Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
430/08.0JACBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUÍS TEIXEIRA
Descritores: RECURSO
CONTAGEM DOS PRAZOS
Data do Acordão: 07/10/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VARAS DE COMPETÊNCIA MISTA E JUÍZOS CRIMINAIS DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 372º E 373º CPP
Sumário: 1. - Os prazos de interposição de recurso são prazos legais perentórios, que não podem ser alterados por mero arbítrio quer do juiz quer de funcionário judicial.

2. Tendo o julgamento decorrido com a presença da arguida e sua defensora e tendo sido designada data para a leitura do acórdão, a que compareceu apenas a defensora, deve considerar-se que a sentença foi notificada à arguida no dia da sua leitura, na pessoa da mandatária.

3.- A notificação da arguida que posteriormente foi solicitada à entidade policial do conteúdo do acórdão, trata-se de um ato facultativo, não obrigatório por lei, que em nada, de per si, altera o prazo legal de recurso.

Decisão Texto Integral:             Acordam em conferência na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra       :

A)

            1. No seguimento da decisão sumária proferida a fls. 1051 a 1055 dos autos, vem a recorrente A... reclamar para a conferência daquela mesma decisão, alegando para tanto e em síntese, o seguinte (req. de fls. 1058 a 1061v), para além do que já resulta da própria decisão sumária que mais adiante se transcreverá:

            1.1. A arguida tem como habilitações literárias, apenas o 3º ano de escolaridade.

            1.2. Pelo que quando a arguida recebeu a notificação, contactou lodo a sua mandatária.

            1.3. A mandatária da arguida, apesar de notificada, estava à espera não de qualquer prazo mas da indicação por parte da arguida da sua vontade em recorrer ou não da decisão condenatória.

            1.4. E quando a arguida a contactou, no dia 31 de Maio de 2012, exibindo a referida notificação, a mandatária entendeu que tinha 30 dias para interpor recurso.

            1.5. Só com esta interpretação é que a mandatária da arguida se encontra em condições de zelar pela defesa e interesses da arguida.

            1.6. Pergunta a recorrente (através da sua ilustre mandatária), se tal notificação da secretaria não era obrigatória, então porque foi feita? Qual o seu efeito?

            1.7. Por todo o exposto, deve considerar-se que o prazo do recurso apenas se iniciou a 30.5.2012.

            1.8. Pelo que deve a reclamação ser deferida com todas as consequências legais.

  2. O Ministério Público não respondeu a esta pretensão dos recorrentes.

            3. Foram os autos a vistos e realizou-se a conferência.    


B)

            Cumpre decidir:

            1. A decisão sumária objecto da presente reclamação para a conferência tem o seguinte teor:

                                                              I         

“1. Nos autos de processo comum nº 430/08.0JACBR da 1ª secção das Varas de competência mista e dos juízos criminais de Coimbra, procedeu-se ao julgamento dos arguidos

A (...) , com alcunha de “ X (...) ”, nascida a 13/05/1959, natural da freguesia de (...) , Coimbra, filha de (...) e de (...) , divorciada, vendedora ambulante, residente no (...) , Coimbra.

B... , nascida a 28/04/1970, natural da freguesia de (...) , Lamego, filha de (...) e de (...) , solteira, desempregada, residente no (...) , Coimbra.

C... , com alcunha de “ Y (...) ”, nascida a 24/11/1984, natural da freguesia da (...) , Coimbra, filha de (...) e de A (...) , solteira, desempregada, residente no (...) , Coimbra.

D , nascido a 14/05/1988, natural de (...) , filho de (...) e de A (...) , solteiro, desempregado, residente no (...) , Coimbra,

A quem era imputada a prática, em co-autoria, de um crime tráfico de estupefacientes, previsto e punido, pelo art. 21º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

2. O julgamento decorreu com a presença dos arguidos, todos eles representados pelos seus defensores, tendo estado presentes nomeadamente nas sessões dos dias 19.3.2012 e 12.4.2012 – v. fls. 818 a 820 e 852 a 854.

3. Nesta última data, 12.4.2012, foi designada a leitura do acórdão para o dia 30 de Abril de 2012, pelas 14,00 horas.

4. Nesta data de 30.3.2012, estavam todos os convocados presentes à excepção da arguida A (...) , tendo sido informado pela sua ilustre mandatária que a mesma se encontrava doente, protestando juntar justificação no prazo legal – v. acta de fls. 876 e 877.

5. Nessa mesma data foi lido o respectivo acórdão que foi igualmente depositado na secretaria em 30.4.2012 – v. fls. 878.

6. A fls. 879 e 880 veio a arguida A (...) requerer a justificação da sua falta do dia 30.4.2012 que foi considerada injustificada por despacho judicial de fls. 883, datado de 11.5.2012.

7. Entretanto, em 3.5.2012 a secretaria do tribunal solicitou à entidade policial (comando da PSP de Coimbra), a notificação da arguida A (...) de todo o conteúdo do acórdão, juntando-se cópia do mesmo.

Dessa notificação fez-se constar a seguinte menção:

“De que para exercer o direito de recurso do referido acórdão deve contactar com a sua mandatária”.

8. A arguida A (...) foi notificada do teor do acórdão em 29.5.2012 – v. certidão de fls. 886v.

9. Em 11.6.2012 foi proferido despacho judicial ordenando a passagem de mandados de detenção da arguida considerando que a mesma tinha sido legalmente notificada do acórdão nos termos do artigo 373º, nº 3, do CPP – v. fls. 894 -, o que ocorreu conforme fls. 895.

10. Em 15.6.2012 foi interposto recurso pela arguida A (...) do respectivo acórdão – v. fls. 898 e seguintes.

11. Este recurso não foi admitido por despacho judicial de 28.6.2012 – v. fls. 999 e 1000 -, com o fundamento de que a arguida tinha sido considerada notificada da sentença no dia 30.4.2012, onde foi lida perante a sua mandatária (defensora) e para a qual (data), a arguida estava legalmente notificada, ao abrigo do artigo 373º, nº 3, do código de Processo Penal, pelo que o prazo de interposição de recurso, de facto e de direito tinha-se esgotado em 30.5.2012.

12. Desta não admissão do recurso reclamou a arguida em 13.7.2012 – v. fls. 104 e ss.

13. Sobre esta reclamação foi proferida a seguinte decisão:

            “APRECIANDO
            O direito ao recurso é um dos direitos constitucionais de defesa no âmbito do direito criminal (artigo 32°, n.° 1 da CRP), todavia, estabeleceu o legislador prazos peremptórios de curta duração para o exercício desse direito.
            No despacho reclamado considerou o Mm° Juiz que o recurso interposto era extemporâneo, tendo em conta a data do depósito do acórdão, porquanto foi a arguida regularmente notificada da data designada para a sua leitura e, não tendo comparecido, esteve representada pelo seu defensor.

            Esta é a regra quanto ao regime dos recursos, sendo o prazo de interposição do recurso de 20 dias (ou de 30 dias, se tiver por objecto a reapreciação da prova gravada), a contar do depósito da sentença na secretaria — artigo 411°, n.°s 1, al. b) e 4 do CPP.


            Todavia, na concreta situação dos autos, entendemos que assiste razão à reclamante. Vejamos.
As regras gerais sobre notificações encontram-se previstas no artigo 113º do CPP, onde no n.° 9 se contempla a obrigação de a sentença ser notificada ao arguido, ao assistente e às partes civis e, bem assim, ao seu advogado ou defensor; neste caso, o prazo para a prática de acto processual subsequente conta-se a partir da data da notificação efectuada em último lugar.
            Tal regra geral é compatível com o julgamento na ausência do arguido, nos termos do artigo 333° do CPP, pois, ainda que o arguido ausente seja representado pelo defensor na audiência (nº 6 que remete para o art. 334º, nº 4), a sentença é notificada ao arguido logo que seja detido ou se apresente voluntariamente, contando-se o prazo para a interposição de recurso a partir da notificação da sentença (n.°s 2, 3 e
5).


            No entanto, estabeleceu o legislador normas especiais - artigos
325°, n.°s 4 e 5, 332°, n.°s 5 e 6; 334°, n.°s 2 e 4 e 373°, n.° 2 do CPP - no que respeita à notificação da sentença proferida em audiência de julgamento, bastando a notificação da sentença ao defensor, e contando-se o prazo de interposição do recurso a partir do depósito na secretaria.


            Como preceitua o n.° 1 do artigo 332° do CPP
é obrigatória a presença do arguido na audiência, sem prejuízo do disposto nos n. 1 e 2 do artigo 333° e nos nºs 1 e 2 do artigo 334°. Acrescentando o nº 5 que se o arguido se afastar da sala de audiência, pode esta prosseguir até final se o arguido já tiver sido interrogado e o tribunal não considerar indispensável a sua presença, sendo para todos os efeitos representado pelo defensor.
            No caso vertente, a arguida e a sua Advogada estiveram presentes em audiência (cfr. acta de fls. 3) e, notificadas da data designada para a leitura do acórdão, a arguida faltou à audiência de 30-4-20 12, estando representada pela sua defensora, tendo o acórdão sido publicitado e depositado nessa data.
            Ora, como determina o nº 4 do artigo 372° do CPP, a leitura da sentença equivale à sua notificação aos sujeitos processuais que tenham estado ou devessem estar presentes em audiência. E, logo após a leitura da sentença, o presidente procede ao seu depósito na secretaria, nos termos do nº
5 do preceito. Estabelecendo ainda o nº 3 do artigo 373° que o arguido que não estiver presente considera-se notificado da sentença depois de esta ter sido lida perante o defensor nomeado ou constituído.


            Sobre esta concreta questão se pronunciou o TC nos Acórdãos n.°s 109/99,
545/03 e 483/2010, disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt, no sentido de “não julgar inconstitucional a norma do artigo 373°, n.° 3, conjugada com a do artigo 113°, n.° 9 do CPP, por entender que apesar de o arguido não ter estado presente na leitura da sentença, como tinha estado presente no julgamento, tinha tido conhecimento pessoal da data da leitura da sentença, nessa sessão estivera presente o seu defensor e a sentença fora depositada nesse dia, ele dispusera de todas as condições para conhecer o teor da sentença e o seu exacto conteúdo”.


            Por conseguinte, do ponto de vista formal, a arguida tinha-se por notificada na pessoa da sua defensora. E, ainda que a arguida tivesse sido notificada do teor do acórdão, posteriormente, como veio a acontecer, tal notificação não teria qualquer consequência, designadamente, não implicava um novo início do prazo de interposição de recurso.


            Porém, como resulta de fls. 19, não foi a arguida
apenas notificada, em 29-5-2012, “do conteúdo do acórdão proferido, cuja cópia se junta para lhe ser entregue neste ato”. Foi também a arguida notificada “De que para exercer o direito ao recurso do referido acórdão, deve contactar com a sua mandatária”.
            Logo, em coerência, e em obediência ao princípio da boa fé processual, tendo a arguida sido notificada nos termos em que o foi, o prazo de interposição de recurso deve ser contado desde a sua notificação
para exercer o direito ao recurso do referido acórdão.
            Em consequência, o recurso que a arguida interpôs do acórdão, em 15-6-2012, foi apresentado em tempo.
            Termos em que,
se decide deferir a reclamação, devendo ser admitido o recurso”.


           
14. Na sequência desta decisão foi o recurso admitido em primeira instância, seguindo a sua normal tramitação até ao presente momento.


III

1. Pese embora o teor da decisão da reclamação da arguida sobre a não admissão inicial do recurso em primeira instância, pelos fundamentos já aduzidos, certo é que aquela decisão de mandar admitir o recurso não vincula este Tribunal de Recurso, que terá que proceder à sua apreciação. Isto mesmo é o que nos diz o artigo 405º, nº 4, do Código de Processo Penal:

“4- A decisão do presidente do tribunal superior é definitiva quando confirmar o despacho de indeferimento. No caso contrário, não vincula o tribunal de recurso”.

2. E sem desprimor para a douta decisão que mandou subir o recurso, entendemos que andou bem o tribunal de primeira instância ao não admitir, por extemporâneo, o recurso em causa, no caso concreto.

Diga-se que partilhamos todo o teor da decisão que apreciou a reclamação até ao ponto em que excepciona o caso concreto, o mesmo é dizer que merece toda a nossa concordância, quando aí se afirma:

            “No caso vertente, a arguida e a sua Advogada estiveram presentes em audiência (cfr. acta de fls. 3) e, notificadas da data designada para a leitura do acórdão, a arguida faltou à audiência de          30-4-20 12[1], estando representada pela sua defensora, tendo o acórdão sido publicitado e depositado nessa data.
            Ora, como determina o nº 4 do artigo 372° do CPP, a leitura da sentença equivale à sua notificação aos sujeitos processuais que tenham estado ou devessem estar presentes em audiência. E, logo após a leitura da sentença, o presidente procede ao seu depósito na secretaria, nos termos do nº
5 do preceito. Estabelecendo ainda o nº 3 do artigo 373° que o arguido que não estiver presente considera-se notificado da sentença depois de esta ter sido lida perante o defensor nomeado ou constituído.


            Sobre esta concreta questão se pronunciou o TC nos Acórdãos n.°s 109/99,
545/03 e 483/2010, disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt, no sentido de “não julgar inconstitucional a norma do artigo 373°, n.° 3, conjugada com a do artigo 113°, n.° 9 do CPP, por entender que apesar de o arguido não ter estado presente na leitura da sentença, como tinha estado presente no julgamento, tinha tido conhecimento pessoal da data da leitura da sentença, nessa sessão estivera presente o seu defensor e a sentença fora depositada nesse dia, ele dispusera de todas as condições para conhecer o teor da sentença e o seu exacto conteúdo”.
            Por conseguinte, do ponto de vista formal, a arguida tinha-se por notificada na pessoa da sua defensora.
E, ainda que a arguida tivesse sido notificada do teor do acórdão, posteriormente, como veio a acontecer, tal notificação não teria qualquer consequência, designadamente, não implicava um novo início do prazo de interposição de recurso[2].

            3. Em abono desta posição se pronuncia Paulo Pinto de Albuquerque in Comentário do Código de Processo Penal, 2ª Edição, em anotação ao artigo 373º, fls. 940, quando sintetiza:

            “Assim, a disposição do artigo 373º, nº 3, constitui uma norma complementar do regime de notificação previsto pelos artigos 113º,. Nº9, 333º, nºs 1, 2 e 5, 334º, nºs 2 e 4, 332º, nºs 5 e 6 e 325º, nºs 4 e 5. Conjugando estas disposições com o artigo 373, nº 3, à luz da tese minimalista do TC, podem verificar-se os seguintes casos:

            a) O arguido esteve presente na audiência, mas somente na leitura da sentença ou acórdão (com ou sem justificação) e o seu defensor esteve presente na leitura da sentença ou acórdão: o arguido e o defensor devem considerar-se notificados e o prazo para notificação do recurso inicia-se com a notificação ao defensor”.

            Oportuna se afigura a interpretação que desta posição é feita no Código de Processo Penal, Comentários e Notas, dos Magistrados do Ministério Público do Distrito Judicial do Porto, Coimbra editora, quando a fls. 949 se afirma:

            “Já Paulo Pinto de Albuquerque, ob. cit., entende que “a decisão de interposição do recurso é, com efeito, uma decisão jurídica, que não só não está reservada pessoalmente ao arguido, como compete obrigatoriamente ao defensor (art. 64º, nº 1, al. d)…pelo que todas as garantias de defesa, incluindo o direito ao recurso, estão asseguradas quando se procede à notificação da sentença apenas ao defensor mas o arguido esteve na audiência de julgamento (art. 373º, nº3 ) e, mesmo que ele não tenha estado na audiência de julgamento, quando dela se ausentou voluntariamente  ou foi afastado devido a uma sua conduta voluntária (artigos 325º, nºs 4 e 5 e 332 nºs 5 e 6) ou quando pediu que a audiência tivesse lugar na sua ausência (artigo 334º,  nºs 2 e 4). Nestes casos, o arguido é representado para todos os efeitos legais pelo seu defensor, incluindo para os efeitos da notificação da sentença penal, fixando-se o início do prazo legal para o recurso na data da notificação do defensor. O conjunto normativo fixado nos artigos 373º, nº 3, 332 nºs 5 e 6 e 334º,  nºs 2 e 4 do CPP interpretado neste sentido, não viola, pois, a Constituição da República”.

            E efectivamente no ac. do Tribunal Constitucional nº 489/2008, in DR II Série, de 11 de Novembro, é fixada a seguinte jurisprudência”.

            “Não são inconstitucionais as normas dos artigos 373º, nº 3 e 113º, nº 9, do CPP, quando interpretadas no sentido de que tendo estado o arguido presente na primeira audiência de julgamento, onde tomou conhecimento da data da realização da segunda, na qual, na sua ausência e na presença do primitivo defensor foi designado dia para a leitura da sentença, deve considerar-se que a sentença foi notificada ao arguido no dia da sua leitura, na pessoa do defensor então nomeado”.

            5. Apontando todas as leituras do disposto do artigo 373º, nº 3, do CPP de que a arguida se deve considerar notificada do teor do acórdão no dia da sua efectiva leitura presente a ilustre mandatária da mesma (sua defensora) e, consequentemente, iniciando-se o prazo para a interposição do recurso a contar daquela data (de notificação), cumpre agora questionar se o acto da notificação à arguida do teor da dita sentença que a secretaria oficiosamente entendeu levar a cabo, introduz alguma alteração na contagem do respectivo prazo de interposição de recurso.

            Entende-se que não, pelas seguintes razões:

            - Os prazos de interposição de recurso são prazos legais peremptórios, que não podem ser alterados por mero arbítrio quer do juiz quer de funcionário judicial.

            - A notificação que em 3.5.2012 a secretaria do tribunal solicitou à entidade policial (comando da PSP de Coimbra), da arguida A (...) do conteúdo do acórdão, trata-se de um acto facultativo, não obrigatório por lei, que em nada, de per si, altera o prazo legal de recurso.

- O facto de em tal notificação, para além do normal teor do acórdão ter sido incluída a menção  “De que para exercer o direito de recurso do referido acórdão deve contactar com a sua mandatária”, não induz em erro nem coloca em causa qualquer princípio da boa fé processual da arguida.

- Desde logo, porque é uma afirmação não só óbvia – que de resto a arguida já deveria saber -, como inócua quanto à posição processual que a arguida poderia e deveria adoptar, pois a sua defensora existe no processo exactamente para essas funções inerentes à defesa dos seus direitos.

- Mas essencialmente, porque a natureza em si, de tal expressão, não induz em erro nem a boa fé processual da arguida quanto ao real e efectivo prazo de interposição do recurso.

Quanto a este, a notificação nada diz, nada refere nem insinua, como poderia acontecer nomeadamente com a inserção da expressão de que “poderia recorrer no prazo “X” ou a partir desta sua notificação”.

- Acresce ainda que a notificação da arguida do teor da sentença foi solicitada pela secretaria em 3.5.2012, ou seja, numa data e momento em que estava a decorrer o prazo de interposição de recurso.  Pelo que a inserção da informação “De que para exercer o direito de recurso do referido acórdão deve contactar com a sua mandatária”, até fazia ainda sentido, naquele momento. Como o fez (fazia), no momento exacto em que foi notificada, em 29.5.2012, pois em termos legais, o direito ao recurso apenas terminou no dia 30.5.2012[3].

- Perante toda esta problemática atinente a esta notificação não obrigatória da arguida com a inserção da referenciada informação de consulta da sua mandatária, caberá com certeza perguntar qual afinal o papel exacto da ilustre mandatária!

Sabendo-se que tinha havido a leitura da sentença à qual esteve presente (a mandatária); que a lei considera a arguida notificada de tal sentença, por força do artigo 373º, nº 3, do CPP; que o prazo máximo de recurso é de 20 ou de 30 dias consoante se recorra só de direito ou também da matéria de facto; estaria a ilustre mandatária à espera de que prazo para interpor recurso?

E se a dita notificação de 3.5.2012 não tivesse existido?

E se porventura esta notificação só tivesse ocorrido dois ou três meses depois?

E se tal notificação (da carta enviada pela secretaria) ainda nem sequer se tivesse concretizado por qualquer motivo imputável à arguida por se ter ausentado para parte incerta ou mesmo por motivo imputável a qualquer entidade policial ou mesmo do tribunal?

Significaria toda esta situação que ainda não tinha decorrido o prazo de interposição de recurso?

Com certeza que não. A resposta óbvia seria a de que a arguida estava notificada e o prazo teria começado a contar-se a partir da leitura da sentença e consequente depósito.

6. É esta, de facto, a interpretação correcta e mais consentânea com todo o processado dos autos. Apesar da notificação feita pela secretaria à arguida do teor do acórdão, tal notificação em nada alterou o decorrer do prazo de recurso que já se tinha iniciado após a leitura daquele. Esta diligência foi um acrescento ao legalmente exigido ou legalmente obrigatório, que não contende nem pode contender com as normais regras de notificação e consequente contagem dos prazos para a prática dos actos, incluindo o do recurso.

A não se considerar legal a notificação da arguida e a contagem do prazo de interposição do recurso com a leitura da sentença (acórdão) na data designada e conhecida da mesma, estaria encontrada a “fuga perfeita” para obstar ao andamento e celeridade processual, quando o espírito legislativo com esta alteração foi precisamente o oposto.

A esta regra e entendimento não pode atender-se a este “incidente” anómalo considerado na apreciação da reclamação, na medida em que, conforme demonstrado, não tem nem teve o mesmo virtualidade de induzir em erro nem a arguida nem muito menos a sua ilustre mandatária, sobre o real prazo (início e fim), para a interposição do recurso, nomeadamente de que tal prazo apenas se contaria a partir daquela notificação.

A inserção ou não inserção de tal conteúdo, em nada interfere com o prazo efectivo e legal da interposição do recurso, sobre o qual não é feita qualquer referência. Pelo que a sua contagem apenas pode obedecer às normas aplicáveis sobre o mesmo. E o teor desta notificação não faz nem poderia fazer, parte dessas regras.

           


IV

            DECISÃO

Por todo o exposto, decide-se rejeitar o recurso não se tomando conhecimento do mesmo por se considerar interposto já depois do prazo legalmente admissível para o efeito.

Sem custas, dado o circunstancialismo que motivou a admissão e subida do recurso em primeira instância.

Coimbra, 10.4.2013”.


C)

1. A reclamação da recorrente nada acrescenta ou trás de novo ao já decidido na decisão sumária.

Na reclamação a ilustre mandatária afirma que estava à espera da posição da sua cliente, a arguida, para decidir se deveria ou não interpor recurso. Que “estava à espera não de um qualquer prazo mas da indicação por parte da arguida da sua vontade ou não de recorrer do acórdão condenatório”.

“Para tanto e porque não conseguiu contactar a arguida, aguardou que esta a contactasse para o efeito”.

2. Merecendo o nosso respeito estas considerações da recorrente, não nos parece todavia que a relação entre mandatário e mandante tenha qualquer interferência, a não ser numa situação excepcional, que não é o caso, no normal decurso do prazo que estiver a correr para a prática de qualquer acto.

Como se decidiu na “decisão sumária”, o que está essencialmente em causa é o momento da notificação legal da recorrente do teor da sentença. E este prazo iniciou-se com a leitura e depósito da dita sentença apesar de a arguida não se encontrar presente, cuja falta foi considerada injustificada.

Quanto ao demais e ao teor da notificação facultativa que a secção entendeu fazer sem qualquer despacho judicial nesse sentido, da decisão à arguida, já foi dito o que havia para dizer, aqui se realçando que, se por mera hipótese, neste momento, por qualquer motivo, tal notificação não se tivesse ainda “concretizado”[4], teoricamente a decisão não teria transitado em julgado e o processo estaria a aguardar para que efeitos? Que a ilustre mandatária conseguisse contactar com a sua cliente, a arguida?

3. Pelo exposto, somos de reafirmar aqui o que já se fez na decisão sumária, dizendo o seguinte:

“É esta, de facto, a interpretação correcta e mais consentânea com todo o processado dos autos.           Apesar da notificação feita pela secretaria à arguida do teor do acórdão, tal notificação em nada alterou o decorrer do prazo de recurso que já se tinha iniciado após a leitura daquele. Esta diligência foi um acrescento ao legalmente exigido ou legalmente obrigatório, que não contende nem pode contender com as normais regras de notificação e consequente contagem dos prazos para a prática dos actos, incluindo o do recurso.

A não se considerar legal a notificação da arguida e a contagem do prazo de interposição do recurso com a leitura da sentença (acórdão) na data designada e conhecida da mesma, estaria encontrada a “fuga perfeita” para obstar ao andamento e celeridade processual, quando o espírito legislativo com esta alteração foi precisamente o oposto.

A esta regra e entendimento não pode atender-se a este “incidente” anómalo considerado na apreciação da reclamação, na medida em que, conforme demonstrado, não tem nem teve o mesmo virtualidade de induzir em erro nem a arguida nem muito menos a sua ilustre mandatária, sobre o real prazo (início e fim), para a interposição do recurso, nomeadamente de que tal prazo apenas se contaria a partir daquela notificação.

A inserção ou não inserção de tal conteúdo, em nada interfere com o prazo efectivo e legal da interposição do recurso, sobre o qual não é feita qualquer referência. Pelo que a sua contagem apenas pode obedecer às normas aplicáveis sobre o mesmo. E o teor desta notificação não faz nem poderia fazer, parte dessas regras”.

4. Terminamos dizendo o seguinte:

Os contactos e relação processual entre mandatária e mandante, neste aspecto, é uma questão que ultrapassa a intervenção do tribunal. Mas sempre se dirá que tinha a arguida ora recorrente, perfeito conhecimento que a sentença era lida na data designada e da qual (data) estava legalmente notificada.

Por sua vez, não constitui justificação o alegado pela ilustre mandatária de que não conseguiu contactar com a sua cliente. Outrossim se nos afigura indiciar-se um certo desinteresse, pelo menos da parte da recorrente arguida, quanto ao desenrolar do seu processo, deixando passar praticamente um mês sem sequer mostrar interesse junto da sua mandatária para saber do resultado do seu julgamento, ou seja, o teor da sentença![5].

5. Decisão

Por todo o exposto, decide-se manter o teor da decisão sumária não se tomando conhecimento do recurso por se considerar interposto já depois do prazo legalmente admissível para o efeito.

Custas a cargo da recorrente com a taxa de justiça que se fixa em 4 (quatro) Ucs.

            (Relator, Luís Teixeira)

            (Adjunto, Calvário Antunes)


[1] Falta esta que foi considerada injustificada.
[2] Negrito da nossa autoria.

[3] Acrescentamos agora que a recorrente ainda poderia fazer uso do prazo excepcional dos nºs 4 e 5 do art. 145º, do CPP, aqui aplicável subsidiariamente.  

[4] Como se afirma na decisão sumária:

Sabendo-se que tinha havido a leitura da sentença à qual esteve presente (a mandatária); que a lei considera a arguida notificada de tal sentença, por força do artigo 373º, nº 3, do CPP; que o prazo máximo de recurso é de 20 ou de 30 dias consoante se recorra só de direito ou também da matéria de facto; estaria a ilustre mandatária à espera de que prazo para interpor recurso?

E se a dita notificação de 3.5.2012 não tivesse existido?

E se porventura esta notificação só tivesse ocorrido dois ou três meses depois?

E se tal notificação (da carta enviada pela secretaria) ainda nem sequer se tivesse concretizado por qualquer motivo imputável à arguida por se ter ausentado para parte incerta ou mesmo por motivo imputável a qualquer entidade policial ou mesmo do tribunal?

Significaria toda esta situação que ainda não tinha decorrido o prazo de interposição de recurso?

Com certeza que não. A resposta óbvia seria a de que a arguida estava notificada e o prazo teria começado a contar-se a partir da leitura da sentença e consequente depósito.

[5] Isto tendo como certo o afirmado pela ilustre mandatária de que não conseguiu contactar com a sua cliente.