Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | FONTE RAMOS | ||
Descritores: | PROCEDIMENTO DE INJUNÇÃO COMPENSAÇÃO RECONVENÇÃO ALTERAÇÃO DO VALOR DA CAUSA NOVA FORMA DE PROCESSO CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO DOS ARTICULADOS | ||
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Data do Acordão: | 03/11/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – LEIRIA – JUÍZO CENTRAL CÍVEL – JUIZ 2 | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE | ||
Legislação Nacional: | ARTIGOS 3º, N.º 3, 6º, 266º, N.º 2, AL. C) , 299º, N.ºS 2 E 3, 547º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ARTIGO 10º, N.º 2 DO DL N.º 62/2013, DE 10 DE MAIO (MEDIDAS CONTRA OS ATRASOS NO PAGAMENTO DE TRANSAÇÕES COMERCIAIS) ARTIGO 1º, 3º, 4º, 7º, 10º E 17º DO DL N.º 269/98, DE 1 DE SETEMBRO - PROCEDIMENTOS CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES EMERGENTES DE CONTRATOS – INJUNÇÃO. | ||
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Sumário: | 1. A lei - art.º 266º, n.º 2, al. c) do CPC - não expressa que a compensação só pode ser feita valer em reconvenção, mas sim que esta é admissível quando se pretenda invocar a compensação.
2. Em regra, a pretensão compensatória atém-se no âmbito da mesma relação jurídica da invocada pelo autor ou em relação conexa. 3. Daí que, em tais situações, seja conveniente e adequado apreciar e decidir conjuntamente, numa concessão processual de invocação da compensação o mais ampla possível, e a um mesmo tempo, as duas pretensões. 4. Não existe no regime do DL n.º 62/2013, de 10.5, o afastamento das regras processuais gerais sobre o cálculo do valor da ação, com influência na tramitação dos ulteriores termos da ação (art.ºs 10º, n.º 2 do DL n.º 62/2013, de 10.5 e 299º, n.ºs 2 e 3, do CPC). 5. Tratando-se de procedimento de injunção para pagamento de importâncias de valor inferior a metade da alçada da Relação, deduzida oposição com reconvenção, sendo os pedidos distintos e adicionado parte do valor do pedido formulado pelo réu ao valor do pedido formulado pelo autor - fixando-se valor superior a € 50 000 -, como o valor invocado pela Ré excede o contra crédito da A., o pedido de condenação neste excesso deverá ser invocado pela via reconvencional, pretensão que, ainda que não compreendida na inicial conformação adjetiva do procedimento, veio a caber no âmbito da ação declarativa comum que resultou da transmutação por força da atuação das partes, do novo valor da ação e do decidido, e acolhido, sobre a (nova) forma do processo e consequente correção da distribuição. 6. Impondo-se disciplinar/adaptar o processo em função da tramitação prevista para uma ação declarativa comum, há que aferir da conveniência ou necessidade em convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais e exercitar o contraditório (cf., v. g., art.ºs 3º, n.º 3, 6º e 547º, do CPC), essencial à afirmação do processo equitativo, sabendo-se que cabe ao tribunal assegurar a justa decisão da causa e que a decisão não pode ser conscienciosa e justa se a causa não estiver convenientemente instruída e discutida. (Sumário elaborado pelo Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | * Relator: Fonte Ramos Adjuntos: Carlos Moreira Vítor Amaral * Sumário do acórdão: (…)* Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I. Em 23.4/2022, A..., S. A., apresentou requerimento injuntivo contra B..., S. A., pedindo que seja condenada a pagar-lhe a quantia global de € 14 307,11, referindo, em resumo, que, no âmbito das respetivas atividades comerciais, forneceu-lhe diversos painéis metálicos, isolantes e produtos associados, e que, transcorrido o prazo de vencimento das faturas e interpelada para o efeito, a requerida nada pagou. Em 23.5.2022, a requerida opôs-se à injunção - impugnou e reconheceu parcialmente o valor do crédito peticionado (montante de € 12 582,68); deduziu reconvenção[1]. Concluiu: «deve: a) Ser a presente reconvenção admitida e julgada procedente por provada e, consequentemente, ser a Requerente e Reconvinda condenada a reconhecer que é devedora da Requerida Reconvinte na quantia de € 68 219,18 correspondente aos prejuízos por aquela causada, operando-se a compensação do crédito no montante de € 12 582,68, condenando-se, consequentemente, a Reconvinda no pagamento de € 55 636,50 correspondente à quantia não compensada. b) Caso se entenda que a Reconvenção não é de admitir, deverá ser julgada procedente por provada a exceção perentória de compensação, e, consequentemente, ser a Requerente e Reconvinda condenada a reconhecer que é devedora da Requerida Reconvinte na quantia de € 68 219,18 correspondente aos prejuízos por aquela causada, operando-se a compensação do crédito nesse valor; Sempre e em qualquer caso, c) Ser a ação julgada parcialmente improcedente, por não provada e, consequentemente, ser a Requerida absolvida do pedido ainda que parcialmente.» Em 24.01.2023, foi proferido o seguinte despacho: «Com cópia do requerimento da oposição apresentada, no qual foi deduzido um pedido reconvencional de condenação da autora no pagamento à ré do valor de € 55 636,50, por via da compensação de créditos e atenta a forma processual sob o qual a presente ação foi distribuída, antes de mais, notifique a autora para querendo, no prazo de 10 dias se pronunciar quanto à (in)admissibilidade da reconvenção apresentada. / * / De igual modo, atento o valor do pedido reconvencional, mais notifique as partes para em 10 dias, querendo, se pronunciarem quanto à (in)competência deste tribunal, atento o disposto nos artigos 299º, n.º 1 e 2 e 530º, n.º 3 do Código de Processo Civil e artigo 117º, n.º 1, alínea a) da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto.» A requerente foi notificada do referido despacho (notificação elaborada a 25.01.2023). Por requerimento de 07.02.2023, a requerente pronunciou-se nos seguintes termos: «(...) Da (in)admissibilidade da reconvenção apresentada: 1. O regime especial relativo ao atraso no pagamento de transações comerciais, estabelecido no Decreto-Lei n.º 62/2013, de 1 de maio, prevê duas formas processuais a seguir quando, havendo oposição, os autos são apresentados à distribuição: (i) se o valor da ação é superior a metade da alçada da Relação, segue-se a forma do processo comum; (ii) se esse valor for inferior a essa alçada, segue-se a forma da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos – cf. artigo 10º. 2. O valor da ação subsequente a um procedimento de injunção determina-se de acordo com o artigo 18º do DL n.º 269/98, de 1.9, segundo o qual o valor processual da injunção e da ação declarativa que lhe seguir é o do pedido, atendendo-se, quanto aos juros, apenas aos vencidos até à data da apresentação do requerimento. 3. Tratando-se de uma ação especial, a mesma é regulada pelas disposições que lhe são próprias – cf. n.º 1 do artigo 549º do Código de Processo Civil (de ora em diante, CPC). 4. “Seguindo o procedimento de injunção, os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergente de contratos, não é admissível reconvenção.” - cf. Acórdão do STJ de 24.9.2015, processo 166878/13.1YIPRT.E1.S1.[2] 6. O valor relevante aqui em vista para efeitos de aferição com o valor de metade da alçada da Relação é, expressamente, o valor do pedido, ou seja, deduzida oposição no procedimento de injunção destinado ao cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais em que o valor do pedido – necessariamente indicado no requerimento de injunção [artigo 10º, n.º 2, alínea e), do anexo ao DL n.º 269/98] – não seja superior a metade da alçada da Relação o procedimento segue a forma de ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos. 7. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, é certo, mas também não pode fazer-se sem encontrar na lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9º, n.ºs 1 e 2, do CC) e, muito menos, conduzir a um resultado que à letra da lei se opõe (artigo 9º, n.º 3, do CC) como seria o caso, salvo melhor opinião, de interpretar a norma em apreço por forma a considerar o valor do procedimento, para efeitos de distribuição e processado subsequente, como o resultante da soma do valor pedido e do valor da reconvenção quando a lei expressamente manda atender ao valor do pedido. (...) 9. (...) do exposto resulta, a nosso ver, a inexistência de qualquer arbitrariedade ou desproporcionalidade no regime que transmutando em ação especial a injunção destinado ao cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, cujo valor do pedido não seja superior a metade da alçada da Relação, não permite a formulação de pedido reconvencional, não se verificando, a nosso ver, a violação de nenhum dos princípios de direito apontados pela Recorrente, os quais supõem a inobservância dos apontados limites.” - cf. Acórdão da RE de 23.04.2020, processo 90849/19.1YIPRT-A.E1. 10. Pelo que não deverá ser admitida a reconvenção apresentada pela Ré. Da (in)competência do tribunal: (...) 13. Na eventualidade de ser admitida a reconvenção – o que não se concebe – tal factualidade alterará o tribunal competente, já que nessa situação a ação passaria a ter valor superior a 50 000€, passando a ser competente o Juízo Central Cível de Leiria.» Por seu lado, a requerida veio requerer “que o seu pedido reconvencional seja aceite” e a remessa dos autos à Instância Central Cível de Leiria. Em 01.3.2023, a Mm.ª Juíza do Juízo Local Cível de Porto de Mós admitiu a reconvenção, determinou o prosseguimento da ação sob a forma de processo comum, fixou o valor da causa (em € 69 841,61), julgou verificada a exceção de incompetência relativa em razão do valor e determinou a remessa dos autos para a Secção Cível da Instância Central do Tribunal da Comarca de Leiria. Efetivada a dita remessa, a requerente, notificada para o efeito, pagou o “complemento” da taxa de justiça consequente ao novo valor da causa; e informou que, nos termos daquela decisão de 01.3.2023, “os presentes autos deveriam ter sido redistribuídos como ação sob a forma de processo comum, pelo que (...) deverá ser corrigida a distribuição em conformidade”[3] (cf. notificação de 11.5.2023 e requerimento de 22.5.2023). Em 12.6.2023, o Mm.º Juiz do Juízo Central Cível proferiu o seguinte despacho: «Uma vez que foi deduzida oposição, nos termos do disposto no artigo 10º, n.º 2, do DL 62/2013, de 10/05, o processo segue a forma de processo comum. / Notifique, sendo as partes para, designadamente, juntarem e requerem todos os seus meios de prova.» Por requerimento de 26.6.2023, reportando-se ao despacho de 12.6.2023, a requerente juntou diversos documentos e aduziu e pediu o seguinte: «a) Ponto prévio - nulidade processual por falta de distribuição do presente processo como ação de processo comum 1. Apesar do (...) despacho (...) identificado, o presente processo não foi objeto de distribuição como ação de processo comum e, como tal, prossegue os seus termos como ação especial para cumprimento de obrigações nos termos do Decreto-Lei n.º 269/98. 2. Tal factualidade inviabiliza que a Autora possa apresentar contraditório quanto à reconvenção apresentada pela Ré. 3. Nomeadamente através da competente réplica à qual terá direito assim que distribuído o processo sob a forma de ação de processo comum. 4. Pelo que deverá ser ordenada a correção da distribuição e, consequentemente, ser expressamente concedido prazo para apresentação da competente peça processual a que a Autora terá direito no âmbito do processo comum. Sem prescindir do requerido, e do direito de vir a apresentar articulado de Réplica, e por manifesta cautela de patrocínio[4], desde já apresenta o seguinte contraditório b) Da impugnação às exceções apresentadas pela Ré 5. Face à falta de transmutação do processo em ação de processo comum, e atendendo às exceções invocadas pela Ré, nos termos do n.º 3 do art.º 3º do CPC, apresenta o respetivo contraditório. 6. A Autora impugna expressamente e para todos os efeitos legais o alegado nos artigos 3º, 5º, 6º, 7º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18º, 19º, 20º, 21º, 22º, 23º, 24º, 25º, 26º, 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 33º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 40º, 41º, 42º, 43º, 44º, 45º, 46º, 47º e respetivo petitório da oposição à injunção.[5] 7. Sendo que, neste momento processual, a Autora não se pronuncia quanto aos artigos 48º a 88º, por se tratar de matéria já apreciada e decidida.[6] 8. Mais impugna especificadamente o teor dos documentos n.ºs 1, 3, 4, 5, 6, 8, 9 e 10 juntos pela Ré, no que se refere aos efeitos e consequente prova que com os mesmos pretende esta fazer. (...) Quanto à matéria de impugnação (artigos 4º a 8º da oposição), 11. Dos 1022,33€ alegados pela Ré no artigo 6º da oposição, 121,40€ não são compensáveis já que foram emitidos a outra empresa, a C..., S. A., não havendo por isso identidade de devedor/credor quanto a este montante – cf. documentos n.ºs 1 e 2 juntos com a presente. 12. Aceita, por isso, apenas a compensação do montante de 900,93€ quanto ao alegado no referido artigo da oposição. Quanto à matéria específica da reconvenção, 13. A existir incidências nos painéis fornecidos, os mesmos dizem respeito a manuseamento, transformação ou outro tipo de manipulação da Ré ou de terceiros, relativamente aos quais a Autora será alheia. / (...) a abertura negocial da Autora sempre foi efetuada por tentativa de manutenção das relações comerciais e não como reconhecimento de qualquer tipo de defeito nos painéis fornecidos. / (...) são integralmente devidas as faturas peticionadas, conforme a própria Ré reconhece, não havendo lugar a qualquer compensação nos termos requeridos por esta. // Por último, (...) requer desde já a seguinte produção de prova: (...).» Na sequência, ainda, dos requerimentos das partes de 10.7.2023 e 17.7.2023[7], o Mm.º Juiz do Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho (de 09.10.2023): «I - Verifica-se que a presente ação foi instaurada inicialmente no Juízo Local Cível enquanto ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato no âmbito de transações comerciais entre empresas, passando a ação, por via da admissão da reconvenção, a correr termos, em face do seu valor (€ 69 841,61), no presente Juízo Central Cível, para onde foi remetida e distribuída, por passar a observar os termos do processo comum de declaração (como se anotou no despacho de 12.6.2023), encontrando-se a correr termos presentemente ainda distribuída na 2ª espécie, enquanto ação especial, e ainda como tal autuada, quando deveria estar já distribuída na 1ª espécie (ação comum) – cf. DL n.º 62/2013, de 10-05: art.º 10º-2; e Lei n.º 62/2013, de 26-08: art.º 44º-1. / II – Verificando-se que existe erro na forma do processo, deve ser corrigida a distribuição em conformidade, carregando-se na espécie correspondente – a 1ª – e descarregando-se na espécie em que se encontram – a 2ª -, continuado o presente processo a correr termos na mesma Secção e Juiz – cf. CPC: art.ºs 210º-b) e 212º. / III – Notifique. / * / IV – Oportunamente, conclua para determinar os ulteriores termos do processo.» Por saneador-sentença de 25.11.2023, o Tribunal recorrido decidiu: «I - Julgar parcialmente reconhecido o crédito da autora, peticionado no requerimento inicial injuntivo e, em consequência, condenar a ré a pagar à autora a quantia de €12 582,68 (doze mil, quinhentos e oitenta e dois euros e sessenta e oito cêntimos); II - Julgar totalmente procedente o pedido reconvencional deduzido pela ré-reconvinte e, em consequência, condenar a autora-reconvinda a pagar àquela a quantia de € 68 219,18 (sessenta e oito mil, duzentos e dezanove euros e dezoito cêntimos); III - Operar a compensação de créditos e condenar a autora-reconvinda a pagar à ré-reconvinte a quantia de € 55 636,50 (cinquenta e cinco mil, seiscentos e trinta e seis euros e cinquenta cêntimos); IV - Condenar a autora-reconvinda nas custas da reconvenção - por referência ao valor de € 55 636,50 – cf. CPC: art.ºs 527º-1-2, 299º-2 e 530º-2. V - Determinar o prosseguimento dos autos para apreciação do objeto da ação referente ao crédito remanescente, no montante de €1 022,33 e eventuais acréscimos.» Inconformada, a A. apelou formulando as seguintes conclusões: A) Do recurso do despacho proferido a 01.3.2023 pelo Juízo Local Cível de Porto de Mós 1. A recorrente entende que o despacho identificado é (apenas) recorrível nesta fase na medida em que o mesmo não decidiu sobre a admissão ou rejeição de algum articulado, mas sim sobre o pedido de admissibilidade de um dos pedidos constantes de articulado previsto e admissível – a oposição à injunção – pelo que recorrível com o saneador sentença nos termos do n.º 3 do art.º 644º do Código de Processo Civil (CPC). 2. O valor relevante para efeitos de aferição com o valor de metade da alçada da Relação é, expressamente, o valor do pedido, ou seja, deduzida oposição no procedimento de injunção destinado ao cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais em que o valor do pedido – necessariamente indicado no requerimento de injunção [art.º 10º, n.º 2, alínea e), do anexo ao DL n.º 269/98] – não seja superior a metade da alçada da Relação o procedimento segue a forma de ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, forma que não admite pedido reconvencional. 3. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, é certo, mas também não pode fazer-se sem encontrar na lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (artigo 9º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil [CC]) e, muito menos, conduzir a um resultado que à letra da lei se opõe (artigo 9º, n.º 3, do CC) como seria o caso, salvo melhor opinião, de interpretar a norma em apreço por forma a considerar o valor do procedimento, para efeitos de distribuição e processado subsequente, como o resultante da soma do valor pedido e do valor da reconvenção quando a lei expressamente manda atender ao valor do pedido. 4. Como defende Gabriela da Cunha Rodrigues (in Revista Julgar Online, dezembro de 2019, p. 19), “é de enveredar por uma interpretação restritiva do artigo 266º, n.º 2, alínea c), do CPC, no sentido de se aplicar apenas às formas de processo que admitem reconvenção, a qual permite respeitar a intenção do legislador com a alteração e, ainda assim, prevenir as consequências negativas que ultrapassaram o resultado pretendido.” 5. Recentemente o Tribunal da Relação de Guimarães decidiu que: “I – A razão para a existência de formas de processo que não admitem reconvenção é a sua maior simplicidade e celeridade, que é garantida através da limitação do objecto do processo e de uma tramitação menos exigente. II – A existência do crédito compensável não pode ser só apurada no âmbito do juízo de compensação, devendo, antes, surgir com autêntica exigibilidade, sob pena de se ir enxertar numa acção pendente (a pretexto de reconvenção) outra que com ela não tenha conexão” - cf. Ac. da RG de 30/11/2023, processo nº 9197/23.0YIPRT-A.G1, dgsi. 6. Assim sendo, a existência do crédito compensável não pode ser só apurada (podendo, apenas, ser liquidada) no âmbito do juízo de compensação. 7. Aí terá de surgir não como mera expectativa, mas com autêntica exigibilidade, sob pena de se ir enxertar numa ação pendente (a pretexto de reconvenção) outra que com ela não tenha conexão. 8. Posto isto, considerando que a reconvenção, quando muito e independentemente da falta, ou não, de suporte legal a nível de direito substantivo, como se entende, se basearia no disposto no art.º 266º, n.º 2, al. a), do CPC, e não na situação prevista na al. c), desse mesmo diploma, tem de se concluir não ser a situação enquadrável numa mera e simples compensação de um crédito já líquido, exigível e vencido. 9. No caso em apreço o pedido indemnizatório apresentado em sede de reconvenção nada tem que ver com as faturas em dívida – que a ré recorrida até reconhece – mas sim estará relacionado com outros fornecimentos para outras obras em nada relacionadas com as faturas da injunção. 10. Procurando a Reconvinte (aqui recorrida) enxertar numa ação pendente (a pretexto de reconvenção) outra que com ela não tem qualquer conexão que não a identidade das partes. 11. Nem nos termos da alínea a), nem da alínea c) do n.º 2 do artigo 266º do CPC, se pode fundamentar a admissão da reconvenção. 12. Pelo que a decisão de admissão da reconvenção deverá ser revogada e substituída por outra que não admita a reconvenção, com todas as legais consequências, nomeadamente a revogação da decisão de correção da distribuição, o que implicará que o processo volte a seguir os termos da ação especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos. B) Do recurso do saneador-sentença 13. Caso se entenda correta a decisão de admissibilidade da reconvenção deduzida, incumbe ao juiz adaptar o processo, ao abrigo dos princípios da gestão e adequação formal – cf. n.º 3 do artigo 37º, aplicável ex vi n.º 3 do 266º e artigos 6º e 547º do CPC – cf., a este respeito, acórdão da RG de 25/05/2017, processo nº 1242/09.9TJVNF.B.G1. 14. Atendendo que quando foi notificada da contestação recebeu indicação expressa para apenas se pronunciar quanto à admissibilidade da reconvenção, e naquele momento não tinha disponível articulado para o efeito, não ficou ciente – como não poderia – de ter qualquer prazo processual em curso para contraditar a referida reconvenção. 15. Assim, naturalmente que um dos atos de adaptação do juiz sempre teria de ser expressamente conceder prazo para o efeito, ou até para as partes corrigirem os seus articulados, ou mesmo ordenar notificação expressa de então, sim, ter-se iniciado o prazo para apresentação da réplica, já que quando a contestação foi notificada originalmente, tal prazo inexistia processualmente, por tal articulado não ser admissível. 16. De facto, na forma especial de processo originária a recorrente não só não tinha obrigação de apresentar réplica, como estava legalmente proibida de apresentar novo articulado após a oposição à injunção, pelo que manifestamente a adaptação a realizar pelo tribunal, após admitir a reconvenção, teria de atentar a esta fragilidade processual em que a autora, aqui recorrente, se encontrava pela impossibilidade objetiva de replicar quando é notificada da contestação. 17. Tendo, contudo, o tribunal a quo falhado na correção dessa limitação processual, violando o seu dever de adequação formal para assegurar um processo equitativo. 18. Ao não ter feito a adaptação que lhe era exigível pela lei processual, o tribunal a quo violou as normas constantes do n.º 3 do artigo 37º, aplicável ex vi n.º 3 do 266º e artigos 6º e 547º, todos do CPC. 19. O tribunal a quo falhou quanto às obrigações que decorriam do reconhecimento da existência de erro na forma de processo, nos termos da lei processual. 20. “O erro na forma de processo é uma nulidade processual”. 21. Dispõe o n.º 2 do artigo 193º do CPC que não podem aproveitar-se os atos já praticados, “se do facto resultar uma diminuição de garantias do réu.” 22. Ora, na relação processual reconvencional a A. assume a figura de Ré e vice-versa, pelo que para este efeito, e em concreto quanto aos efeitos do verificado erro na forma de processo, não poderiam nunca aproveitar-se atos já praticados no processo em análise que prejudicassem a A./recorrente, na sua posição de ré do pedido reconvencional. 23. Sendo a recorrente manifestamente prejudicada e sendo as suas garantias de defesa claramente diminuídas pelo aproveitamento do atabalhoado andamento dos presentes autos. 24. Até ao despacho que verificou existir erro na forma de processo e ordenou a respetiva correção, os autos iniciaram termos numa injunção de valor que não admitiria que viesse depois a correr sob a forma de processo comum, foi redistribuída duas vezes em tribunais distintos, sempre como ação especial, na qual a A. está legalmente impedida de apresentar qualquer articulado após a oposição, pelo que até à verificação do erro na forma de processo sempre esteve a A. processualmente impedida de articular o seu contraditório. 25. Pelo que, após o despacho que verificou existir erro na forma de processo e após a respetiva correção de distribuição, uma efetiva e correta adequação do estado dos autos e o respeito pelas suas mais essenciais garantias de defesa das partes teria sempre que passar pela notificação da A./reconvinda para: (1) querendo, aperfeiçoar o seu articulado de contraditório à reconvenção (que, nunca é demais recordar, já havia sido apresentado nesta altura dos autos); (2) ou notificá-la para a apresentação, querendo, de réplica – peça que agora já poderia apresentar por estar já no âmbito da ação de processo comum. 26. Ao não o fazer verifica-se uma nulidade processual por omissão de ato processual legalmente previsto, que viola o disposto na parte final do n.º 2 do artigo 193º do CPC. 27. Apenas no âmbito do processo comum ordinário, a parte que é notificada da contestação com reconvenção tem consciência, por via dessa notificação no âmbito desta específica forma de processo, que se inicia o prazo para replicar. 28. E é só para este tipo de processo que tal cominação pode operar, porque não tem a parte qualquer dúvida de quando e por que motivo corre o prazo em causa. 29. No caso em análise, a notificação da contestação é efetuada no âmbito da forma de processo especial que não só não prevê a réplica, como proíbe qualquer articulado posterior à oposição/contestação. 30. Tendo a Autora sido notificada apenas para efeito de pronúncia de admissibilidade ou não da reconvenção, em nenhum momento a parte ficou consciente que prazo algum deveria correr. 31. O mesmo ocorreu posteriormente pois o processo, como se viu, manteve-se como ação especial até outubro, tendo só aí sido verificado o erro na forma de processo e corrigida – insuficientemente, como se viu – a sua forma. 32. Nessa medida, em especial atendendo à falta de distribuição do mesmo como ação comum ordinária, não existiu no processo momento claro em que a parte ficou consciente de que tinha que apresentar a defesa, e que o prazo para essa defesa estava a correr, o que seria essencial para aplicação do artigo 587º do CPC, e que justificaria o ónus ali previsto. 33. Sendo totalmente abusivo, violador da ratio legis e a unidade do sistema jurídico processual civil que fundamenta as consequências ali previstas, a aplicação da cominação prevista no artigo 587º do CPC ao caso em apreço. 34. A decisão que seja proferida sem prévia observância do princípio do contraditório é nula, podendo essa nulidade ser suscitada em sede de recurso a interpor dessa decisão. 35. Acresce que a falta de pronúncia do juiz sobre o contraditório efetivamente exercido implica a nulidade da Decisão reclamada, nulidade que aqui expressamente se invoca, nos termos conjugados dos art.ºs 607º, 608º, n.º 2, 615º, n.º 1 alínea d) e n.º 4 do CPC. 36. Atendendo ao supra exposto, parece manifesto que a interpretação das normas dos art.ºs 574º e 587º do CPC efetuada pelo tribunal recorrido, cominando a autora com a ficcionada admissão por acordo dos factos alegados pela reconvinte num processo que se iniciou como ação especial e que como tal correu termos até ser verificado erro na forma de processo, sem ter lugar qualquer adaptação processual que protegesse a posição da recorrente – ré naquele pedido – são inconstitucionais por violação do princípio do Estado de Direito democrático e da proporcionalidade que lhe é inerente e, bem assim, do direito fundamental, do tipo direitos, liberdades e garantias, de acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efetiva e dos princípios da proibição da indefesa e do processo equitativo, subordinado a princípios e garantias fundamentais, como sejam os princípios do contraditório e da igualdade, consagrados nos art.ºs 2º, 3º, n.º 2, 18º, 20º, 202º e 204º da Constituição da República Portuguesa e ainda no art.º 6º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, ratificada por Portugal através da Lei n.º 65/78, de 13.10. 37. A apelada, na sua oposição, não cumpriu o disposto na alínea c) do artigo 572º do CPC, que impõe ao Réu expor os factos essenciais em que se baseiam as exceções deduzidas, especificando-as separadamente, sob pena de os respetivos factos não se considerarem admitidos por acordo. 38. Pelo que, face à manifesta insuficiência das suas alegações, por aplicação do disposto na alínea c) do artigo 572º do CPC, não poderão tais “factos” ser admitidos por acordo. 39. Ora, constituindo tais valores a totalidade do suposto crédito da ré sobre a autora, e não sendo suscetíveis de ser admitidos por acordo, terá de cair por terra a sua inserção nos factos provados e, consequentemente, deverá passar para matéria a inserir no objeto do litígio e enunciada nos temas da prova ainda a produzir. 40. O que acarretará a anulação da sentença por falta de matéria que a sustente. Deve o: A) Quanto ao despacho proferido a 01.3.2023, ser o mesmo revogado e substituído por outro que não admita a reconvenção, com todas as legais consequências, nomeadamente passando o processo a correr os termos do processo especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos. B) Quanto ao saneador sentença, deverá ser revogada e: a. Ser substituída por despacho que, em cumprimento do dever de adaptação do processo, convide a A. a aperfeiçoar o seu articulado de contraditório à reconvenção, concedendo prazo expresso para a apresentação da agora processualmente devida réplica; Caso assim não se entenda, subsidiariamente: b. Ser substituída por despacho saneador que não comine com o presumido reconhecimento tácito das alegações da reconvinte, mantendo-se a matéria constante da reconvenção, que foi já objeto de articulado de contraditório, como matéria a inserir no objeto do litígio e enunciada nos temas da prova ainda a produzir. A Ré respondeu concluindo pela improcedência do(s) recurso(s). Por despacho de 09.3.2024, o Mm.º Juiz do Tribunal a quo não admitiu o recurso do despacho de 01.3.2023 (segmento da pronúncia sobre a admissibilidade da reconvenção)[8], impugnação que, em sede de Reclamação, veio a ser admitida por esta Relação[9]. Admitiu, no entanto, o recurso do despacho saneador-sentença parcial (com subida imediata, em separado e com efeito devolutivo). Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objeto do recurso, importa apreciar e decidir: a) (in)admissibilidade da reconvenção; b) regularidade da tramitação; c) mérito do saneador-sentença (cuja reapreciação depende da resposta às anteriores questões). * II. 1. Para a decisão do(s) recurso(s) releva o que consta do relatório que antecede. 2. Cumpre apreciar e decidir. O DL n.º 62/2013, de 10.5, aplicável à situação dos autos[10], transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 2011/7/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16.02.2011, que estabelece medidas contra os atrasos de pagamento nas transações comerciais (art.º 1º). Tal regime aplica-se a todos os pagamentos efetuados como remuneração de transações comerciais (art.º 2º, n.º 1); para efeitos do referido diploma, entende-se por «Transação comercial», uma transação entre empresas ou entre empresas e entidades públicas destinada ao fornecimento de bens ou à prestação de serviços contra remuneração (art.º 3º, alínea b)). O atraso de pagamento em transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida (art.º 10º, n.º 1, sob a epígrafe “procedimentos especiais”). Para valores superiores a metade da alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum (n.º 2). Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais (n.º 3). As ações para cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, seguem os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos quando o valor do pedido não seja superior a metade da alçada da Relação (n.º 4). 3. Em matéria cível, a alçada dos tribunais da Relação é de € 30 000 e a dos tribunais de 1ª instância é de € 5 000 (art.º 44º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26.8). 4. Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL n.º 32/2003, de 17.02 - art.º 7º do Anexo ao DL n.º 269/98, de 01.9, na redação conferida pelo art.º 8º do DL n.º 32/2003, de 12.02[11]. O art.º 1º do referido DL n.º 269/98 (diploma preambular), na redação dada pelo art.º 6º do DL n.º 303/2007, de 24.8, prevê os procedimentos (especiais) destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15 0000, cujo regime consta dos art.ºs 1º a 5º do Anexo ao citado DL n.º 269/98. 5. Atendendo, agora, ao regime dos procedimentos a que se refere o art.º 1º do dito DL n.º 269/98. Relativamente à ação declarativa (Cap. I/Anexo), importa destacar: - A petição (o autor exporá sucintamente a sua pretensão e os respetivos fundamentos) e a contestação não carecem de forma articulada; o duplicado da contestação será remetido ao autor simultaneamente com a notificação da data da audiência de julgamento (art.º 1º, n.ºs 1, 3 e 4, sob a epígrafe “petição e contestação”). - No que concerne aos termos posteriores aos articulados, prevê o art.º 3º que, se a ação tiver de prosseguir, pode o juiz julgar logo procedente alguma exceção dilatória ou nulidade que lhe cumpra conhecer ou decidir do mérito da causa (n.º 1); a audiência de julgamento realiza-se dentro de 30 dias, não sendo aplicável o disposto nos n.ºs 1 a 3 do artigo 155º do Código de Processo Civil às ações de valor não superior à alçada do tribunal de 1ª instância (n.º 2); as provas são oferecidas na audiência, podendo cada parte apresentar até três testemunhas, se o valor da ação não exceder a alçada do tribunal de 1ª instância, ou até cinco testemunhas, nos restantes casos (n.º 4). - E no tocante à audiência de julgamento existem ainda especificidades visando principalmente a celeridade e simplificação dos atos (art.º 4º). Quanto à injunção (Cap. II/Anexo)[12] e no que aqui interessa, será de atentar no seguinte: - Depois da “noção” do art.º 7º - supra referida - preceitua o art.º 10º (a respeito da “forma e conteúdo do requerimento”) que, no requerimento, deve o requerente, nomeadamente, expor sucintamente os factos que fundamentam a pretensão; formular o pedido e indicar, quando for o caso, que se trata de transação comercial abrangida pelo DL n.º 62/2013, de 10.5[13] [n.º 2, alíneas d), e) e g)]. - À oposição é aplicável o disposto no n.º 3 do art.º 1º (art.º 15º); deduzida oposição ou frustrada a notificação do requerido, no caso em que o requerente tenha indicado que pretende que o processo seja apresentado à distribuição[14], (…), o secretário apresenta os autos à distribuição que imediatamente se seguir (art.º 16º, n.º 1). - Por último, dispõe o art.º 17º (sob a epígrafe “termos posteriores à distribuição”) que, após a distribuição (...), segue-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 4 do art.º 1º e nos art.ºs 3º e 4º (n.º 1); recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais (n.º 3). 6. O processo especial aplica-se aos casos expressamente designados na lei (art.º 546º, n.º 2, 1ª parte, do CPC) e regula-se pelas disposições que lhe são próprias e pelas disposições gerais e comuns; em tudo quanto não estiver prevenido numas e noutras, observa-se o que se acha estabelecido para o processo comum (art.º 549º, n.º 1, do CPC). 7. Os presentes autos tiveram origem num requerimento de injunção, sujeito ao regime previsto no DL n.º 269/98, de 01.9, mormente, quanto à apresentação do requerimento de injunção e à eventual dedução de oposição. Quando foi instaurado, o procedimento especial de injunção era processo próprio para exigir judicialmente o cumprimento das seguintes obrigações: a) obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior a € 15 000; b) obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL n.º 32/2003, de 17.02 e pelo DL n.º 62/2013, de 10.5, independentemente do valor da dívida.[15] A A. recorreu, pois, a meio processual adequado (injunção) destinado a exigir o cumprimento de obrigação pecuniária emergente de transação comercial abrangida pelo DL 62/2013, de 10.5 (outrora DL n.º 32/2003 de 17.02) – cf. art.ºs 1º do DL n.º 269/98, de 01.9 e 10º do DL n.º 62/2013, de 10.5.[16] In casu, o valor da pretensão formulada no requerimento injuntivo em causa é inferior a metade da alçada da Relação (€ 15 000) e respeita a contratos de natureza comercial (transações comerciais) envolvendo as partes; a dedução da oposição determinava, no caso, a apresentação dos autos à distribuição e, em princípio, a tramitação (simples e expedita) prevista nos art.ºs 1º, n.º 4, 3º, 4º e 17º, n.º 1, do DL n.º 269/98, de 01.9.[17] 8. Decorre dos autos que (já) não se questiona o valor da causa, a redistribuição como ação declarativa comum (com as vicissitudes descritas em I., supra) e a competência do Tribunal, e bem assim que o primeiro dissenso respeita à pronúncia sobre a admissibilidade da reconvenção decidida pelo despacho de 01.3.2023. Esta, pois, a 1ª questão. 9. A questão de saber se a compensação tem, ou não, de ser invocada sempre via reconvencional, ao abrigo do anterior art.º 274º, n.º 2, al. b) e atual art.º 266º, n.º 2, alínea c) do CPC tem sido abundantemente abordada na doutrina e na jurisprudência, constituindo uma vexata quaestio com dilucidações, essencial ou circunstancialmente, díspares. E as principais orientações existentes na doutrina e na jurisprudência sobre a admissibilidade da reconvenção (e/ou da compensação de créditos) no âmbito do regime do DL n.º 269/98, de 1.9, são as seguintes: A primeira, com o entendimento de que “não obstante a ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias (AECOP) de valor não superior a € 15 000 apenas comportar dois articulados, caso o réu pretenda excecionar a compensação de créditos, deve ser admitida a dedução de pedido reconvencional, cabendo ao Juiz adequar o processado (547º CPC)” - embora a compensação de créditos, face à redação do art.º 266º, n.º 2, al. c) do CPC, tenha sempre de ser operada por via da reconvenção, não admissível numa ação especial de cumprimento de obrigações pecuniárias, por razões de justiça material, não pode ser coartada ao requerido a possibilidade de, nessas ações, invocar a compensação de créditos por via da dedução de reconvenção, devendo o juiz, se necessário, fazer uso dos seus poderes de gestão processual e de adequação formal para ajustar a respetiva tramitação à dedução do pedido reconvencional.[18] A segunda, no sentido de que nas ações especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias reguladas no anexo do DL n.º 269/98, de 01.9, não é admissível a dedução de pedido reconvencional, nos termos do art.º 266º, n.º 2, do CPC, uma vez que tal não se coaduna com a simplicidade de tramitação e celeridade que o legislador pretendeu imprimir a esta forma processual.[19] A terceira defende que o citado segmento normativo da lei processual civil atribui ao compensante uma mera faculdade de usar a reconvenção para fazer operar a compensação, podendo, assim, invocá-la por via excetiva - é admissível a dedução da compensação, mas como exceção perentória sob pena de ser coartado um meio de defesa ao requerido.[20] 10. Na verdade, a compensação constitui uma exceção perentória que pode obstar ao direito da contraparte, constituindo um meio de extinção das obrigações (art.ºs 847º e seguintes do CC) e que pode ser invocada em sede de contestação (art.º 571º, n.º 1, do CPC; não se antolha, pois, nos casos em que o valor da compensação não exceda o contra crédito, a necessidade de obrigar sempre o compensante a invocá-la apenas via reconvencional. A lei - art.º 266º, n.º 2, al. c) do CPC - não expressa que a compensação só pode ser feita valer em reconvenção, mas sim que esta é admissível quando se pretenda invocar a compensação[21], nem tal entendimento extremo se alcança como o mais conveniente para operar a justa composição do litígio de modo mais célere e com o menor dispêndio de meios, sabendo-se que, em regra, a pretensão compensatória atém-se, no âmbito da mesma relação jurídica da invocada pelo autor ou em relação conexa. Daí que, em tais situações, seja conveniente e adequado apreciar e decidir conjuntamente, numa concessão processual de invocação da compensação o mais ampla possível, e a um mesmo tempo, as duas pretensões.[22] 11. É requisito fundamental da compensação que haja uma reciprocidade de créditos e débitos das partes e, ainda, entre outros requisitos, ser o crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, perentória ou dilatória, de direito material [art.º 847º, n.º 1, a) do CC], considerando-se, assim, que a obrigação é judicialmente exigível quando o credor puder exigir o seu cumprimento através de ação executiva, se já estiver munido de título executivo, ou, no caso contrário, através de ação declarativa para obtenção de sentença que condene o devedor no cumprimento [será na ação declarativa, onde é deduzida a compensação, por via de exceção ou de reconvenção, que devem ser verificados os respetivos requisitos, designadamente o da exigibilidade judicial, de molde a poder concluir-se quanto à existência desse contra crédito para eficaz compensação].[23] 12. A compensação é, sob o ponto de vista processual, um instituto sui generis, equiparável à reconvenção em certo aspeto e identificável com a exceção num outro. A sua equiparação à reconvenção obrigará desde logo o réu a deduzir o seu contra crédito nos termos do art.º 583º do CPC, com as necessárias adaptações, ao mesmo tempo que levará o tribunal a considerar a contestação, na parte relativa à invocação do contra crédito, como uma petição inicial. A identificação da compensação com a exceção perentória (ressalvada a hipótese do contra crédito de montante superior ao pedido formulado pelo autor) condirá, por seu turno, com o facto de o réu não concluir solicitando a condenação do autor num pedido autónomo, mas requerendo apenas a declaração judicial de improcedência, total ou parcial, do pedido formulado pelo autor.[24] 13. Na situação em análise, o valor da compensação excede o contra crédito, a Ré deduziu reconvenção e ocorreram vicissitudes adjetivas que reclamam adequada ponderação. 14. A decisão proferida em 01.3.2023 foi assim fundamentada: - A 2ª orientação referida em II. 9., supra, tem vindo a merecer alguma flexibilização, designadamente quando em sede de reconvenção é pretendida pelo réu/reconvinte a compensação de créditos.[25] - Dando mostras de uma inversão consolidada naquela que foi uma corrente quase unânime num dado período, veja-se o acórdão do STJ de 06.6.2017-processo 147667/15.5YIPRT.P1.S2, disponível em www.dgsi.pt.[26]. - Propendemos a adotar tal entendimento pelas razões expostas com especial destaque para a natureza da alegada inadmissibilidade de dedução da reconvenção – que se prende com razões puramente formais e processuais – argumento que esbarra de forma frontal com o disposto no 266º, n.º 3 do CPC que prevê a situação em que se permite ao Juiz ultrapassar a limitação decorrente da diferença de forma de processo. - A perda da celeridade que caracteriza a ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias de valor não superior a € 15 000 é compensada pela obtenção de uma decisão mais justa e que propicia ganhos processuais, evitando quer a instauração de uma ação autónoma seja para o réu satisfazer o seu contra crédito (nos casos em que não se admita sequer a defesa por compensação enquanto exceção perentória), seja para o réu satisfazer o remanescente do seu contra crédito na parte em que excede o valor do pedido (nos casos em que, pese embora se admita a dedução da compensação enquanto exceção perentória, se limite tal admissibilidade ao valor do pedido formulado pelo autor). - Por outro lado, não existindo, no regime do DL n.º 62/2013 de 10.5, o afastamento das regras processuais gerais sobre o cálculo do valor da ação, em função do preceituado no art.º 299º do CPC, o valor da reconvenção deverá ser adicionado ao valor da ação, pelo que a dedução de oposição com reconvenção impõe a soma dos dois pedidos, valor em função do qual serão tramitados os ulteriores termos dos atos processuais (art.º 299º, n.ºs 2 e 3, do CPC). - Assim, por razões de justiça material e à luz do poder-dever de gestão processual, em ações especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor inferior a € 15 000 é admissível a dedução de reconvenção para efeito de compensação de créditos, verificando-se o fator de conexão previsto no art.º 266º, n.º 2, alínea c) do CPC. - Por outra via, no âmbito destas ações será de aplicar o disposto no art.º 299º, n.º 2 do CPC conjugado com o disposto no art.º 10º, n.º 2 do DL n.º 62/2013, de 10.5, ou seja, procedendo à soma dos dois pedidos, nos termos do primeiro normativo, passando os autos a seguir a forma de processo comum, caso a soma seja superior a € 15 000. - No presente caso, e nos termos do disposto nos art.ºs 299º, n.º 2 e 530º, n.º 3 do CPC, constata-se que ao valor do pedido (€ 14 205,11) somar-se-ia o valor do pedido reconvencional mas apenas na parte em que excede a compensação (€ 55 636,50). Contas feitas, o valor da ação será de € 69 841,61, seguindo os autos a forma de processo comum, sendo como tal, também por esta via, admissível a reconvenção deduzida. - Assim, em face do exposto, nos termos do disposto nos art.ºs 266º, n.ºs 2, alínea c) e 3 e 547º do CPC, admite-se a reconvenção deduzida. - Subsequentemente, nos termos do disposto no art.º 10º, n.º 2 do DL n.º 62/2013, de 10.5, atento o valor da presente ação, determina-se o prosseguimento da ação sob a forma de processo comum, corrigindo-se a distribuição, em conformidade (sem prejuízo dos atos já praticados pelas partes, compatíveis com esta forma de processo). 15. No caso vertente, o processo surgiu como procedimento de injunção. Por via da oposição/contestação da Ré, e como se explicitou nas decisões proferidas em 01.3.2023 e 12.6.2023 (esta, proferida pelo Tribunal competente para a instrução e o julgamento dos autos), passou e/ou deveria passar a observar os termos do processo comum de declaração, transmutação ou convolação do processamento injuntivo em processamento comum enquadrável (face ao novo valor da causa) na previsão do art.º 10º, n.º 2 do DL n.º 62/2013, de 10.5, sendo que só então foi e podia/devia ser admitida a reconvenção (com a possibilidade de oportuna apresentação de novo articulado, previsto na tramitação do processo comum).[27] Em 01.3.2023, determinou-se a alteração da forma de processo para processo comum e admitiu-se o pedido reconvencional. Como o valor invocado pela Ré excede o contra crédito da A., o pedido de condenação neste excesso sempre deveria ser invocado pela via reconvencional[28], pretensão que, ainda que não compreendida na inicial conformação adjetiva do procedimento, veio a caber no âmbito da ação declarativa comum que resultou da transmutação por força da atuação das partes, do novo valor da ação e das mencionadas decisões de 01.3.2023 e 12.6.2023 (nessa parte - forma do processo e consequente correção da distribuição -, acolhidas).[29] Assim, retomando o expendido supra, nomeadamente, em II. 10. e 13, e verificados os requisitos (desde logo, formais/adjetivos), conforme também se explicitou na decisão sob censura (cf. II. 14., supra), nada seria de objetar à admissibilidade da reconvenção, o que dita a improcedência do 1º segmento da apelação. 16. Contudo, importava/importa disciplinar/adaptar o processo em função da tramitação prevista para uma ação declarativa comum (porquanto, além do mais, a Ré deduzira um pedido reconvencional).[30] 17. Atendendo, designadamente, ao concreto (e limitado) objeto do despacho de 24.01.2023 e às vicissitudes (e delonga) que antecederam a efetiva (re)distribuição dos autos como ação declarativa comum (cf. despachos de 01.3.2023, 12.6.2023 e 09.10.2023; cf., ainda, ponto I., supra), afigura-se que se deverá atender e relevar a posição assumida pela A. no requerimento de 26.6.2023 (impugnando - após aquele despacho de 12.6.2023 - o aduzido pela Ré/reconvinte)[31], mormente no tocante ao pedido reconvencional, sem prejuízo de se poder/dever aferir da conveniência ou necessidade em convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais e exercitar o contraditório (cf., v. g., art.ºs 3º, n.º 3[32], 6º e 547º[33], do CPC), essencial à afirmação do processo equitativo[34], sabendo-se que cabe ao tribunal assegurar a justa decisão da causa e que a decisão não pode ser conscienciosa e justa se a causa não estiver convenientemente instruída e discutida.[35] 18. Daí que se considere que sempre seria excessivo e injustificado atuar a consequência do não cumprimento do ónus de contestação da reconvenção estabelecida no art.º 587º, n.º 1, do CPC (admissão dos factos não impugnados pelo A.)[36], em momento anterior a junho/2023, porquanto não seria efetivamente dada a oportunidade para o A. se opor à reconvenção deduzida e seus fundamentos[37], perspetiva que temos por adequada e razoável face às circunstâncias e vicissitudes da tramitação dos autos, tanto mais que a matéria em análise tem suscitado, e suscita, dificuldades várias. 19. Por conseguinte, importa revogar a decisão de 25.11.2023, sem prejuízo dos factos admitidos na contestação e do reconhecimento (parcial) do crédito reclamado pela A. na injunção (montante de € 12 582,68 - a que respeita o ponto I. do segmento injuntivo da decisão recorrida). Tudo o mais permanece controvertido e deverá ser sujeito a adequada instrução (cf., principalmente, II. 16. a 18., supra) e a julgamento. 20. Procedendo, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso do saneador-sentença, considera-se prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas. * III. Face ao exposto, julga-se a apelação parcialmente procedente, pelo que se mantém a decisão de 01.3.2023 e revoga o saneador-sentença de 25.11.2023, na parte impugnada, como se indica em II. 19., supra. Custas por A. e Ré, em partes iguais. * 11.3.2025
[7] No requerimento da A. de 17.7.2023 (na sequência da “resposta” da requerida, de 10.7.2023, ao requerimento daquela de 26.6.2023), impugnou-se o alegado pela parte contrária e afirmou-se, designadamente: «efetivamente não houve notificação com identificação da reconvenção, mas apenas para uma questão prévia entretanto decidida, e que por cautela de patrocínio igualmente aqui se invoca – mas sim com a prévia falta de distribuição como processo comum que permitirá usufruir do direito a apresentar uma réplica, o que não sucedeu até à data», mas, em qualquer caso, «“A falta de impugnação, por via de articulado de réplica, não implica a confissão dos factos, pois o Autor pode sempre e deve responder à matéria da exceção em sede de audiência prévia, ou, não havendo, na audiência final (artigo 3º, n.º 4 do CPC).” (...)». [8] Por considerar que a A./recorrente “não chegou a interpor recurso do mesmo pelo que a respetiva decisão transitou em julgado no que respeita à admissibilidade da reconvenção”. [9] Nos presentes autos (apenso B), em 13.6.2024, o relator proferiu o seguinte despacho: «No despacho sobre o requerimento de interposição do(s) recurso(s), de 09.3.2024, o Mm.º Juiz do Tribunal a quo não admitiu, por extemporâneo, o recurso do despacho de 01.3.2023 (segmento da pronúncia sobre a admissibilidade da reconvenção) e admitiu o recurso do despacho saneador-sentença parcial (com subida imediata, em separado e com efeito devolutivo). / A A./recorrente reclamou contra a referida não admissão do recurso, reclamação ora tramitada sob o apenso A. / Atendendo a toda a problemática versada nos autos, considera-se, salvo o devido respeito por entendimento contrário, que não se justificará conhecer do recurso do presente apenso (B) sem que previamente se profira decisão na dita reclamação (nos termos e para os efeitos do art.º 643º, n.º 4 do CPC). / Se admitido o recurso, ante a interconexão das matérias em causa e, também, por razões de economia processual, cremos que justificará um único julgamento, nesta Relação. / E também se justifica(rá) que a reclamação seja apresentada ao mesmo relator. / Termos em que se determina: / a) que os presentes autos sejam retirados da tabela de 18 de junho; / b) que, oportunamente, a reclamação seja apresentada ao mesmo relator do presente apenso. (...) Na reclamação, o relator (a 16.9.2024) decidiu admitir o recurso interposto e determinou a requisição dos autos do recurso (sem duplicar os elementos do apenso B), nos termos legais – cf. art.º 643º, n.ºs 4 e 6, do CPC), despacho confirmado, em Conferência, por acórdão de 12.11.2024 - cf. apenso A. [12] A respeito da delimitação do campo de aplicação do procedimento de injunção e dando-nos conta da correspondente evolução legislativa, cf. acórdão da RC de 25.01.2022-processo 8509/20.3YIPRT.C1, publicado no “site” da dgsi (como os demais a citar). [16] Sobre o conceito de “transação comercial” para efeitos do DL n.º 62/2013, de 10.5 e debruçando-se dobre a questão de saber se determinado contrato que baseia o procedimento injuntivo está, ou não, incluído naquele conceito, cf. acórdãos da RC de 25.01.2022-processo 8509/20.3YIPRT.C1 e da RP de 06.5.2024-processo 2327/23.4YIPRT.P1. [17] Ou seja, como ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais prevista no art.º 10º do DL n.º 62/2013, de 10.5 (e no Anexo ao DL n.º 269/98, de 01.9) - cf., de entre vários, acórdão da RP de 06.5.2024-processo 2327/23.4YIPRT.P1. [18] Cf., por exemplo, acórdãos da RG de 15.12.2022-processo 117544/21.7YIPRT-B.G1, 28.9.2023-processo 17389/23.6YIPRT.G1 e 12.10.2023-processo 13066/23.6YIPRT-A.G1, RP de 13.6.2018-processo 26380/17.0YIPRT.P1, 10.11.2020-processo 66423/19.1YIPRT-A.P1, 08.11.2021-processo 2408/20.6T8PRD-A.P1, 13.7.2022-processo 40939/21.8YIPRT-A.P1, 14.12.2022-processo 628/22.8T8VFR-A.P1 e 10.7.2024-processo 27994/21.0YIPRT-A.P1 [aresto que indica a evolução da figura da “reconvenção”, desde o CPC de 1876] e RL de 09.10.2018-processo 102963/17.1.YIPRT.L1-7, 23.02.2021-processo 72269/19.0YIPRT.L1-7 [com o sumário: «I. No que tange à admissibilidade da invocação da compensação de créditos invocada pelo requerido no âmbito do regime do DL n.º 269/98, de 1.9, perfilam-se três teses: a) A da inadmissibilidade da reconvenção uma vez que tal não se coaduna com a simplicidade de tramitação e celeridade que o legislador pretendeu imprimir a esta forma processual; b) A da admissibilidade da dedução da compensação, mas como exceção perentória sob pena de ser coartado um meio de defesa ao requerido; c) A da invocação da compensação de créditos por via da dedução de reconvenção, devendo o juiz, se necessário, fazer uso dos seus poderes de gestão processual e de adequação formal para ajustar a respetiva tramitação à dedução do pedido reconvencional. II. Adere-se à terceira posição porquanto: é a solução que resulta da conjugação do art.º 549º, n.º 1 com o art.º 266º, n.º 2, al. c); permite a apreciação numa única ação das questões que, doutra forma, teriam de ser apreciadas em duas ações (cf. art.º 729º, al. h)); a imediata apreciação da compensação evita que o compensante suporte o risco de insolvência da contraparte; conforma-se melhor com o princípio da igualdade das partes; o legislador quis facilitar a compensação; é a posição que mais se conforma com o espírito do atual processo civil, o qual dá prevalência às decisões de mérito sobre as decisões formais, recorrendo para tal designadamente aos princípios da gestão processual e da adequação formal. III. Ocorrendo um erro na qualificação do meio processual utilizado e na formulação do mesmo na medida em que o requerido deduziu a compensação de créditos como exceção, cabe ao juiz corrigir oficiosamente o erro e proferir o necessário e concomitante despacho de aperfeiçoamento no sentido do apelante/requerido cumprir as normas atinentes à dedução de reconvenção (art.ºs 193º, n.º 3, 590º, n.º 3 e 583º do Código de Processo Civil).»] e 07.7.2022-processo 86718/21.3YIPRT.L1-A-7, publicados no “site” da dgsi. Na doutrina e no sentido da admissibilidade da reconvenção, releva a posição de M. Teixeira de Sousa, “AECOPs e Compensação”, Blog IPPC, de 26.4.2017 https://blogippc.blogspot.com. [19] Cf., entre outros, acórdãos do STJ de 24.9.2015-processo 166878/13.1YIPRT.E1.S1 [concluindo-se: «IV - Seguindo o procedimento de injunção, os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergente de contratos, não é admissível reconvenção.»], da RG de 23.3.2017-processo 37447/15.0YIPRT.G1, 22.6.2017-processo 69039/16.0YIPRT.G1, 17.12.2018-processo 47652/18.1YIPRT-A.G1 e 09.5.2024-processo 66852/23.6YIPRT.G1-A, RP de 12.5.2015-processo 143043/14.5YIPRT.P1, 08.7.2015-processo 19412/14.6YIPRT-A.P1, 24.01.2018-processo 200879/11.8YIPRT.P1, 21.6.2021-processo 83857/20.1YIPRT-A.P1 e 13.3.2023-processo 109593/21.1YIPRT-A.P1, RC de 30.4.2015-processo 949/13.0TTLRA.C1 e 07.6.2016-processo 139381/13.2YIPRT.C1 [com o sumário: «1. Face à redação do art.º 266º, n.º 2, alínea c), do CPC de 2013 é de concluir que foi intenção do legislador estabelecer que a ´compensação de créditos` terá sempre de ser operada por via da ´reconvenção`, independentemente do valor dos créditos compensáveis, ´quando o direito do réu ainda não esteja reconhecido`. 2. No âmbito do processo especial previsto no DL n.º 269/98, de 01.9, no qual não é admissível reconvenção, não é possível operar a compensação de créditos por via de ´excepção`, exceto se o direito do réu já estiver reconhecido judicialmente ou pelo próprio devedor. (...)»], RL de 17.01.2008-processo 10606/2007-8 e RE de 08.12.2018-processo 38620/16.9YIPRT.E1 e 30-05-2019-processo 81643/18.8YIPRT-A.E1, publicados no “site” da dgsi. Na doutrina, Salvador da Costa, A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 6ª edição, Almedina, Coimbra, 2008, pág. 88 e J. Lebre de Freitas, Ação Declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013, págs. 348 e seguinte. [20] Cf. acórdão da RC de 26.02.2019-processo 2128/18.1YIPRT.C1 [com o sumário: «I - A compensação assume-se, substantivamente, como figura autónoma - exceção perentória - e, como tal, e até ao valor do contra crédito, pode, adjetivamente, ser invocada na contestação – art.ºs 847º do CC e 571º do CPC. II - É que o art.º 266º, n.º 2, al. c) do CPC apenas estatui que a reconvenção é admissível se se quiser invocar a compensação; e não que esta, até ao valor do contra crédito, apenas pode ser invocada via reconvencional.»], publicado no “site” da dgsi. Igual ou idêntico entendimento foi adotado nos acórdãos da RG de 17.12.2018-processo 107776/18.0YIPRT-C.G1, 13.6.2019-processo 107776/18.0YIPRT-C.G1 e 05.03.2020-processo 104469/18.2YIPRT.G1, da RC de 16.01.2018-processo 12373/17.1YIPRT-A.C1 [sumariando-se: «1. A al. c) do n.º 2 do artigo 266º do CPC apenas diz que a ´compensação` é admissível como fundamento de reconvenção e não que a compensação só possa ser feita valer por esse meio. 2. A compensação opera por mera declaração unilateral de uma das partes à outra (n.º 1 do artigo 848º CC), tendo a extinção dos créditos eficácia retroativa ao momento em que os créditos se tornaram compensáveis (artigo 854º CC). 3. Em processo onde seja vedada a dedução de reconvenção, ao réu terá de ser facultada a possibilidade de invocar a compensação por via de exceção, sob pena de lhe ser coartado um importante meio de defesa.»], 22.5.2018-processo 153874/15.3YIPRT (mesmo coletivo), 10.12.2019-processo 78428/17.2YIPRT-A.C1 [tendo-se concluído: «(...) 2 - As normas processuais devem ser interpretadas - se necessário, em termos restritivos -, na busca da coerência e harmonia do sistema jurídico, à luz do seu escopo de realização do direito substantivo, não podendo constituir entrave a tal realização. 3 - Aquela al.ª c) do n.º 2 do art.º 266º da lei adjetiva somente estabelece que a compensação é admissível como fundamento de reconvenção – para reconhecimento judicial do direito de crédito, com valor de caso julgado –, e não que só possa vingar, processualmente, por esse meio. 4 - Em processo onde não era admissível a dedução de reconvenção ao tempo do oferecimento do articulado de oposição, razão pela qual o demandado se limitou a excecionar a compensação extintiva, com posterior transmutação para ação de processo comum, deve essa defesa por exceção ser admitida, obstando-se ao esvaziamento de um importante meio de defesa e aos inconvenientes de interposição de ação autónoma posterior, com o risco para o réu de pagamento e de futuro não recebimento.»] e 08.10.2024-processo 83315/23.2YIPRT-B.C1, RP 23.02.2015-processo 95961/13.8YIPRT.P1, 09.3.2020, proc. 21557/18.4YIPRT.P1 e 17.5.2022-processo 4456/20.7YIPRT.P2 (sublinhado nosso) [sumariando-se: «I - Enquanto não surge uniformização jurisprudencial, entendemos que na AECOP é admissível a invocação da compensação de créditos pelo réu, por meio de defesa por excepção peremptória, decorrente de uma interpretação (restritiva) do preceituado na al. c) do n.º 2 do art.º 266º do CPC, ou seja, entendendo que este preceito legal, não obstante a sua inserção sistemática, se aplica tão só às formas de processo que admitem reconvenção. II - Consequentemente, e em respeito pelo direito do contraditório, cf. art.º 3º, n.º 4 do CPC, à oposição do réu onde esta venha peticionar a compensação de créditos, por dedução de excepção peremptória, é legitimo ao autor responder à matéria de tal excepção, (como aliás a outra qualquer que seja deduzida) por “articulado impróprio” este, que tem de ser admissível na AECOP. III - Tudo sem olvidar que na realidade, e no caso, o efeito prático-jurídico que o réu pretende é que seja apreciado e decidido o contra-crédito que alega deter sobre o autor e a consequente operação de compensação, sendo-lhe indiferente que tal apreciação ocorra sob a égide da figura processual da excepção ou da reconvenção.»] e da RE de 10.02.2022-processo 37952/20.6YIPRT-A.E1 e 13.10.2022-processo 83572/21.9YIPRT.E1 [aresto no qual, seguindo muito de perto a fundamentação do cit. acórdão da RC de 26.02.2019-processo 2128/18.1YIPRT.C1, se concluiu: «O artigo 266º, n.º 2, alínea c), do CPC não impõe que a invocação da compensação de créditos tenha de ser sempre feita através de reconvenção, apenas referindo que a compensação é admissível como fundamento da reconvenção, mas não que a compensação só possa ser feita valer por esse meio.»], publicados no mesmo site. Na doutrina, vide Rui Pinto, “A Problemática da Dedução da Compensação no Código de Processo Civil de 2013”, publicado em 24.5.2017 no blogue IPPC (https://blogippc.blogspot.com), onde se diz que o importante será que «o processo civil realize o direito material, independentemente do modo de expressão procedimental. Por isso, mesmo os processos especiais têm de assegurar ao devedor a possibilidade de opor ao seu credor a compensação, necessariamente fora da reconvenção. Essa possibilidade tem lugar pela contestação por excepção perentória». O relator do presente acórdão veio a rever/alterar a posição expressa no acórdão da RC de 07.6.2016-processo 139381/13.2YIPRT.C1, publicado no “site” da dgsi, conforme decorre do cit. acórdão da RC de 08.10.2024-processo 83315/23.2YIPRT-B.C1, do mesmo coletivo [assim sumariado: «1. O artigo 266º, n.º 2, alínea c), do CPC não impõe que a invocação da compensação de créditos tenha de ser sempre feita através de reconvenção, apenas referindo que a compensação é admissível como fundamento da reconvenção, mas não que a compensação só possa ser feita valer por esse meio. 2. Em processo onde seja vedada a dedução de reconvenção, ao Réu deverá ser facultada a possibilidade de invocar a compensação por via de exceção, sob pena de lhe ser coartado um importante meio de defesa e da necessidade de interposição de ação autónoma posterior, com o risco de futuro não recebimento.»]. [21] Vide J. Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 4ª edição, págs.145 e seguintes e, entre outros, acórdão do STJ de 14.12.2021-processo 107694/20.2YIPRT.S1 [concluindo-se: «II. O artigo 266º, n.º 2, alínea c), do CPC não impõe que a invocação da compensação de créditos tenha de ser sempre feita através de reconvenção, apenas referindo que a compensação é admissível como fundamento da reconvenção, mas não que a compensação só possa ser feita valer por esse meio.»]. [22] Cf., nomeadamente, acórdão do STJ de 18.10.2016-processo 6271/08.7TBBRG.P1.S1 e o cit. acórdão da RC de 26.02.2019-processo 2128/18.1YIPRT.C1, que traduz a orientação desta Secção Cível. [23] Vide, entre outros, Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, Reimpressão da 7ª edição, Almedina, 2004, págs. 198 e 204 e seguintes e o acórdão da RC de 24.02.2015-processo 91832/12.3YIPRT-A.C1 (intervindo o aqui relator como “1º adjunto”). [26] Sumariado nestes termos: «I - Inexiste motivo de justiça material que justifique o tratamento desigual que se consubstancia em admitir a reconvenção em procedimento de injunção instaurado por comerciante contra um outro comerciante e destinado à cobrança de quantia de valor superior a metade da alçada da Relação, mas em rejeitá-la em procedimento de injunção destinado à obtenção do pagamento de importâncias de valor inferior. II - Pretendendo a ré exercer o direito à compensação de créditos (e assim deixar de suportar, pelo menos em parte, o risco de insolvência da contraparte), a rejeição da reconvenção perfila-se como um prejuízo não menosprezável para aquela, cabendo, por outro lado, que não esquecer que o legislador civil facilita a invocação daquela forma de extinção das obrigações e que a celeridade é uma condição necessária, mas não suficiente, da Justiça. III - A partir do momento em que é deduzida oposição com reconvenção ao procedimento de injunção e este adquire cariz jurisdicional, há que aplicar as regras dos art.ºs 299 e seguintes do CPC (que o disposto no n.º 2 do art.º 10º do DL n.º 62/2013 não afastam), cabendo então e caso os pedidos sejam distintos, adicionar o valor do pedido formulado pelo réu ao valor do pedido formulado pelo autor.» (sublinhado nosso) [27] Neste sentido, cf., nomeadamente, acórdãos do STJ de 06.6.2017-processo 147667/15.5YIPRT.P1.S2 (cf. nota anterior, ponto III do sumário) e da RL de 16.6.2020-processo 77375/19.8YIPRT-A.L1-7 [concluindo-se: «(...) III – Assim, deduzida oposição com reconvenção ao procedimento de injunção, este assume natureza jurisdicional, sendo-lhe aplicáveis as regras dos artigos 299º e seguintes do Código de Processo Civil, pelo que estando em causa um pedido inicial e um pedido reconvencional distintos, haverá que adicionar ambos os valores e, sendo o total superior a metade do valor da alçada da Relação, o processo seguirá os trâmites da forma de processo comum. IV – Em tal situação torna-se, desde logo, admissível a reconvenção, cumprindo ao juiz aferir da verificação dos demais requisitos legais previstos no art.º 266º, n.º 2 do Código de Processo Civil.»], que se afigura contrário ao expendido no saneador-sentença recorrido, sobretudo, quando se afirma que a A./reconvinda passou a dispor do articulado de réplica “logo que foi notificada da apresentação da contestação-reconvenção, o que ocorreu em 28.01.2023, na sequência do despacho proferido em 24.01.2023 e não apresentou réplica, limitando-se a sustentar a inadmissibilidade da reconvenção (cf. requerimento de 07.02.2023)”. Assim, salvo o devido respeito por opinião em contrário, o que se propugna na decisão recorrida será demasiado restritivo e contrário a estes princípios, designadamente ao concluir: “Caso contrário, a admitir-se a possibilidade da autora-reconvinda apresentar réplica em momento posterior, tal equivaleria a criar ´artificialmente` um ´momento` processual para o efeito e que, segundo defende a autora, seria após a correção da distribuição, o que parece estar em contravenção à lei processual e, como tal, proibido.” Veja-se, ainda, a perspetiva crítica indicada na “nota 29”, infra, também de sentido contrário ao delineado na decisão recorrida. [28] Cf. acórdão o cit. acórdão da RC de 26.02.2019-processo 2128/18.1YIPRT.C1. [29] Como se referiu do despacho do relator, confirmado pelo acórdão de 12.11.2024 (apenso A), relativamente àquela decisão de 01.3.2023, mostrava-se impugnado, apenas, a simples admissão da reconvenção, «independentemente de (em momento oportuno) se poder apontar, ou não, quaisquer irregularidades processuais ou eventuais vícios da mesma decisão [e não foi impugnada/questionada a (eventual) incompetência, em razão do valor, do Tribunal de Porto de Mós para conhecer da (in) admissibilidade da reconvenção (máxime, se poderia ter conhecido da admissibilidade da reconvenção ou se tal questão deveria ter sido relegada para o Tribunal competente em razão do valor por a modificação do mesmo se produzir automaticamente, i. é, independentemente da admissibilidade do pedido reconvencional) - sobre a matéria e no sentido dessa incompetência, cf. acórdão da RE de 15.6.2023-processo 102576/22.6YIPRT-A.E1 (...), publicado no “site” da dgsi]». [30] Relativamente a procedimento europeu de injunção, mas com alguma similitude com a situação em análise, cf. acórdão da RC de 10.9.2013-processo 378/12.3TVPRT.C1. [31] De resto - como bem se refere na alegação de recurso -, “numa altura em que a ação ainda se encontrava a correr termos sob o tipo de processo especial e antes de ser verificada e reconhecida pelo tribunal o erro na forma de processo e antes de a ação ser redistribuída como ação de processo comum”. [32] Que assim reza: «O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.» Cf., por exemplo, acórdão do STJ de 16.12.2021-processo 4260/15.4T8FNC-E.L1.S1, onde se concluiu: “(...) VIII – O respeito pelo princípio do contraditório, genericamente consagrado no artigo 3º, n.º 3, do Código de Processo Civil, não depende de um juízo subjetivo do juiz quanto à necessidade, segundo o seu entendimento pessoal, de ouvir ou não ouvir as partes, aquilatando se elas ainda têm algo a dizer-lhe que ache relevante para o que há a decidir, mas é, bem pelo contrário, substantivamente assegurado pela imposição do dever processual, que especialmente lhe incumbe, de garantir às partes o direito (que lhes assiste) de dizer aquilo que, no momento processualmente adequado (definido previamente pela lei), ainda entenderem ser, do seu ponto de vista, relevante.” [33] Que estabelece: «O juiz deve adotar a tramitação processual adequada às especificidades da causa e adaptar o conteúdo e a forma dos atos processuais ao fim que visam atingir, assegurando um processo equitativo.» [34] Cf., ainda, “nota 27”, supra. [36] Que preceitua: «A falta de apresentação da réplica ou a falta de impugnação dos novos factos alegados pelo réu tem o efeito previsto no artigo 574º.» (disposição que estabelece os ónus de impugnação e a consequência da sua inobservância). [37] Veja-se, ainda, por exemplo, o cit. acórdão da RC de 10-12-2019-78428/17.2YIPRT-A.C1, quando refere que “nas ações em que seja admissível a reconvenção, (...) quer a compensação seja deduzida como defesa por exceção, seja a título de reconvenção, sempre ao autor haverá de ser dada a possibilidade de resposta, por respeito ao princípio do contraditório”. |