Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1/06.5IDGRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CALVÁRIO ANTUNES
Descritores: GRAVAÇÃO DEFICIENTE
MOMENTO DE ARGUIÇÃO DA NULIDADE
Data do Acordão: 06/01/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: FORNOS DE ALGODRES
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Legislação Nacional: ARTIGOS 122º, 363º, 364º CPP, ARTIGO 9.º, DO DECRETO-LEI 39/95 DE 15/2
Sumário: A falta de gravação ou a gravação deficiente dos depoimentos prestados oralmente em audiência constitui nulidade a invocar no decurso do prazo de recurso da sentença, pois só com a prolação desta, surge na esfera jurídica dos sujeitos processuais por ela afectados, o direito ao recurso, designadamente se o seu objecto for a reapreciação da prova gravada.
Decisão Texto Integral: I. Relatório:

Nos presentes autos de processo comum, com intervenção de tribunal singular, o ministério Publico acusou:
- MG..., casado, e residente em … Fornos de Algodres,
- IK..., casado, e residente em … Fornos de Algodres,
- TT…, Lda., Fornos de Algodres,
imputando-lhes a prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, nº2 e 79º do Código Penal, sendo a sociedade arguida ainda por referência ao disposto nos artigos 7º e 12º do RGIT e de um crime de frustração de créditos do artigo 88º, nº1 do RGIT.
***
Efectuado o julgamento foi proferida a seguinte decisão:
I – quanto ao arguido MG...:
a) absolver o mesmo da prática de um crime de frustração de créditos do artigo 88º, nº1 do RGIT;
b) condenar o mesmo pela prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, nº2 e 79º do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão;
c) suspender a execução da pena de prisão aplicada pelo período de 4 (quatro) anos na condição deste, em idêntico período, proceder ao pagamento das prestações tributárias em falta, no montante de €144.665,23 e acréscimos legais nesse período, à taxa em vigor, indiciando-se a contagem deste prazo após trânsito da presente condenação;
d) condenar o mesmo nas custas do processo que se fixam em 3 (três) UCs.
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II– quanto ao arguido IK...:
a) absolver o mesmo da prática de um crime de frustração de créditos do artigo 88º, nº1 do RGIT;
b) condenar o mesmo pela prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, nº2 e 79º do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão;
c) suspender a execução da pena de prisão aplicada pelo período de 4 (quatro) anos na condição deste, em idêntico período, proceder ao pagamento das prestações tributárias em falta, no montante de €144.665,23 e acréscimos legais nesse período, à taxa em vigor, indiciando-se a contagem deste prazo após trânsito da presente condenação;
d) condenar o mesmo nas custas do processo que se fixam em 3 (três) UCs.
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III – quanto à sociedade TT... – LDA.
a) absolver a mesma da prática de um crime de frustração de créditos do artigo 88º, nº1 do RGIT;
b) condenar a mesma pela prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105º do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, nº2 e 79º do Código Penal, por referência ao disposto nos artigos 7º e 12º do RGIT, na pena de 500 (quinhentos) dias de multa à taxa diária de €5,00, no total de €2.500,00;
d) condenar a mesma nas custas do processo que se fixam em 3 (três) UCs.
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2. Não concordando com a decisão proferida, vieram quer o arguido MG..., a fls. 984/1008 e depois 1078/1102, quer o arguido IK... (fls. 1012/1069), interpor recurso da mesma.
Assim,
2.1. O arguido MG..., formulou nas respectivas motivações, as seguintes (transcritas) conclusões:

“1°
O arguido IK... nunca exerceu qualquer acto de gerência na sociedade arguida, cabendo esta única e exclusivamente ao recorrente.

É nula a Audiência de Julgamento nos termos do art. 363º do C.P.P., por a gravação ela mesma, ser em diversas partes imperceptível, restringindo, desta feita, o direito de recurso do arguido, consagrado no art. 32, n.º 1 da C.R.P.

O arguido não se apropriou do valor apurado a título de IVA referido nos pontos 13 e 14 da matéria de facto dada como provada, nem, consequentemente, a fez reverter em seu proveito próprio, nem no da sociedade arguida.

Na verdade, arguido, na qualidade de sócio-gerende da TT... _ Lda., nunca procedeu à venda dos veículos elencados nos pontos 21, 22 e 23 da matéria de facto dada como provado.

Do mesmo modo, também não recebeu qualquer tipo de pagamento na concretização dos negócios acima referidos, nomeadamente, no negócio que envolveu a aquisição por parte da W... do imobilizado do qual era detentora a sociedade arguida.

Na verdade, os veículos nunca chegaram a entrar na sua esfera jurídica do arguido, pois, encontravam-se sujeitos a um contrato de Leasing, cujo locador era a X...

O que sucedeu foi apenas um acerto de contas que envolveu terceiros, neste caso, a sociedade proprietária do imobilizado, a X..., não sendo, deste modo, retido qualquer valor a título de IVA.

Não existe qualquer documento, nomeadamente, nenhuma factura, que prove que a arguida tenha vendido os bens à W....

Apenas existe registos da contabilidade, embora incompleta, encontrada nos computadores da sociedade arguida, e contas correntes, não valendo estes como factura, pois apenas reflectem movimentos contabilísticos e não vendas nas quais tenha sido retido IVA.
10º
A contabilidade da sociedade arguida encontrava-se completamente desorganizada, sendo apenas reconstituída até Agosto de 2004, pelo que seria impossível apurar-se, sem dúvida inultrapassável, o montante devido a título de IVA nos períodos elencados no ponto 13 da matéria de facto dada como provada, sem recorrer a métodos indiciários.
11º
Desta forma, é nula, quanto a esses factos, a sentença por violação das normas que proíbem a utilização de métodos indiciários em sede de direito Penal.
12º
Em tudo o que se concluiu até agora, o mesmo se aplica quanto aos pontos 24 e 25 da matéria de facto dado como provada.
13º
De facto, o arguido, na qualidade de sócio gerente da TT..., nunca procedeu à venda do imobilizado Supra citado à Y....
14º
Também nunca receberam qualquer quantia relativa a esse negócio, como se pode comprovar pelo facto de não existir nos autos qualquer título de pagamento feito por parte da Y... à TT...,
15º
Na realidade, os veículos nem sequer eram propriedade da sociedade arguida, sendo antes aquela da locadora financeira BES Leasing, pelo que não seria possível vender um bem que não lhe pertencia.
16º
O que sucedeu foi que a Y... liquidou a dívida existente da TT... para com a locadora financeira, passando a ser aquela proprietária dos veículos em questão, não havendo, neste particular, lugar ao pagamento de IVA.
17º
O mesmo de dirá do negócio com a JT..., referido nos pontos 26 e 27 da matéria de facto dada como provada.
18º
O arguido, na qualidade de sócio gerente da TT..., nunca vendeu os semi-reboques referidos nos pontos supra citados à JT....
19º
Na verdade, os veículos tinham reserva de propriedade a favor da JT..., pelo que seria impossível serem vendidos à sociedade que era, ela mesma, proprietária, até integral pagamento dos mesmos, o que não sucedeu.
20º
Consequentemente, não foi retido qualquer valor a título de IVA.
21º
Nestes termos, não tendo sido retido qualquer valor a título de IVA nas vendas referidas nos pontos 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 da matéria de facto dada como provada, e, sendo o restante montante de imposto devido apurado com recurso a métodos indiciários, impõe-se a absolvição do arguido.
22º
A douta Sentença violou os artigos 32º, n.º1 da C. R. P., 363º do C.P.P.

Termos em que deve ser dado integral provimento ao presente recurso:
-declarando-se nula a Audiência de Julgamento por violação do artigo 363º do C.P.P
- absolvendo-se o arguido da prática em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança p.p. pelo art. 105º do R.G.I.T., aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 26º, 30º, n.º2 e 79º do Código Penal,
Como é de JUSTIÇA ”

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2.2. Por sua vez, o arguido IK..., formulou nas respectivas motivações, as seguintes (transcritas):

“1) É nula a Audiência de Julgamento nos termos do art. 363º do C.P.P., por a gravação da mesma, ser em diversas partes imperceptível, restringindo, desta feita, o direito de recurso do arguido, consagrado no art. 32, n.º 1 da C.R.P.
2) O artº. 95º da lei nº 53-A/2006, de Dezembro, alterou o artº. 105º, nº 4, do R.G.I.T., aditando-lhe a alínea b), de tal modo que, enquanto na redacção primitiva a não entrega da prestação tributária (mesmo que declarada) dentro do prazo de 90 dias a contar do prazo legal da entrega da referida prestação, configurava, sem mais, uma infracção criminalmente punível, já face à Lei nova [al. b) do nº 4 do art.º 105º] uma tal omissão de entrega da prestação durante o referido prazo de 90 dias, deixou de constituir uma infracção criminalmente punível.
3) O artº. 95º da lei nº 53-A/2006 é uma lei despenalizadora, dado que retirou a qualificação de infracção criminalmente punível a factos que, segundo a lei antiga, eram considerados criminalmente puníveis.
4) A conclusão impõe-se, quer a "exigência" constante da al. b) seja qualificada como condição objectiva de punibilidade, quer como elemento do tipo de ilícito do crime de abuso de confiança fiscal - entendimento sustentado pelo Prof. Taipa de Carvalho, com o qual se concorda (neste sentido Prof Taipa de Carvalho e Ex.ma Senhora Doutora Juíza Desembargadora Isabel Pais Martins - obra e Ac. citados).
5) Por tal motivo, a douta decisão recorrida deveria ter absolvido o co-arguido IK... e, não o tendo feito, violou o artº. 105º, nºs. 1 e 4, als. a) e b), do R.G.I.T. e arts, 2º, nº 2, do C.P ..
6) Acresce ainda que o arts. 95º da lei nº 53-A/2006, que acrescentou a al. b) do nº 4 do artº. 105º do R.G.I.T., modificou o tipo de ilícito e conforme já foi referido introduziu uma nova condição de punibilidade:
"4.- Os factos descritos nos números anteriores só são puníveis se:
a. Tiverem decorrido mais de 90 dias sobre o termo do prazo legal da entrega da prestação;
b. A prestação comunicada à administração tributária através da correspondente declaração não for paga, acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após a notificação para o efeito".
7) Ora no caso sub-judice, o sujeito passivo não cumpriu a obrigação de comunicação à administração tributária, os valores foram apurados no âmbito de uma acção inspectiva.
8) Assim sendo, e considerando a modificação legislativa operada como uma lei despenalizadora, a mesma é aplicável às actuações/omissões ocorridas antes da sua entrada em vigor - como expressamente decorre do nº 2 do artº. 2º do CP ..
9) A sentença recorrida não contém os elementos que, em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos, permitam a um leitor atento e minimamente experiente ficar ciente da lógica do raciocínio seguido pelo Tribunal e das razões da sua convicção. Designadamente,
10) Como não contém, ainda que de forma sintética, o exame crítico dos documentos e em que termos é que os mesmos relevaram para a determinação da matéria de facto provada e da matéria de facto não provada.
11) A ausência do processo lógico e racional seguido pela sentença recorrida na apreciação da prova, consubstancia a violação do disposto no art.º 374º, nº 2, do CP.P., o que acarreta a nulidade da sentença, nos termos do artº. 379º, nº 1, al. a) do CP.P. - que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos.
12) E como tal vício decorre do texto da decisão recorrida, a decisão proferida é nula, nos termos do artº. 410º, nº 2, al. b), do C.P.P., além de que a matéria dada como provada era insuficiente para a decisão condenatória proferida - o que igualmente acarretaria a nulidade, por força do disposto no artº. 410º, nº 2, al. a), do C.P.P ..
13) A prova produzida em audiência não foi devidamente valorada, sendo certo que se a mesma tivesse sido apreciada segundo os cânones subjacentes ao artº. 127º do C.P.P., seguramente que a materialidade fáctica dada como provada teria sido bem diferente.
14) O recorrente, no que a si respeita, entende que os factos constantes dos pontos 1, 2, 5 a 29 dos factos provados foram incorrectamente julgados e que toda a prova documental e testemunhal impunha que devia ter sido dada outra resposta a tais factos, pelo que incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento.
15) E no que toca ao exercício da função de gerência, toda a prova evidencia, de modo claro e manifesto, que quem administrava, praticava actos, celebrava negócios, procedia a pagamentos e recebimentos e controlava os fluxos financeiros, não era o ora Recorrente, o qual apenas era gerente de direito - a própria sentença o afirma de modo claro e inequívoco.
16) Sem prejuízo do que adiante se dirá quanto a este aspecto, reafirma-se que, com o devido respeito por opinião contrária, o Tribunal "a quo" incorreu em erro de julgamento ao dar como provados, no que tange ao ora recorrente, os factos constantes dos pontos 1, 2, 5 a 29 dos factos provados, pois os meios de prova referidos e a sua valoração crítica e reflexiva de acordo com as regras da experiência, impunham uma resposta diferente, no sentido de que o recorrente não poderia ser responsabilizado por tais factos, dado que a gerência efectiva era apenas exercida pelo arguido MG....
17) Foi o Recorrente IK... condenado, não por ter praticado qualquer facto, mas por saber que o gerente de facto não cumpriu as obrigações tributárias, nada tendo feito.
18) O Recorrente, como decorre da sentença, foi condenados pela comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria; mas para que ela exista, é essencial que haja uma decisão conjunta com vista à obtenção de um determinado resultado, e uma execução igualmente conjunta, sendo necessária, para ser definida uma decisão conjunta, a existência da consciência e da vontade de colaboração de uns com os outros na realização de um tipo de crime.
19) Nenhuma prova foi feita sobre qualquer decisão ou execução conjunta, bem como da existência da consciência e da vontade de colaboração do recorrente na realização do crime pelo qual foi condenados, pelo que o mesmo não podia ter sido condenado por actos de que não é autor nem co-autor.
20) O arguido não se apropriou do valor apurado a título de IVA referido nos pontos 13 e 14 da matéria de facto dada como provada, nem, consequentemente, a fez reverter em seu proveito próprio, nem no da sociedade arguida.
21) Assim e em jeito de conclusão, salvo melhor opinião houve erro de julgamento ao ter o douto Aresto Recorrido dado como provados os factos constantes nos pontos 10.º a 20.º, uma vez que a certeza exigível para serem considerados tais factos como provados não existiu.
22) Limitando-se o Tribunal “a quo” a aderir a um relatório inspectivo que nem a representante da Administração Tributária conseguiu sustentar.
23) Na verdade, arguido, na qualidade de sócio-gerende da TT... _ Transportes Rodoviários, lda., nunca procedeu à venda dos veículos elencados nos pontos 21, 22 e 23 da matéria de facto dada como provado.
24) Do mesmo modo, também não recebeu qualquer tipo de pagamento na concretização dos negócios acima referidos, nomeadamente, no negócio que envolveu a aquisição por parte da W... do imobilizado do qual era detentora a sociedade arguida.
25) Na verdade, os veículos nunca chegaram a entrar na sua esfera jurídica do arguido, pois, encontravam-se sujeitos a um contrato de Leasing, cujo locador era a X....
26) O que sucedeu foi apenas um acerto de contas que envolveu terceiros, neste caso, a sociedade proprietária do imobilizado, a X..., não sendo, deste modo, retido qualquer valor a título de IVA.
27) Não existe qualquer documento, nomeadamente, nenhuma factura, que prove que a arguida tenha vendido os bens à W....
28) Apenas existe registos da contabilidade, embora incompleta, encontrada nos computadores da sociedade arguida, e contas correntes, não valendo estes como factura, pois apenas reflectem movimentos contabilísticos e não vendas nas quais tenha sido retido IVA.
29) A contabilidade da sociedade arguida encontrava-se completamente desorganizada, sendo apenas reconstituída até Agosto de 2004, pelo que seria impossível apurar-se, sem dúvida inultrapassável, o montante devido a título de IVA nos períodos elencados no ponto 13 da matéria de facto dada como provada, sem recorrer a métodos indiciários.
30) Desta forma, é nula, quanto a esse factos, a sentença por violação das normas que proíbem a utilização de métodos indiciários em sede de direito Penal.
31) Em tudo o que se concluiu até agora, o mesmo se aplica quanto aos pontos 24 e 25 da matéria de facto dado como provada.
32) De facto, o arguido, na qualidade de sócio gerente da TT..., nunca procedeu à venda do imobilizado supra citado à Y....
33) Também nunca receberam qualquer quantia relativa a esse negócio, como se pode comprovar pelo facto de não existir nos autos qualquer título de pagamento feito por parte da Y... à TT....
34) Na realidade, os veículos nem sequer eram propriedade da sociedade arguida, sendo antes aquela da locadoa financeira BES leasing, pelo que não seria possível vender um bem que não lhe pertencia.
35) O que sucedeu foi que a Y... liquidou a dívida existente da TT... para com a locadora financeira, passando a ser aquela proprietária dos veículos em questão, não havendo, neste particular, lugar ao pagamento de lVA.
36) O mesmo de dirá do negócio com a JT..., referido nos pontos 26 e 27 da matéria de facto dada como provada.
37) O arguido, na qualidade de sócio gerente da TT..., nunca vendeu os semi-reboques referidos nos pontos supra citados à JT....
38) Na verdade, os veículos tinham reserva de propriedade a favor da JT..., pelo que seria impossível serem vendidos à sociedade que era, ela mesma, proprietária, até integral pagamento dos mesmos, o que não sucedeu.
39) Consequentemente, não foi retido qualquer valor a título de IVA.
40) Nestes termos, não tendo sido retido qualquer valor a título de IVA nas vendas referidas nos pontos 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27 da matéria de facto dada como provada, e, sendo o restante montante de imposto devido apurado com recurso a métodos indiciários, impõe-se a absolvição do arguido.
41) O Tribunal "a quo", pelas razões aduzidas e tal como decorre do texto da sentença, condenou o ora recorrente apenas por ser "gerente de direito".
42) Tendo em conta o disposto nos artºs. 6º e 105º do RGIT e em especial o artº. 26º do C.P. e a doutrina que lhe está subjacente, é autor todo aquele que, com o seu comportamento, dá causa à realização de um crime praticando actos idóneos a causar o resultado.
43) O recorrente não tomou parte directa na execução dos factos, por acordo ou juntamente com outros, pelo que, ao contrário do afirmado pela douta sentença recorrida, não há co-autoria.
44) O recorrente, apesar de figurar como gerente de direito, não exerceu efectivamente ou de facto os poderes correspondentes a essa qualidade.
45) Não tendo praticado actos na qualidade de gerente, não pode ser responsabilizado criminal ou civilmente pelos actos praticados pela gerência efectiva ou de facto de outrem.
46) Aliás, a douta decisão recorrida, reconhecendo que o ora recorrente não exerceu a gerência efectiva, a fls. 13 consignou: "Ora face a tais circunstâncias e ao conhecimento da situação da empresa do arguido, conclui-se que o arguido IK...não poderia deixar de saber que as declarações não estavam a ser enviadas e que o imposto não estava a ser liquidado (…).
47) Implicitamente nesta afirmação está a certeza que a sua responsabilidade advém apenas do facto de ser gerente de direito.
48) Com o devido respeito, o Tribunal "a quo" não procedeu a uma adequada interpretação e aplicação da lei.
49) É um facto que o R.G.I.T. alterou, de forma significativa, o tipo legal de crime de abuso de confiança fiscal, relativamente ao que a esse propósito dispunha o R.J.I.F.N.A.
50) Hoje a conduta incriminadora consiste na mera não entrega à Administração Fiscal, dentro de determinado prazo, das quantias pecuniárias envolvidas.
51) Assim, quem adoptou a conduta criminalmente punível; quem não entregou à Administração Fiscal as quantias pecuniárias deduzidas, foi apenas e só aquele arguido MG....
52) O ora recorrente, não exercendo a gerência efectiva (dado que a mesma era exercida pelo co-arguido MG...), não poderá ser responsabilizado (como decorre do artº. 6º do R.G.I.T.), dado que o mesmo não agiu voluntariamente como titular de um órgão, membro ou representante de uma pessoa colectiva.
53) É um facto que sobre quem actua em representação de uma sociedade (por via de regra, os gerentes), impende o dever legal de cumprir as obrigações tributárias.
54) Mas também é pacífico na doutrina e na jurisprudência que a responsabilidade dos gerentes ocorre apenas quando os mesmos exerçam efectivamente a gerência.
55) A seguir-se o entendimento vertido na decisão recorrida, seria absolutamente inútil a distinção entre o "gerente de facto" e o mero "gerente formal e/ou de direito".
56) O Tribunal "a quo" inculca a ideia de ter existido comparticipação criminosa para, desse modo, responsabilizar criminalmente o recorrente.
57) Mas, com o devido respeito por melhor opinião e como se referiu supra, para que ocorra comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria, é essencial que haja uma decisão conjunta com vista à obtenção de um determinado resultado, e uma execução igualmente conjunta, sendo necessária, para ser definida uma decisão conjunta, a existência da consciência e da vontade de colaboração de uns com os outros na realização de um tipo de crime.
58) Da factualidade provada não se evidencia a existência de qualquer decisão conjunta, nem a existência de consciência e de vontade de colaboração do arguido IK...com o arguido MG...na realização do crime pelo qual foi condenado.
Assim,
59) Deveria o ora recorrente ter sido absolvido do crime pelo qual se encontrava acusado, ou seja, como co-autor do crime de abuso de confiança fiscal.
60) Ao decidir de modo diverso, o Tribunal "a quo" violou, além de outros, o disposto nos artºs.105º, 6º-1 e 7º-3 do R.G.I.T., artºs.l0º e 26º do C.P. e artº. 24º da L.G.T.
61) Cotejando o plasmado na douta sentença ora recorrida nomeadamente a fls. 23 do aresto e no que toca ao Arguido IK...verifica-se que a Meretíssima Juiz do Tribunal a quo considera dois factores, no Âmbito do n.º 2 do Art. 70.º do Código Penal que não deveria ter sido considerados como depoentes contra o Arguido. A saber
62) Aquando da prática dos factos, o Arguido ainda não tinham sido condenado pelos crimes constantes no Ponto 35.º da matéria assente.
63) De facto, as condenações transitaram em julgado em 05.01.2005 e 04.07.2006, pelo que à data dos factos não tinham antecedentes criminais.
64 ) Acresce ainda que, se considera como desfavorável ao arguido que este não tenha procedido à liquidação do imposto em falta, quando se sabe que a empresa de que era sócio foi declarada Insolvente e que o Arguido se encontra sem trabalhar mercê de um acidente de viação que o deixou incapacitado (cfr. Factos constantes nos Pontos 30 a 33 da matéria dada como provada.
65) Pelo que, ao considerar tais aspectos quer em termos de prevenção especial, quer na escolha da medida da pena, o Ilustre Tribunal "a quo" violou os Arts. 70.º e 71.º do CP e ainda o princípio in dúbio pro reo plasmado no Art. 32.º da CRP.
66) A decisão recorrida violou o disposto nos artºs. 2º, nº 2 e 26º do C.P.; artº. 105º, nº 4, als. a) e b), arts, 6º, nº 1 e artº, 7º, nº 3, do R.G.I.T.; artº. 24º da L.G.T.; artºs. 283º, nº 3, al. b), 358º, 359º, 379º nº 1, 410º nºs. 1 e 2 als. a) e b), e 412º nº 3 al. a) do C.P.P., os quais deverão ser interpretados nos termos preditos.

DEVERÁ O PRESENTE RECURSO SER RECEBIDO, JULGADO PROCEDENTE E, POR VIA DISSO, SER PROFERIDO DOUTO ACÓRDÃO QUE:

a) - DECLARE NULA A SENTENÇA PROFERIDA, COM OS EFEITOS DAí DECORRENTES. Ou, se assim se não entender,

b) - REVOGUE A DECISÃO RECORRIDA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE, NO QUE TANGE AO RECORRENTE, JULGUE A ACUSAÇÃO IMPROCEDENTE, ABSOLVENDO-O.”
***
3. Notificados nos termos e para os efeitos do artº 413º do CPP, todos os sujeitos processuais, apenas o Ministério Publico, veio responder (a fls. 1111/1141), pugnando pela não procedência do recurso do arguido, e onde formula as seguintes (transcritas) conclusões:

1 - A nulidade por falta de documentação da prova terá ser considerada como uma nulidade sanável e dependente de arguição, uma vez que não se encontra prevista no elenco das que são consideradas insanáveis, estando pois sujeita ao regime de arguição e de sanação dos artigos 120.° a 122.° do Código de Processo Penal.

2- O prazo de arguição, na falta de disposição legal em contrário, deverá ser o prazo legal de 10 dias previsto no artigo 105°, n.º 1, do Código de Processo Penal, contado a partir do momento em que os arguidos tiveram acesso ao suporte magnético das gravações efectuada em sede de audiência de discussão e julgamento. A arguição de tal nulidade deve ser feita nos termos gerais, por meio de requerimento formulado perante o tribunal de lª instância, e não directamente na motivação de recurso interposto da sentença.

3- Assim, caso se conclua pela verificação de tal nulidade, resultante da deficiente documentação dos actos, há que concluir que a mesma se mostra sanada, já que não foi previamente arguida perante o tribunal a quo, e por este decidida.

4 - Por força da jurisprudência fixada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2008, de 09/04, publicado no DR de 15/05/2008, entende -se que a alteração produzida pelo artigo 95.º da Lei n.º 53 -A/2006 não implicou qualquer alteração nos elementos constitutivos do crime previsto no artigo l05º do RGIT que permaneceu imodificado na sua tipicidade, pelo que não ocorre qualquer descriminalização da conduta dos arguidos.

5 - A caracterização do facto ilícito criminalmente punível impõe a determinação que o agente não entregue à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar pelo decurso de prazo superior a 90 dias sobre o termo do prazo legal de entrega da prestação e, nos casos em que não tenha procedido ao pagamento da prestação comunicada à administração tributária através da correspondente declaração, ao seu pagamento, acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.

6 - Não incorreu o Tribunal "a quo" em qualquer omissão na fundamentação da decisão, passível de determinar a nulidade da sentença recorrida, por força do disposto no art. 379.° n.º1 al. a) e 374.° n.º 2, ambos do Código de Processo Penal.

7 - Consideramos ainda, salvo melhor opinião, desprovido de qualquer fundamento o apontado vício à douta sentença recorrida de contradição insanável entre a fundamentação e a decisão.

8 - Em face da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, vemos que, não obstante os arguidos declararem que o arguido IK...não tinha qualquer intervenção da parte financeira da empresa, numa tentativa de o desresponsabilizar pela sua actuação, o certo é que acabam por concluir o contrário.

9 - São os próprios arguidos admitem que eram ambos que assinavam as declarações fiscais e conheciam as dificuldades financeiras que a empresa atravessava. Ademais, o arguido MG...admitiu ainda que o seu irmão igualmente assinava as declarações fiscais e os cheques para pagamento dos impostos.

10 - O arguido IK...confirmou que, pelo menos a partir de 2002, quando se apercebeu das dificuldades financeiras da empresa, começou a estar mais atento para todas as questões, e que apenas abandonou a gerência de facto em Dezembro de 2004.

11 - Face a tais circunstâncias e ao conhecimento da situação da empresa do arguido, concluiu, bem, o Tribunal "a quo" que o arguido IK...não podia deixar de saber que as declarações não estavam a ser entregues e que o imposto não estava a ser liquidado nem pago, tendo anuído em tal estado de coisas.

12 - Para apuramento do valor devido a título de IVA, o Tribunal considerou os ficheiros informáticos constantes dos autos e ainda o balancete relativo ao mês de Agosto de 2004, através dos quais a inspecção tributária contabilizou o IVA suportado nas aquisições e dedutível para efeitos fiscais, bem como o IVA liquidado pelos serviços prestados e com a venda do imobilizado, estabelecendo quais os valores que deveriam ter sido entregues nos cofres do Estado a título de IVA e que o não foram.

13 - Se é certo que a parte referente ao IVA liquidado pelos serviços prestados pela empresa "TT..." não se encontram suportados pelas respectivas facturas, não se pode olvidar que existe o balancete relativo a Agosto de 2004 e que os arguidos confirmaram que, apesar de não manterem contabilidade organizada neste período, por o TOC se ter demitido, efectuavam todos os registos de clientes e fornecedores nos ficheiros informáticos constantes dos autos, cujo conteúdo confirmaram.

14 - No que concerne à venda do imobilizado, verificamos que, de fls. 165 a 170, 223 a 236, se encontram juntas as respectivas facturas emitidas pela sociedade arguida cujo valor inclui o IVA que devia ter sido entregue à administração fiscal.

15 - A empresa W... adquiriu os veículos identificados nos autos à empresa TT..., a quem entregou dois cheques, no valor de € 357.595,00 para o seu pagamento. Tais veículos foram posteriormente vendidos pela empresa W... à empresa Evicar, pelo mesmo valor. É esta operação que resulta espelhada nos documentos de fls. 163 a 191 e 686 a 688.

16 - Conforme se pode ver das certidões do registo dos veículos automóveis constantes de fls. 732 a 766, grande parte dos veículos já eram propriedade da empresa TT..., no momento em que foram alienados.

17 - A partir do momento em que a empresa TT... emitiu as facturas de fls. 165 a 168 e liquidou o respectivo IVA, deveria ter elaborado a respectiva declaração periódica de IV A e procedido à sua entrega nos cofres do Estado.

18 - E não se diga que a circunstância dos valores obtidos pela TT... terem sido utilizados para liquidar dívidas exclui, de algum modo, a sua responsabilidade. O facto do cheque emitido pela empresa W... à ordem da empresa TT..., para pagamento do negócio em causa, ter sido posteriormente endossado a um terceiro constitui em si mesmo um enriquecimento por parte da empresa TT..., resultante da redução do seu passivo.

19 - A empresa Y... e a empresa TT... celebraram um acordo que intitularam de confissão de dívida e dação em pagamento através do qual a Y... liquidou, por conta da TT..., às empresas …, a quantia total de €138.184,23, e a … entregou à Y... os veículos com as matrículas ….e semi-reboques com as matrículas …(cfr. fls. 641 a 684).
Em consequência deste negócio, a empresa TT... emitiu as facturas de fls. 723 a 725, no âmbito das quais liquidou IVA pela transmissão dos veículos à Y… .

20 - Em sede de sentença foram efectuadas as correcções ao IVA dedutível com base nos elementos juntos pelo BES Leasing a fls. 709, 718 e 719, que correspondem às facturas relativas às prestações dos contratos de locação financeira referentes aos meses de Novembro de 2004, Setembro de 2004 e Outubro de 2004, respectivamente.

21 - No que concerne aos factos provados relativos à empresa JT... , diremos apenas que os mesmos são irrelevantes no que concerne ao preenchimento do tipo objectivo de ilícito pelo qual os arguidos foram condenados, já que os factos referentes a esta empresa reportam-se ao período de Fevereiro a Março de 2005.

22 - Resulta da factualidade apurada que os recorrentes procederam à liquidação de IVA, que receberam efectivamente, e não procederam à entrega dessas quantias 'descontadas' à entidade a quem se destinavam e eram devidas, a Administração Fiscal.

23 - Mostra-se indiferente o destino dado a essas quantias, não sendo necessária a prova de que as mesmas foram gastas em proveito exclusivo da sociedade ou dos seus sócios.

24 - O tipo legal de crime não é simplesmente integrado pelo engrossar do património mas também pela diminuição do passivo, como que resulta do pagamento das dívidas da empresa.

25 - O montante relativo ao IVA é devido ao Estado a partir do momento em que é emitida a factura relativa à operação que a ele está sujeita e liquidado o respectivo quantitativo.

26 - Bem andou o Tribunal "a quo" ao condenar os arguidos IK... e MG... pela prática, em co-autoria material e na forma continuada, de um crime de abuso de confiança do art. 105° do RGIT, aprovado pela Lei n. ° 15/2001, de 5 de Junho, em conjugação com os artigos 260, 30°, nº2 e 79° do Código Penal, tendo feito uma correcta valoração das provas apresentadas em sede de audiência de discussão e julgamento.

27 - A douta sentença recorrida não violou qualquer norma legal, pelo que deverá ser mantida na íntegra.

Nestes termos e nos melhores de Direito devem ser declarados totalmente improcedentes os recursos apresentados pelos arguidos, confirmando-se, em consequência, a Douta Decisão recorrida, assim se fazendo inteira e sã
JUSTIÇA! ”.
***
4. Admitidos os recursos (fls. 1154) e subidos os autos a esta Relação, o Ex.mº Sr. Procurador-Geral Adjunto, em douto parecer, pronunciou-se no sentido da improcedência dos recursos (fls. 1163).
Notificados, nos termos do que dispõe o artº 417.º, n.º 2, do CPP, ninguém veio dizer o que quer fosse.
***
5. Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

***
II. Fundamentação:
1. Delimitação do objecto do recurso e poderes cognitivos do Tribunal ad quem:
Conforme Jurisprudência uniforme nos Tribunais Superiores e da doutrina, são apenas as questões suscitadas pelos recorrentes e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, (Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98), sem prejuízo das de conhecimento oficioso.

Assim sendo, temos como


Questões a decidir:
1.1. Do recurso do arguido MG...,
1.1.a) Da nulidade do artº 363º do CPP, por não gravação dos depoimentos prestados em audiência. Da violação do artº 32 da CRP
1.1.b) Da factualidade provada (pontos 13 e 14, 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27).
***
1.2. Do recurso do arguido IK...,
1.2.a) Da nulidade do artº 363º do CPP, por não gravação dos depoimentos prestados em audiência. Da violação do artº 32 da CRP
1.2.b) Da existência de crime.
1.2.c) Da factualidade provada (pontos 1, 2, 5 a 29 dos factos provados foram incorrectamente julgados ?)
***
2. Da sentença recorrida, constam, como provados e não provados, os seguintes factos com base fundamentação apresentada (por transcrição):
“Factos provados
Da prova produzida, resultaram provados os seguintes os factos, com relevância para a causa:
1 - Os arguidos eram sócios gerentes da Firma "TT... , com sede em Fornos de Algodres, que se encontra presentemente insolvente.
2 - Os 1ºs e 2ºs arguidos foram sócios gerentes da 3ª arguida durante o exercício de 2004 e 2005.
3 - A 3ª arguida tinha como actividade principal, a actividade de "transportes de mercadorias, em regime de aluguer" – a que corresponde o … .
4 - A 3ª arguida encontrava-se colectada no Serviço de Finanças e enquadrada como sujeito passivo de IVA, no regime normal mensal.
5 - Nos exercícios 2004 e 2005, a arguida desenvolveu as referidas actividades, prestando os serviços típicos daquelas actividades.
6 - Os 1º e 2º arguidos trabalhavam na sede da sociedade sita em Fornos de Algodres e, no exercício das referidas funções de gerência da sociedade arguida, dirigiram as actividades desta, sendo os responsáveis pelos assuntos relacionados com os fornecimentos de materiais necessários para o exercício da descrita actividade, procedendo aos pagamentos inerentes ao funcionamento da empresa, recebendo pagamentos de clientes, bem assim como efectuando o pagamento dos ordenados dos trabalhadores.
7 - Os 1.º e 2.° arguidos eram ainda responsáveis, na qualidade de gerentes, pela gestão dos pagamentos aos credores, nomeadamente o pagamento ao Estado dos impostos apurados resultantes da referida actividade e dos impostos deduzidos nos rendimentos dos trabalhadores.
8 - A actividade acima aludida (em 3 e 5) está sujeita a IVA, pelo que cabia aos 1.º e 2.° arguidos, em representação e no interesse da sociedade arguida, receber dos clientes os preços correspondentes aos serviços prestados, emitir as facturas, bem assim como liquidar e receber desses clientes o IVA incidente sobre tais operações.
9 - Devendo depois entregar o IVA liquidado nas facturas emitidas nos cofres do Estado, até ao dia 10 do 2.° mês seguinte.
10 - Contudo, em meados do ano de 2004, concretamente em Agosto de 2004, os 1.º e 2.° arguidos formularam o propósito de, na qualidade de gerentes e em representação da sociedade arguida, não remeteram, no prazo legal, aos serviços competentes da Administração Fiscal, as declarações do IVA relativas a Agosto de 2004 a Dezembro de 2004.
11 - Como tal situação também não foi detectada pelos serviços competentes, os 1.º e 2.° arguidos passaram em cada um dos meses e períodos seguintes, sempre na referida qualidade de gerentes da 3.ª arguida e em representação desta, a formular idêntico propósito, sendo certo que a descrita actuação foi facilitada pelo facto de não haver fiscalização atempada por parte dos serviços de fiscalização da Direcção Geral de Impostos - Direcção de Finanças.
12 - Assim, a partir de Agosto do ano de 2004 e até Dezembro de 2004, apesar dos 1.º e 2.° arguidos, na referida qualidade, terem recebido o IVA dos clientes da 3ª arguida, não procederam à sua entrega ao Estado nos prazos legalmente estipulados.
13 - Os montantes declarados, que se vieram a apurar e que não foram entregues nos aludidos prazos nos cofres do Estado, cifram-se no montante global de €146.967,52 discriminado da seguinte forma:
Período de retenção Imposto em falta / €
Agosto de 2004 €61.497,48
Setembro de 2004 €15.839,57
Outubro de 2004 €12.176,74
Novembro de 2004 €15.995,74
Dezembro de 2004 €39.155,70
TOTAL €144.665,23

14 - Os arguidos apropriaram-se assim do total de €144.665,23 a título de IVA liquidado, apurado, recebido e não entregue nos cofres do Estado.
15 - Que fizeram reverter e despenderam em benefício e proveito próprio, bem como da 3.ª arguida, assim enriquecendo, desde logo, o património da 3.ª arguida em igual montante e prejudicando o Estado-Fazenda Nacional, pelo menos, em valor equivalente.
16 - O IVA apurado não foi pago até ao dia 10 do 2.º mês àquele a que respeitam as operações.
17 - Decorridos mais de noventa dias sobre o termo do prazo legal de entrega de cada uma das prestações referidas e acima descritas, verificou-se que os arguidos não procederam ao pagamento de qualquer das aludidas quantias.
18 - Acresce que, notificados para efectuarem o pagamento das quantias ainda em dívida, bem assim como dos juros de mora e coima aplicável, nos termos do disposto no artigo l05.º, n.º 4, alínea b), do Regime Geral das Infracções Tributárias, na redacção que lhe foi introduzida pela Lei nº53-A/2006, de 29/12, não o efectuaram, nem nos 30 dias subsequentes, nem até ao presente momento, não obstante advertidos do consequente prosseguimento do procedimento criminal e de que tal pagamento determinaria o arquivamento do processo.
19 - Apesar de terem recebido as quantias referentes a IVA acima mencionadas, os arguidos não as entregaram ao Estado – Fazenda Nacional, apoderando-se das mesmas, tendo diluído os valores assim obtidos no património da 3.ª arguida.
20 - E fizeram-no não obstante saberem que estavam obrigados a entregá-las nos cofres do Estado (ao Estado – Fazenda Nacional), e que delas não podiam dispor como suas já que não lhe pertenciam.
21 - Em 4 de Agosto de 2004, os 1.º e 2.° arguidos venderam à firma "W... -, Lda.", os seguintes tractores:
- DAFA/tractor
- DAF A/tractor
- DAFA/tractor
- DAFA/tractor
- DAF A/tractor
- DAFA/tractor
- DAFA/tractor
- DAF A/tractor
- DAFA/tractor
- DAF A/tractor
- DAF A/tractor
- DAFA/tractor
- DAFA/tractor
22 - E à venda dos seguintes reboques;
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque
- INVEOE/Reboque ,
pelo valor de global de € 300.500,00 euros + IVA (€57.095,00)
23 - A firma "W..., Lda.", procedeu ao pagamento, que foi efectivamente recebido pela 3.ª arguida desta quantia através dos cheques n.º5459212 e n.º5459115 sobre o BCP.
24 - Em 7 de Dezembro de 2004, os 1.º e 2.º arguidos venderam à Y... Coimbra, Lda.:
- a viatura Volvo FH12 e tractor com matricula …;
- a viatura Volvo FH12 e tractor com matricula …;
- o semi reboque e tractor com a matricula …,
pelo valor de global de € 147.500,00 + IVA (28.025.00).
25 - Este valor foi pago pelo Y... Coimbra, Lda. e foi efectivamente recebido pelos arguidos.
26 - Em Fevereiro e Março do ano de 2005, os 1.º e 2.° arguidos venderam a "JT... " semi-reboques no valor global de €57.809.00 + IVA (10.983,00).
27 - Este valor foi pago pela JT... e foi efectivamente recebido pelos arguidos.
28 - Ao actuar como supra descrito agiram os arguidos voluntária e conscientemente, com o propósito deliberado de tornar suas as quantias acima referidas (IVA), o que lograram concretizar.
29 - Sabiam, ainda, que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, tendo actuado sempre, com o propósito reiterado de se apropriarem de tais quantias, beneficiando da circunstância da administração fiscal não actuar atempada e eficazmente sobre situações semelhantes.
Provou-se ainda que:
30 - O arguido IK... encontra-se incapacitado para trabalhar, em virtude de um acidente de viação.
31 - Não aufere qualquer tipo de subsídio.
32 - Vive com o salário da mulher.
33 - Tem 3 filhos, encontrando-se apenas um deles a seu cargo, por ser menor.
34 - Tem o 6º ano de escolaridade.
35 - O arguido IK... foi condenado:
i) por sentença proferida em 09-12-2004, no processo nº33/03.5TAFAG pelo Tribunal Judicial de Fornos de Algodres, transitada em julgado em 05-01-2005, na pena de 15 meses de prisão, suspensa por 4 anos, pela prática em 2001, de um crime de abuso de confiança contra a segurança social do artigo 107º do RGIT;
ii) por acórdão proferido em 19-06-2006, no processo nº248/04.9IDGRD pelo Tribunal Judicial de Fornos de Algodres, transitada em julgado em 04-07-2006, na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de €5,00, pela prática, em 03-06-2004, de um crime de abuso de confiança fiscal do artigo 24º do Decreto-Lei nº394/93, de 24/11, que veio a ser declarada extinta, pelo seu cumprimento, em 21-09-2006. (cfr. fls. 819 e ss.).
36 - O arguido MG… exerce a profissão de motorista de camiões TIR, pela qual aufere mensalmente a quantia de €560,00, a qual acrescida de suplementos e do valor referente à cláusula TIR, ascende ao montante fixado entre €900,00 e €1.000,00.
37 - A sua mulher trabalha, sendo funcionária pública.
38 - Reside numa casa propriedade do sogro, pagando uma renda mensal de €300,00.
39 - Tem três filhas com 11 anos de idade.
40 - Tem o 12º ano de escolaridade.
41 - O arguido MG...foi condenado:
i) por sentença proferida em 09-12-2004, no processo nº33/03.5TAFAG pelo Tribunal Judicial de Fornos de Algodres, transitada em julgado em 05-01-2005, na de 15 meses de prisão, suspensa por 4 anos, pela prática, em 2001, de um crime de abuso de confiança contra a segurança social do artigo 107º do RGIT;
ii) por acórdão proferido em 19-06-2006, no processo nº248/04.9IDGRD pelo Tribunal Judicial de Fornos de Algodres, transitada em julgado em 04-07-2006, na de 180 dias de multa, à taxa diária de €7,00, pela prática, em 03-06-2004, de um crime de abuso de confiança fiscal do artigo 24º do Decreto-Lei nº394/93, de 24/11, que veio a ser declarada extinta, pelo seu cumprimento, em 21-09-2006. (cfr. fls. 822 e ss.).
42 - A sociedade arguida não tem averbada qualquer condenação no seu registo criminal. (cfr. fls. 638).
*
- Factos não provados.
I – Desde 2004, que a 3.a arguida vem acumulando dívidas fiscais (IV A e IRS).
II – Com efeito, os arguidos cientes da existência de diversas dívidas fiscais e que o imobilizado era os únicos bens da sociedade arguida susceptível de permitir o pagamento das dívidas acumuladas, já liquidadas, os 1.º e 2.° arguidos decidiram pôr em prática um plano destinado a frustrar a cobrança dos referidos créditos;
III – Os negócios referidos em 21º e 26º dos factos provados constituíram um estratagema dos 1.° e 2.° arguidos para impedir que a Administração Fiscal penhorasse e vendesse as viaturas/reboques e assim recuperasse os montantes não liquidados.
IV – Pois apesar de terem recebido os valores supra mencionados não procederam ao pagamento dos impostos em dívida, nem reinvestiram estes montantes na 3ª arguida.
V – Os 1.º e 2.° arguidos, tendo em conta o descrito em 21.° a 26.°, actuaram em nome e no interesse da sociedade arguida, na qualidade de seus representantes legais voluntária e conscientemente, com o propósito deliberado de impedir a Administração Fiscal de satisfazer os seus créditos, o que lograram concretizar bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
*
– Motivação da decisão da matéria de facto
O Tribunal fundamentou a sua convicção quanto à matéria de facto com base nas declarações dos arguidos, que admitiram não ter procedido à entrega das declarações fiscais nem ter procedido à entrega de quaisquer impostos no período temporal em causa nos autos, em conjugação com a prova documental junta aos autos:
- a fls. 4 a 8, auto de notícia;
- a fls. 10 a 27, relatório de inspecção tributária e respectivos anexos de fls. 33 a 247, com especial enfoque para fls. 33 (certificação das cópias dos ficheiros informáticos), 41 a 64 (balancete relativo ao mês de Agosto de 2004), 65 a 74 (relação dos custos e IVA deduzido desde Setembro de 2004 inclusive a Abril de 2005), 75 a 84 (relação das facturas emitidas pela sociedade desde Setembro de 2004), 85 a 96 (relação dos custos por rubrica desde Setembro de 2004 inclusive a Abril de 2005), 97 e 98 (mapa das mais valias e das menos valias), 100 a 102 (informação e anexos sobre as contas de clientes), 103 a 120 (relativa a pagamentos de facturas a favor da sociedade arguida), 162 a 190 (notificação efectuada pela Divisão de Inspecção Tributária, resposta e respectivos documento efectuada à sociedade W... sobre a venda do imobilizado); 191 a 253 (notificação efectuada pela Divisão de Inspecção Tributária, resposta e respectivos documento efectuada à sociedade Y... Coimbra, Lda. sobre a venda do imobilizado), 254 a 277 (notificação efectuada pela Divisão de Inspecção Tributária, resposta e respectivos documento efectuada à sociedade JT.... sobre a venda do imobilizado);
- de fls. 282 a 291, certidão da matrícula da sociedade e de fls. 581 a 583, certidão permanente da matrícula;
- de fls. 292 a 294, síntese cadastral de contribuinte dos arguidos;
- de fls. 326 a 330, notificações e respectivos comprovativos para pagamento do imposto em dívida;
- de fls. 641 a 684 e de fls. 721 a 725, informações e documentos juntos pela Y... Coimbra Lda. sobre o modo de pagamento da venda do imobilizado da arguida à primeira;
- de fls. 685, informação prestada por JT... sobre o modo de pagamento da venda do imobilizado da arguida à primeira;
- de fls. 686 a 688 e de fls. 751, informação e fotocópias dos cheques juntos por Evicar, anteriormente W..., sobre o modo de pagamento do imobilizado da arguida à primeira;
- de fls. 706 a 720 informações e facturas relativas aos contratos de locação financeira nºs 1059035 e 1056571 celebrados com a Bes Leasing e Factoring;
- de fls. 733 a 741, certidões do registo automóvel de parte dos tractores que foram objecto de alienação;
- de fls. 887 a 929, informação prestada pela Direcção de Finanças da Guarda relativas às notificações efectuadas ao Senhor(a) Administrador(a) de Insolvência e à arguida no âmbito da inspecção tributária, cópia das mesmas e resposta do Senhor(a) Administrador(a) de Insolvência e relatório de inspecção;
- de fls. 930 a 935, informação prestada pelo Serviço de Finanças de Fornos de Algodres sobre a notificação das liquidações adicionais de IVA nos períodos de Agosto a Dezembro de 2004 e impressões sobre o averbamento nos ficheiros informáticos das Finanças da data em que foram efectuadas as notificações – 19/12/2005 – no cadastro da arguida.
Cumpre referir, que no que se refere, em especial, ao montante e forma como o imposto foi apurado a convicção do Tribunal ancorou-se no relatório de inspecção elaborado pelos Serviços Tributários e respectivos documentos de suporte, nas declarações da Senhora Inspectora CF... e nas declarações do arguido MG…, na parte em que referiu que após Agosto de 2004 – data em que o contabilista se tinha demitido – continuaram a proceder aos registos das transacções da empresa – v. g. listagem dos movimentos de clientes e listagem dos movimentos de fornecedores (cfr. recibo da cópia dos ficheiros informáticos de fls. 33) e que os documentos foram todos guardados e entregues ao administrador da insolvência.
Nesta sede, é mister esclarecer que o imposto não foi apurado com base em métodos indiciários mas antes com base na documentação e registos de contabilidade existentes nos computadores da sociedade arguida.
No âmbito do direito processual penal, conforme estabelece o artigo 125º do Código de Processo Penal, são admissíveis todos os meios de prova que não forem proibidos.
Assim, se é certo que parte dos valores obtidos não se encontram suportados pelas respectivas facturas, não se pode olvidar que existe o balancete relativo a Agosto de 2004, bem como, os registos informáticos elaborados sob a autoridade dos sócios-gerentes da sociedade arguida.
Acresce que, se os métodos indiciários não podem ser admissíveis em sede de direito penal, tal não obsta nem colide com as presunções judiciais, que correspondem a ilações que o julgador retira de factos que são conhecidos para firmar outros factos que são desconhecidos, nos termos do artigo 349º do Código Civil (neste sentido vide Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, p.31/01.3IDCBR.C1, in www.dgsi.pt).
As presunções legais não poderão, todavia, colidir com o princípio do in dubio pro reo. De acordo com este princípio se após a produção da prova se mantém dúvida razoável quanto aos factos essenciais correspondentes ao tipo legal do crime, a mesma tem de funcionar em sentido favorável ao arguido, no sentido de não poderem ser dados como provados os factos que lhe são imputados.
Mas tal princípio não pode funcionar em caso de dúvida imotivável, irrazoável ou irracional ou meramente conveniente.
Contra qualquer acto humano é sempre possível levantar dúvidas, estes são sempre passíveis de ser questionados, mesmo quando se tenham por certos e seguros.
Mas as referidas dúvidas, em direito penal, para serem válidas, procedentes, têm de ser razoáveis, que ilidam a certeza contrária.
No caso dos autos, conforme supra se referiu os elementos probatórios juntos aos autos são certos e seguros, não se levantando qualquer dúvida positiva que abale os valores que atestam, pois que não se pode efabular despesas e custos que não tenham sido levados em conta naqueles registos.
É que foi o próprio arguido MG... que referiu que mantinham os registos dos valores das operações da sociedade arguida e ambos os arguidos confirmaram a venda dos veículos.
Ora, de acordo com as regras da experiência e da normalidade, não pode deixar de se concluir que os mesmos retratam a actividade da empresa no período contributivo em causa pois que nenhum sentido faria alguém ocupar o seu tempo a elaborar e a manter registos que não estivessem de acordo com a realidade e mais nos quais não estivessem registadas todas as despesas (nelas se incluindo as facturas relativas à aquisição dos veículos que entretanto foram vendidos), mas apenas algumas, tanto mais que estas permitiriam (mais tarde ou mais cedo) a redução do imposto a pagar através da dedução do IVA suportado.
E tal convicção não é abalada pelas declarações do sr. Administrador de Insolvência, pois que, apesar de se ter pronunciado pela desorganização da documentação e da contabilidade, nenhuma impugnação, reclamação ou oposição foi apresentada quanto à liquidação do IVA efectuada pelos serviços de Finanças, antes tendo aquele concordado com os valores encontrados (cfr. resposta no âmbito da inspecção de fls. 891).
Acresce que as correcções ao IVA dedutível que vieram a ser feitas em sede de sentença com base nos elementos juntos pelo BESleasing a fls. 709, 718 e 719, que correspondem às facturas relativas às prestações dos contratos de locação financeira (e não as demais porquanto se encontram evidenciado no balancete de Agosto de 2004 que eram levadas em conta as despesas com este fornecedor), nos períodos respeitantes às datas de emissão das mesmas igualmente não beliscam o supra referido pois que apesar das demais diligências encetadas nenhuns outros registos resultaram que implicassem correcções aos valores apresentados.
É que no que se refere à venda do imobilizado, encontram-se juntas as respectivas facturas emitidas pela sociedade arguida, cujo valor inclui o IVA que devia ter sido entregue.
Ao que acresce que, decorre da experiência comum, ser habitual que não sejam levadas ao registo automóvel todas as inscrições da propriedade tendo em vista a não desvalorização do veículo.
Donde torna-se despicienda a discussão sobre a falta de registo da propriedade a favor da sociedade arguida.
Ademais nem sequer é crível que as adquirentes tivessem adquirido as referidas viaturas sem que as mesmas estivessem tituladas a favor da sociedade arguida, ou antes que tivessem sido celebrado um contrato de cessão da posição contratual, pois que para efeitos da sua contabilidade nada lhes valeria ter uma factura de venda emitida por quem não era o proprietário.
Por último refira-se, no que concerne ao recebimento dos valores pela arguida, teve o Tribunal em conta os registos efectuados pelos serviços da sociedade arguida, não sendo necessário o seu efectivo recebimento, i. e., entrada na conta bancária da sociedade, tendo bastado que tais valores tivessem colocados na efectiva disponibilidade da sociedade arguida (v. g. endosso do cheque emitido pela W... a favor da sociedade X... – cfr. fls. 688).
No que concerne aos factos dados como provados relativos à autoria dos factos, o Tribunal teve em conta as declarações de ambos os arguidos.
Com efeito, apesar de terem tentado desresponsabilizar a actuação do arguido Idílio, não deixam de admitir que eram ambos que assinavam as declarações fiscais e conheciam as dificuldades financeiras que a empresas atravessada.
Ademais, o arguido MG... admitiu ainda que o seu irmão igualmente assinava os cheques para pagamento dos impostos e referiu que o TOC havia deixado de prestar à sociedade os seus serviços em Agosto de 2004.
Ora, face a tais circunstâncias e ao conhecimento da situação da empresa do arguido, conclui-se que o arguido IK...não podia deixar de saber que as declarações não estavam a ser entregues e que o imposto não estava a ser liquidado nem pago, tendo anuído em tal estado de coisas.
As condições económicas dos arguidos resultaram das suas declarações que se afiguraram sinceras e coerentes.
O pretérito criminal dos arguidos resultou dos respectivos certificados do registo criminal de fls. 638, 819 a 824, 822 a 824.
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No que se refere aos factos dados como não provados resultaram da falta de idoneidade e consistência da prova produzida de forma a que, pela positiva e com segurança, pudessem ser tidos como assentes.
Com efeito, nenhuma prova foi produzida quanto ao intuito deliberado dos arguidos impedirem a Administração fiscal de satisfazer os seus créditos.
Acresce que tais factos foram ainda infirmados na medida em que se apurou através dos documentos juntos a fls. 825 e 826, impressão relativa a dois processos fiscais conjugados com fls. 827 e 828, fotocópias de dois cheques emitidos à ordem da Direcção Geral do Tesouro no valor em dívidas dos referidos processos e com o extracto da conta bancária da sociedade arguida de fls. 800 a 817 relativo ao período temporal compreendido entre 01/08/2004 a 01/02/2005, que os arguidos utilizaram parte do dinheiro recebido nas transacção para pagamento de dois processos de execução fiscal relativos períodos anteriores àqueles que se encontram em causa nos presentes autos.”


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3. APRECIANDO.
Ambos os arguidos recorrentes (MG... e IK...) vieram suscitar a questão da nulidade da audiência de discussão e julgamento, alegando que a gravação da prova aí produzida é em diversas partes imperceptível, restringindo, consequentemente o direito ao recurso dos arguidos. Tal violaria o disposto nos artºs 363º do CPP e 32º da CRP, devendo, consequentemente, anular-se agora tal audiência e sentença subsequente.
Em resposta a tal veio o M.P., junto da primeira instância, defender que tal nulidade por falta de documentação da prova terá ser considerada como uma nulidade sanável e dependente de arguição, uma vez que não se encontra prevista no elenco das que são consideradas insanáveis, estando pois sujeita ao regime de arguição e de sanação dos artigos 120.° a 122.° do Código de Processo Penal e que o prazo de arguição, na falta de disposição legal em contrário, deverá ser o prazo legal de 10 dias previsto no artigo 105.°, n.º 1, do Código de Processo Penal, contado a partir do momento em que os arguidos tiveram acesso ao suporte magnético das gravações efectuada em sede de audiência de discussão e julgamento. A arguição de tal nulidade deve ser feita nos termos gerais, por meio de requerimento formulado perante o tribunal de l.ª instância, e não directamente na motivação de recurso interposto da sentença.
Vejamos então.
3.1. Começando pela tese do M.P., adiantaremos desde já que não concordamos com tal posição.
Na verdade não foi pacífica entre a jurisprudência a abordagem desta questão, no que tange ao momento até ao qual pode ser suscitada.
Assim, para uns, como defende o M.P, nestes autos, tal nulidade está sujeita ao regime de arguição e de sanação dos art.º 105º n.º 1, 120º, n.º1 e 121º do CPP.
Segundo esta tese, o termo inicial do prazo de 10 dias ocorre no dia em que os suportes técnicos com o registo das gravações ficam à disposição dos sujeitos processuais, visto que só nesta data poderão os interessados tomar conhecimento da omissão ou deficiência da gravação do registo da prova, estando a partir desta data habilitados a arguir o respectivo vício.
Por isso, de acordo com a citada posição, esta nulidade sana-se se não for tempestivamente arguida, contando-se o prazo de dez dias (artº 105º, n.º 1 do CPP) a partir da audiência, acrescido do tempo que mediou entre a entrega do suporte técnico pelo sujeito processual interessado ao funcionário e a entrega da cópia do suporte técnico ao sujeito processual que a tenha requerido. E caso a audiência de julgamento se prolongue por várias sessões, o prazo contar-se-ia a partir de cada sessão da audiência, acrescido do tempo que mediou entre a entrega do suporte técnico pelo sujeito processual interessado ao funcionário e a entrega da cópia do suporte técnico ao sujeito processual que a tenha requerido.
Em conclusão e para os seguidores desta tese, teremos que se trata de: • é uma nulidade a que se refere o artigo 363º do CPP e não uma irregularidade de acordo com os artigos 118º, n.º 2 e 123º, n.º 1 do CPP, ou uma irregularidade conforme o n.º 2 daquele artigo 123º do CPP (no fundo, a parcial deficiência de um determinado depoimento, com suficiente relevância para não permitir a sua completa percepção, gera nulidade); • a nulidade deve ser invocada em 10 dias perante o tribunal de 1ª instância, a contar do dia em que se entregaram as cópias das gravações à parte requerente;
• pode ainda ser arguida em sede de recurso, se os 10 dias em causa ainda se contiverem dentro do prazo normal de recurso, contado a partir dos momentos temporais do artigo 411º/1 do CPP; • pode a Relação conhecer de tal nulidade, não a devendo remeter à 1ª instância para conhecimento da nulidade.
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Contudo para outra corrente tem sido entendido que deve ser considerado essencialmente que, em matéria de gravação de audiência, estabelece o artigo 9.º, do Decreto-Lei 39/95, de 15/2 (aplicável ex vi artigo 4.º, do CPP): “Se, em qualquer momento se verificar que foi omitida qualquer parte da prova ou que esta se encontra imperceptível, proceder-se-á à sua repetição sempre que esta for essencial ao apuramento da verdade”.
Tendo-se ainda presente o teor do artigo 363.º, do CPP, que dispõe: “As declarações prestadas oralmente são sempre documentadas na acta, sob pena de nulidade”.
Assim, existirá uma nulidade, dependente de arguição. Existe acordo nesta parte com a orientação antes referida.
Contudo, a convergência de ideias continua quanto ao momento em que é proferida a decisão. Este será “aquele em que se configura o exercício do direito de dela recorrer, no pressuposto de que só depois de conhecida a decisão final surge na esfera jurídica dos sujeitos processuais por ela afectados, na decorrência de um abstracto direito constitucional ao recurso, o concreto 'direito material' em determinado prazo, deste ou daquele recurso ordinário ou extraordinário” (cf., v. g., José António Barreiros, Sistema e Estrutura do Processo Penal Português, I, p. 189).
Deste modo, anteriormente à decisão final sobre o objecto do processo, no termo da fase do julgamento em 1.ª instância, não estão concretizados, nem se sabe se processualmente vão existir, os pressupostos de exercício do direito ao recurso, que como “direito a recorrer” de “decisão desfavorável”, concreto e efectivo, apenas com aquele acto ganha existência e consistência processual.
No que respeita ao arguido, o momento relevante do ponto de vista do titular do direito ao recurso só pode ser, assim, coincidente com o momento em que é proferida a decisão de que se pretende recorrer, pois é esta que contém e fixa os elementos determinantes para formulação do juízo de interessado sobre o direito e o exercício do direito de recorrer.
Aliás tal interpretação é a que melhor se harmoniza com o transcrito artigo 9.º, do Decreto-Lei 39/95, no qual se prevê expressamente a repetição, para o caso de “em qualquer momento” se verificarem deficiências e falhas na gravação, ou se a gravação for inaudível ou deficiente.
E, se tais deficiências, por razões alheias ao recorrente, influenciadoras do exame da decisão da causa, pois impossibilitam não só o recorrente de estruturar o seu recurso sobre a matéria de facto, como o de este tribunal de recurso reavaliar a apreciação dos meios de prova, conforme dispõe o artº 412º nº 6 CPP, são apenas reveladas durante o prazo do recurso devem ser conhecidas pelo tribunal superior.
Outra interpretação que não seja a de se admitir a arguição da nulidade da gravação no recurso interposto da matéria de facto (até ao final do respectivo prazo), viola o artigo 32º, nº 1, da Constituição, que consagra o direito ao recurso como uma das garantias de defesa em processo penal, pois lhe restringe excessiva e desproporcionadamente o direito de impugnar as nulidades ocorridas na gravação de uma anterior sessão de julgamento.
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Entendemos que, salvo o devido respeito pela posição contrária, é mais justa e correcta esta ultima tese, por entendermos ser a que melhor se coaduna com os direitos do arguido, em matéria de recursos, permitindo-nos dizer que hoje é dominante, se não mesmo pacifica esta tese que defende que tal arguição pode ser arguida em sede de recurso e no prazo deste (vidé por todos, Ac do TRC, de 09- 09-23, Procº Nº 35/05.7JELSB.C1, Relator: Dr. Esteves Marques; Ac. TRC de 09-06-02, Procº nº9/05.8TAAND.C1, Relator: Dr. Jorge Gonçalves; Ac. do TRC de 10-06-23, Procº nº 518/03.3TACTB.C1, Relator: Dr. Alberto Mira e Ac. do TRP, de 05-05-2010, Procº nº507/08.1GBPRD.P1, Relator: LUÍS; todos in www.dgsi.pt).
Assim sendo, não tem razão o Ministério Publico, considerando-se o recurso tempestivo e dele se irá conhecer.

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3.2. Da nulidade da audiência em obediência ao artº 363º do CPP, por não gravação dos depoimentos prestados em audiência. Da violação do artº 32 da CRP.
Vieram ambos os recorrentes defender que se deve declarar nula a audiência de discussão e julgamento e todo o processado posterior, uma vez que os depoimentos prestados pelas testemunhas CF... e BR... se mostram em muito momentos completamente imperceptíveis e sempre muito pouco perceptíveis, sendo que esses depoimentos seriam essenciais para a prova da verdade material, na opinião dos recorrentes.
Vejamos então.
Como já se referiu por diversas vezes, o conhecimento, pelo Tribunal da Relação, da impugnação ampla em matéria de facto, pressupõe e exige que este tribunal de 2.ª instância tenha acesso à prova produzida em audiência de julgamento.
Efectivamente, com a gravação das declarações orais prestadas em julgamento e com a opção de facultar às partes cópia do respectivo registo, a lei pretendeu consagrar um efectivo 2.º grau de jurisdição em matéria de facto, a exercer junto do Tribunal da Relação.
Após algumas duvidas, encontra-se agora a jurisprudência pacificada, após a alteração introduzida no artigo 363.º do Código de Processo Penal pela Lei n.º 48/2007, de 29-08, que consagrou a imperatividade da documentação da prova oralmente recolhida na audiência, alargada a todas as referidas formas de processo e classificou essa ausência como nulidade, ao estipular que “As declarações prestadas oralmente na audiência são sempre documentadas na acta, sob pena de nulidade”.
Assim, a documentação deficiente das declarações prestadas oralmente constitui hoje, para a maioria da jurisprudência, uma nulidade sanável, ficando prejudicada a jurisprudência fixada no acórdão do STJ n.º 5/2002, que entendia existir irregularidade neste caso e cuja não inconstitucionalidade foi confirmada pelo acórdão do TC n.º 208/2003. Caracteriza-se tal deficiência pela documentação que não permite ou impossibilita a captação do sentido das palavras dos declarantes.
A Jurisprudência tem sido pacífica em considerar que a imperceptibilidade ou inaudibilidade, de passagens dos depoimentos documentados em acta conduzem à nulidade do acto, que, arguida em tempo e por quem tem legitimidade, conduz à anulação da audiência de discussão e julgamento.
Alegaram os recorrentes ser completamente impossível transcrever as declarações das testemunhas CF... e BR..., sendo impossível perceber o conteúdo, quer das perguntas feitas, quer das respostas dadas por aquelas testemunhas, porquanto as mesmas se encontram deficientemente gravadas, o que impossibilita o recorrente e o tribunal superior de ter acesso às mesmas, sendo certo que essa é para o recorrente uma das provas que considera impor uma decisão diversa da recorrida.
Ora, em matéria de gravação de audiência, estabelece o artº 9º do Dec. Lei 39/95 de 15/2 (aplicável ex vi artº 4º CPP), que estipula: “Se, em qualquer momento se verificar que foi omitida qualquer parte da prova ou que esta se encontra imperceptível, proceder-se-á à sua repetição sempre que esta for essencial ao apuramento da verdade”.
Tendo este Tribunal da Relação procedido á audição do CD onde se procedeu ao registo sonoro das declarações das testemunhas em causa e ao constatar que a qualidade da gravação era muito má, foi proferido o despacho de fls. 1167, onde se ordenou que fosse oficiado ao tribunal recorrido qual a qualidade das gravações e se fossem audíveis, que nos fosse enviado novo CD.
Em sequência de tal foi proferido (em 1ª instância) o despacho de fls. 1171, que ordenou que se gravasse de novo a prova existente e que se enviasse o novo CD a este tribunal. Porém, na primeira instância, foi informado que (por transcrição) “…ouvidas as gravações dos depoimentos prestados pelas testemunhas CF… e BR..., as mesmas não são audíveis.
Finalmente informo Vª Exª, que se tentou nova gravação dos referidos depoimentos, tendo a mesma mantido-se pouco audível.”
Recebido neste Tribunal de Recurso o novo CD, procedemos a nova tentativa de audição dos depoimentos das testemunhas indicadas, donde resultou ser a este tribunal de recurso completamente impossível entender aquilo que foi perguntado e foi respondido pelas testemunhas em causa.
Na verdade, ao tentarmos ouvir o depoimento da testemunha CF…, disco1, ponto 20100128143343_7663_64396, minuto 29 a 44, não se percebe quase nenhuma das perguntas e muito menos as respostas, apenas se entendendo que se pretende saber da testemunha que valores se consideraram para efeitos de IVA. Igualmente ao min 48 a 56 e 58, não se percebem nem perguntas nem respostas, ouvindo-se apenas comentários. O mesmo sucede ao longo de todo o seu depoimento, que esta quase na sua totalidade inaudível.
Relativamente ao depoimento da testemunha BR..., a situação é idêntica.
Ao tentarmos ouvir o que consta do CD, ponto 20100406144600_7636_64396, ficamos sem perceber nem as perguntas nem as respostas.
Isto é as únicas intervenções que são audíveis e perceptíveis são apenas algumas das dos intervenientes que colocam as questões ou que pedem esclarecimentos, mas à excepção dos segundos iniciais em que as testemunhas começam a responder, toda a sua intervenção é imperceptível, inviabilizando que se entenda o que quer que seja!
Quais as consequências jurídicas dessa deficiente gravação, quando, como é o caso, essas declarações são invocadas no acórdão recorrido e na motivação pois o recorrente pretende suportar-se nelas com vista à impugnação da matéria de facto?
Somos de opinião que tendo em conta o disposto no artº 363º e 364º do CPP, estando as declarações prestadas e registadas inaudíveis, existe a invocada nulidade, cuja consequência é necessariamente a repetição da prova inaudível.
Os recorrentes invocaram a referida nulidade atempadamente ou seja dentro do prazo e não pode subsistir qualquer dúvida quanto à obrigatoriedade da documentação das declarações prestadas oralmente na audiência e tal consequência (que é a nulidade) é desencadeada não apenas nos casos de falta ou ausência de documentação, mas também nas situações de deficiência de documentação.
Até porque, neste caso tais deficiências, por razões alheias ao recorrente, influenciam no exame da decisão da causa, pois impossibilitam este tribunal de recurso de reavaliar a apreciação dos meios de prova, conforme dispõe o artº 412º nº 6 CPP.
É que outra interpretação que não seja a de se admitir a arguição da nulidade da gravação no recurso interposto da matéria de facto, viola o artº 32º nº 1 da Constituição, que consagra o direito ao recurso como uma das garantias de defesa em processo penal, pois lhe restringe excessiva e desproporcionadamente o direito de impugnar as nulidades ocorridas na gravação de uma anterior sessão de julgamento.
Sendo ininteligível a gravação dos depoimentos de determinadas, deverá ordenar-se a repetição desses depoimentos para que se possa apreciar a matéria de facto de que se recorre uma vez que, a não ser assim, para além deste Tribunal de Recurso se ver a braços com falta de matéria prima, a parte que recorre, vê-se impedida de exercer o seu direito de recurso com tais fundamentos.
Assim sendo, a falta de gravação ou a sua deficiência, nos casos em que a lei a prevê, porque influi decisivamente na decisão da causa, constitui a omissão de um acto prescrito por lei embora não sendo da culpa do Tribunal e sim do deficiente funcionamento do material utilizado que constantemente dá estes problemas e perdas de tempo.
Tal vicia o julgamento da matéria de facto e, consequentemente, os actos seguintes, porquanto se tem de extrair da deficiência da gravação o efeito próprio de uma nulidade processual: o de anulação e repetição do acto viciado e dos actos posteriores que dele dependam. (neste sentido, além dos acima referidos, vidé Ac do TRC, de 27-04-2011, Processo: 114/09.1GCSEI.C1, Relator: ELISA SALES; Ac TRG, de 03-05-2010, Proc nº 327/07.0GAPTL.G1, Relator: ESTELITA DE MENDONÇA; Ac do TRL de19-05-2010, Procº 59/04.1PDCSC.L1-3, Relator: CONCEIÇÃO GONÇALVES, in www.dgsi.pt)
Esta nulidade que se verifica só pode ser reparada com a anulação parcial do julgamento, cabendo determinar a sua repetição com gravação das declarações das testemunhas CF… e BR....
Assim, tendo a nulidade ocorrido na audiência de discussão e julgamento, todos os restantes actos que dela dependeram ficaram igualmente afectados, isto é, as alegações orais, a prestação das últimas declarações a que alude o artº 361º, do CPP, a elaboração da sentença e a sua leitura que deverão também ser repetidos para a sanação do vício (artº 122º CPP).
Face ao exposto fica prejudicada a apreciação das restantes questões.

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III. Decisão:
Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra, no seguinte:
1. Julgar procedente o recurso dos arguidos MG... e IK..., quanto à nulidade da deficiente gravação das declarações prestadas em audiência de julgamento pelas indicadas testemunhas e, consequentemente, julgam-se as mesmas inválidas, ordenando-se a sua repetição, bem como se declaram inválidos os actos anteriormente referidos, devendo proceder-se à sua repetição, após o que, deverá ser proferida nova sentença em conformidade, seguindo-se os ulteriores termos do processo.
2. Consideram-se prejudicadas as demais questões suscitadas pelos arguidos referidos.
- Sem custas.
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(Processado e revisto, pelo relator, o primeiro signatário)


Coimbra, 01/06/2011.


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Calvário Antunes



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Mouraz Lopes