Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2411/15.8T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL
ASSEMBLEIA GERAL
VOTAÇÃO
DANO
SOCIEDADE
SÓCIO
Data do Acordão: 07/13/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA, LEIRIA, INSTÂNCIA CENTRAL – 1.ª SECÇÃO DE COMÉRCIO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 380.º E 386.º DO CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS
Sumário: 1. O artigo 386.º do Código das Sociedades Comerciais, que consagra a regra geral do quórum deliberativo das assembleias gerais (e excepções a ela, nele previstas), não tem carácter imperativo, mas sim dispositivo, pelo que pode ser derrogado pela lei ou pelos estatutos da sociedade em causa.

2. Estipulando os estatutos da sociedade que a alteração destes só poderia ser aprovada por maioria superior a 75% de votos favoráveis correspondentes à totalidade do capital, a estipulação estatutária sobrepõe-se ao que se acha estabelecido no artigo 386.º do CSC, que só vale como regra geral, podendo ser derrogado por diversa (específica) disposição legal ou constante do pacto social.

3. Tendo a proposta de alteração dos estatutos da requerida merecido o voto contra do recorrente, que detém 29.98 % dos votos, é patente que a mesma não foi aprovada, por falta de quorum deliberativo.

4. Compete ao presidente da assembleia geral apurar o resultado das votações, proclamar o sentido (positivo ou negativo) da deliberação e declarar o encerramento da assembleia. Sofrem de nulidade todas as deliberações tomadas após a declaração de encerramento da assembleia, por a mesma já não ter poder deliberatório.

5. Nos termos do disposto no artigo 380.º, n.º 1, in fine, do NCPC, um dos requisitos exigidos para que se decrete a suspensão de deliberações sociais é o de que a execução das deliberações cause dano apreciável.

6. Existem danos apreciáveis para a sociedade requerida e para o recorrente, na qualidade de seu sócio, decorrentes da aprovação e execução das deliberações em causa por a demora da sua apreciação e decisão na competente acção de anulação, frustrar a eficácia prática a atingir com a declaração de anulação/suspensão das deliberações sub judice.

Decisão Texto Integral:

            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

 A... , residente na Av. (...) Leiria, veio deduzir o presente procedimento cautelar para suspensão de deliberação social, nos termos dos artigos 380º e seguintes do Código de Processo Civil, contra B... , S.A., pessoa colectiva número (...) com sede em (...) Bidoeira de Cima, pedindo que seja determinada a suspensão das deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral Anual a 29 de Junho de 2015, tudo com as demais consequências legais.

Requer ainda que seja determinada a inversão do contencioso, declarando a anulação das deliberações sociais tomadas na mesma assembleia.

Partindo da caracterização da requerida e da sua legitimidade, decorrente de ser sócio da requerida, o requerente, alegou, em síntese, a ilegalidade de deliberações societárias por violação da lei, por violação do pacto social e os danos apreciáveis que decorrerão caso não sejam suspensas e anuladas a final da deliberação de aprovação de contas, da deliberação de nomeação de órgãos sociais e a final fundamentou as razões para se determinar a inversão do contencioso e declarar a anulação das deliberações sociais tomadas na mesma assembleia.

Juntou prova documental, requereu a junção da respectiva acta invocando recusa de entrega da mesma por parte da requerida e testemunhal.

Citada a Requerida veio a mesma deduzir oposição, nos termos que se mostram a fls. 139 e segs., resumidamente, por não se verificarem as ilegalidades assacadas às invocadas deliberações, que respeitaram a lei e os estatutos da requerida, pugnando pela improcedência da presente providência, não ser declarado a inversão do contencioso, peticionada pela requerente, e caso assim se não entenda, deve o Tribunal pronunciar-se sobre a validade das deliberações de 16/06/2015 e de 29/06/2015, bem como sobre o abuso de minoria em que se traduz o comportamento do Requerente, que é sócio de várias sociedades que têm o mesmo objecto social da requerida.

Juntou prova documental, apresentou a respectiva acta e rol de testemunhas.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais, com recurso à gravação dos depoimentos prestados, após o que foi proferida a sentença de fl.s 533 a 580, na qual se procedeu ao saneamento dos autos e neste âmbito se declarou a legitimidade do autor e fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final, se julgou improcedente, por não provada, a requerida providência, ficando as custas a cargo do requerente.

Inconformado com a sentença proferida, dela interpôs recurso o requerente, A... , recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo – (cf. despacho de fl.s 722), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

1. O art. 11º do pacto social prevê que as deliberações sociais são tomadas por maioria superior a setenta e cinco por cento de votos favoráveis correspondentes à totalidade do capital.

2. No dia 16/06/2015 realizou-se uma assembleia geral extraordinária da sociedade Requerida cuja ordem de trabalhos era proceder à alteração a vários artigos dos estatutos da Requerida – nomeadamente o art. 11.

3. A proposta de alteração aos estatutos mereceu os votos favoráveis dos acionistas C... , D... e E... e o voto desfavorável do acionista e Recorrente A... .

4. Os votos a favor da aprovação da proposta de alteração aos estatutos correspondem apenas a 70% do capital social da Requerida, razão pela qual a referida proposta não foi aprovada por falta de quórum, ao abrigo do art. 11º do pacto social.

5. A ata n.º 89, respeitante à assembleia geral extraordinária de 16 de junho de 2015, contém uma menção expressa à proclamação, pelo presidente da mesa, de deliberação negativa.

6. Ao presidente da mesa da assembleia geral cabem múltiplas funções, entre elas, a de direção e condução da reunião de tal colégio. E neste específico desempenho, compete-lhe, notadamente, abrir e encerrar a assembleia, pôr em discussão cada ponto da ordem do dia, dar a palavra aos participantes que dela pretendam usar, aceitar e pôr à votação propostas de deliberação, efetuar a contagem dos votos e, ainda, proclamar o resultado da votação.

7. Não existe qualquer dúvida de que é a deliberação proclamada pelo Presidente – e só essa – a que se formou.

8. Tem legitimidade para proceder à impugnação da deliberação social os sócios que não tiverem votado no sentido que fez vencimento.

9. Contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, o Recorrente não podia ter impugnado a deliberação proclamada na assembleia geral de 16/06/2015 — de rejeição da proposta — porque havia votado justamente no sentido da rejeição.

10. Se é certo que o Presidente proclamou uma deliberação negativa – conforme consta da ata 89 – e que não ocorreu nenhuma retificação, pelo presidente, do sentido dessa proclamação, então é igualmente certo que se formou uma deliberação negativa de rejeição da proposta de alteração dos estatutos.

11. O registo de alteração dos estatutos, efetuado com base na ata n.º 89, onde foi proclamada uma deliberação negativa, foi levado a registo, o que é simplesmente desconcertante: a ata contém uma menção expressa à proclamação, pelo presidente da mesa, de deliberação negativa (rejeição da proposta de alteração dos estatutos), pelo que se mostra incompreensível e obsceno o registo efetuado.

12. O conservador não tem a liberdade de decidir registar uma deliberação ou o seu contrário – o conservador tem de registar a deliberação proclamada pelo Presidente.

13. Mesmo que o presidente da mesa se tivesse enganado ou tivesse errado ao proclamar a deliberação negativa, o vício de procedimento determinaria a respetiva anulabilidade: por isso, a deliberação, até ser impugnada, produziria os seus efeitos e, não tendo sido impugnada tempestivamente – como de facto não foi – convalida-se.

14. Ou seja, a deliberação de rejeição da proposta de alteração, mesmo que se considerasse inválida, já estaria convalidada.

15. Razão pela qual não há quaisquer dúvidas de que os estatutos não foram alterados.

16. O reforço do quórum deliberativo por via estatutária não é ilegal.

17. A maioria qualificada de dois terços dos votos emitidos pode ser aumentada nos estatutos. Tal como é possível reforçar estatutariamente a maioria prevista no n.º 4 do art. 386º.

18. A doutrina e a jurisprudência são praticamente consensuais quanto a esta questão.

19. O art. 386º, n.º 4 é uma norma dispositiva e, como tal, deve entender-se que a fixação de um quórum nos estatutos constitui uma derrogação implícita da normal.

20. Razão pela qual a doutrina reconhece a não aplicação do n.º 4 do art. 386º aos casos em que os estatutos fixem um quórum acrescido – como são os da Requerida.

21. Se assim não se considerasse, a redução de quórum seria arbitrária, e, mais grave, constituiria um mecanismo fácil para contornar qualquer reforço estatutário de quórum, pois bastaria faltar na primeira data para, na segunda, lograrem aprovar a deliberação, que se bastaria com metade dos votos.

22. Permitir que em segunda convocatória se aprove uma deliberação que aquela percentagem de capital nunca lograria aprovar em primeira convocação, constitui uma subversão do espírito do art. 386º, n.º 4.

23. Ou seja, uma cláusula estatutária que ele acima da percentagem exigida por lei o capital necessário para a aprovação de deliberações, é incompatível com uma norma que reduz esse capital em segunda convocatória.

24. O presidente da mesa goza de competências próprias, não podendo os sócios, independentemente do capital que detenham, sobrepor as suas decisões às do Presidente.

25. Tendo o Presidente decidido encerrar os trabalhos da assembleia geral de 29/06/2015, a alegada reabertura dos trabalhos mais não é que uma reunião não convocada: o procedimento que se iniciaria com a convocatória conclui-se com o encerramento da assembleia, estando qualquer ato posteriormente praticado provado de legitimidade procedimental.

26. Assim sendo, as alegadas “deliberações” aprovadas na assembleia geral anual de 26/06/2015, que constam das fls. 54ss do livro de atas, são nulas, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 56º, n.º 1, alínea a).

27. Não pode, por isso, ser levada a cabo a tese do Tribunal a quo a respeito da aparente validade das deliberações tomadas após ter sido encerrada a assembleia de 26/06/2015.

28. Conclui-se que as deliberações padecem de nulidade, por vício de procedimento (art. 56º, n.º 1, al. a) CSC) por terem sido tomadas em assembleia não convocada – aquela que foi convocada estava já encerrada por decisão do Presidente.

29. Mas, procederiam sempre de anulabilidade, por vício de procedimento (art. 58º, n.º 1, al. a) CSC) em virtude de não terem sido aprovadas pelo quórum fixado na cláusula 11ª do pacto social, que pelas razões expostas, se mantém em vigor na sua redação originária.

30. As “deliberações” tomadas na AG anual de 29/06/2015, consideradas válidas pelo Tribunal a quo, causam danos quer à Sociedade, quer ao próprio Requerente enquanto sócio.

31. A Certificação Legal das Contas relativas ao ano de 2014 contém quatro reservas.

32. Da deliberação de aprovação das contas resulta um claro dano, na justa medida em que as mesmas não espelham com realidade a verdadeira situação da sociedade Requerida, uma vez que há imparidades que não estão reconhecidas no balanço da Sociedade e o ativo e capital próprio da empresa está sobreavaliado – conforme resulta da certificação legal das contas apresentada pelo Fiscal Único e conforme ficou provado na douta sentença a que ora se recorre.

33. As reservas chamam a atenção para aspetos que não estão de acordo com as normas contabilísticas.

34. A reserva relativa aos diferimentos, caso tivesse sido corrigida, faria com que o resultado líquido do período passasse de positivo a negativo.

35. Está evidenciado nas reservas que o capital próprio da empresa está sobrevalorizado em cerca de € 2.140,00 (passaria de 5.791,00 para € 3.651,00 – um decréscimo de 27%).

36. Ou seja, o rácio de autonomia financeira da empresa desceria de 24% para 17%.

37. As dívidas ao Estado da Requerida aumentaram de 2013 para 2014, no montante de € 350.000,00.

38. as contas que foram “aprovadas” na AG no dia 29 de junho de 2015, não relatam a verdadeira situação da empresa.

39. O aumento de dívida, a constante e crescente interpelação para regularização de dívidas da Requerida, por fornecedores e entidades bancárias - no nosso humilde entendimento - não se coaduna com “sinais de recuperação

40. O Recorrente é o único acionista que não integra o CA, nem sequer o seu voto contribuiu para a eleição dos novos órgãos sociais.

41. O Requerente não votou a deliberação de novos órgãos sociais porque, como vimos, tal “deliberação” foi feita após o encerramento da assembleia geral.

42. O Recorrente foi ilegalmente afastado do cargo de presidente da mesa.

43. Se tal deliberação não for suspensa agravam-se os prejuízos e danos que a mesma acarreta ao Recorrente.

44. Pois que, enquanto presidente da mesa da AG, o Requerente ainda conseguia ter um papel minimamente ativo nas assembleias gerais.

45. Ao destituírem e elegerem novo Presidente, o Recorrente fica completamente alheio e sem o mínimo de controlo sobre o cumprimento da lei e dos estatutos Sociedade.

46. Pois que, como vimos, o episódio ocorrido na AG de 16/06/2015, se não fosse a atuação do Recorrente na qualidade de presidente da mesa, teria sido aprovada uma deliberação completamente inválida por total desrespeito aos estatutos.

47. E é exatamente isso que se pretende evitar com a presente providência cautelar: evitar que se tomem decisões em assembleia geral, completamente desprovidas de legalidade, que inevitavelmente irão conduzir a litígios judiciais (porque o acionista Recorrente terá que as impugnar), causando-lhe prejuízos mais que óbvios.

48. Até que a ação de anulação da deliberação transite em julgado, certamente muitas assembleias gerais se irão realizar e todas elas, sem exceção, irão ser alvo de ação judicial de anulação,

49. Razão pela não podemos concordar com o entendimento do Tribunal a quo, quer ao considerar, por um lado, válida a aprovação dos estatutos, e consequentemente válidas as alegadas deliberações aprovadas em AG de 29/06/2015; quer ao considerar que não se verifica a probabilidade de existência de dano apreciável (tanto para a Recorrida como para o sócio Recorrente).

Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exa., deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se totalmente a sentença recorrida, substituindo-se por outra que julgue procedente a Providência Cautelar e, em consequência:

a) Ser determinada a não aprovação da alteração dos estatutos da sociedade Requerida;

b) Ser determinada a suspensão das deliberações sociais tomadas em Assembleia Geral anual de 29 de junho de 2015, por violação da lei e do pacto social.

Nos termos e com os fundamentos acima expostos.

Ao julgardes assim, Venerandos Juízes Desembargadores, estareis uma vez mais a fazer A COSTUMADA JUSTIÇA!

Juntou Parecer elaborado pelo Professor Doutor Pedro Maia, em que este conclui, em resumo, que “As deliberações padecem de nulidade, por vício de procedimento (art. 56.º, n.º 1, al. a), CSC), por terem sido tomadas em assembleia não convocada – aquela que fora convocada estava já encerrada pelo seu presidente; e padeceriam também de anulabilidade, por vício de procedimento (art 58.º, n.º 1, al. a), CSC), em virtude de não terem sido aprovadas pelo quorum fixado na cláusula 11.ª do pacto social, que, pelas razões expostas, se mantém em vigor na sua redacção originária.”.

Contra-alegando, a requerida, apresentou as seguintes conclusões:

a. O tribunal a quo decidiu em conformidade com a prova produzida, tendo considerado, e bem, a improcedência da providência cautelar.

b. Entendemos que o Tribunal recorrido efectuou a correcta valoração da matéria dada como provada, bem como de todos os elementos que foram carreados para o processo.

c. A sentença recorrida encontra-se devidamente fundamentada e o Tribunal a quo fez uma correcta interpretação e valoração da factualidade apurada e de todas as provas produzidas nos autos, bem como do direito a aplicar aos autos.

d. Entendemos que a sentença recorrida não enferma de qualquer vício ou reparo, devendo a mesma ser confirmada, mantendo-se inalterada.

e. O recorrente não tem razão, pelo que deverá improceder o seu recurso.

f. Não há qualquer reparo a fazer à decisão proferida nos autos, devendo a mesma ser mantida.

g. A Mma. Juiz a quo formou a sua convicção pela avaliação de todas as provas carreadas para os autos, e nomeadamente, através dos documentos juntos aos autos e pelos depoimentos prestados pelas testemunhas indicadas pelo requerente e requerida.

h. A lei não prescreve, pela positiva, as qualidades que deva assumir a pessoa designada presidente da mesa da assembleia.

Trata-se de matéria que fica ao critério dos acionistas que o elejam, devendo ainda observar-se o que digam os estatutos. De todo o modo, para além de independência e de não reunir incompatibilidades, nos termos que abaixo referiremos, o presidente deve ter capacidade física e intelectual para o cargo, reunindo ainda conhecimentos mínimos de Direito das sociedades: de outra forma, depressa cairá em justa causa de destituição. Com efeito: não é compaginável uma assembleia geral moderna em que o presidente, por tudo e por nada, tenha de interromper os trabalhos para colher conselho jurídico.

i. No domínio da condução da assembleia, o presidente da mesa tem, desde logo, poderes relativos às:

– constituição da assembleia: cabe-lhe mandar organizar a lista dos acionistas que estiverem presentes e representados no início da reunião (382º/1), com as especificações e formalidades previstas na lei (382º/2 e 4);

– verificação das representações: os respetivos pedidos são-lhe dirigidos (380º/2);

– regularidade das participações: em virtude da legalidade, o presidente não é passivo nestas operações: antes deve, por si ou pelos seus auxiliares, certificar-se preliminarmente da idoneidade de todas as presenças.

j. No que respeita, designadamente, ao decurso das reuniões, cabe ao presidente:

– declarar aberta a sessão: um ponto formal importante para esclarecer todos os presentes de que se está perante um órgão social coletivo em funcionamento, que pode deliberar; a sessão deverá iniciar-se sem atrasos, respeitando a hora indicada na convocatória;

– permitir um período antes da ordem do dia: serão dadas informações ou trocadas impressões sem qualquer conteúdo deliberativo; esta hipótese deve ser evitada ou deve surgir muito parcimoniosa, particularmente nas reuniões ordinárias, sob pena de comprometer o tempo útil para discussões;

– conceder a palavra ao conselho de administração: em regra, este é o primeiro a pronunciar-se, explicando a situação da sociedade e dando um apanhado do seu relatório;

– seguir a ordem do dia, de modo adequado: introduzindo alterações na sequência dos pontos em discussão, quando conveniente;

– admitir novos pontos ausentes da ordem do dia, no caso de a lei o permitir ou de, tratando-se de uma assembleia universal, todos os sócios concordarem;

– organizar e conduzir a discussão a propósito de cada ponto;

– colocar à votação os pontos que entenda estarem devidamente esclarecidos e discutidos;

– determinar o modo de votação: braço no ar, sentados e levantados, nominal, escrutínio secreto ou outros;

– verificar, a propósito de cada votante, o seu direito e a regularidade dos votos;

– determinar “suspensões normais” da assembleia (387º/1),

designadamente para conversações entre acionistas, para café ou para refeições curtas; embora a lei não ponha limites, afigura-se que tais pausas não deverão exceder os 30/60 minutos, não pondo em causa a conclusão dos trabalhos;

– apurar o resultado de cada votação e proclamá-lo;

– admitir contraprova, em caso de dúvida, repetindo a votação;

– declarar a reunião encerrada: de novo um ponto formal importante, para que todos se apercebam de que não haverá mais deliberações possíveis.

k. O presidente veio a autonomizar-se. Recebe uma competência própria, distinta da assembleia e passa a não depender, quotidie et singulis momentis, desta. Trata-se de um sistema com vantagens, uma vez que dá credibilidade e consistência à própria assembleia. Mas pode operar com mais uma instância de controlo, capaz de embaraçar – e, logo: de encarecer – o desempenho societário. Na prática, porém, o presidente identificar-se-á com a maioria presente no conselho de administração, pelo que tudo funcionará com lesteza.

l. Na base desse e doutros preceitos e de múltiplas decisões jurisdicionais tendentes a concretizá-lo na prática, a jurisprudência tem vindo a autonomizar os seguintes pressupostos dos procedimentos cautelares:

(1) A probabilidade séria de existência do direito, traduzida na ação proposta ou a propor, que tenha por fundamento o direito a tutelar;

(2) O justo e fundado receio de que outrem cause lesão grave e de difícil reparação a esse direito;

(3) O não exceder o prejuízo resultante da providência o dano que com ela se quer evitar.

m. A probabilidade séria da existência do direito (fumus boni iuris) deve ser apreciada em termos sumários (summaria cognitio). Não se trata de indagar exaustivamente, de acordo com os elementos fornecidos por ambas as partes, se o direito existe e é totalmente eficaz mas, apenas, se – perante os dados invocados pela requerente – é de esperar que ele exista. Os juízos exigidos são juízos de razoabilidade: o Tribunal irá ponderar, perante as regras da experiência, se, com os dados de que já dispõe, lhe parece seriamente compaginável que o direito invocado exista, numa probabilidade “forte”

n. O justo e fundado receio tem um triplo alcance a saber: (a) visa prevenir as consequências de uma possível demora do processo principal (periculum in mora); (b) evita providências decretadas perante meras situações de perigo hipotético, virtual ou latente; (c) afasta a violação já consumada: a esta haverá que reagir com meios de fundo diversos; a jurisprudência ressalva – e bem – a hipótese de, havendo violação consumada, ser de esperar novas violações; a estas reage-se com providências cautelares, que poderão preveni-las.

o. Estes três pontos têm tradução prática. Assim, cabe ao requerente invocar e provar, de modo minimamente consistente, o montante, ainda que aproximado, dos danos que a providência visa prevenir. As providências não são meios adequados para enfrentar lesões de direitos já inteiramente consumadas. Quanto às consequências destas: caso elas indiciem novas atuações danosas, podem ser requeridas providências verificando-se, a tal propósito, se estão reunidos os requisitos legais.

p. Não pode o presidente abandonar a mesa e, com isso, paralisar a sociedade. No limite, o funcionamento de uma assembleia geral dependeria do belo-prazer do presidente, o que se deve ter por excluído

q. A lei permite que o presidente possa determinar “suspensões normais” da assembleia geral (387º/1). Trata-se, como temos defendido, de suspensões de 30 a 60 minutos, para café, para descanso, para contagem de votos ou para conversações entre acionistas. A partir daí, só a própria assembleia pode deliberar suspensões: e com certos limites (387º/1, 2ª parte e 387º/2).

Voltamos a frisar: de outro modo, o presidente teria um poder de vida ou de morte sobre a assembleia. Essa hipótese é de afastar, para mais quando o presidente não seja independente, como aqui sucede.

r. Se o presidente, indevidamente, encerrar os trabalhos e se retirar, temos, tecnicamente, uma situação de não-comparência. Aplica-se o artigo 374º/3 do Código das Sociedades Comerciais, de modo a não bloquear o funcionamento da sociedade.

s. O artigo 386º do Código das Sociedades Comerciais em causa parece claro:

– as regras da maioria simples dos votos emitidos aplica-se, em geral, nos termos do artigo 386º/1: pode ser afastada por disposição da lei ou por cláusula dos estatutos;

– no caso dos assuntos previstos no artigo 383º/2, entre os quais a alteração dos estatutos, a competente deliberação deve ser aprovada por dois terços dos votos: 386º/3.

t. Neste último caso, a lei não só não ressalva a cláusula em contrário como utiliza o imperativo deve.

u. A interpretação deve ser mais exigente: há que localizar os valores subjacentes à ponderação do legislador.

v. No tipo societário “sociedade anónima”, o legislador não é favorável a bloqueios. A experiência mostra que manter uma anónima refém de minorias equivale a impedir a criação e a circulação de riquezas. A situação é delicada, tanto mais que não se prevê o direito è exoneração dos sócios. Confirma-se, assim, a imperatividade dos 2/3: nem menos, para manter a estabilidade do ente coletivo e nem mais, para prevenir os tais bloqueios. De resto, é precisamente isso o que resulta da letra da lei.

w. Significa tudo isto que as alterações estatutárias votadas em 16-Junho de 2015 foram validamente aprovadas, com observância da maioria legal.

x. Uma assembleia não pode ser dirigida por um sócio minoritário em conflito com os restantes.

y. O Direito das sociedades não deve ser um jogo formal, em que decisões graves sejam tomadas sem consideração pela substancialidade envolvida.

z. Tanto basta para, também aqui, se afigurar inteiramente correta a douta sentença recorrida. Quando da mera leitura da ata, resulte claro que certa deliberação foi aprovada, não pode a realidade ser invertida por um presidente da mesa que decida em causa própria. A boa-fé e a lealdade societária a tanto se opõem.

aa. Parece-nos claro que o procedimento cautelar deve naufragar.

Tendo o presidente abandonado a assembleia, temos o equivalente a uma não-comparência, que foi devidamente colmatada. Não se verifica nenhuma irregularidade nem, muito menos, uma nulidade do depois decidido, com quorum constitutivo e deliberativo.

bb. A inscrição comercial subsequente é válida.

cc. Ao abandonar a assembleia, o presidente desconsiderou os seus deveres funcionais. Os cargos devem ser exercidos, nos bons e nos (subjetivamente) maus momentos. Não pode, depois, prevalecer-se do ilícito próprio para impugnar deliberações. Há um tu quoque, pacificamente sindicado pelos nossos tribunais como abuso do direito. Além disso, sempre se verificaria o desvio de função, em nova hipótese abusiva, já apontada.

dd. Relativamente à assembleia de 16 de Junho de 2015: o artigo 386º/3, na sua letra como no seu espírito, é imperativo. A maioria de 2/3 é necessária e suficiente para alterar estatutos. E quando resulte da própria ata que essa maioria foi alcançada, a deliberação é adotada. Não pode um presidente da mesa, em conflito pessoal de interesses, proclamar validamente o contrário.

ee. Os autos não permitem caracterizar o periculum in mora. Não houve factos provados nesse sentido. Pelo contrário: o bloqueio da sociedade representaria um prejuízo para a sociedade muito maior do que as deliberações sociais questionadas poderiam jamais acarretar para o requerente. Por qualquer destas vias, não se demonstram os requisitos da suspensão requerida

ff. Entendeu o Tribunal e na nossa opinião bem, que da análise de toda a prova produzida e tendo em conta os pressupostos para ser decretada a providência cautelar de suspensão de deliberações sociais, os mesmos não se encontram preenchidos, tendo necessariamente que ser julgada improcedente com todas as legais consequências.

gg. O procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais, procedimento nominado e previsto no artº 380º CPC, assenta na verificação cumulativa dos seguintes requisitos:

- Ser o requerente sócio da sociedade que tomou deliberação;

- ser essa deliberação contrária à lei ou ao pacto social7

- e resultar da sua execução dano apreciável

hh. Os pressupostos estatuídos no preceito mencionado não se encontram preenchidos, devendo por isso manter-se a sentença recorrida, a qual se acolhe.

ii. Deve a sentença recorrida ser confirmada e manter-se inalterada.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve o recurso interposto pelo recorrente ser julgado improcedente, e ser a sentença recorrida confirmada, Só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!

Juntou Parecer elaborado pelo Professor Doutor António Menezes Cordeiro, em que se conclui, em resumo que: “Chegados a este ponto, parece-nos claro que o procedimento cautelar deve naufragar. Tendo o presidente abandonado a assembleia, temos o equivalente a uma não-comparência, que foi devidamente colmatada. Não se verifica nenhuma irregularidade nem, muito menos, uma nulidade do depois decidido, com quorum constitutivo e deliberativo. A inscrição comercial subsequente é válida.

Relativamente à Assembleia de 16 de Junho de 2015: o artigo 386.º/3, na sua letra como no seu espírito, é imperativo. A maioria de 2/3 é necessária e suficiente para alterar os estatutos. E quando resulte da própria ata que essa maioria foi alcançada, a deliberação é adotada. Não pode um presidente da mesa, em conflito pessoal de interesses, proclamar validamente o contrário”.

Dispensados os vistos legais, há que decidir.          

Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 635, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do NCPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir:

A. Se as deliberações aprovadas na assembleia geral anual da requerida, de 26 de Junho de 2015, são nulas, nos termos e para os efeitos do artigo 56.º, n.º 1, al. a), do CSC; ou assim não sendo, passíveis de declaração de anulabilidade, nos termos do disposto no artigo 58.º, n.º 1, al. a), do CSC;

B. Se as referidas deliberações causam danos quer à sociedade requerida, quer ao requerente, na qualidade de seu sócio e;

C. Se a actuação do requerente para com a requerida configura “abuso de minoria”.

É a seguinte a matéria de facto dada por indiciariamente provada na decisão recorrida:

1º A Requerida é uma sociedade anónima constituída em 1969, com o capital social de 1.000.000,00€ (um milhão de euros) e que se tem dedicado essencialmente à actividade de extracção de argilas, areias, caulinos e outros inertes.

2º A sociedade Requerida tem um Conselho de Administração composto por três membros, sendo tais cargos ocupados, actualmente, pelos accionistas C... , D... e E... .

3º Estes membros ainda se mantém em funções, tendo um dos Mandatos dos membros do CA terminado a 31 de Dezembro de 2014.

4º O Requerente ocupa o cargo de Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Requerida e é secretariado pelo Ilustre Advogado - Dr. F... .

5º A Requerida tem como fiscal único a sociedade “ G... , SROC” representada pelo Dr. H... .

6º No passado dia 29 de Junho, realizou-se a assembleia geral anual da Requerida, com a seguinte ordem de trabalhos:

Ponto Um: Deliberar sobre relatório de gestão e as contas do exercício;

Ponto Dois: Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados;

Ponto Três: Apreciação geral da administração e da fiscalização da Sociedade;

Ponto Quatro: Eleger os órgãos sociais para o triénio 2015 a 2017.

7º Na sequência desta Assembleia Geral foram tomadas deliberações.

8º O Requerente é titular de 59.950 acções no valor de 5,00 € (cinco euros) cada, o que perfaz uma participação no valor nominal de € 299.750,00 que corresponde a 29,98% do capital social da Requerida.

9º O remanescente da participação social da Requerida (cerca de 70% do capital social) pertence aos accionistas C... , D... e E... , Presidente e Vogais, respectivamente, do Conselho de Administração da Requerida.

10º No passado dia 18 de Março de 2015, os accionistas e membros do CA – C... e D... – enviaram ao Requerente, na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia Geral, uma carta a solicitar a convocatória de uma Assembleia Geral Extraordinária, cuja ordem de trabalhos incluía a alteração a artigos do pacto social conforme documento de fls.47 a 49.

11º A convocatória foi publicada e a AG extraordinária veio a realizar-se no dia 16 de Junho de 2015 (cfr. acta nº 89 se encontra junta a fls.50 a 55 e cujo teor se dá por reproduzido).

12º Dispõe o pacto social da Requerida, no seu artigo 11º, que “As deliberações sociais são tomadas por maioria superior a setenta e cinco por cento de votos favoráveis correspondentes à totalidade do capital”.

13º O referido artigo era um dos que se pretendia fosse alterado, por forma a que as deliberações dos accionistas fossem tomadas pela maioria dos votos emitidos.

14º Os accionistas C... e D... têm, em conjunto, a referida maioria.

15º Conforme se pode extrair do teor da acta da AG do dia 16 de Junho 70% dos votos correspondentes à totalidade do capital social votaram favoravelmente.

16º Na referida Assembleia teve a proposta de alteração ao pacto social o voto contra do Requerente que é detentor de 29.98% dos votos, tendo sido, além do mais, ficado exarado em acta: “por conseguinte pelo sr. Presidente foi considerada reprovada a proposta de deliberação” e “Em conclusão e pelos fundamentos referidos pelo Sr. Presidente, deve a proposta de alteração do pacto social ser rejeitada.

Pelo Sr. Presidente foi dada a palavra aos accionistas D... e E... , os quais referiram corroborar a posição supra assumida pelo accionista C... , no sentido de a alteração dos estatutos ser aprovada.

Nada mais havendo a tratar, o Presidente da Mesa da presente Assembleia Geral, Sr. A... , deu por encerrada a sessão, às nove horas e quarenta minutos, da qual se lavrou a presente acta, que depois de lida vai por ele ser assinada e por mim que a subscrevi”.

17º O Requerente tomou conhecimento de que havia sido registada, na Conservatória do Registo Comercial de Leiria, a alteração ao pacto social promovida pelos accionistas e administradores C... , D... e E... e procedeu ao pedido de rectificação do mesmo.

18º O processo especial de rectificação do registo, intentado pelo Requerente, corre os seus termos na Conservatória do Registo Comercial de Leiria, e está averbado na certidão permanente da Requerida – Av. 1 AP. 1/20150629 - PROCESSO ESPECIAL DE RECTIFICAÇÃO.

19º Foram tomadas na Assembleia Geral Anual de 29 de Junho de 2015, deliberações, a saber:

- Deliberar sobre o relatório de gestão e as contas do exercício;

- Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados;

- Deliberação sobre a apreciação geral da administração e da fiscalização da Sociedade;

- Deliberação sobre a eleição dos órgãos sociais para o triénio 2015 a 2017.

20º A Assembleia Geral Anual da sociedade teve lugar no dia 29 de Junho de 2015, com inicio pelas 8.30h.

21º Neste mesmo dia, o Requerente – através dos seus mandatários – dirigiram-se à CRComercial de Leiria por forma a reclamar do registo lavrado da acta de 18 de Março, através do qual foi dada publicidade à alteração dos estatutos.

22º Pelo menos, aludindo que a questão do registo da acta anterior estava naquele preciso instante a ser discutida na Conservatória do Registo Comercial de Leiria a questão do registo da acta anterior estava naquele preciso instante a ser discutida na Conservatória do Registo Comercial de Leiria, o presidente da mesa da AG e aqui Requerente declarou a suspensão da mesma por um período de uma hora.

23º Após ter decorrido uma hora, voltou a reunir a AG.

24º Pelo presidente da mesa da AG foi declarada nova suspensão dos trabalhos até às 15 horas, altura em que os trabalhos deveriam ser retomados e em que seria expectável a resolução da situação.

25º Os accionistas C... , D... e E... não aceitaram esta decisão do Presidente da Mesa e informaram que iriam prosseguir com os trabalhos, tendo ficado exarado em acta nº 90 e que se encontra junta a fls.67 a 73 e que se considera reproduzida, além do mais, “neste momento pelo Sr. Presidente da Mesa foi dito que não assume a continuação da direcção dos trabalhos desta Assembleia, indo ausentar-se do local, pelo que neste momento pelas 11.40 horas encerra a Assembleia quanto aos trabalhos por si dirigidos.

Pelo representante do accionista A... e por discordância total e por considerar um desrespeito às funções do presidente da Mesa da Assembleia Geral, embora podendo fazer a assinatura da lista de presenças, recusa-se a fazê-lo devendo a sociedade, nos termos do artº 63º/3 do Código das Sociedades Comerciais notificar judicialmente o accionista para que no prazo inferior a oito dias a assine, sem prejuízo do direito de que, a não assinando, invocar em juízo a falsidade da acta.

Pedida a palavra pela representante do accionista C... , a mesma disse que tal situação não se aplicará para a assinatura da acta da Assembleia, uma vez que a mesma é para ser assinada pelo secretário e pelo presidente da Mesa da Assembleia Geral e não por todos os accionistas.

Neste momento pelas 11.40 horas, o Presidente da Mesa da presente Assembleia Geral, Sr. A... , depois de lida a acta até este momento, vai por ele ser assinada e por mim que subscrevi”.

26º Chegou ao conhecimento do Requerente que, após ter “dito que não assume a continuação da direcção dos trabalhos desta Assembleia, indo ausentar-se do local, pelo que neste momento pelas 11.40 horas encerra a Assembleia quanto aos trabalhos por si  dirigidos”, os accionistas C... , D... e E... terão levado a cabo reunião de Assembleia Geral.

27º Foi levado ao registo a alteração ao pacto social e foram aprovadas as contas e nomeados novos órgãos sociais.

28º Pela Certificação Legal das Contas relativas ao ano de 2014, elaborada pelo Fiscal Único, constata-se que a mesma contém quatro reservas, sendo a mesma do seguinte teor:

“(…)

1. Examinamos as demonstrações financeiras de B... , S.A., as quais compreendem o Balanço em 31 de Dezembro de 2014, que evidencia um total de 24.162.142,35 euros e um total de capital próprio de 51.791.272,32 euros, incluindo um resultado liquido de 30.119,95, a Demonstração dos resultados por naturezas, a Demonstração das alterações no capital próprio e a Demonstração dos fluxos de caixa do exercício findo naquela data, e o correspondente Anexo.

Responsabilidades

2-É da responsabilidade da Administração a preparação de demonstrações financeiras que apresentem de forma verdadeira e apropriada a posição financeira da Empresa, o resultado das suas operações e os fluxos de caixa, bem como a adoção de politicas e critérios contabilísticos adequados e a manutenção de um sistema de controlo interno apropriado.

3. A nossa responsabilidade consiste em expressar uma opinião profissional e independente, baseada no nosso exame daquelas demonstrações financeiras.

Âmbito

4. exceto quanto à limitação descrita no parágrafo nº 7 abaixo, o exame a que procedemos foi efectuado de acordo com as Normas Técnicas e as Diretrizes de Revisão/Auditoria da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, as quais exigem que o mesmo seja planeado e executado com o objectivo de obter um grau de segurança aceitável sobre se as demonstrações financeiras estão isentas de distorções materialmente relevantes. Para tanto o referido exame inclui:

- a verificação, num base de amostragem, do suporte das quantias e divulgações+ constantes das demonstrações financeiras e a avaliação das estimativas, baseadas em juízos e critérios definidos pela Administração, utilizadas na sua preparação;

- a apreciação sobre se são adequadas as politicas contabilísticas adotadas e a sua divulgação, tendo as circunstâncias;

- a verificação da aplicabilidade do principio da continuidade; e

5. O nosso exame abrangeu também a verificação da concordância da informação financeira constante do relatório de gestão com as demonstrações financeiras.

6. Entendemos que o exame efectuado proporciona uma base aceitável para a expressão da nossa opinião.

Reservas

7. Está incluída nos ativos fixos tangíveis a quantia de 1.050,3 milhares de euros resultantes de aquisições de imóveis por escrituras de justificação. Não existe suporte que fundamente as quantias atribuídas aos vários imóveis e à escrituração dos mesmos.

8. Em participações financeiras-método de equivalência patrimonial constam 3.846,0 milhões de euros, não tendo sido aquela quantia ajustada em 431 milhares euros resultantes das reservas constantes da certificação legal das contas das suas subsidiárias Q... , S.A. e S... , S.A. Em consequência, o ativo e o capital próprio estão sobreavaliados em 431 milhares milhares de euros.

9. As rúbricas de Clientes e Outras Contas a Receber incluem as quantias de 201,7 milhares de euros e 1.156,9 milhões de euros, repetivamente, com elevado risco de cobrança, não estando reconhecidas as imparidades correspondentes. Em consequência, o ativo e o capital próprio estão sobreavaliados na quantia de 1.358,6 milhares de euros

10.A rubrica Diferimentos constante do ativo do Balanço inclui 349,9 milhares de euros que não satisfazem os requisitos para serem reconhecidos como ativos. O seu desreconhecimento faz com que o ativo e o capital próprio estejam sobreavaliados em 349,9 milhares de euros, estando o resultado do período, antes de impostos, sobreavaliados em 174,3 milhares de euros.

Opinião

11. Em nossa opinião, exceto quanto ao efeito do ajustamente que poderia revelar-se necessário, caso não existisse a limitação descrita no parágrafo nº 7 acima e quanto aos efeitos das situações descritas nos parágrafos nº 8 a nº 10 acima, as referidas demonstrações financeiras apresentam de forma verdadeira e apropriada, em todos os aspectos materialmente relevantes, a posição financeira de B... , S.A., em 31 de Dezembro de 2014, o resultado das suas operações e os fluxos de caixa no exercício findo naquela data, em conformidade com os princípios contabilísticos geralmente aceites em Portugal.

Relato sobre outros requisitos legais

12. É também nossa opinião que a informação constante do relatório de gestão é concordante com as demonstrações financeiras do exercício.

(…).”

29º Conforme consta do balanço da empresa, as dívidas ao Estado da Requerida aumentaram de 2013 para 2014, no montante de € 350.000,00, perfazendo o montante global de € 921.000,00 a 31/12/2014.

30º A requerida tem valor de IVA em dívida.

31º O Requerente é o único accionista que não integra o CA.

32º Pelo menos, através da certidão permanente da sociedade Requerida, o Requerente tomou conhecimento que foram nomeados novos órgãos sociais e resulta do respectivo registo que se encontra pendente até decisão do Processo Especial de Retificação que ainda se encontra em curso na CRC de Leiria.

33º O Requerente fez parte do Conselho de Administração da Requerida desde o ano de 2003 até 16/09/2012, data em que renunciou ao referido cargo, sendo que a sua assinatura era obrigatória para vincular a sociedade.

34º Por razões de ordem profissional, o Requerente renunciou ao cargo de Vogal do CA, sugerindo – para sua substituição – como vogal do CA: Eng. J... , que veio a exercer o cargo entre 17/09/2012 e 22/01/2013; Dr. K..., que veio a exercer o cargo desde 28/01/2013 até, pelo menos, 06/08/2014.

35º O administrador K... (administrador indicado pelo Requerente) renunciou. 36º O Requerente foi interpelado por fornecedores e, pelo menos, o BANIF relativamente ao pagamento de dívidas da Requerida.

37º O Requerente, ao longo dos anos, prestou garantias pessoais para assegurar o bom e integral cumprimento dos empréstimos contraídos pela Requerida.

38º O Requerente esteve em incumprimento perante o Banco de Portugal, por obrigações vencidas junto do banco BANIF.

39º O Requerente solicitou à Requerida informações.

40º O Requerente intentou um processo especial de inquérito judicial à sociedade, nos termos dos artigos 292º do CSC e artigos 1048º e seguintes do CPC, que corre os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, 1ª Secção de Comércio – J3, Instância Central – Leiria, Processo nº 1617/15.4T8LRA,

41º O Requerente, pelo menos, foi Presidente da Mesa da AG da Requerida.

42º Na AG anual realizada no passado dia 29 de Junho, os restantes accionistas procederam à eleição de novo Presidente da Mesa.

43º Enquanto Presidente da Mesa da AG, o Requerente tinha um papel activo nas assembleias gerais.

44º O autor é titular de 59.950 (cinquenta e nove mil, novecentas e cinquenta) acções, a que corresponde o valor nominal de 299.750,00€, equivalente a 29,975% do capital social.

45º O accionista C... é titular de 69.900 acções, a que corresponde o valor nominal de 349.500,00€ (34,95%) e o accionista D... é titular de 70.000 acções a que corresponde o valor de 350.000,00€ (35%).

46º Para além destes três accionistas é ainda acionista E... , sendo titular de 100 acções, a que corresponde o valor nominal de 500,00€ (0,05%) e o accionista I... que é titular de 50 acções, a que corresponde o valor nominal de 250,00€ (0,025%).

47º No âmbito de uma sociedade comercial e no caso anónima, o Presidente da Mesa da Assembleia, tem o poder/dever de condução dos trabalhos da Mesa.

48º A maioria dos accionistas presentes na Assembleia do dia 16/06/2015, com votos correspondente a 70% do capital social da Requerida, votaram a alteração dos estatutos da sociedade.

49º O Requerente, enquanto Presidente da Mesa da Assembleia da sociedade, por Convocatória de Assembleia Geral, datada de 27 de Abril de 2015 e publicada no Portal do Ministério da Justiça – Publicação On-Line de Acto Societário em 28 de Abril de 2015, procedeu à convocação de todos os accionistas da B... , S.A. para se reunirem em Assembleia Geral Extraordinária, com um único Ponto da Ordem de Trabalhos, que tinha por objecto “deliberar sobre a alteração aos artigos 5º, nº 1, 11º, 12º, nº 3 e 15º, nº 1alinea a) do Pacto Social”, tudo conforme Convocatória da Assembleia Geral junta como doc. 2 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzida.

50º Tal reunião de accionistas, conforme resulta da Convocatória, foi marcada para o dia 29 de Maio de 2015, pelas 8.30 horas, tendo ficado marcada uma segunda data para o dia 16 de Junho de 2015, pelas 8.30 horas, no mesmo local e com a mesma ordem de trabalhos.

51º Chegados ao dia 29 de Maio de 2015, pelas 8.30 horas, não foi possível reunir os accionistas em Assembleia na primeira data, por nenhum ter comparecido no local indicado pela Convocatória apenas se encontrando no local o Secretário e o representante do Fiscal Único da Sociedade, Dr. H... .

52º Não tendo igualmente comparecido à hora marcada o Requerente, Presidente da Mesa da Assembleia e accionista A... , foi, na sua ausência, a sua substituição pelo representante do Fiscal Único G... , SROC, Dr. H... , o qual, por se encontrar presente, presidiu à Assembleia-geral Extraordinária, aceitando desempenhar o cargo, na Assembleia.

53º Na convocatória da Assembleia, no seu ponto 4, foi fixada uma segunda data para a realização da mesma, esta realizou-se na segunda data designada, dia 16 de Junho de 2015, pelas 08:30, no mesmo local e com a mesma ordem de trabalhos, tudo conforme acta nº 88 de 29 de Maio de 2015, a qual se encontra junta como documento nº 3 da contestação e se dá por inteiramente reproduzida.

54º A acta nº 89 foi apresentada a registo em 16/06/2015, respeitante à Assembleia de accionistas, realizada na segunda data, constante da aludida Convocatória.

55º Da acta nº 89 de 16/06/2015 resulta que os quatro itens do ponto único da ordem de trabalhos mereceram os votos favoráveis dos accionistas D... , E... e C... , representado pela Drª N... e o voto desfavorável do accionista A... representado pelo Dr. P... .

56º A acta levada a registo foi da assembleia ocorrida na segunda data designada - 16/06/2015.

57º Os presentes na assembleia representam 99,975% (noventa e nove virgula novecentos e setenta e cinco por cento) do capital social.

58º O registo da acta que deliberou a alteração dos estatutos da Requerida foi aceite e registado sem reservas, conforme consta da certidão da sociedade, sendo que até ao dia de hoje não foi o mesmo sujeito a qualquer alteração junto da respectiva Conservatória do Registo Comercial.

59º A Requerida não tem conhecimento que o Requerente tenha impugnado a Acta da Assembleia de alteração dos Estatutos datada de 16-06- 2015, tendo solicitado junto da Conservatória do Registo Comercial para que esta se pronunciasse sobre a rectificação do Registo.

60º A aludida acta está assinada pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral em funções e pelo Secretário.

59º Estando o seu conteúdo e as deliberações tomadas apresentados a registo em 16/06/2015.

60º A Assembleia Geral do dia 29/06/2015 foi suspensa, conforme consta da acta nº90.

62º Como é relatado na acta nº 90 de 29 de Junho de 2015, o Requerente, pretendeu fazer uma nova suspensão, face aos motivos invocados, para as 15.00 horas desse dia.

63º Não consta que a proposta de suspensão tenha sido votada favoravelmente pelos accionistas C... , D... e E... que representando cerca de 70% dos votos emitidos.

64º O Requerente não apresentou uma lista de elementos que compusessem os órgãos sociais, a ser apreciada e votada pela Assembleia.

65º O Requerente quando saiu da reunião exigiu que a acta fosse por si assinada, sabendo que os restantes acionistas não aprovaram a suspensão dos trabalhos e manifestaram a intenção de os continuar.

66º Os administradores C... e D... , são administradores da Requerida há mais de 20 anos, Presidente e Vogal do Conselho de Administração, respectivamente, sempre com a anuência do Requerente.

67º O requerente contactou os Bancos com que a Requerida trabalha, bem como fornecedores desta, nomeadamente de combustíveis, criando-lhes um alarmismo e insegurança, no sentido de que a Requerida "não tem futuro"; "está na eminência de fechar"; "não tendo sequer administração".

68º Sempre o Requerente teve pleno conhecimento de todas as movimentações financeiras da Requerida e das suas dificuldades nos últimos anos, dada a crise económica geral, uma vez que são saldos que remontam de há anos, tendo aquele e os restantes accionistas aprovado por unanimidade as contas da sociedade ao longo dos últimos anos, com todos os movimentos certificados pelo Fiscal Único da sociedade e nas diversas certificações legais de contas emitidas ao longo de vários anos, conforme actas das assembleias que se encontram juntas com a contestação como documentos nºs 5 e 6.

69º Tais saldos e endividamento tiveram a intervenção do Requerente, dado que era necessária a assinatura obrigatória do mesmo ou do seu filho Engº J... ou do administrador por si indicado, K... .

70º Em todas as certificações de contas, encontram-se aquelas demonstrações financeiras.

71º Nunca foram emitidas quaisquer reservas relativamente a estes movimentos financeiros, sendo estes do conhecimento directo do Requerente.

72º Pelo menos, na certificação legal das contas de 2013, existe uma reserva também existente em 2014, que se refere ao facto de haver dívidas a receber de cobrança duvidosa para as quais não existe reconhecida qualquer imparidade.

73º As contas de 2013 foram preparadas e assinadas por todos os administradores, incluindo o Dr. K... , administrador designado em representação do Requerente A... e a quem prestava toda a informação e consentimento nas decisões que tomava, conforme documento nº 7 junto com a contestação e se dá por inteiramente reproduzido.

74º Em Junho de 2014, na Assembleia Geral, esteve presente o Requerente e o Administrador K... , assembleia essa na qual foram apresentadas as contas e o relatório de gestão do exercício, os quais foram aprovados, tendo ambos conhecimento e pedidos os esclarecimentos ao ROC presente, o qual prestou todos os esclarecimentos pretendidos pelo Requerente.

75º A dívida para com o Banco Banif está reestruturada e regularizada, não estando em incumprimento.

76º A empresa não tem dívidas ao Estado em situação de mora, pois existem acordos para pagamento em prestações que estão a ser cumpridos, e em especial, no que se refere ao IVA e à data da prestação de contas, toda a dívida foi objeto de acordo de pagamento em prestações ao Estado.

77º Na presente data está a ser cumprido pela Requerida um plano prestacional, para pagamento integral de todos os valores existentes em execução fiscal, tendo a sua situação fiscal regularizada.

78º Quanto à dívida para com a Segurança Social está em curso o cumprimento de um plano prestacional consolidado, tendo a sua situação contributiva regularizada.

79º O registo da deliberação encontra-se provisório nos termos do artº 64º, nº 2, al. b) do Código do Registo Comercial, conforme consta da certidão comercial da Requerida.

80º O Presidente do Conselho de Administração C... e o Vogal D... , desempenham os seus cargos, enquanto tal, há mais de 20 anos, sendo reconhecidos, nomeadamente, junto da banca, fornecedores, clientes e funcionários, como os gestores de facto e diariamente presentes, da Requerida e reconhecidos como interlocutores negociais da Requerida, seja para que assunto for.

81º Verifica-se uma diminuição da actividade de obras públicas, construção civil e indústria cerâmica desde a crise económica iniciada em 2007, actividade essa que sempre foi o foco principal da actividade desenvolvida pela Requerida.

82º A requerida tem aumentado os lucros e reduzido o passivo daquela, conforme resulta do Balancete a 31 de Maio de 2015.

83º Na presente data a Requerida não é Ré ou executada em quaisquer processos, estando regularizados, com excepção de um processo de natureza laboral, contestado, aguardando a realização do respectivo julgamento.

84º A requerida tem cerca de 120 funcionários da Requerida.

85º O administrador K... até se afastar da requerida, teve sempre acesso a todos os elementos contabilísticos da sociedade B... , S.A., e sempre que este solicitava esclarecimentos ou informações, as mesmas eram-lhe prestadas, nomeadamente pelo seu director financeiro, Dr. W....

86º Este administrador apresentou a sua renúncia ao cargo por motivos pessoais, pois foi-lhe apresentado um projecto na Africa do Sul, para o qual foi convidado a desenvolver, o que ele aceitou, tendo-se deslocado para aquele país em Setembro de 2014.

87º A renúncia do administrador K... foi comunicada em 06 de Agosto de 2014 e produziu efeitos em 01/10/2014.

88º O requerente já não presta garantias pessoais à requerida há tempo não concretamente apurado.

89º A requerida apresentou juntamente com os restantes réus, a sua contestação aos autos de inquérito judicial, requerido pelo ora Requerente.

90º O requerente foi durante anos administrador, tendo informação privilegiada sobre, designadamente inventário, qualidade das matérias primas, stocks, preços de venda, reservas e tem a gestão de facto de outras empresas como é o caso da I... , S.A., L... , SA, O... , S.A. e ultimamente a M... , Lda.

91º As empresas elencadas são concorrentes no mercado da Requerida, só que dada a qualidade comum do Requerente, enquanto administrador das várias sociedades, a Requerida no relacionamento com estas entidades, funcionava essencialmente, mas não só, como fornecedora.

92º O requerente, enquanto Presidente da Comissão Executiva e Vice- Presidente do Conselho de Administração da sociedade comercial I... , S.A. (ADM), deu indicações à tesouraria desta sociedade e comunicou ao director financeiro da Requerida, que não faria mais qualquer pagamento, respeitante à conta de fornecimento de matérias primas que ascendia a montante não concretamente apurado.

93º A Requerente cessou, no último trimestre do ano de 2014, os fornecimentos àquela empresa, tendo passado a fazer fornecimentos a concorrentes daquela sociedade, com benefícios no preço de venda da mercadoria.

94º As informações solicitadas pelo Requerente na sua missiva de 02-02-2015, enquanto acionista, foram-lhe prestadas nos termos da missiva de 02/03/2015, conforme documento nº 14 que se encontra junto com a contestação e que se considera reproduzida.

95º Na segunda missiva enviada ao Requerente foi, além do mais, exarado que:

“1- Como é do vosso conhecimento, o v/ constituinte A... , é administrador/accionista de várias empresas, nas quais quer ele, quer a esposa, quer familiares directos ou outros em relação de dependência directa exercem cargos de administração e gestão de facto e de direito em empresas que estão em manifesta e declarada concorrência comercial e operacional com a minha constituinte, como é o caso a titulo meramente exemplificativo das sociedades comerciais I... , S.A., L... , S.A., O... , S.A. e M... (caso em que a gestão é de facto exercida pelo seu constituinte).

3- Esta situação de concorrência directa, tem implicado a abordagem de clientes da B... , por parte daquelas empresas, quer a clientes das matérias primas comercializadas pela B... , quer a elementos do quadro de recursos humanos da mesma, com a contratação de alguns deles,

6- Quanto á informação solicitada das empresas participadas da B... , S.A, pertence tal direito aos respectivos accionistas, os quais, quando devidamente legitimados, enquanto accionistas ou sócios, o devem requerer por solicitação dirigida aos respectivos órgãos de gestão das empresas em causa”;

96º A Requerida tem conhecimento que o Requerente foi, pelo menos, “oferecer” areia a preços mais baixos às empresas Unibetão e Pavibetão, empresas estas que também são clientes da Requerida, o que a obrigou a novamente alterar as suas condições comerciais junto daqueles clientes.

*

Não se provou, designadamente:

- Que o objectivo dos accionistas C... , D... e E... , ao procederem ao registo da alteração ao pacto social, fosse justamente poderem, conjuntamente e sem a anuência do Requerente, aprovar contas e nomear novos órgãos sociais.

- Que os três accionistas supra referidos tenham procedido ao pedido de convocatória de AG Extraordinária tendo como objecto a alteração ao pacto social e não aguardaram assim pela AG Anual para alterar o pacto social, uma vez que o seu objectivo era, justamente, lograr registar tal alteração e, com base na mesma, proceder à aprovação de contas e proceder à eleição de novos membros dos órgãos sociais, sem que o voto do Requerente pudesse interferir em tal nomeação.

- Que os três accionistas se encontram conluiados, visando a sua conduta manter o Requerente afastado da vida da Sociedade.

- Que o requerente queira com os presentes autos conseguir o que não tem conseguido nos últimos dez meses, que é controlar a Requerida em seu exclusivo proveito pessoal, ou das empresas por si controladas, directamente ou através de familiares ou pessoas próximas.

- Que o que o requerente pretenda é que a requerida entre em rotura económico-financeira, de foram a afastá-la do mercado, onde aquele desenvolve a sua actividade através de empresas por si controladas.

A. Se as deliberações aprovadas na assembleia geral anual da requerida, de 26 de Junho de 2015, são nulas, nos termos e para os efeitos do artigo 56.º, n.º 1, al. a), do CSC; ou assim não sendo, passíveis de declaração de anulabilidade, nos termos do disposto no artigo 58.º, n.º 1, al. a), do CSC.

Como resulta do relatório que antecede, o recorrente defende a nulidade das deliberações em causa, com o fundamento em as mesmas, por um lado, terem resultado de deliberações tomadas já depois de encerrada a assembleia pelo presidente da assembleia geral (no caso, o próprio o recorrente), equivalendo a assembleia não convocada, uma vez que a regular e legalmente convocada pelo presidente, já estava, validamente encerrada e, por outro, porque não foram aprovadas pela maioria estatutariamente prevista, uma vez que, segundo o artigo 11.º dos estatutos da requerida, a alteração do pacto social careceria de aprovação de 75% por centos dos votos, o que não se verificou, dado que o ora recorrente votou contra e ele, sozinho, detém 29.98% dos votos.

Do que, para além do mais, decorre que não foi aprovada a pretendida alteração do artigo 11.º dos estatutos da requerida, na assembleia geral extraordinária, de 16 de Junho de 2015, pelo que se mantém a exigência de que a alteração dos estatutos fosse aprovada por 75% dos votos, o que tem como consequência que as deliberações tomadas/aprovadas na assembleia de 29 de Junho de 2015, não foram aprovadas por falta de quorum deliberativo (75% dos votos e não 2/3 ou a maioria dos votos emitidos).

Por seu lado, a requerida, defende que da assembleia de 16 de Junho, resulta a aprovação da alteração dos estatutos, designadamente do seu artigo 11.º, pelo que deixou de ser exigida a maioria de 75% dos votos para a alteração dos estatutos, dado que tal alteração estatutária foi aprovada por mais de 2/3 dos votos, não podendo o presidente da mesa da assembleia geral, proclamar que assim não era.

Defendendo que o artigo 396.º, n.º 3 do CSC (Código das Sociedades Comerciais, doravante designado de CSC), é imperativo, tanto na sua letra, como no seu espírito, no sentido de ser necessário e suficiente a maioria de 2/3 para alterar estatutos.

Assim sendo, quando se procedeu à assembleia de 29 de Junho de 2015, já não se exigia que as deliberações fossem aprovadas por 75% dos votos e tendo as mesmas sido aprovadas por mais de dois terços dos votos emitidos, são válidas, nos termos dos estatutos, então, em vigor.

Ainda relativamente à assembleia geral de 29 de Junho de 2015, defende a recorrida que o recorrente, na qualidade de presidente da mesa da assembleia geral, não podia nem declarar a suspensão dos trabalhos nos termos em que o fez, dado que, nos termos do disposto no artigo 387.º, n.º 1, do CSC, apenas lhe é permitido declarar “suspensões normais” e muito menos, declarar encerrada a referida assembleia e abandonar a mesa, como fez, o que, na sua perspectiva, equivale a uma situação de não comparência, devendo, neste caso, aplicar-se o disposto no artigo 374.º, n.º 3, do CSC, nomeando-se um presidente ad hoc, assim continuando a assembleia, como foi feito, pelo que nada afecta a regularidade/legalidade das deliberações que, nestes moldes, vieram a ser aprovadas por todos os demais sócios, com excepção do ora recorrente.

Na sentença recorrida, considerou-se que, ao invés do proclamado pelo respectivo presidente, na assembleia de 16 de Junho de 2015, se deve considerar aprovada a alteração dos estatutos, dado que a referida alteração apenas teve o voto contra do requerente, que detém 29.98% dos votos, nos seguintes termos:

“A acta nº 89 foi apresentada a registo em 16/06/2015, respeitante à Assembleia de accionistas, realizada na segunda data.

Da acta nº 89 de 16/06/2015 resulta que os quatro itens do ponto único da ordem de trabalhos mereceram os votos favoráveis dos accionistas D... , E... e C... , representado pela Drª N... e o voto desfavorável do accionista A... representado pelo Dr. P... .

Atento o sentido da votação dos vários itens do ponto único da ordem de trabalhos, a invocação do artigo 11º do Pacto Social da sociedade para a não aprovação de todos os itens do ponto único da ordem de trabalhos, não é aplicável ao caso presente, dado que o mesmo viola normas imperativas do Código das Sociedades Comerciais, nomeadamente os nºs 3 e 4 do artº 386º do Código das Sociedades Comerciais.

Com efeito, estando em causa a alteração do pacto social da sociedade, nos termos previstos do artigo 383º, nº 2 do Código das Sociedades Comerciais, para aprovação de tal matéria basta, nos termos estabelecidos no artº 386º, nº 3 do Código das Sociedades Comerciais, obter votos favoráveis superiores a 2/3 dos votos emitidos e não a maioria em que eventualmente o contrato disponha diversamente, no caso com o mínimo de 75% dos votos, nos termos considerados no artº 11 do pacto há data da realização da Assembleia de 16/06/2015.

De facto, o legislador estabeleceu uma diferença de tratamento entre a forma de aprovação de assuntos genéricos da sociedade, o que faz por aplicação do artº 386º, nº 1 da aprovação de assuntos de natureza específica, como é o caso de alteração do contrato da sociedade, os quais faz plasmar, de forma taxativa, no nº 2 do artº 383º do Código das Sociedades Comerciais.

Assim entende-se que basta a aplicação do nº 3 do artº 386º do Código das Sociedades Comerciais para a aprovação da alteração do pacto social da sociedade, onde são exigidos 2/3 dos votos emitidos, o que, no caso em concreto se verifica, pois os itens do ponto único da ordem de trabalhos, foram aprovados com cerca de 70% dos votos emitidos, percentagem superior aos 66,66% que a lei exige.

Mas mesmo que assim não se entenda sempre se dirá que a alteração dos estatutos da sociedade estaria legitimada pelo nº 4 do artº 386º do Código das Sociedades Comerciais.

Com se referiu, a acta levada a registo foi da assembleia ocorrida na segunda data designada ou seja, 16/06/2015.

Nos termos do nº 4 (in fine) do artº 383º do Código das Sociedades Comerciais, “ao funcionamento da assembleia que reúna na segunda data fixada aplicam-se as regras relativas à assembleia da segunda convocação”, sendo que, nos termos do referido preceito do nº 4 do artº 386º do Código das Sociedades Comerciais, “se na assembleia reunida em segunda convocação, estiverem presentes accionistas detentores de pelo menos, metade do capital social, a deliberação… pode ser tomada pela maioria dos votos emitidos”.

Ora, estando presentes na assembleia 99,975% do capital social, com os votos favoráveis dos accionistas D... , E... e C... , considera-se aprovada a alteração dos Estatutos nos termos apresentados a registo.

Afigura-se-nos, assim, que não foi “deliberado reprovar”, pois o sentido de voto dos accionistas D... , E... e C... foi de aprovação, sendo que, salvo melhor, o Presidente da Assembleia não tem poderes legais ou estatutários para deliberar.

No que respeita ao registo efectuado por transcrição, e no qual o Requerente apresentou um Processo Especial de Rectificação de Registo, com fundamento principal na violação pela Conservadora do principio da legalidade, devendo, na sua alegação, ser recusado nos termos do nº 1, alínea b) do artº 48º do Código de Registo Comercial sempre se dirá que o registo da acta que deliberou a alteração dos estatutos da Requerida, foi aceite e registado sem reservas, conforme consta da certidão da sociedade até ao dia de hoje não foi o mesmo sujeito a qualquer alteração junto da respectiva Conservatória do Registo Comercial, sendo certo que não se conhece que o Requerente tenha impugnado a Acta da Assembleia de alteração dos Estatutos datada de 16-06-2015, tendo solicitado, sim, junto da Conservatória do Registo Comercial para que esta se pronunciasse sobre a rectificação do Registo, mas não sobre o conteúdo daquela acta levada a registo.

Assim, não tendo o Requerente impugnado a deliberação de 16-06-2015, aceitou o conteúdo da mesma, estando por tal motivo alterados os Estatutos da Requerida, pois, aquele para sustentar e obter a declaração de nulidade da Acta, sempre teria que impugnar o conteúdo da mesma, nos termos do artº 58º do Código das Sociedades Comerciais, efeito que, salvo melhor, não se obtém com o Processo Especial de Rectificação de Registo, apresentado junto da Conservatória do Registo Comercial de Leiria.

A deliberação tomada em 29 de Junho de 2015 não viola a lei, bem como não viola os Estatutos da Requerida, tendo sido validamente tomada.

Quanto à posição assumida pelo Requerente de que o anterior Pacto Social se encontra em vigor, sem as alterações da Assembleia Extraordinária do dia 16 de Junho de 2015, entendemos que tal entendimento não poderá proceder, dado que quando foi lavrada a acta das deliberações impugnadas nos presentes autos, a alteração estatutária da sociedade estava e está em vigor, pois o processo especial de rectificação do registo não tem efeitos suspensivos, nem é do conhecimento que a acta nº 89 de 16/06/2015 tenha sido judicialmente impugnada, no respectivo prazo legal, já decorrido, nem são a mesma e única acta.

Refira-se que a doutrina é unânime no sentido de que as assembleias para alteração de estatutos da sociedade devem ser feitas em momentos não coincidentes com a Assembleia Geral Ordinária anual, sendo que a apreciação e aprovação de contas, bem como a eleição de órgãos sociais, cujo mandato já terminou, são actos ordinários e como tal podem constar da mesma assembleia.

Por sua vez, a alteração de estatutos da sociedade deve ser objecto de uma assembleia geral extraordinária, especialmente convocada para o efeito.

Em face do que vem de se dizer, entende-se, salvo melhor, que a acta ora impugnada não viola a lei nem os estatutos da sociedade, respeitando a mesma o formalismo legal que lhe é exigido, estando assinada pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral em funções e pelo Secretário, nos termos do artº 388º do Código das Sociedades Comerciais, e encontrando-se o seu conteúdo e as deliberações tomadas de acordo com os Estatutos da sociedade em vigor apresentados a registo em 16/06/2015 e de acordo com os artºs 383º e 386º do Código das Sociedades Comerciais.”.

Conclui-se, pois, pela validade da deliberação tomada na assembleia de 16 de Junho de 2015, com a inerente alteração do artigo 11.º dos estatutos da requerida, com fundamento em violação do disposto no artigo 386, n.os 3 e 4 do CSC, que fixa que a alteração dos estatutos deve ser aprovada por 2/3 dos votos, não se podendo, por isso exigir, uma votação superior a 75% dos votos e, por maioria de razão, porque se tratou de deliberação em segunda convocação, caso em que, nos termos do artigo 386.º, n.º 4 do CSC, a lei se basta com a maioria dos votos emitidos.

Tendo a referida alteração sido aprovada pelos demais sócios, nas já indicadas percentagens, tem de se considerar aprovada a alteração dos estatutos, que o requerente não impugnou, pelo que, quando em 29 de Junho de 2015, se procedeu à assembleia geral anual da requerida, já não era exigida a aprovação das deliberações nela tomadas por 75% dos votos, em consequência do que as referidas deliberações estão conformes com os estatutos da requerida (versão aprovada em 15 de Junho de 2015) e com a lei, sendo, por isso, válidas.

Na sequência do que ora se deixou escrito, é bom de ver que assume fundamental importância a questão da alteração dos estatutos da requerida, que era o objecto da assembleia de 15 de Junho; isto é, desta questão decorre a validade/invalidade das deliberações tomadas na posterior assembleia de 29 de Junho.

Como facilmente se entende, a solução a dar a esta questão, passa, quase em exclusivo, pela posição que se tome relativamente ao que se considere como aprovado ou não aprovado na assembleia de 15 de Junho.

E, desde já adiantando a nossa posição, não pode considerar-se que na assembleia de 15 de Junho, se aprovou a pretendida alteração dos estatutos da requerida, designadamente do seu artigo 11.º.

Efectivamente, como resulta dos itens 11.º a 16.º dos factos dados por indiciariamente provados, foi requerida e veio a realizar-se uma assembleia geral extraordinária da requerida, a qual tinha como ordem de trabalhos a alteração de alguns artigos do pacto social da ora requerida, entre eles o 11.º que dispunha/dispõe o seguinte:

“As deliberações sociais são tomadas por maioria superior a setenta e cinco por cento de votos favoráveis correspondentes à totalidade do capital”.

Tinha-se em vista alterá-lo por forma a que: “as deliberações dos accionistas fossem tomadas pela maioria dos votos emitidos”.      

Como resulta dos itens 15.º e 16.º dos referidos factos, tal alteração teve 70% de votos a favor e 29.98% contra, em função do que, como aí consta, o presidente da assembleia exarou em acta que se “considerava reprovada a proposta de deliberação e deu a mesma como encerrada”.

Dispõe-se no artigo 386.º do CSC o seguinte:

“1. A assembleia geral delibera por maioria dos votos emitidos, seja qual for a percentagem do capital social nela representado, salvo disposição diversa da lei ou do contrato; as abstenções não são contadas.

(…)

3. A deliberação sobre algum dos assuntos referidos no n.º 2 do artigo 383.º deve ser aprovada por dois terços dos votos emitidos, quer a assembleia reúna em primeira quer em segunda convocação.

4. Se, na assembleia reunida em segunda convocação, estiverem presentes ou representados accionistas detentores de, pelo menos, metade do capital social, a deliberação sobre algum dos assuntos referidos no n.º 2 do artigo 383.º pode ser tomada pela maioria dos votos emitidos.”.

Um dos assuntos referido no n.º 2 do artigo 383.º do CSC é a alteração do contrato de sociedade.

Como refere Coutinho de Abreu, in Código Das Sociedades Comerciais Em Comentário, Almedina, Vol. VI, pág. 120 e seg.s, trata o artigo 383.º do CSC, do quórum constitutivo das assembleias gerais, valendo, como regra, o que se dispõe no seu n.º 1, que não exige tal quórum, valendo como excepções os casos em que, como no presente, se pretende a alteração do contrato de sociedade, hipótese em que, cf. seu n.º 2, se exige a presença de, pelo menos um terço dos accionistas.

De qualquer forma, como se ressalva na parte final do seu n.º 1, o contrato social, pode dispor diferentemente e com sobreposição sobre o que aqui, como regra, se acha estipulado – cf. autor e ob. cit., a pág. 120.

Por outro lado, cf. autor e ob. cit., pág. 141 e seg.s, no artigo 386.º do CSC, trata-se do que se designa como quórum deliberativo, ou seja, “número mínimo de votos a favor de uma proposta deliberativa exigido para que ela seja considerada aprovada”.

Neste âmbito e como resulta do n.º 1 do referido artigo 386, vale, releva, a regra da maioria simples dos votos emitidos.

Regra esta que contém várias excepções, desde logo a consagrada na parte final do seu n.º 1, que prevê a possibilidade de existência de “disposição diversa da lei ou do contrato”.

Daqui decorre, pois, que, desde logo, se o contrato (pacto social) dispuser de forma diversa, será esta a regra a considerar e não a prevista, de forma geral, na 1.ª parte do preceito em causa.

Ainda como excepções a esta regra, o que se prevê para a alteração do contrato de sociedade (deve ser aprovada por dois terços dos votos emitidos, quer em primeira quer em segunda convocação – cf. seu n.º 2) e admitindo-se a hipótese de em segunda convocação, poder ser tomada pela maioria dos votos emitidos.

No entanto, como já se aflorou, a regra geral (e excepções a ela nele previstas) contida no artigo 386.º do CSC, não tem carácter imperativo, mas sim dispositivo, pelo que, como já referido e o consagra a parte final do seu n.º 1, a mesma pode ser derrogada pela lei ou pelos estatutos da sociedade em causa.

Como refere Coutinho de Abreu, in ob. cit., pág. 145 “Relativamente à regra do n.º 1 do art. 386.º (maioria simples dos votos emitidos), ela pode em geral ser derrogada pelos estatutos exigindo maioria qualificada dos votos emitidos.

(…)

Também a maioria qualificada de dois terços dos votos emitidos prevista no n.º 3 do artigo 386.º pode ser aumentada nos estatutos. Tal como é possível reforçar estatutariamente a maioria prevista no n.º 4 do artigo 386.º.”.

Semelhante é a posição defendida por A. Menezes Cordeiro, in SA: Assembleia Geral E Deliberações Sociais, Almedina, 2009, a pág.s 111 e 112, quando ali refere que “Os estatutos podem, porém, fixar regras mais exigentes” e que “Nos estatutos das sociedades, particularmente nas de dimensão mais reduzida, requerem-se, por vezes, quóruns agravados.”.

Também Paulo Olavo Cunha, in Direito Das Sociedades Comerciais, 5.ª Edição, Almedina, a pág. 616, defende que até “um certo limite pode ser contratualmente, estabelecido um quorum agravado para poderem ser tomadas certas deliberações”, desde que não assumam um carácter de unanimidade, mas revistam uma natureza de maioria qualificada, concluindo que nas sociedades anónimas “o limite de 4/5 parece constituir um nível ainda aceitável”.

Por último (mas sem esgotar todas as referências doutrinárias neste sentido), refere Pinto Furtado, in Deliberações de Sociedades Comerciais, colecção teses, Almedina, a pág.s 207 e 208, que “A constante ressalva de contrária cláusula contratual revela prontamente o carácter de algum modo dispositivo de semelhantes exigências legais – mas acresce que, para as maiorias qualificadas, preceitua ainda o Código, nuns casos, que poderá o contrato de sociedade estipular um “número ainda mais elevado de votos” (…) noutros (…) que poderá o contrato reduzi-lo a mera maioria e noutros (…) limitação de votos.”.

Resulta, pois, do exposto que a norma ínsita no artigo 386.º do CSC não tem carácter imperativo, mas apenas dispositivo e, por isso, pode ser derrogada pelos estatutos da sociedade, como acima já referido.

Ora, referindo-se no artigo 11.º dos respectivos estatutos que a alteração destes só poderia ser aprovada por maioria superior a 75% de votos favoráveis correspondentes à totalidade do capital, sobrepõe-se esta disposição estatutária ao que se acha estabelecido no artigo 386.º do CSC, que reitera-se, só vale como regra geral, podendo ser derrogado por diversa (específica) disposição legal ou constante do pacto social.

Assim sendo, dado que na assembleia de 16 de Junho de 2015, a proposta de alteração do artigo 11.º dos estatutos da requerida, mereceu o voto contra do recorrente que, repete-se, detém 29.98 % dos votos, é patente que a mesma não foi aprovada, porque, de acordo com o artigo 11.º dos estatutos, para ser aprovada teria de ter mais de 75% de votos a favor, o que não se verificou.

E nem a tal obsta o facto de se tratar de assembleia reunida em segunda convocação e de, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 386.º do CSC, em tal caso, a deliberação poder ser tomada pela maioria dos votos emitidos.

Como acima já referido, as regras de formação de maiorias previstas no artigo 386.º do CSC, apenas constituem o regime regra, a que se sobrepõe o disposto nos estatutos e dispondo estes que é exigível uma maioria qualificada de 75%, não pode a mesma ser derrogada pelo que se dispõe no referido preceito.

Os sócios ao constituirem uma sociedade (dentro dos limites legais vigentes) têm o poder de conformar a regulação da vida societária de acordo com os estatutos que apresentam para tal, pelo que, não podem, posteriormente, sem que para tal exista uma convergência de vontades da maioria dos detentores do capital social, alterar os estatutos a seu bel prazer, tendo que se sujeitar, em primeira linha, ao que se achar disposto nos estatutos com vista à regulação concreta das várias facetas do desenvolvimento do escopo societário.

Em suma, contrariamente ao decidido em 1.ª instância, não temos por assente que a alteração dos estatutos apresentada e votada na assembleia de 16 de Junho de 2015, foi aprovada.

Ao invés, por falta de quorum deliberativo, impõe-se, concluir, face ao exposto, que a mesma foi rejeitada, não aprovada.

De resto, cf. item 16.º dos factos indiciariamente dados como provados, na acta da assembleia de 16 de Junho de 2015, foi exarado, pelo respectivo presidente, que a proposta de alteração dos estatutos não foi aprovada.

Ora, fora de toda a dúvida, no términus da assembleia, a tarefa de apurar o resultado das votações e proclamar o sentido da deliberação, incumbe ao presidente da mesma – cf. Paulo de Tarso Domingues, in Código das Sociedades Comerciais em Comentário, cit., VI, pág. 41 e nota 69, onde se refere ser este “um aspecto de enorme importância, uma vez que a partir deste momento não poderão mais naquela assembleia, ser aprovadas quaisquer deliberações pelos sócios. Vide Pedro Maia (2002), p. 461 e Menezes Cordeiro (2011), p. 1011, que considera nulas quaisquer deliberações aprovadas depois do encerramento da assembleia pelo presidente, ainda que outrem venha a assumir depois disso, o cargo de presidente.”.

Também Pedro Maia, in O Presidente da Assembleia de Sócios, in Problemas do Direito Das Sociedades, IDET, Almedina, pág. 460, refere que “Concluído o processo de votação, incumbe ao presidente proceder à contagem dos votos e anunciar à assembleia o resultado da votação, isto é, o sentido (positivo ou negativo) da deliberação tomada.”; acrescentando a pág. 461 que “Esgotada a ordem do dia, o presidente deve comunicar o encerramento da assembleia, para que os sócios fiquem seguros de que, a partir desse momento, não serão tomadas quaisquer outras deliberações.”.

Opinião que é, também, a expressa por António Menezes Cordeiro, in SA: Assembleia Geral …, já citada a pág. 73, onde refere que compete ao presidente da assembleia geral “apurar o resultado de cada votação e proclamá-lo” e “declarar a reunião encerrada: de novo um ponto formal importante, para que todos se apercebam de que não haverá mais deliberações possíveis.”.

Daqui decorre, pois, que tendo o presidente da assembleia de 16 de Junho, no âmbito das competências que lhe são próprias, declarado a mesma como encerrada e exarando em acta que a proposta de alteração dos estatutos não fora aprovada, é este o único sentido que se pode dar à deliberação, sendo irrelevante que alguns membros da assembleia sejam de opinião que a mesma fora, ao invés, aprovada.

Teve lugar a votação e proclamado o seu resultado, não relevam as opiniões a tal respeito: a proposta foi ou não aprovada, de acordo com o sentido da votação e a maioria a considerar e o sentido da respectiva proclamação só poderia vir a ser atacado por via da impugnação judicial, o que não sucedeu, dado que, nos autos nada consta no sentido de que foi requerida a sua suspensão ou anulação.

Ou seja, mantém-se válida a deliberação tomada na assembleia de 15 de Junho de 2015, tal como exarada em acta; isto é, que foi rejeitada a proposta de alteração dos estatutos da requerida, do que decorre manter-se vigente o artigo 11.º dos estatutos da requerida, sem tal alteração; ou seja, exige-se que as deliberações sociais são tomadas por maioria superior a 75% dos votos favoráveis correspondentes à totalidade do capital – cf. item 12.º dos factos indiciariamente dados como provados.

Por último, no que toca à eventual propositura da acção de anulação com vista a atacar a deliberação tomada na assembleia de 15 de Junho, apenas de referir que quem o poderia (deveria) fazer eram os sócios que não votaram no sentido que fez vencimento – cf. artigo 59.º, n.º 1, do CSC e não o recorrente.

Efectivamente, o ora recorrente não ficou vencido, relativamente à formação de tal deliberação (votou contra a proposta de alteração dos estatutos), pelo que, nos termos expostos, não era a ele que competia intentar a acção de anulação, pelo que é irrelevante o que, quanto a tal, se refere na decisão recorrida.

Em suma, por todo o exposto, tem de se considerar que se mantêm em vigor os estatutos da requerida, na redacção anterior à data em que teve lugar a referida assembleia extraordinária, por a proposta de alteração dos estatutos não ter sido aprovada; ou seja, não houve qualquer alteração dos estatutos da requerida.

Como consequência directa desta conclusão, não pode ter-se por assente que as deliberações tomadas na assembleia de 29 de Junho de 2015, não violam a lei nem os estatutos da requerida, uma vez que esta afirmação constante da decisão recorrida, se baseia no pressuposto que houve alteração (válida e legal) dos estatutos da requerida.

Assim não foi e como as deliberações da assembleia de 29 de Junho de 2015, não foram aprovadas pela maioria prevista no artigo 11.º dos estatutos da requerida, é evidente a sua anulabilidade, cf. artigo 58.º, n.º 1, al. a), do CSC.

Ainda relativamente à assembleia de 29 de Junho, colocam as partes grande enfase no facto de o presidente da assembleia a ter declarado suspensa por duas vezes, o que, na óptica da recorrida não é possível por extravasarem as “suspensões normais”, a que se refere o artigo 387.º, n.º 1, do CSC.

As suspensões aqui referidas, por regra, são “interrupções de curta duração, usuais ou convenientes para o ordenado ou eficiente funcionamento da assembleia” – cf. Coutinho de Abreu, ob. cit., pág. 148.

No entanto, face ao que consta dos itens 20.º a 25.º dos factos indiciariamente dados por provados, a questão não se prende tanto com as suspensões aí referidas, mas sim com o facto de (cf. item 26.º) o presidente da assembleia ter declarado encerrada a assembleia de 29 de Junho de 2015 “quanto aos trabalhos por si dirigidos” e, não obstante, a mesma ter prosseguido por vontade dos demais accionistas, sob a direcção de outra pessoa.

Importa, pois, averiguar das consequências do facto de o presidente da mesa da assembleia ter declarado o encerramento desta assembleia e qual a eficácia decorrente do facto de a mesma ter continuado, agora, sob a presidência de outra pessoa que não o designado presidente da assembleia geral.

Defendem os recorridos que a situação em causa configura “uma situação de não comparência”, devendo aplicar-se o disposto no artigo 374.º, n.º 3 do CSC.

Dispõe-se neste preceito que:

“No silêncio do contrato, na falta de pessoas eleitas nos termos do número anterior ou no caso de não comparência destas, serve de presidente da mesa da assembleia geral o presidente do conselho fiscal, da comissão de auditoria ou do conselho geral e de supervisão …”.

E em caso de falta destes (cf. seu n.º 4) “preside à assembleia geral um accionista, por ordem do número de acções de que sejam titulares”.

Como refere Paulo de Tarso Domingues, CSC em Comentário, já citado, VI, pág.s 31 e 32, deve proceder-se à nomeação de presidente ad hoc (apenas para aquela reunião), de acordo com os referidos critérios “se o presidente (permanente) da mesa não se encontrar presente – porque não existe ou não compareceu.”.

Pedro Maia, in ob. cit., pág. 432, defende que “a presidência da assembleia é atribuída no início dos trabalhos, não se alterando com vista a facilitar o decurso normal dos trabalhos e, sobretudo, a elaboração da acta, até ao encerramento da reunião.”.

Também Paulo Olavo Cunha, in ob. cit., pág. 573 defende a ideia de que a designação de um presidente ad hoc, só deve ocorrer em caso de “falta ou ausência de qualquer membro da mesa.”.

Ora, no caso em apreço, não se verificou a falta ou ausência do presidente (permanente) da assembleia geral da recorrida, pelo que não tem aplicação o disposto no artigo 374.º, n.º 3, do CSC e, consequentemente, não era legítima a designação de um presidente ad hoc para dirigir a assembleia, que já se iniciara, sob a direcção do presidente (permanente) da assembleia geral e que a ela compareceu, do que decorre não se estar perante caso de “falta ou ausência” do presidente (permanente) da assembleia geral.

Este iniciou a assembleia de 29 de Junho e nas relatadas circunstâncias, em dada altura, declarou-a por encerrada, após o que, posteriormente, prosseguiu a discussão da ordem de trabalhos, já sem a presença deste e sob a orientação de presidente ad hoc para tal nomeado, na sequência do que vieram a ser tomadas as deliberações referidas no item 19.º, dos factos indiciariamente tidos por provados.

Já acima vimos quais as competências do presidente da assembleia geral para declarar o encerramento da assembleia e que, após tal declaração, não poderão ser tomadas novas deliberações, sob pena de nulidade.

O facto é que foi declarada encerrada a assembleia de 29 de Junho, pelo presidente (permanente) da assembleia da requerida (cf. item 25.º).

Como resulta dos autos, o dissídio entre o recorrente e os demais sócios da recorrida, prendia-se com a anterior aprovação/rejeição da proposta de alteração dos estatutos da requerida – objecto da deliberação da assembleia extraordinária de 16 de Junho de 2015.

Proposta, esta que, como acima já referido, não foi aprovada.

Como refere António Menezes Cordeiro, in SA: Assembleia Geral …, já cit., a pág.s 70 e 71, um dos princípios da condução das reuniões da assembleia geral é o da “legalidade: o presidente é, no âmbito da assembleia, o guardião da lei e dos estatutos, agindo em consequência.

É importante recordar que o presidente da mesa recebe os seus poderes da lei e dos estatutos: não é um delegado dos accionistas nem, muito menos, da maioria que o tenha elegido. Embora ao serviço da sociedade – logo: dos accionistas – ele deva tratá-los em modo colectivo, o que pode pressupor que se deva opor, em certas circunstâncias, à maioria da assembleia.”.

Ora, no caso em apreço, o presidente da assembleia encerrou os trabalhos da mesma e por conseguinte pôs fim ao seu poder deliberativo, com vista a defender os estatutos da requerida, que exigiam uma maioria superior a 75% dos votos, o que não estava a ser respeitado pela maioria dos sócios, no pressuposto (não verificado), de que os estatutos já só exigiam a maioria dos votos emitidos.

Assim, tem respaldo legal a actuação do presidente da mesa e sofrem de nulidade todas as deliberações tomadas após a declaração de encerramento da assembleia de 29 de Junho, por a mesma já não ter poder deliberatório, como acima já referido, equivalendo, efectivamente, na prática, a uma assembleia geral não convocada (cf. artigo 56.º, n.º 1, al. a), do CSC), dado que a regularmente convocada foi declarada encerrada pelo presidente e no exercício dos poderes/funções que lhe são atribuídas.

Assim, verificam-se os requisitos para se declara a nulidade e a anulabilidade das deliberações tomadas na assembleia de 29 de Junho de 2015, pelo que, quanto a esta questão, procede o recurso.

B. Se as referidas deliberações causam danos quer à sociedade requerida, quer ao requerente, na qualidade de seu sócio.

No que a esta questão concerne, alega o recorrente que este requisito também se deve ter por verificado porque as contas aprovadas, dadas as reservas apresentadas, não espelham a verdadeira situação financeira da requerida, dada a sobrevalorização do capital próprio da mesma e aumentou o passivo, para além de que tendo sido afastado da presidência da assembleia geral e não integrando o conselho de administração, fica impedido de ter um mínimo controlo sobre a vida da sociedade e respeito pela lei e pelos estatutos.

Na sentença recorrida, considerou-se que as contas, apesar das reservas, expressam adequadamente a situação financeira da requerida e, de igual modo, não se deu por verificada a existência de prejuízos para a sociedade ou para os sócios, decorrentes das deliberações em causa, que não possam ser eliminados em sede de acção de anulação.

Nos termos do disposto no artigo 380.º, n.º 1, in fine, do NCPC, um dos requisitos exigidos para que se decrete a suspensão de deliberações sociais é o de que a execução das deliberações cause dano apreciável.

Como refere Moitinho de Almeida, in Anulação E Suspensão De Deliberações Sociais; Coimbra Editora, 1983, pág. 100, deve considerar-se que, no respeitante aos sócios, as deliberações sociais podem afectá-los na qualidade de terceiros porque há direitos que, tendo embora a sua matriz na qualidade social, dela se autonomizaram, radicando-se na esfera jurídica do seu titular, acrescentando a fl.s 159 que, como a lei se contenta com que o dano seja apreciável, não é de exigir que ele seja irreversível ou de difícil reparação.

Por outro lado, como se refere no Acórdão da Relação de Lisboa, de 17/07/2008, Processo n.º 2321/2008-1, seguindo jurisprudência do STJ, disponível no respectivo sítio da dgsi, “dano apreciável é o dano visível, de aparente dignidade, estimável; dano irreparável é o dano incompensável.”.

Também ali se considerando e defendendo que “O dano a considerar tanto é o do sócio requerente da suspensão da deliberação, como o da sociedade. Efectivamente, «na falta de distinção legal, é indiferente para o decretamento da suspensão se o perigo de dano afecta apenas o sócio requerente ou se influi em primeira linha na sociedade derivando depois para a esfera jurídica do sócio»” a que há que acrescentar a exigência de que “a deliberação, ou a sua execução, em si mesmas comportem, a possibilidade de prejuízos imputáveis à demora do processo de anulação” e na esteira do que ensinava Vasco da Gama Lobo Xavier, in O conteúdo da providência de suspensão de deliberações sociais, Coimbra, 1978, pág. 23, importa considerar que “o dano que há que ter em conta para fundamentar a suspensão é o que deriva do retardamento da sentença de anulação da deliberação, por isso que a específica finalidade do procedimento de suspensão de deliberações sociais é garantir a eficácia prática de uma eventual sentença anulatória, face à possibilidade de a duração do respectivo processo frustrar os resultados que, através dele, o autor visa atingir.”.

Acrescentando que se visa prevenir os actos a cuja prática os administradores ou gerentes ficam vinculados, uma vez produzido o especial efeito jurídico a que a deliberação tende.

Ora, volvendo, ao caso em apreço, cf. item 42.º, foi eleito um novo presidente da mesa da assembleia geral e o requerente é o único accionista (cf. item 31.º) que não faz parte do Conselho de Administração da requerida, pelo que a consumar-se a deliberação tomada, o recorrente fica impedido de exercer qualquer controlo sobre o desenvolvimento do escopo societário da requerida, podendo os demais accionistas, ao abrigo da pretendida alteração dos estatutos da requerida, passar a aprovar o que lhes aprouver, sem necessidade dos votos do recorrente que, assim, na prática, fica impedido de exercer qualquer influência nas decisões a tomar e condução e desenvolvimento da vida societária da requerida.

Não sendo de descurar que o recorrente prestou garantias pessoais para assegurar o cumprimento de empréstimos contraídos pela requerida e foi interpelado para pagar dívidas desta – cf. itens 36.º e 37.º.

Ficando afastado da direcção e controlo da sociedade requerida fica, desde logo, impedido de saber em que estado se mantêm tais garantias; se ainda se verificam as circunstâncias que originaram que as prestasse.

Por outro lado, se é certo que, cf. itens 75.º a 78.º, inexiste mora ou incumprimento das dívidas da requerida aí referidas, dada a celebração dos acordos ali mencionados, menos certo não é que cf. item 29.º, as dívidas ao Estado ascendiam, em 31/12/2014 a 921.000,00 €, tendo aumentado de 2013 para 2014 em 350.000,00 €.

Last but not least, cf. item 28.º, a certificação legal das contas relativas a 2014, contém quatro reservas que fazem com esteja incluída nos activos fixos a quantia de 1.053,3 milhares de euros resultantes de aquisições de imóveis por escrituras de justificação, sem que exista suporte que a fundamente; que o activo e o capital próprio da empresa estejam sobreavaliados em 431.000 €, decorrente da falta de ajuste desta quantia resultante das reservas constantes das suas subsidiárias; o activo e o capital próprio da empresa estejam sobreavaliados em 1.358,6 milhares de euros, referentes a quantias de elevado risco de cobrança, sem que estejam reconhecidas as correspondentes imparidades e sobreavaliação do activo e capital próprio, antes de impostos, em 174,3 milhares de euros, por a rubrica “Diferimentos” incluir 349,9 milhares de euros que não satisfazem os requisitos para serem reconhecidos como activos.

Ou seja, como se refere no item 28.º ponto 11, não fora a existência das aludidas reservas, “as referidas demonstrações financeiras apresentam de forma verdadeira e apropriada, em todos os aspectos materialmente relevantes, a posição financeira” da requerida.

O mesmo é dizer que existindo tais reservas, as contas aprovadas não apresentam, não reflectem, a verdadeira e real situação da requerida, com todas as consequências daí decorrentes.

Assim, é mister concluir que existem danos apreciáveis para a sociedade requerida e para o recorrente, na qualidade de seu sócio, decorrentes da aprovação e execução das deliberações em causa, a atender nesta sede, por a demora da sua apreciação e decisão na competente acção de anulação, frustrar a eficácia prática a atingir com a declaração de anulação/suspensão das deliberações sub judice.

Pelo que, também, quanto a esta questão, procede o recurso.

C. Se a actuação do requerente para com a requerida configura “abuso de minoria”.

Invoca a requerida que o recorrente actua em abuso de minoria, com o fundamento em que o mesmo, quer a nível das assembleias gerais quer nas relações com os seus credores e fornecedores e trabalhadores, tem colocado a imagem da requerida numa “situação extremamente delicada” e que o seu voto minoritário, está a colocar a sociedade numa “situação instável e perigosa, podendo mesmo chegar a dificultar, para além do tolerável, a realização do seu objecto social, podendo até causar a dissolução da sociedade”, acrescentando que o requerente tem “tomado atitudes com finalidades egoístas … e tem prejudicado o interesse social da sociedade”.

Na decisão recorrida, não se considerou que o requerente actue em abuso de minoria, mas apenas que se trata de uma “situação de conflito com a administração da requerida por discordância de formas de actuação e de decisão”.

Embora a requerida não tenha interposto recurso da decisão proferida em 1.ª instância, retorna ao tema nas contra-alegações do presente recurso e como esta figura se enquadra no domínio do abuso de direito – e por isso, de conhecimento oficioso – impõe-se que nos debrucemos sobre tal problemática.

Como se refere no Acórdão do STJ, de 11/01/2011, Processo n.º 801/06.6TYVNG.P1.S1, disponível no respectivo sítio do itij, a figura do abuso de minoria, enquadra-se, em primeira linha, no abuso de direito, tal como este se acha consagrado no artigo 334.º do Código Civil, a qual, em sede de deliberações sociais, é de aplicar, no caso de se estar perante “deliberações que se apresentem formalmente como regulares – que não contrariam formalmente a lei nem o contrato de sociedade – mas que lesam ou ameaçam interesses da sociedade ou dos sócios, em termos tão chocantes que se impõe e justifica a possibilidade da sua impugnação (…)

Trata-se, enfim, de sancionar aqueles que embora não contendam com as normas legais não respeitem o seu espírito, designadamente quanto às exigências de equilíbrio que impedem os sócios de, com o seu voto, servirem interesses extra-sociais, por apenas seus ou de terceiros, em detrimento da sociedade ou de sócios menos dotados de capital”.

Este Aresto veio a ser comentado por Pedro Maia, in Cadernos de Direito Privado, n.º 40, em termos não inteiramente coincidentes com o concluído naquele, designadamente, não aceitando que os casos de exercício abusivo de um direito individual do sócio, quando tal direito se encontre à margem do processo de formação de uma deliberação, se enquadrem no invocado artigo 58.º, n.º 1, al. b), do CSC, devendo, ao invés, ficar sujeito ao princípio geral de proibição de abuso de direito, ao abrigo do disposto no artigo 334.º do CC.

Ali referindo a pág. 77 que “o abuso de minoria releva em casos de recusa de propostas de deliberação”, acrescentando a pág.s 79 e 80 que, nos casos em que a maioria é calculada sobre a totalidade dos votos correspondentes ao capital social (como se verifica in casu, cf. item 12.º), o que releva é “se sobre o sócio pode, em determinadas circunstâncias, impender um dever de voto (…) de um dever de votar a favor de uma proposta de deliberação, isto é, de um dever de votar em determinado sentido sobre uma determinada proposta de deliberação. Esta questão releva já do dever de lealdade que impenda sobre cada sócio na relação com a sociedade e da medida em que tal dever possa determinar um concomitante dever de o sócio votar a favor de determinada proposta de deliberação.”.

Acrescentando que no caso de abuso de minoria “está em causa destruir um voto abusivamente emitido” e no do “dever de voto, a ser admissível, estará em causa impor ao sócio o exercício do voto.”.

Coutinho de Abreu, in Abusos de Minoria, Problemas Do Direito Das Sociedades, já citado, a pág. 66 e seg.s, refere que “abusa do direito de impugnação o sócio que propõe acção anulatória, não ou não tanto para repor a legalidade ou juridicidade e satisfazer consequentemente interesses pessoais de que aquele direito é instrumento, mas para ou sobretudo para entravar o desenvolvimento da sociedade (contrariando o interesse social), prejudicar especialmente outros sócios (contrariando interesses destes relacionados com a sociedade), ou beneficiar-se especialmente à custa da sociedade ou de sócios maioritários (contrariando o interesse social ou interesses de sócios relacionados com a sociedade).

Este abuso do direito de impugnação, enquanto forma de antijuridicidade ou ilicitude, tem as consequências da actuação sem direito. Assim, deve a acção de anulação ser julgada improcedente.”.

No que se refere ao abuso do direito de voto, menciona que o sócio tem o poder de votar ou não votar, de acordo com os seus próprios interesses, desde que tal não se revele incompatível com o interesse social, ou interesse relevantes dos outros sócios referentes à sociedade.

Ao mesmo tempo que, em certos casos, se impõe ao sócio um “dever de voto positivo”, caso em que os sócios minoritários devem votar, juntamente com os maioritários, a favor de certas propostas, v.g. alteração do capital social e reduções de capital.

O mesmo autor, na sua obra Curso De Direito Comercial Das Sociedades, Vol. II, 5.ª Edição, Almedina, a pág. 290, refere que o supra citado “dever de voto positivo” se insere no “dever de lealdade perante a sociedade” e no exemplo ali referido (aumento de capital), tanto é atendível a exigência de maioria qualificada, enquanto manifestação da tutela legal de legítimos interesses dos sócios minoritários ou os interesses da sociedade que podem passar pela própria sobrevivência desta, v. g., no caso de aumento do capital mínimo, determinado por lei ou como forma de suprir graves dificuldades financeiras da empresa, casos em que (cf, ob. cit., pág. 292) o não apoio dos sócios minoritários se afigurará como abusivo.

No caso em apreço, da factualidade dada como indiciariamente provada, nada resulta que configure uma actuação abusiva do ora requerente ao exercer o seu direito de ver anuladas as deliberações ora em causa.

Os estatutos da sociedade exigem para a formação da maioria os votos correspondentes a mais de 75% de votos favoráveis correspondentes à totalidade do capital e a não aprovação das mesmas não coloca em causa a sobrevivência da sociedade nem a impede de desenvolver o respectivo escopo social.

O que se verifica, como já referido na decisão recorrida, é uma situação de conflito entre o requerente e os demais sócios mas que, contrariamente ao alegado pela requerida, não a coloca numa situação que a impossibilite ou dificulte, para além do tolerável, que leve a cabo a sua actividade.

O requerente encontra respaldo para a sua posição no que os estatutos da requerida dispõem para a formação das maiorias e goza do direito a, assim, ver protegida a sua posição de sócio minoritário, mas sem que se vislumbre (nem a requerida alegou quaisquer factos, em concreto, dos quais se possa retirar a conclusão que extrai) que actua abusivamente, nos termos e moldes acima referidos.

Nem tal actuação se pode retirar do que consta dos itens 90.º, 91.º e 96.º.

O recorrente não é gerente da requerida, pelo que não se verifica a hipótese a que se alude no artigo 257.º do CSC, o dever de não concorrência apenas se impõe ao gerente de uma sociedade e não a um mero sócio.

Em suma, não se pode concluir que o recorrente, na qualidade de sócio minoritário da requerida, actue em abuso de direito e, por decorrência em “abuso de minoria”.

Pelo que, improcede esta questão do recurso.

Nestes termos se decide:

Julgar procedente o presente recurso de apelação, em função do que se revoga a decisão recorrida, que se substitui por outra que julga procedente a providência cautelar requerida e, consequentemente:

a) se determina a não aprovação da alteração dos estatutos da sociedade requerida e;

b) se determina a suspensão das deliberações sociais tomadas em Assembleia Geral Anual de 29 de Junho de 2015.

Custas pela apelada, em ambas as instâncias.

Coimbra, 13 de Julho de 2016.

Arlindo Oliveira (Relator)
Emidio Francisco Santos
Catarina Gonçalves