Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
346/23.0T8FIG-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO RUÇO
Descritores: PROVIDÊNCIA CAUTELAR INOMINADA
UNIÃO DE FACTO
DIREITO A RESIDIR NA CASA DO FALECIDO COMPANHEIRO
PRAZO
Data do Acordão: 02/06/2024
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Tribunal Recurso: JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DA FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE, COM VOTO DE VENCIDO
Legislação Nacional: ARTIGO 5.º, N.º 2, DA LEI N.º 7/2001, DE 11/5
ARTIGOS 359.º E 362.º, 1, DO CPC
Sumário: I- Numa providência cautelar, apenas se tomam decisões provisórias e concretas aptas a afastar um perigo de lesão do direito invocado.
II- O pedido de fixação do prazo, durante o qual a requerente poderá usar a casa do seu falecido companheiro, não se inclui neste tipo de finalidade própria da providência cautelar.

III- É na ação principal, que conhece do direito em termos definitivos, que esse pedido deve ser formulado, apreciado e decidido.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra,


*

Juiz relator………….....Alberto Augusto Vicente Ruço

1.º Juiz adjunto………..Luís Filipe Dias Cravo

2.º Juiz adjunto………..Carlos António Paula Moreira


*

Recorrentes…………………..AA; e

………………………………….BB

Recorrida……………………..CC


*

I. Relatório

a) O presente recurso vem interposto da decisão que decidiu a presente   providência cautelar inominada que a requerente instaurou contra as requeridas, alegando ter vivido em união de facto com o pai destas últimas e ter direito a residir na casa de habitação do seu falecido companheiro.

Requereu ao tribunal que intimasse as requeridas a

- se absterem de praticar quaisquer atos que firam o direito real de habitação e recheio do imóvel que se pretende decretar;

- reporem a eletricidade que mandaram cortar após a instauração da ação principal.

Em sede de oposição, as requeridas impugnaram a matéria de facto invocada no requerimento inicial e concluíram pela improcedência dos pedidos.

Realizou-se a audiência de julgamento e foi proferida desião com o seguinte dispositivo:

«…decide-se deferir parcialmente a presente providência cautelar e, em conformidade:

- reconhecendo-se a união de facto entre a Requerente e DD e que a sua casa de morada de família se situava no rés do chão do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., sita na Rua ..., ..., ..., defere-se o pedido de condenação das requeridas a absterem-se de praticar quaisquer atos que firam o direito real de habitação e recheio do mencionado rés do chão, por parte da requerente, pelo prazo de 37 anos, ou seja, até ao ano 2059, inclusive.

Valor: €30 000,01 (arts. 303º n.º 1 e 304º n.º 3 d), ambos do CPC)

Custas pela requerente, por um lado, e pelas requeridas, por outro lado, na proporção de metade, fixando-se a taxa de justiça em 2,5 Ucs (arts. 539º, n.ºs 1 e 2, do CPC, e 7º, n.º 4, do RCP). Registe e notifique.»

b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte das requeridas e também da requerente, cujas conclusões são as que a seguir se indicam, seguindo a cronologia processual.

Recurso interposto pelas Requeridas:

«1. O douto despacho proferido não atendeu às questões suscitadas pelas requerentes na sua Contestação.

2. As recorrentes opõem-se ao prazo até 2057 mencionado na sentença de que se recorre.

3. As recorrentes não aceitam o referido prazo, pois não está devidamente fundamentado e deveria.

4. Como não está a área de uso da recorrida.  

5. O que acontece no que concerne aos contadores de água e luz.

6. Ao uso do quintal, arrumos e hortas.

4. O que é de extrema importância e de relevâncias extrema.

Termos em que, e nos melhores de Direito, se requer a V.E.as. Senhores Desembargadores decidir no se tido de que deve a douta sentença proferida ser revogada e ser aceite o recurso interposto e anular a decisão proferida. O que se tara Justiça.

Recurso interposto pela requerente:

«a) A douta sentença em crise tem por base um procedimento cautelar intentado pela ora recorrente no âmbito de uma acção principal de reconhecimento de união de facto e consequentemente reconhecimento de direito de habitação e recheio do imóvel que constituía casa morada de família por forma a impedir que as recorridas praticassem quaisquer actos que violassem este eventual direito, nomeadamente com o corte de electricidade e serviços.

b) Provou-se que desde o ano de 1985 que o imóvel sito na Rua ... ..., ... sempre foi a casa morada de família do falecido e ora recorrente.

c) A Meritíssima Juíza a quo, após apreciação da prova dá como provado que a ora recorrente viveu em união de facto pelo período de 37 anos e consequentemente reconhece o direito ao uso e habitação da ora recorrente, mas apenas quanto ao rés do chão, permitindo que esta possa contratar os referidos serviços de electricidade para aquela divisão.

d) Ficou provado que o imóvel acima identificado sempre foi a casa morada de família da ora recorrente, usufruindo do mesmo na sua plenitude.

e) O referido imóvel é constituído pelo prédio urbano composto por casa de habitação composta de r/c, com dois arrumos e cozinha rural e 1º andar com sala, 4 quartos, cozinha e banho exterior, não descrito na competente conservatória do registo predial ... e inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...75º.

f) Tal prédio urbano não é suscetível de divisão nem andares e utilização independentes.

g) As ora recorridas não peticionaram qualquer divisão e salvo o devido respeito não o podiam sequer fazer, porquanto o imóvel não é passível de ser divisível nos moldes invocados na douta sentença.

h) Apenas peticionaram e tão só a improcedência do reconhecimento da união de facto.

i) Estando assim reconhecida a união de facto e o respectivo direito previsto no artigo 5º da lei 7/2001 de 11 de Maio, a Meritíssima Juíza a quo deveria ter efectuado tal reconhecimento quanto à totalidade do imóvel e não quanto a algumas divisões que constituem a totalidade do imóvel.

j) O mesmo imóvel sempre foi usado na sua plenitude e globalidade pela ora recorrente, pois a mesma tem lá a sua roupa, os seus bens pessoais, fazia lá a sua higiene e confecionava refeições mais elaboradas no primeiro andar pois o rés do chão não tinha as condições necessárias para o efeito.

k) Com a douta sentença, a Meritíssima Juíza a quo, ao atribuir à ora recorrente a divisão do rés do chão, a qual tem parcas condições de habitabilidade, privou-a de usufruir do imóvel na sua globalidade e de um direito que lhe assiste e que vem previsto na Lei.

Termos em que e nos melhores de direito se R. a V. Exªs Srs. Venerandos Juízes Desembargadores, a substituição da douta sentença em crise por douto acórdão desse Venerando Tribunal no qual seja reconhecido à ora recorrente, o direito de uso e habitação e recheio da totalidade do imóvel sito na Rua ... ..., ..., usufruindo esta na sua globalidade do mesmo, pelos motivos acima expostos, condenado as recorridas a absterem-se de praticar quaisquer actos, com as legais consequências e tudo como acto da mais elementar Justiça!»

c) Não há contra-alegações.

II. Objeto do recurso.

As questões que os recursos colocam são as seguintes:

1 – No que respeita ao recurso das Recorridas, cumpre verificar se deve revogar-se a decisão recorrida no que respeita ao prazo fixado até 2059 para o exercício do direito.

2 – Em segundo lugar, se procede a pretensão de definir a área sobre a qual recai o direito de uso e habitação reconhecido na sentença recorrida.

Como esta questão está conexa com a questão colocada no recurso da requerente, que pretende que se declare que o direito reconhecido na decisão recorrida abrange toda a habitação e não apenas ao rés-do-chão, serão ambas analisada em simultâneo.

III. Fundamentação

a) Matéria de facto – Factos provados

1. A requerente conheceu DD no ano de 1985.

2. Em 1985, DD, a requerente e o filho menor desta, com 5 anos de idade, de nome EE, passaram a viver juntos na casa de habitação do primeiro, sita na Rua ..., ..., ....

3. O referido prédio urbano, de acordo com a caderneta predial, é composto de r/c, com dois arrumos e cozinha rural e 1º andar com sala, 4 quartos, cozinha e banho exterior, não se encontra descrito na competente conservatória do registo predial ... e encontra-se inscrito na matriz predial urbana sob o art. ...75º, em nome de cada uma das requeridas, na proporção de 1/6 cada uma, e de DD, enquanto cabeça de casal de herança, na proporção de 2/3.

4. Desde a data acima referida e com a mudança da requerente do seu filho menor para a habitação de DD, sempre se trataram como marido e mulher.

5. A requerente e DD dormiam na mesma cama e faziam carícias um ao outro mesmo em público.

6. A requerente e DD passeavam juntos.

7. A requerente e DD tomavam refeições juntos.

8. A requerente e DD festejavam aniversários e faziam almoços em família.

9. A requerente e DD iam juntos a eventos sociais tais como batizados e casamentos.

10.  Desde 2020 e até finais de 2022, DD ficou acamado no rés do chão do mencionado prédio, sendo alimentado e higienizado pela requerente.

11. Em 2020, a requerente e o referido DD passaram a residir no rés do chão do referido prédio.

12. Pelo menos, meses antes de dezembro de 2022, o primeiro andar do referido prédio, que dispõe de acesso de escadas a partir do exterior, entrou em obras, por iniciativa das requeridas, porque não dispunha de condições de habitualidade, fruto da sua degradação, com a finalidade de vir a ser arrendado.

13. Em 17 de novembro de 2022, o referido FF foi internado no Hospital ....

14. O referido DD faleceu em .../.../2022.

15. FF deixou como suas únicas e universais herdeiras, suas filhas, as acima referidas requeridas AA e BB.

16. A Requerente não deixa as requeridas entrar no referido prédio para levar os bens do falecido pai.

17.  O Ilustre Mandatário das requeridas remeteu à requerente uma carta, com data de 06.02.2023, fixando-lhe um prazo para abandonar a casa onde residiu com o falecido FF, sob pena de lhe cortar a luz e a água.

18. Encontra-se pendente inquérito criminal fundado em queixa apresentada pela aqui requerente contra as requeridas, sob o nº 58/23.....

19. Em sede de esclarecimentos solicitados pelo tribunal, a E Redes escreveu:

«Pedido de Informação

Cumpre esclarecer que o local de consumo ...09, CPE ... (Habitação), corresponde à instalação sita na Rua ..., ... ... Para este local de consumo vigoram os seguintes contratos de fornecimento de energia elétrica:

• No período de 19.08.2017 a 06.02.2023, vigorou um contrato de fornecimento de energia elétrica, titulado por DD, com o NIF ...08, contrato esse celebrado com o Comercializador EDP Comercial;

• No período de 07.02.2023 a 08.03.2023, vigorou um contrato de fornecimento de energia elétrica, titulado por CC, com o NIF ...75, contrato esse celebrado com o Comercializador EDP Comercial;

• No período 09.03.2023 até ao presente, vigorou um contrato de fornecimento de energia elétrica, titulado por AA, com o NIF ...74, contrato esse celebrado com o Comercializador EDP Comercial.

Respondendo às questões:

No período da vigência do contrato (09.03.2023 até ao presente) titulado pela Sra. AA, e para este local de consumo, existem as seguintes visitas técnicas ao local, todas a pedido do comercializador EDP Comercial:

• No dia 13.03.2023, o Comercializador EDP Comercial, submeteu um pedido de desligação para o local de consumo em questão – CPE ...;

• No dia 15.03.2023, em deslocação técnica ao local, os técnicos não efetuaram a desligação de energia elétrica, conforme solicitado pelo comercializador, pelo facto de não terem deixado efetuar a desligação,  exibindo o contrato novo;

• Entretanto, no dia 15.03.2023, o comercializador EDP Comercial, submeteu um processo de anulação do pedido de desligação, anteriormente enviado, mantendo-se assim o contrato em vigor;

• Posteriormente, a 08.05.2023, consta um processo de interrupção de fornecimento de energia elétrica, submetido pelo comercializador EDP Comercial;

• No dia 23.05.2023 foi efetuada a interrupção de fornecimento de energia elétrica, conforme solicitação do comercializador EDP Comercial;

• A instalação encontra-se com o fornecimento de energia elétrica interrompido desde 23.05.2023. Não se verifica qualquer contacto ou solicitação, efetuada pela Sras. AA, BB ou GG, para com a E-REDES, por causa do imóvel sito na Rua ..., .... ....”

2. Matéria de facto – Factos não provados

a) A requerente conheceu DD precisamente a 18 de janeiro de 1985.

b) DD foi apresentado à requerente em casa de uma prima deste de nome HH, tendo de imediato ambos iniciado uma relação amorosa com a consequente mudança da requerente CC e do seu filho menor com 5 anos de idade de nome II para a habitação, propriedade daquele DD, sita na acima referida Rua ..., ..., ....

c) Em 1985, DD era viúvo há cerca de 9 meses.

d) A requerente e DD apoiavam-se mutuamente em todos os

atos conjugais.

e) Após tal data as requeridas tentaram proibir o contacto com a requerente com aquele DD, tendo inclusivamente insultado e ameaçado esta na casa de morada de família.

f) Logo após o óbito daquele DD e logo após também a requerente ter intentado ação principal a que este procedimento segue por apenso, as requeridas têm vindo a pressionar e ameaçar a requerente no sentido de abandonar de imediato a casa morada de família onde aquela residiu durante 37 anos e 11 meses com o falecido pai destas.

g) Pela requerente foi oportunamente transmitido às requeridas que tem o direito real de habitação conferido pelo art. 5.º n.º 2 da lei n.º 7/2001 de 11 de Maio, ou seja o direito a usufruir da casa morada de família e do respetivo recheio por tempo igual ao da duração da união – 37 anos e 11 meses.

h)   As requeridas tudo têm feito para impedir a requerente de usufruir na sua plenitude de um direito que lhe assiste, vedando-lhe o acesso a várias divisões, deixando-lhe “recados” escritos e colados nas portas da habitação, partem-lhe vários vasos com flores, entram e saem quando querem.

i) No passado dia 23 de maio de 2023, as requeridas com manifesta e requintada má-fé e bem sabendo que não o podiam fazer decidiram cortar a luz no imóvel, objeto dos presentes autos, onde a requerente reside.

j) A requerente deslocou-se à EDP por forma a repor o contrato que se encontrava em seu nome, mas por esta instituição foi dito que nada podem decidir até existir sentença judicial transitada em julgado que determine que a mesma tem legitimidade para habitar naquele imóvel.

k) A requerente não tem quaisquer imóveis, sua propriedade, nem tem capacidade para providenciar outra habitação, não aufere qualquer tipo de reforma em virtude de ter dedicado a sua vida ao falécio DD, estando assim preenchida a sua situação de necessidade como membro sobrevivo da união de facto.

l) As requeridas com esta atitude as requeridas estão a causar lesão grave e dificilmente reparável ao direito real de habitação e recheio do referido imóvel da casa morada de família da requerente.

m) Não é a requerente que paga a luz e a água do referido prédio.

n) As requeridas foram alertadas pela polícia de que poderia haver problemas com a eletricidade, porque os fios estavam em pré-contacto com a água.

o) Por isso, as requeridas levaram técnico da EDP ao local.

p) A requerente não deixou entrar o técnico da EDP.

q) As requeridas participaram a situação às autoridades.

c) Apreciação da restante questão objeto do recurso

Não se farão considerações sobre o enquadramento jurídico geral dos factos, por estar já feito na sentença e não ter sido colocada em causa no recurso, seguindo-se diretamente para análise das questões colocadas no recurso.

1 – Considerando o recurso das Recorridas, vejamos se deve revogar-se a decisão recorrida no que respeita ao prazo fixado até 2059 para o exercício do direito.

A resposta é positiva, pela seguinte razão:

A Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, dispõe, no n.º 2 do seu artigo 5.º, que «No caso de a união de facto ter começado há mais de cinco anos antes da morte, os direitos previstos no número anterior são conferidos por tempo igual ao da duração da união.»

Daí o prazo fixado na decisão recorrida.

Porém, este prazo não foi pedido pela requerente, mas terá sido fixado, certamente por se ter entendido que decorria automaticamente do n.º 2 do artigo 5.º da referida lei, como de facto decorre.

Porém, a decisão sobre esta matéria não é própria de uma providência cautelar, na qual se tomam decisões provisórias e concretas aptas a afastar um perigo de lesão do direito invocado.

O pedido de fixação do prazo não se inclui neste tipo de finalidade própria da providência cautelar.

É na ação principal, que conhece do direito em termos definitivos, que esse pedido deve ser formulado, apreciado e decidido.

Com efeito, como resulta do disposto no artigo 362.º, n.º 1, do CPC, «Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado.»

Por conseguinte, o âmbito da providência cautelar circunscreve-se à adoção de medidas concretas de conservação do direito ameaçado ou antecipação do gozo de qualquer direito ainda não vencido e que se encontre ameaçado no presente.

Nada mais que isto.

Ora, a fixação do prazo de duração do direito a habitar a casa e a usar o seu recheio, até 2059, vai além da simples medida conservatória deste direito ou antecipatória do mesmo, que se obtém com a mera decisão de manter a requerente no gozo da habitação até ser proferida decisão na ação principal onde, aí sim, se fixará, se a ação proceder, o prazo durante o qual a requerente poderá habitar a casa e usar o seu recheio.

Por conseguinte, a fixação do prazo durante o qual se exercerá o direito ameaçado, até 2059, não pode ser objeto de decisão da providência cautelar porque extravasa da finalidade para a qual se encontra talhada.

Só assim não seria se tivesse sido pedida a inversão do contencioso (artigo 359.º do CPC), situação que não ocorre no caso dos autos.

Por conseguinte, cumpre revogar a decisão nesta parte, pela razão indicada.

2 – Vejamos se procede a pretensão de definir a área sobre a qual recai o direito de uso e habitação reconhecido na decisão recorrida.

Como esta questão está conexa com a questão colocada pelo recurso da requerente, que pretende que se declare que o direito reconhecido na decisão recorrida abrange toda a habitação e não apenas ao rés-do-chão, serão ambas analisada em simultâneo.

Sobre esta problemática cumpre referir que assiste razão à Requerente.

Com efeito, esta pediu o seguinte:

«… deve o procedimento cautelar requerido ser julgado procedente, por provado, sem audição prévia das requeridas e em consequência ordenar que as mesmas se abstenham de praticar quaisquer actos que lesem o direito real de habitação e recheio peticionado nos autos principais, bem como reponham o fornecimento de eletricidade que abusivamente cortaram, tudo com as legais consequências e como é de lei e se impõe.»

Ela pediu que se reconhecesse o direito sobre a totalidade da habitação e não apenas ao rés-do-chão.

Por conseguinte, tendo-se reconhecido que a requerente viveu em união de facto com o pai das requeridas nesta habitação é sobre a totalidade da habitação que se reconhece a incidência do direito, pois nada foi pedido e ponderado relativamente a uma eventual restrição dos espaços habitacionais.

IV. Decisão

Considerando o exposto.

1 - Julga-se o recurso interposto pelas Requeridas parcialmente procedente e revoga-se a decisão recorrida no segmento «… pelo prazo de 37 anos, ou seja, até ao ano 2059, inclusive».

2 -  Julga-se o recurso interposto pela Requerente procedente e declara-se que o direito reconhecido na decisão recorrida abrange a totalidade do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia ..., sita na Rua ..., ..., ..., ficando a decisão recorrida revogada na parte em que contradiz o ora decidido.

3 - Custas do recurso interposto pelas requeridas a cargo da requerente. Custas do recurso interposto pela requerente a cargo das requeridas.


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Voto a decisão, mas, quanto ao ponto 1 do dispositivo, divirjo da fundamentação, porquanto considero que o tribunal a quo decidiu além do pedido, pois a requerente não pediu a fixação do prazo de permanência na habitação.
Carlos António Paula Moreira

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Coimbra, …