, nas indicadas escolas de condução, para a obtenção ou renovação da habilitação de condução do grupo 2.

Os arguidos, enquanto psicólogos do x(...), efetuavam tais avaliações psicológicas (conforme foi confirmado pela arguida A... ), sendo certo que o conteúdo de tais avaliações estavam fixadas na lei – artigo 14.º e seguintes do D.L. n.º 313/2009, de 27.10. Os relatórios constantes do apenso 01, também confirmaram que os candidatos eram avaliados aos diversos itens constantes do ponto 3 dos factos assentes. Estes mesmos relatórios foram valorados para dar como assente o facto constante do ponto 4.

O facto descrito em 5, também resulta do disposto no n.º 4 do artigo 20.º do citado D.L. 313/2009.

Os factos descritos nos pontos 6 a 10 foram confirmados, de forma isenta e credível, pelas testemunhas J... , diretor da escola de condução “ L... ”, M... , dono da empresa “ N... , Lta” e Q... , diretor da escola de condução “ O... ”, sem que ninguém colocasse em causa que tais factos correspondiam à verdade.

Todos as testemunhas que efetuaram os testes de avaliação (que infra se identificarão) nas referidas escolas de condução confirmaram que realizaram os testes percetivo-cognitivos. Assim, foram dados como assentes os factos constante no ponto 11.

O facto constante do ponto 14, resulta da análise dos relatórios que compõem o apenso 01, já que em todos eles consta que os condutores e candidatos foram sujeitos aos três exames: testes escritos psicotécnicos, testes à capacidade motora e entrevista com psicólogo.

A testemunha José Manuel Batista Pereira confirmou, de forma isenta e credível, os factos constantes dos pontos 17 a 19 e 21. O relatório subscrito pela arguida A... junto aos autos a fls. 233 a 248 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 20 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha U... descreveu, de forma coerente e isenta, os factos escritos nos pontos 22, 23 e 24 e o relatório subscrito pela arguida A... junto aos autos a fls. 218 a 220 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 25 e a data em que a avaliação foi feita.

W... confirmou, de forma desinteressada e coerente, os pontos 26 a 28 e relatório subscrito pela arguida A... junto aos autos a fls. 31 a 34 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 29 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha X... descreveu os factos 30 a 32, de forma verosímil e o relatório subscrito pela arguida A... junto aos autos a fls. 36 a 39 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 33 e a data em que a avaliação foi feita.

E... relatou coerentemente os factos constantes dos pontos 34 a 36. O relatório subscrito pela arguida A... junto aos autos a fls. 26 a 29 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 37 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha Y... , de forma credível, confirmou os factos descritos em 38 a 40 e o relatório subscrito pela arguida A... junto aos autos a fls. 252 e 255 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 41 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha V... relatou, de forma isenta, os factos descritos nos pontos 42 a 44 e o relatório subscrito pela arguida A... junto aos autos a fls. 247 a 250 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 45 e a data em que a avaliação foi feita.

Analisemos, agora, as declarações da arguida ( A... ).

No essencial a arguida veio alegar que trabalha no x(...), desde 2008, com a atual função de diretora técnica. Segundo a mesma, nunca ia às escolas de condução e não reconhece as assinaturas constantes dos relatórios de avaliação assinados com o seu nome. Declarou, ainda, que nunca fez relatórios em que os exames de avaliação não tenham sido efetuados por si.

Como se constata da matéria de facto apurada, não acreditamos nas declarações da arguida por as mesmas de revelarem inverosímeis e inexplicáveis. Desde logo, importa ter presente que a arguida é diretora técnica do x(...), sendo psicóloga de profissão. Alega que não reconhece as assinaturas dos relatórios assinados com o seu nome mas não consegue encontrar qualquer explicação para o facto. Sendo a arguida funcionário do x(...) não se consegue vislumbrar quem poderia utilizar o seu nome para assinar relatórios de avaliação. Este instituto tinha, segundo a arguida, cinco psicólogos, não existindo motivos para terem relatórios como seu nome, qualquer um dos outros podia subscrevê-los. Por outras palavras, a arguida não consegue esclarecer por que motivo tinham de utilizar o seu nome. Acresce que é a própria arguida que afirma que confia nos colegas, pelo que não acredita que tenham sido eles a falsificar a sua assinatura. A arguida também veio alegar que só durante o julgamento se apercebeu deste facto, o que também não se mostra credível. A arguida está acusada de sete crimes de atestado falso, não sendo verosímil e só em pleno julgamento tenha analisado os relatórios em causa.

Como se vê as declarações da arguida não são credíveis nem lógicas e contradizem as regras da normalidade. A própria arguida não consegue encontrar justificação para os factos que alega, certamente porque ela não existe.

Assim, neste particular, as declarações da arguida não foram valorizadas.

Relativamente aos factos descritos nos pontos 46 a 48, consideramos apenas os relatórios juntos aos autos a fls. 78 a 80, 57 a 60 e 62 a 65.

A testemunha T... descreveu, de forma credível, os factos constantes dos pontos 49 a 51 e relatório subscrito pela arguida B... junto aos autos a fls. 46 a 48 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 52 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha H... relatou os factos constantes dos pontos 53 a 55, de forma consistente, e o relatório subscrito pela arguida B... junto aos autos a fls. 128 a 131 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 56 e a data em que a avaliação foi feita.

AA... confirmou os factos dos pontos 57 a 59, de forma que consideramos coerente, e o relatório subscrito pela arguida C... junto aos autos a fls. 189 a 192 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 52 e a data em que a avaliação foi feita.

F... descreveu os factos, de forma isenta e coerente, descritos nos pontos 61 a 63 e o relatório subscrito pelo arguido D... junto aos autos a fls. 82 a 87 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 64 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha AA... mencionou os factos 65 a 67, de forma convincente, e o relatório subscrito pela arguida B... junto aos autos a fls. 257 a 260 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 68 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha CC... narrou convincentemente os factos descritos em 69 a 71 e 73 e o relatório subscrito pela arguida B... junto aos autos a fls. 209 a 212 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 72 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha R... expôs, de forma credível, os factos descritos em 74 a 76 e 78 e o relatório subscrito pela arguida B... junto aos autos a fls. 115 a 117 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 77 e a data em que a avaliação foi feita.

A testemunha Z... descreveu os factos constantes dos pontos 79 a 81 e o relatório subscrito pela arguida C... junto aos autos a fls. 193 a 195 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 82 e a data em que a avaliação foi feita.

Esta testemunha não confirmou os factos descritos nas alíneas m), n) e o), pelo que foram os mesmos considerados não provados.

DD... mencionou os factos descritos em 83 a 85 e o relatório subscrito pela arguida C... junto aos autos a fls. 196 a 199 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 86 e a data em que a avaliação foi feita.

Também a testemunha EE... narrou os factos constantes dos pontos 87, 88 e 90 e o relatório subscrito pela arguida C... junto aos autos a fls. 184 a 187 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 89 e a data em que a avaliação foi feita.

Por fim, a testemunha FF... referiu os factos descritos em 91 e 92 e o relatório subscrito pela arguida C... junto aos autos a fls. 213 a 216 do apenso 01, confirma o facto descrito no ponto 93 e a data em que a avaliação foi feita.

Em suma, podemos dizer que cada uma das testemunhas indicadas confirmou os factos que consideramos provados e que lhe diziam respeito (sendo certo que nunca foi colocado em causa a veracidade das suas declarações) e os documentos juntos no apenso 1, demonstram inequivocamente que os arguidos elaboraram relatórios onde atestaram que as testemunhas tinham sido submetidos a determinadas avaliações que na realidade não tinham realizado. É do confronto dos depoimentos das testemunhas e dos documentos juntos que se concluiu que os relatórios atestam factos que os arguidos desconheciam se correspondiam ou não à verdade, pois não fizeram as avaliações necessárias para o efeito. Todas as testemunhas indicadas (com exceção do Z... ) confirmaram que não efetuaram qualquer avaliação em máquinas, como a descrita no documento de fls. 397 e seguintes, que, como é consabido, é exigido para as avaliações psicomotoras (e foi afirmado pela arguida A... ).

Importa, ainda, dizer que nenhuma das testemunhas reconheceu as arguidas, o que confirma o facto constante do ponto 15.

Os factos descritos nos pontos 12, 13, 15 e 16, são uma conclusão dos factos descritos nos pontos 14 a 94, pelo que nada mais há a referir do que já anotamos.

Quanto aos factos relatados em 94 a 99, a sua prova resulta da conjugação dos restantes factos dados como provados. Como se refere no Ac. da R.P. de 23.02.93, B.M.J. 324/620, “dado que o dolo pertence à vida interior de cada um, é portanto de natureza subjetiva, insuscetível de direta apreensão. Só é possível captar a sua existência através de factos materiais comuns de que o mesmo se possa concluir, entre os quais surge com maior representação o preenchimento dos elementos integrantes da infração. Pode comprovar-se a verificação do dolo por meio de presunções, ligadas ao princípio da normalidade ou das regras da experiência”. No mesmo sentido vide Ac. da R.P. 0140379, de 03.10.2001, Ac. R.G. 1559/05.1, de 14.12.2005, ambos em www.jurisprudencia.vlex.pt.

Aceitamos as declarações da arguida A... para dar como provados os factos respeitantes à sua situação económica.

Valoramos os CRC juntos aos autos para concluir que os arguidos não têm antecedentes criminais.

Foram dados como não provados os factos constantes das alíneas a) a l) por não se ter feito qualquer prova quanto a eles.

***

APRECIANDO

O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que os recorrentes extraem das respectivas motivações, de acordo com o estabelecido no artigo 412º, n.º 1 do CPP, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso.

In casu, os recorrentes impugnam a decisão proferida sobre a matéria de facto, imputando à sentença recorrida os vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova, previstos nas alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 410º do CPP, através dos quais pretendem pôr em causa o julgamento da matéria de facto.

Mais consideram os recorrentes que a sua conduta não pode ser subsumida à previsão legal dos n.ºs 1 e 3 do artigo 260º do CP.

*

I- Questão prévia:

 Com a motivação dos recursos e a pretexto de fundamentar a sua versão dos factos, juntaram os recorrentes documentos (a recorrente A... 4 documentos e os recorrentes C... , B... e D... 2 documentos).

Conforme o preceituado no artigo 165º, nº 1 do CPP “o documento deve ser junto no decurso do inquérito ou da instrução e, não sendo isso possível, deve sê-lo até ao encerramento da audiência”. Todavia, em qualquer dos casos deve ser assegurado o princípio do contraditório (n.º 2).

Daqui resulta que a produção de prova em audiência se faz até ao encerramento desta, só podendo reabrir-se a audiência para produção de prova suplementar, quando se mostre necessário para a determinação da sanção a aplicar – cfr. artigos 361º, n.º 2 e 371º do CPP.

Isto sem prejuízo de, tal limite vir a ser ultrapassado, mas até à leitura da sentença, quando o tribunal oficiosamente ordenar a junção de determinado documento que se lhe afigura necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, ao abrigo do disposto no art. 340º do CPP ([1]).

Compreende-se a razão do prazo fixado no citado artigo 165º, face ao estabelecido no artigo 355º do mesmo Código, segundo o qual só valem em julgamento as provas que tenham sido produzidas ou examinadas em audiência; este exame não significa que os documentos tenham de ser lidos em voz alta em audiência, podendo ocorrer aquando da deliberação do tribunal (art. 365º) ([2]).

Acresce que, requereram os recorrentes que este tribunal de recurso oficiasse à Inspecção-Geral das Actividades em Saúde e ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, solicitando que estas entidades esclarecessem determinados pontos que os recorrentes indicaram, esclarecimentos que, em seu entender, serviriam como contraprova de factos dados como provados.

Ora, o tribunal de recurso não se pode pronunciar sobre questões que não foram do conhecimento do tribunal recorrido. “O tribunal de recurso deve apreciar se uma questão decidida pelo tribunal de que se recorreu foi bem ou mal decidida e extrair daí as consequências atinentes; o tribunal de recurso não pode pronunciar-se sobre questão nova, salvo se isso for cometido oficiosamente pela lei" ([3]).

Na situação em apreço, alegam os recorrentes que os documentos juntos com a motivação de recurso constituem prova documental que infirmam factos dados como provados.

A ser assim, considerando os recorrentes que os mesmos eram importantes para a decisão da causa, não se vislumbra qual a razão de não terem sido tempestivamente apresentados tais documentos, já que os mesmos estão datados ou foram emitidos em momento anterior ao encerramento da audiência de julgamento.

Não o tendo feito oportunamente, pelo acima exposto, a ora requerida junção é extemporânea.

De igual modo, quanto aos pontos que os recorrentes pretendiam que fossem esclarecidos pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde e pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, não cuidaram os recorrentes de os solicitar, antes do início da audiência de julgamento ou no decurso da mesma, como se observa das respectivas actas.

*

II - No requerimento de interposição dos recursos, dizem os recorrentes que os mesmos têm por objecto a reapreciação da prova gravada.

Assim, pugnando pela sua absolvição, começam os recorrentes por querer impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, ainda que confundindo-a com os vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova.

Como sabemos, a matéria de facto pode ser sindicada através da invocação dos vícios a que alude o n.º 2 do artigo 410º do CPP, ou mediante a impugnação da matéria de facto nos termos do artigo 412º, n.ºs 3, 4 e 6 do mesmo Código.

Como estabelece o n.º 3 do artigo 412º do CPP «Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) as provas que devam ser renovadas.» e, nos termos do n.º 4 «Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação».

Ora, não cumpriram os recorrentes o ónus de especificação a que estavam obrigados: se quanto aos “concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados” indicaram, de forma não muito precisa, os pontos 3, 4, 5, 6, 8, 9, 11, 97 e 98 dados como provados, estando documentada em acta a prova produzida em audiência (art. 363º do CPP), não fizeram qualquer referência ao que ficou consignado na acta (atenta à gravação em CD, não estavam os recorrentes impedidos de concretizar as passagens da gravação dos depoimentos, porquanto no CD se visualiza, relativamente a cada depoimento, não só a duração integral do mesmo, como os minutos e segundos que vão correndo ao longo do mesmo, de forma a identificar o momento exacto em que cada declaração foi produzida).

E, quanto “às concretas provas que impunham decisão diversa da recorrida” referem que “para contraprova dos factos dados como provados, se junta a transcrição das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento, principalmente na parte em que admitem que fizeram sempre exames médicos e teste junto do Delegado de Saúde”.

Acontece que, com base em tal transcrição não pode este tribunal reapreciar a prova produzida.

Já antes das alterações de 2007, não se podia atender à transcrição da prova apresentada/efectuada por iniciativa dos recorrentes porquanto, o ónus da transcrição da prova gravada cabia ao tribunal, conforme Assento de Fixação de Jurisprudência do STJ nº 2/2003, de 16-01-03 (in DR, I Série, de 30-01-03), nos termos do qual “sempre que o recorrente impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, em conformidade com o disposto nos nºs 3 e 4 do artigo 412º do Código de Processo Penal, a transcrição ali referida incumbe ao tribunal”.

A Lei n.º 48/2007, de 29.8 mudou profundamente o regime de impugnação da matéria de facto. O legislador teve dois objectivos: tornar mais exigente a especificação dos pontos de facto impugnados e das provas que impõem decisão diversa da recorrida no recurso da decisão sobre a matéria de facto e pôr cobro ao dever de transcrição dos registos gravados. O novo regime articula-se com as regras novas sobre a documentação das declarações prestadas na audiência e o acesso dos sujeitos processuais a esta documentação. ([4])

Como anteriormente já havia decidido o STJ (por acórdão de 24-10-2002, no proc. 2124/2002, disponível in www.dgsi.pt): “… o labor do Tribunal da 2ª Instância num recurso da matéria de facto não é uma indiscriminada expedição determinada a repetir toda a prova (por leitura e/ou audição), mas sim um trabalho de reexame da apreciação da prova (…) nos pontos incorrectamente julgados, segundo o recorrente e a partir das provas que, no mesmo entender, impõem decisão diversa da recorrida (art. 412º, n.º 3, als. a), b) e c) do CPP) e levam à transcrição (n.º 4 do art. 412º do CPP).

Se o recorrente não cumpre esses deveres não é exigível ao Tribunal Superior que se lhe substitua e tudo reexamine, quando o que lhe foi pedido é que sindique erros de julgamento que lhe sejam devidamente apontados, com referências às provas e respectivos suportes”.

O tribunal de recurso não procede a um novo julgamento, incumbindo-lhe apreciar se uma questão decidida pelo tribunal de que se recorreu foi bem ou mal decidida e extrair daí as devidas consequências.

Deste modo, não tendo os recorrentes impugnado a matéria de facto de acordo com o estabelecido nos n.ºs 3 e 4 do citado artigo 412º, tem-se como definitivamente assente a factualidade fixada pelo tribunal de 1ª instância, estando este tribunal de recurso impossibilitado de a alterar, conforme o disposto no artigo 431º, al. b), do Código de Processo Penal, isto sem prejuízo da eventual alteração decorrente da existência dos vícios a que alude o artigo 410º (vícios que foram também invocados pelos recorrentes).

*

Quanto à recorrente A... , importa ainda apreciar a sua argumentação quanto às assinaturas apostas nos relatórios onde consta o seu nome. Diz a recorrente:

“- refuta perentoriamente a autenticidade das assinaturas apostas nos relatórios em que consta o seu nome;

- a Mmª Juiz “a quo” poderia e deveria ter requerido uma peritagem de letra e assinatura de modo a verificar a autenticidade ou não das mesmas;

- verificou que as assinaturas eram falsas alguns dias antes do início da audiência mas, por desconhecimentos só em plena audiência é que informou o mandatário”.

Para uma melhor compreensão da questão suscitada pela recorrente procedemos à audição integral das declarações que prestou em audiência.

Na verdade, declarou a arguida A... na 3ª sessão da audiência de julgamento (em 7-5-2014) “não reconheço as assinaturas em nenhum dos relatórios”, sendo a prática habitual que “o psicólogo que efectuasse a avaliação era o psicólogo que assinava o relatório”. E, a instâncias do seu Defensor, reconheceu que “ao ter só olhado para os relatórios na 2ª feira (em 5-5-2014), isso de alguma forma limitou a sua defesa”.

Ora, ainda de acordo com as declarações que prestou, quando foi ouvida em fase de inquérito não foi confrontada com os relatórios onde constava o seu nome e assinatura e, tendo sido notificada da acusação, não abriu o envelope que a acompanhava (estava muito ocupada com o seu processo de doutoramento).

Por outro lado, não foi requerida a abertura da instrução.

Insurge-se a recorrente com o facto da Mmª Juiz, na sequência das declarações que prestou, não ter ordenado a realização de exame à letra e assinatura constantes nos aludidos relatórios, de modo a verificar a autenticidade ou não das mesmas.

O artigo 340º, que consagra o princípio da investigação ou da verdade material, admite com grande amplitude a produção de todos os meios de prova permitidos, isto é, aqueles meios de prova cujo conhecimento se afigure necessário à descoberta da verdade e boa decisão da causa (princípio da necessidade – n.º 1), que forem legalmente admissíveis (princípio da legalidade – n.º 3 e art. 125º), adequados ao objecto da prova (princípio da adequação) e de obtenção possível – n.º 4, al. c).

Estes princípios levam a que o tribunal não esteja circunscrito aos meios de prova indicados pelos sujeitos processuais, sendo assim o árbitro da apontada necessidade ([5]).  

Da audição das declarações a que procedemos, constatámos que a Mmª Juiz face ao desenrolar da prova produzida e examinada em audiência, não considerou necessária a realização de qualquer diligência de prova, quando foi dito pela arguida A... que não reconhecia as aludidas assinaturas como suas (como deixou consignado da Motivação da decisão).

De qualquer forma, tendo a arguida alertado (como referiu) o seu Ilustre Defensor para essa questão, na 1ª sessão da audiência de julgamento, que ocorreu no dia 5 de Maio, nada impedia que o seu Defensor tivesse requerido a realização das pertinentes diligências de prova, nessa mesma data, ao abrigo do citado artigo 340º. E, então sim, nessa sequência, deveria a Mmª Juiz a quo pronunciar-se sobre a (ir)relevância e a (des)necessidade da pretensão da arguida para os presentes autos.

*

Argumentam os recorrentes que a sentença sob apreciação enferma de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova.

Para fundamentar tais vícios alegam que:

«- por manifesta omissão, não foram ouvidas as entidades que possuem competência atribuída por Lei para averiguar da verificação ou não do eventual crime de atestado falso, nomeadamente a Inspecção-geral das Actividades em Saúde, do IMTT -Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, IP e, da Ordem dos Psicólogos;

- foram tiradas conclusões e feitos raciocínios que não têm aderência à realidade da prova produzida e, por outro lado, não são valorados factos (exemplo dos exames médicos realizados no Delegado de Saúde) que por si só conduziriam, inelutavelmente, a outra solução

Ora, a existência destes vícios tem de resultar da decisão recorrida na sua globalidade, sem recurso a elementos externos.

O artigo 410º do CPP, onde estão previstos os vícios da decisão recorrida, está intimamente ligado aos requisitos da sentença previstos no artigo 374º, n.º 2 do mesmo diploma, concretamente à exigência de fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação das provas que serviram para fundamentar a convicção do Tribunal.

O vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada verifica-se quando os factos provados são insuficientes para justificar a decisão assumida, ou quando o Tribunal recorrido deixou de investigar matéria de facto relevante de tal forma que o que foi apurado não permite, por insuficiência, a aplicação do direito ao caso submetido a apreciação, deixando de observar o dever da descoberta da verdade material.

O Prof. Germano Marques da Silva fala em “lacuna” no apuramento da matéria de facto.

Quanto ao erro notório na apreciação da prova, porque violador dos dados do conhecimento público generalizado, consiste em erro de tal modo evidente que não escapa ao comum dos observadores. Estar-se-á perante tal erro quando da leitura da decisão impugnada, por si ou conjugada com as regras da experiência comum, se conclua que os factos nela dados como provados não podem ter acontecido ou que os factos dados como não provados não podem deixar de ter acontecido, isto é, quando os factos dados como provados e/ou como não provados se revelam inequivocamente desconformes, impossíveis, ou seja, quando aqueles traduzem uma situação fáctica irreal ou utópica – (acórdão do STJ, de 11-3-2004, proferido no recurso 2674/02 deste TR).

Como resulta da fundamentação da matéria de facto, os factos dados como provados assentam numa apreciação crítica de global de toda a prova produzida no seu conjunto. Com efeito, conjugando a prova documental com a prova testemunhal não tivemos dúvidas em dar como provados os factos assentes.

Indicou o Tribunal a quo, em função dos documentos juntos aos autos, por que os depoimentos das testemunhas se revelaram credíveis. E ainda, explicou por que as declarações da arguida A... se revelaram inverosímeis e inexplicáveis.

Acresce, que a fundamentação de facto, quer na enumeração dos factos (provados e não provados), quer na motivação de facto, não apresenta qualquer erro, ou qualquer facto contrário às regras da lógica e da experiência comum, de que qualquer cidadão com formação média logo se aperceba e, é suficiente para a decisão de direito encontrada, pelo que improcedem os alegados vícios.

Acontece, que os recorrentes confundem tais vícios com uma diferente convicção probatória sobre a suficiência da prova e a credibilidade dos meios de prova apreciados em julgamento. No fundo, os recorrentes impugnam a convicção adquirida pelo tribunal a quo sobre determinados factos, em contraposição com a que sobre os mesmos eles adquiriram em julgamento, esquecendo-se da regra da livre apreciação da prova prevista no art. 127º do CPP.

Improcede pois, nesta parte, a argumentação dos recorrentes.

*

III. Consideram os recorrentes que “a sua conduta, em momento algum, poderá ser enquadrada e subsumida às previsões legais contidas nos n.ºs 1 e 3 do artigo 260º do Código Penal porquanto, o crime de atestado falso, na formulação actual é um crime específico próprio, na medida em que só pode ser autor deste crime: médico, dentista, enfermeiro, parteiro, dirigente ou empregado de laboratório que sirva fins médicos, ou pessoa encarregada de fazer autópsias. Ora, como se provou, os ditos fins médicos eram assegurados pela intervenção do Delegado de Saúde e nunca pela realização de exames psicotécnicos realizados por meros psicólogos”.

Estabelece o artigo 260º do CP:

«1- O médico, dentista, enfermeiro, parteira, dirigente ou empregado de laboratório ou de instituição de investigação que sirva fins médicos, ou pessoa encarregada de fazer autópsias, que passar atestado ou certificado que sabe não corresponder à verdade, sobre o estado do corpo ou da saúde física ou mental, o nascimento ou morte de uma pessoa destinado a fazer fé perante autoridade pública ou a prejudicar interesses de outra pessoa, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.

2- Na mesma pena incorre o veterinário que passar atestados nos termos e com os fins descritos no número anterior relativamente a animais.

3- Na mesma pena incorrem as pessoas referidas nos números anteriores que passarem atestado ou certificado ignorando se correspondem à verdade os factos deles constantes.

4- Na mesma pena incorre quem passar atestado ou certificado referido nos n.ºs 1 e 2 arrogando-se falsamente as qualidades ou funções neles referidas.»

Como verificamos, trata-se de um tipo especial relativamente ao crime de falsificação p. e p. pelo artigo 256º do mesmo diploma.

Como justificação da autonomia deste tipo de crime é referida “a frequência da sua prática” (…) sendo que “a especialidade reside na pessoa do agente, no tipo de documentos abrangidos, na forma da falsificação incriminada – só falsidade intelectual – e na punição que é mais branda” – cfr. Leal-Henriques e Simas Santos, in Código Penal Anotado, II vol., 3ª Edição, 2000, págs. 1146 e ss.

Tal como no crime de falsificação de documento, também aqui o bem jurídico-criminal é a segurança e a credibilidade no tráfico jurídico-probatório e, tal como no crime de falsificação de documento o agente é punido logo que falsifica o atestado, independentemente da sua utilização. Trata-se, por isso, de um crime de perigo uma vez que o crime está consumado antes da efectiva lesão do bem jurídico (que ocorre apenas quando for utilizado para fazer fé perante a autoridade pública ou para prejudicar interesses de outra pessoa) ([6]).

Como pode ler-se no ponto 11 da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 98/X, que esteve na origem da Lei n.º 59/2007, de 4 Set., diploma que alterou o Código Penal, «Os crimes de falsificação são objecto de diversas alterações. (…) No caso específico de atestado falso, criminaliza-se a conduta de quem emita o documento ignorando se os factos dele constantes são verdadeiros».

Portanto, nos termos do n.º 3 do aludido preceito passou a punir-se o autor de atestado emitido sem terem sido verificados os factos dele constantes. Assim, passaram a punir-se as condutas que atestam uma declaração de ciência falsa, dado que, quem atesta ou certifica sabe que o que declara não corresponde ao seu próprio conhecimento. A declaração de ciência é falsa porque é falso o facto sobre o qual a declaração se baseia ([7]).

Por outro lado, trata-se de um tipo legal de crime que deverá ser praticado por um específico agente (as pessoas referidas nos n.ºs 1 e 2 do preceito, as quais têm um dever especial de dizer a verdade), ou por aquele que passa atestado ou certificado arrogando-se falsamente as qualidades ou funções neles referida.

Acresce que, mesmo que se ateste ou se certifique facto falso juridicamente relevante, a conduta do agente apenas integra a previsão do artigo 256º se ele tiver actuado com “intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado, ou de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo”.

Volvendo à situação dos autos,

Determinou o artigo 126º do Código da Estrada que fossem fixados em regulamento os requisitos mínimos de aptidão física, mental e psicológica dos condutores para o exercício da condução.

Tais requisitos mínimos foram fixados inicialmente no DL n.º 45/2005, de 23 Fev., alterado pelos DL n.ºs 103/2005, de 24 Jun. e 174/2009, de 3 Ag., e transitaram para o Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir aprovado pelo DL n.º 313/2009, de 27 Out., anexo a este diploma.

Neste Regulamento assegura-se que o acto médico e o exame psicológico de avaliação do candidato ou condutor devem ser os mais adequados à habilitação pretendida, tendo em conta o interesse do avaliado e da segurança rodoviária.

No campo da avaliação médica e psicológica estabeleceu-se que a sua realização possa ser efectuada por Centros de Avaliação Médica e Psicológica (CAMP), passando as entidades públicas a intervir, essencialmente, em sede de recurso e, conferiu-se à Inspecção-Geral das Actividades em Saúde e ao Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, I.P. (IMTT), a competência para fiscalizar aqueles centros, de acordo com as suas atribuições.

Nos termos do artigo 6º deste Regulamento, quanto ao quadro de pessoal dos CAMP, estatui-se que aos médicos e psicólogos compete avaliar os candidatos ou condutores de acordo com as disposições legais, regulamentares e técnicas que disciplinam a actividade de avaliação da aptidão física, mental e psicológica.

O exame médico destina-se a avaliar as condições físicas e mentais de candidatos ou condutores e o exame psicológico destina-se a avaliar as áreas perceptivo-cognitiva, psicomotora e psicossocial relevantes para o exercício da condução ou susceptíveis de influenciar o seu desempenho – artigos 12º e 14º do Regulamento.

Tal como resultou provado, os arguidos exerceram funções, como psicólogos, no Instituto de Investigação e Formação (...), Ldª (IFR). E, no âmbito das suas funções competia aos arguidos procederem à realização dos exames psicológicos.

Este x(...) estava certificado para, nos termos do citado DL n.º 313/2009, proceder às avaliações médicas e psicológicas legalmente exigidas para a obtenção ou renovação de habilitação de condução do grupo 2, como resulta da certidão de fls. 325 a 328.

Ora, os arguidos actuando no exercício das suas funções, no que respeita às avaliações psicológicas, procederam à elaboração de relatórios onde avaliaram/certificaram as áreas perceptivo-cognitiva, psicomotora e psicossocial relevantes para o exercício da condução ou susceptíveis de influenciar o seu desempenho; relatórios que assinaram e foram remetidos para as escolas de condução “ L... ” e “ O... ”.

Todavia, ainda que os candidatos a exame de condução tenham sido sujeitos a testes escritos de avaliação perceptivo-cognitiva, resultou provado que pelo menos 17 candidatos não foram sujeitos a exame de avaliação das capacidades psicomotoras e, pelo menos 4 candidatos não foram sujeitos a entrevista com um dos psicólogos do x(...) tendo em vista a avaliação das capacidade psicossociais.

Mais foi dado como assente que embora todos os relatórios de avaliação estejam assinados pelos arguidos, a verdade é que os mesmos não intervieram na realização dos aludidos exames, pois que não orientaram, acompanharam ou supervisionaram os examinados e, que ao subscreverem os aludidos relatórios de avaliação, atestaram que os examinados possuíam as capacidades exigidas para obterem aprovação, sem comprovarem se o teor de tais relatórios correspondiam ao real estado dos mesmos.

Considerou a sentença recorrida, quanto à subsunção jurídica da conduta dos arguidos, que os arguidos eram, à data dos factos, funcionários de um centro de investigação que servia fins médicos – avaliação da aptidão física, mental e psicológica -, pelo que podem ser autores de um crime de atestado médico p. e p. pelo artigo 260º, n.ºs 1 e 3 do Código Penal.

Discordamos desta conclusão.

Acontece que, de acordo com o Código Deontológico da Ordem dos Psicólogos Portugueses ([8]), no que respeita à sua natureza, a avaliação psicológica é definida como um acto exclusivo da Psicologia e um elemento distintivo da autonomia técnica dos/as psicólogos/as relativamente a outros profissionais (ponto 4.1 dos Princípios específicos).

Por outro lado, não competindo a avaliação psicológica às pessoas referidas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 260º do CP, também não se pode considerar que tal actividade dos psicólogos seja paramédica, dado não constar na lista anexa ao DL n.º 261/93, de 24 de Julho que regulamenta o exercício das actividades paramédicas. Nos termos do artigo 1º deste diploma, o exercício das actividades profissionais de saúde, designadas por actividades paramédicas, compreendem a utilização de técnicas de base científica com fins de promoção da saúde e de prevenção, diagnóstico e tratamento da doença, ou de reabilitação.

Por conseguinte, dado que os relatórios que os arguidos elaboraram e assinaram não versavam sobre as condições físicas e mentais de candidatos ou condutores, e que os psicólogos não constam do elenco das pessoas referidas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 260º do CP, teremos de concluir que não se mostra preenchido o elemento objectivo do tipo do crime de atestado falso, impondo-se a absolvição dos arguidos.

*****
IV- DECISÃO

Face ao exposto, acordam os juízes da secção criminal deste Tribunal da Relação em:

- Conceder provimento aos recursos e, em consequência, absolver os arguidos A... , B... , C... e D... da prática dos crimes de atestado falso p. e p. pelo artigo 260º, n.ºs 1 e 3 do CP, que lhes haviam sido imputados.

Sem custas.


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Coimbra, 11 de Março de 2015

(Elisa Sales - relatora)

(Paulo Valério - adjunto)


[1] - Ac. RP de 8-10-97, CJ, Tomo IV, pág. 243.
[2] - Ac. STJ, de 25-2-93, proc. n.º 43 287.
[3] - Acs. do STJ de 6-2-87 e de 3-10-89, in BMJ 364/714 e 390/408.
[4] - Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, 2ª ed., Univ. Católica Editora, pág. 1131.
[5] - cfr. Acs. do STJ, de 31-10-91, BMJ n.º 410, pág. 418; de 4-12-96, BMJ n.º 462, pág. 286.
[6] - Helena Moniz in Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo II, Coimbra Editora 1999, págs. 721 e 722.
[7] - Helena Moniz, in ob. cit., pág. 725.
[8] - Aprovado pelo Regulamento n.º 258/2011, publicado em 20 de Abril de 2011 no Diário da República, II Série, n.º 78.