Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
249/12.3TBGRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JACINTO MECA
Descritores: GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
CRÉDITO LABORAL
CRÉDITO
GARANTIA
PENHOR
Data do Acordão: 03/21/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA GUARDA – 3º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 333º, Nº 1, AL. A) DO CÓDIGO DO TRABALHO; 666º, Nº 1 E 749º, Nº 1 DO C. CIVIL.
Sumário: I – Concorrendo sobre o produto da venda de um bem móvel integrante da massa falida créditos dotados de privilégio mobiliário geral como sucede com os créditos emergentes do contrato de trabalho, sua cessação ou violação – alínea a) do nº 1 do artigo 333º do CT – e um crédito garantido por penhor, deve este último - nos termos do disposto no artigo 666º, nº 1 e artigo 749º, nº 1, ambos do CC - ser graduado em 1º lugar e consequentemente pago preferentemente relativamente aos demais créditos mobiliários que incidam sobre a coisa que foi objecto de penhor.

II - As acções denominadas por Banco A…, SA inscritas em nome de terceiros alheios à insolvente, não podem ser objecto de venda e com o seu produto serem os credores ressarcidos porque não são passíveis de integrar a massa nos termos do artigo 46º do CIRE.

Decisão Texto Integral:                 Acordam os Juízes que integram a 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra.

                1. Relatório

Por sentença proferida a 6 de Março de 2012, já transitada em julgado, foi declarada a insolvência da sociedade aqui requerida “I…, Lda.”, tendo sido fixado o prazo de 30 dias para a subsequente reclamação de créditos por parte dos respectivos credores.

Em obediência ao estatuído no artigo 129º, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), a Sra. Administradora de insolvência juntou a relação de créditos reconhecidos que consta de fls. 12 a 19, assim se criando o apenso C.

Durante o prazo plasmado no artigo 130º, n.º 1, do CIRE (e sendo certo que não houve necessidade de ser cumprido o estabelecido no artigo 129º, n.º 4, do CIRE), não foram apresentadas quaisquer impugnações.

Assim, estabelece em princípio o artigo 130º, n.º 3, do CIRE que se homologa a lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, salvo a existência de qualquer eventual “erro manifesto”.

Justamente, da nossa parte, entendemos que existe erro manifesto ao ter-se considerado o crédito da credora “C…, Lda.” como sendo privilegiado.

Na verdade, vista a reclamação de créditos apresentada por tal credora e que foi junta ao presente apenso C a fls. 73 a 75, verifica-se que tal credora funda o seu suposto privilégio apenas e tão-só na penhora que logrou efectuar de uma determinada máquina (bem móvel) da aqui insolvente no âmbito de uma acção executiva que identifica.

No entanto, a verdade é que dispõe o artigo 140º, n.º 3, do CIRE que na graduação de créditos a efectuar em sede de insolvência (como é aqui o caso) não é considerada qualquer preferência resultante de simples penhora, pelo que a conclusão necessária é a de que o crédito da aludida credora “C…, Lda.” terá de ser aqui considerado como crédito comum, e não como crédito privilegiado.

No mais, ao abrigo do estabelecido no 130º, n.º 3, do CIRE, e uma vez que não nos parece que exista qualquer outro erro manifesto, homologa-se desde já a lista em causa apresentada pela Sra. Administradora da insolvência e constante de fls. 12 a 19 do presente apenso C (apenas com a ressalva acabada de efectuar supra), incumbindo proferir de imediato sentença de graduação de tais créditos, os quais se consideram reconhecidos.

Assim, constata-se que existem créditos garantidos, privilegiados, subordinados e comuns, conforme tais categorias são previstas nas sucessivas alíneas a), b) e c) do artigo 47º, n.º 4, do CIRE, relevando ainda os subsequentes artigos 48º e 49º do mesmo Código para a explicitação da categoria de créditos subordinados.

Não colocamos aqui em causa a qualificação nestas categorias que foi efectuada pela Sra. Administradora de insolvência de cada um dos créditos constantes da lista de fls. 12 a 19, uma vez que a mesma nos parece correcta, apenas com a excepção que já supra se corrigiu relativamente à credora “C…, Lda.”, que passa a ser considerada como credora comum.

Por seu turno, quanto aos bens a considerar, e na ausência de qualquer apenso ou auto de apreensão de bens (uma vez que tal apreensão nunca foi determinada, tendo a insolvente sempre permanecido em actividade até à data de hoje atendendo à inicial administração da massa insolvente pela devedora e hoje à aprovação de um plano de insolvência que se encontra em curso), pensamos que nos haveremos de louvar (à falta de qualquer outro elemento) no inventário que foi elaborado pela Sra. Administradora de insolvência e que consta de fls. 233 a 244 dos autos principais. De tal inventário consta que apenas existem bens móveis a considerar, muito embora exista ainda o imóvel onde a insolvente exerce a sua actividade e da qual é locatária financeira. Enquanto tal locação se mantiver e perdurar (como ainda perdura), o imóvel em causa não é propriedade da insolvente (como nunca foi até este momento), e por isso não pode ser aqui considerado para qualquer efeito.


*

Assim, isto posto, temos então antes do mais que os créditos garantidos na lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência são os constantes dos nºs 11, 31, 44 e 56, estando os mesmos em parte garantidos por penhores efectuados sobre acções da insolvente representativas de determinados capitais, e sendo os respectivos credores Banco A…, S.A., “G…, S.A.”, “L…, S.A.”, e “N…, S.A.”.

O penhor em causa, de que beneficia o credor Banco A… incide sobre uma máquina de centro de corte e furação modelo F-750 Kaltenbach, e sobre um total de 197.047 acções denominadas por “Banco A…, S.A.”, em nome de ...

O penhor em causa de que beneficia a “G…” incide sobre 710 acções representativas do capital de tal sociedade.

O penhor em causa de que beneficia a “L…” incide sobre 710 acções representativas do capital de tal sociedade.

O penhor em causa de que beneficia a “N…” incide sobre 3.600 acções representativas do capital de tal sociedade.

Por seu turno, parte dos créditos relativos aos credores Banco A…, “G…”, “L…” e “N…” constituem créditos sob condição, na medida em que assentam em garantias autónomas que os aqui credores prestaram em benefício de outros credores, sendo que esta não interpelou ainda os referidos Banco A…, “G…”, “L…” e “N…”para procederem ao pagamento dos montantes desses créditos.

Esta precisão tem relevância nos termos e para os efeitos do estabelecido no artigo 50º do CIRE e sobretudo do artigo 181º do mesmo Código, a ressalvar oportunamente e a final.

Por outro lado, os créditos identificados como privilegiados na lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência e que se reportam a créditos dos quais são titulares trabalhadores da insolvente, relativos a salários não pagos e a compensações pela cessação dos contratos de trabalho (concretamente os nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63) beneficiam de um privilégio creditório mobiliário geral e de um privilégio imobiliário especial sobre os bens imóveis da insolvente nos quais tais ex-trabalhadores prestavam a sua actividade.

Tais privilégios encontram-se previstos no art. 333º, n.º 1, do Código do Trabalho.

Prosseguindo, o crédito do Instituto de Segurança Social, I.P. (constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência), é relativo às contribuições vencidas e não pagas e beneficia assim de um privilégio creditório mobiliário geral e de um privilégio creditório imobiliário geral, previstos anteriormente nos artigos 10º, n.º 1, e 11º, ambos do Decreto-lei n.º 103/80, de 9 de Maio, e hoje nos artigos 204º e 205º da Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro (Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social) e artigo 97º, n.º 1, alínea a), a contrario, do CIRE, que inclui os juros de mora, por força do artigo 734º do Código Civil (Código Civil).

Quanto ao crédito reclamado pela Fazenda Nacional e que consta do n.º 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, veio esta explicitar que se trata de créditos relativos a de IRS e IVA, pelo que beneficiam de privilégio mobiliário geral e de um privilégio imobiliário especial sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora ou outro acto equivalente, nos termos do disposto no artigo 111º do Código do IRS, e no artigo 736º, n.º 1, Código Civil.

Aqui chegados, elencadas que estão as garantias e privilégios existentes, ter-se-á a nosso ver que efectuar seis graduações de créditos diferenciadas, sendo uma para efeitos do produto da eventual venda da máquina de centro de corte e furação modelo F-750 Kaltenbach; outra para efeitos do produto da eventual venda das 197.047 acções denominadas por “Banco A…, S.A.”, em nome de …; outra para efeitos do produto da eventual venda das acções da credora “G…”; outra para efeitos do produto da eventual venda das acções da credora “L…”; outra para efeitos do produto da eventual venda das acções da credora “N…”; e ainda outra para efeitos do produto da eventual venda de todos os restantes bens (móveis) da insolvente.

Assim, então para efeitos do produto da eventual venda da máquina de centro de corte e furação modelo F-750 Kaltenbach, beneficia o Banco A…, S.A. de penhor sobre a mesma para garantia de parte do seu crédito, aqui no valor de € 667.617,82; e beneficiam os trabalhadores da insolvente, o Instituto da Segurança Social, IP, e os créditos de IRS e de IVA todos de privilégio creditório mobiliário geral.

A este respeito, julgamos especificamente que o privilégio mobiliário geral dos trabalhadores da insolvente prevalece sobre o privilégio mobiliário geral do Instituto de Segurança Social, IP, conforme resulta da conjugação do art. 333º, n.º 2, al. a), do Código do Trabalho – que coloca o primeiro antes dos créditos previstos no art. 747º, n.º 1, do Código Civil –, com o artigo 10º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 103/80 (ou o artigo 204º, n.º 1, da Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro (Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social) - que reconhece preferência ao segundo após os créditos plasmados no artigo 747º, n.º 1, al. a), do Código Civil.

Por outro lado, considerando o artigo 666º, n.º 1, do Código Civil, mas conjugando-o com o artigo 10º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 103/80 (ou o artigo 204º, n.º 2, da Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro (Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social), pensamos que o crédito reclamado pela Segurança Social terá de prevalecer sobre o crédito do credor pignoratício.

Por seu turno ainda, no confronto entre o crédito garantido por penhor e o crédito de IRS e IVA, pensamos que o já citado artigo 666º, n.º 1, do Código Civil, dá prevalência ao crédito garantido por penhor.

                (…).

                Com base nos pressupostos de direito e facto que constam da decisão recorrida foi homologada por sentença a lista de credores reconhecidos elaborada pela Sra. Administradora de insolvência, junta a fls. 12 a 19 do presente apenso C, apenas com a precisão de que o crédito relativo à credora “C…, Lda.” é reconhecido como crédito comum, e não como crédito privilegiado.

E graduam-se os créditos reconhecidos nos termos acabados de referir, com direito a serem pagos nos seguintes termos:

A) Pelo produto da eventual venda da máquina de centro de corte e furação modelo F-750 Kaltenbach, nos seguintes termos:

Ø Em primeiro lugar os créditos, dos trabalhadores da insolvente, constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pelo Banco A…, S.A. na parte garantida por penhor (no valor de €667.617,82), constante do n.º 11 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quarto lugar, indiferentemente, os créditos relativos a IRS e IVA, constantes do n.º 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quinto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os restantes créditos constantes da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes, com excepção dos créditos subordinados.

Ø Em sexto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os créditos de natureza subordinada constantes dos nºs 1, 25, 27, 29, 34 e 65 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes.


*

B) Pelo produto da eventual venda das 197.047 acções denominadas por “Banco A…, S.A.”, em nome de …, nos seguintes termos:

Ø Em primeiro lugar os créditos reclamados pelos trabalhadores da insolvente constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pelo Banco A…, S.A. na parte garantida por penhor (no valor de €667.617,82), constante do n.º 11 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quarto lugar, indiferentemente, os créditos relativos a IRS e IVA, constantes do n.º 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quinto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os restantes créditos constantes da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes, com excepção dos créditos subordinados.

Ø Em sexto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os créditos de natureza subordinada constantes dos nºs 1, 25, 27, 29, 34 e 65 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes.


*

C) Pelo produto da eventual venda das 710 acções representativas do capital da “G…, S.A.”, nos seguintes termos:

Ø Em primeiro lugar, em primeiro lugar os créditos reclamados pelos trabalhadores da insolvente constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pela “G…, S.A.”, constante do n.º 31 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quarto lugar, indiferentemente, os créditos relativos a IRS e IVA, constantes do n.º 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quinto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os restantes créditos constantes da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes, com excepção dos créditos subordinados.

Ø Em sexto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os créditos de natureza subordinada constantes dos nºs 1, 25, 27, 29, 34 e 65 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes.


*

Pelo produto da eventual venda das 710 acções representativas do capital da “L…, S.A.”, nos seguintes termos:

Ø Em primeiro lugar, em primeiro lugar os créditos reclamados pelos trabalhadores da insolvente constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pela “L…, S.A.”, constante do n.º 44 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência; Em quarto lugar, indiferentemente, os créditos relativos a IRS e IVA, constantes do nº 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quinto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os restantes créditos constantes da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes, com excepção dos créditos subordinados.

Ø Em sexto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os créditos de natureza subordinada constantes dos nºs 1, 25, 27, 29, 34 e 65 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes.


*

E) Pelo produto da eventual venda das 3.600 acções representativas do capital da “N…, S.A.”, nos seguintes termos:

Ø Em primeiro lugar, em primeiro lugar os créditos reclamados pelos trabalhadores da insolvente constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pela “N…, S.A.”, constante do n.º 56 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quarto lugar, indiferentemente, os créditos relativos a IRS e IVA, constantes do n.º 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quinto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os restantes créditos constantes da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes, com excepção dos créditos subordinados.

Ø Em sexto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os créditos de natureza subordinada constantes dos nºs 1, 25, 27, 29, 34 e 65 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes.


*

F) Pelo produto da eventual venda de todos os restantes bens móveis da insolvente que ainda não foram anteriormente referidos, nos seguintes termos:

Ø Em primeiro lugar, em primeiro lugar os créditos dos trabalhadores da insolvente constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar, indiferentemente, os créditos relativos a IRS e IVA, constantes do n.º 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quarto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os restantes créditos constantes da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes, com excepção dos créditos subordinados.

Ø Em quinto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os créditos de natureza subordinada constantes dos nºs 1, 25, 27, 29, 34 e 65 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes.


*

Relativamente aos créditos sob condição e que igualmente constam da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência deverá ter-se oportunamente em consideração o disposto no artigo 181º do CIRE.

*

                Notificado da decisão de reclamação e graduação de créditos o Banco A…, SA interpôs recurso que instruiu com as suas doutas alegações que finalizou com as seguintes conclusões:

...

                Não houve contra alegações.

                O recurso foi admitido como apelação, a subir imediatamente e nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo, tudo nos termos do disposto nos artigos 676º, 678º, n.º 1, 680º, n.º 1,685º, n.º 1, 685º-C, n.º 1, e 691º, nºs 1 e 5, todos do Código de Processo Civil, e ainda do artigo 14º, n.º 5, e n.º 6, al. b), do CIRE.


*

2. Delimitação do objecto do recurso

As questões a decidir na apelação e em função das quais se fixa o objecto do recurso sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, nos termos das disposições conjugadas do nº 2 do artigo 660º e artigos 661º, 664º, 684º, nº 3 e 685ºA, todos do Código de Processo Civil, são as seguintes:

v Graduação, pelo produto da eventual venda da máquina “centro de corte e furação modelo F – 750 Kaltenbach”, em primeiro lugar do crédito reclamado pelo Banco A…, S.A., na parte garantida por penhor;

v Violação dos artigos 2º e 18º, da Constituição da República Portuguesa, o que fundamenta a não aplicação, por inconstitucionalidade, do artigo 204º, nº 2 da Lei nº 110/2009 e artigo 333º, nº 2 do Código do Trabalho, quando interpretado no sentido em que no concurso de vários privilégios mobiliários gerais com o penhor, o crédito privilegiado da Segurança Social e os créditos laborais prevalecem sobre o penhor.

v Não graduação dos créditos com base nas acções tituladas por … por não pertencerem à massa insolvente.

                3. Colhidos os vistos

                Considerou a decisão recorrida que por referência ao produto da venda da máquina F-750 Kaltenbach, o apelante beneficia de penhor que garante de parte do seu crédito no montante de € 667.617,82, beneficiando também, os trabalhadores da insolvente e o Instituto da Segurança Social e o Estado/ IRS e IVA, de privilégio creditório mobiliário geral, sustentando que o privilégio mobiliário geral dos trabalhadores prevalece sobre o privilégio mobiliário geral do Instituto de Segurança Social, IP – artigos 333º, nº 1, alínea a) do CT, 747º, nº 1 do CC e 10º, nº 1 do DL nº 103/80 ou o artigo 204º, nº 1 da Lei nº 110/2009 – tal como entendeu que o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP deve prevalecer sobre o crédito do credor pignoratício e nesse sentido graduou por referência ao produto da venda daquela máquina em 1º lugar os créditos dos trabalhadores em 2º lugar os créditos da Instituto de Segurança Social, IP, em 3º lugar o crédito reclamado pelo Banco A…, SA na parte garantida pelo penhor, ou seja, até ao montante de € 667.617,82.

                Contra este entendimento se insurge o apelante Banco A…, SA avançando com um conjunto de argumentos que analisaremos individualmente de modo a abordarmos todas as questões e a conferirmos a necessária uniformidade ao acórdão.

                3.1 - O apelante, escorado na «errada aplicação» dos artigos 204º, nºs 1 e 2 do DL nº 110/2009, de 16.9, 333º/2/a do CT e 666º, 747º, nº 1 do CC, defende que o entendimento do Tribunal a quo “desrespeita a prevalência do crédito pignoratício face ao crédito dos trabalhadores (…) e privilegia, ilegitimamente o crédito dos trabalhadores estendendo-lhe de forma ilegal e arbitrária o nº 2 do artigo 204º da Lei nº 110/2009, de 16 de Setembro”.

                Vejamos se lhe assiste razão.

                Privilégio creditório é a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros, privilégios que são de duas espécies – mobiliários ou imobiliários – como, de resto, declara o nº 1 do artigo 735º do CC, expressando o artigo 745º do CC a ordem porque serão pagos os créditos privilegiados.

No que respeita ao conceito de credores da insolvência e classes de créditos sobre a insolvência declara a alínea a) do artigo 47º do CIRE que “os créditos sobre a insolvência são «garantidos» e «privilegiados» os créditos que beneficiem, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais e de privilégios creditórios gerais sobre os bens da massa insolvente, até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias ou dos privilégios gerais (…)” declarando a alínea a) do nº 1 do artigo 97º do CIRE que se extinguem com a declaração de insolvência os privilégios creditórios gerais que forem acessórios de créditos sobre a insolvência de que forem titulares o Estado, as autarquias locais e as instituições de segurança social constituídos mais de 12 meses antes da data do início do processo de insolvência.

                3.2 A alínea a) do n º 1 do artigo 12º da Lei nº 7/2009 de 12.2 revogou a Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, na redacção dada pela Lei n.º 9/2006, de 20 de Março, pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, e pela Lei n.º 12 -A/2008, de 27 de Fevereiro, conferindo ao artigo 333º do CT a seguinte redacção[1]:
1 – Os créditos do trabalhador emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação gozam dos seguintes privilégios creditórios:
a) Privilégio mobiliário geral;
b) Privilégio imobiliário especial sobre bem imóvel do empregador no qual o trabalhador presta a sua actividade.
2. A graduação dos créditos faz-se pela ordem seguinte:
a). O crédito com privilégio mobiliário geral é graduado antes de crédito referido no n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil;
b) O crédito com privilégio imobiliário especial é graduado antes de crédito referido no artigo 748.º do Código Civil e de crédito relativo a contribuição para a segurança social.

                Por sua vez o nº 1 do artigo 666º do CC declara: o penhor confere ao credor o direito à satisfação do seu crédito, bem como juros, se os houver, com preferência sobre os demais credores, pelo valor de certa coisa móvel, ou pelo valor de créditos ou outros direitos não susceptíveis de hipoteca, pertencentes ao devedor ou a terceiros.

                Finalmente o nº 1 do artigo 749º do CC prescreve: «o privilégio geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre as coisas abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente».

                Em anotação a esta última norma escreveram os Srs. Profs. P. Lima e A. Varela[2] «refere-se este artigo aos privilégios mobiliários gerais e resolve o conflito entre os direitos dos credores e os direitos de terceiros constituídos sobre os bens móveis do devedor (…) o privilégio geral não pode exercer-se com prejuízo dos direitos pertencentes a terceiros sobre os bens móveis que são objecto desse privilégio (…)».

                3.3 A Lei nº 17/86, de 14.6 conferiu privilégio creditório prioritário mobiliário ou imobiliário aos créditos dos trabalhadores o que determinou a revogação da alínea d) do nº 1 do artigo 737º do CC na parte correspondente aos créditos laborais bem com da alínea f) do nº 1 do artigo 747º do CC, desde que se entendesse que as indemnizações devidas pela cessação do contrato de trabalho se integravam no artigo 12º daquela lei, o que sabemos não ter sido pacífico na jurisprudência, mas que o legislador solucionou no artigo 377º do CT solução mantida no actual artigo 333º do CT ao conferir à violação ou cessação do contrato de trabalho os privilégios enunciados nas alíneas a) e b) do seu nº 1.

                Sem que nos mereça qualquer dúvida interpretativa – artigo 9º do CC – o artigo 333º do CT conjugado com o artigo 747º, nº 1 do CC permite concluir que os créditos dos trabalhadores na sua vertente mais ampla prevalecerem sobre todos os créditos que gozem de privilégio imobiliário – artigo 747º, nº 1 do CC – mas tal entendimento pode sofrer excepções como aquela que apreciamos nos presentes autos. Com efeito, o artigo 666º, nº 1 do CC não deixa de conferir ao credor pignoratício uma clara prevalência – preferência – sobre os demais credores, nos quais se incluem naturalmente os créditos dos trabalhadores, como de resto, declara o nº 1 do artigo 749º do CC ao referir que o privilégio geral não vale contra terceiros, titulares de direitos que, recaindo sobre coisas abrangidas pelo privilégio, sejam oponíveis ao exequente, ou seja, «aqueles que não podem ser atingidos pela penhora, nos quais estão compreendidos os direitos reais de gozo e de garantia, no qual se integra o penhor de coisa como sucede no caso em apreço.

                Assim como nos parece que é não podemos deixar de concordar com o apelante e considerar que concorrendo sobre o produto da venda de um bem móvel integrante da massa falida créditos dotados de privilégio mobiliário geral como sucede com os créditos emergentes do contrato de trabalho, sua cessação ou violação – alínea a) do nº 1 do artigo 333º do CT – e um crédito garantido por penhor, deve este último nos termos do disposto no artigo 666º, nº 1 e artigo 749º, nº 1 ambos do CC ser graduado em 1º lugar e consequentemente pago preferentemente relativamente aos demais créditos mobiliários que incidam sobre a coisa que foi objecto de penhor[3].

                3.4 - Esta alteração tem consequências ao nível da graduação do crédito do Instituto da Segurança Social, IP que foi graduado em 2º lugar relativamente ao produto da eventual venda da máquina de centro de corte e furação modelo F-750 Kaltenbach.

                  Declara o artigo 736º/1 do CC que «o Estado e as autarquias locais têm privilégio mobiliário geral para as garantias dos créditos por impostos indirectos e também pelos impostos directos inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora ou acto equivalente e nos dois anos anteriores».

Os créditos da Segurança Social e respectivos juros de mora, gozam, de harmonia com o disposto no n.º 1 do art.º 10º do DL n.º 103/80, de 9/5, de privilégio mobiliário geral, graduando-se logo após os créditos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil. No mesmo sentido se pronuncia o nº 1 do artigo 204º da Lei nº 110/2009, de 16.9 (Código dos Regimes Contributivos dos Sistema Previdencial da Segurança Social): os créditos da segurança social por contribuições, quotizações e respectivos juros de mora gozam de privilégio mobiliário geral, graduando -se nos termos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil.

Graduando-se os créditos do trabalho com privilégio mobiliário geral antes de crédito referido no n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil, então, não podemos deixar de concluir que a graduação constante da sentença recorrida e por referência ao produto da eventual venda da máquina de centro de corte e furação modelo F-750 Kaltenbach passa a ser a seguinte:

Ø Em primeiro lugar o crédito reclamado pelo Banco A…, S.A. na parte garantida por penhor (no valor de €667.617,82), constante do n.º 11 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar os créditos, dos trabalhadores da insolvente, constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência.

Quanto à restante graduação mantém-se a que consta da alínea A) da decisão recorrida. 


*

4. Violação dos artigos 2º e 18º, da Constituição da República Portuguesa, o que fundamenta a não aplicação, por inconstitucionalidade, do artigo 204º, nº 2 da Lei nº 110/2009 e artigo 333º, nº 2 do CT

                A questão colocada pelo apelante Banco A…, SA em sede de inconstitucionalidade está claramente prejudicada por via da procedência do recurso relativamente à graduação do penhor por referência aos créditos dos trabalhadores e da Segurança Social, IP.

Com efeito, a procedência do recurso relativo à graduação de créditos, alínea A) da sentença recorrida, prejudicou claramente questão da inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 333º do CT e 204º da Lei nº 110/2009 de 16.9, uma vez que entendemos que as razões invocadas pelo apelante foram acolhidos por este Tribunal, pelo que só havia lugar ao conhecimento da inconstitucionalidade se o Tribunal da Relação tivesse entendimento distinto daquele que o apelante partilha nas suas doutas alegações/conclusões.

                5. Não graduação dos créditos com base nas acções tituladas por … por não pertencerem à massa insolvente:

Pode ler-se nas doutas conclusões 26ª a 31ª e citamos: «a graduação de créditos relativa às 197.047 acções tituladas por … viola o artigo 46º do CIRE pelo que deve ser nessa parte eliminada».

Determina o nº 1 do artigo 46º do CIRE:

A massa insolvente destina-se à satisfação dos credores da insolvência, depois de pagas as suas próprias dívidas, e, salvo disposição em contrário, abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo.

De modo simplista pode afirmar-se que a massa insolvente abrange a totalidade do património da insolvente. Sucede que nos termos do artigo 128º do CIRE «devem os credores reclamar os seus créditos por meio de requerimento» o que o apelante Banco A…, SA fez nos termos constantes de folhas 44 a 72, individualizando-se do seu requerimento de reclamação – artigo 128º do CIRE – o item 16 com a seguinte redacção:

Acresce que o supra referido crédito Banco A…, SA, no montante de Eur.667.617,82 (…) que decorre do contrato de financiamento nº FEC 450011, mencionado no anterior artigo 12, encontra-se ainda garantido por penhor de valores imobiliários:

· Penhor 148.560 acções denominadas por Banco A…, SA depositadas no dossier nº …, associado à conta nº …, associado à conta nº … em nome de ...

· Penhor 48.487 acções denominadas por Banco A…, SA depositadas no dossier nº …, associado à conta nº …, associado à conta nº … em nome de ...

Ou seja, dúvidas não se suscitam relativamente à reclamação de créditos por referência a 197,047 acções que foram dadas como garantia – penhor – relativamente ao crédito Banco A…, SA, no montante de Eur.667.617,82, crédito que, de resto, foi reconhecido pela Sra. Administradora da insolvência como decorre de folhas 13 dos presentes autos.

Tal como refere a decisão recorrida «na ausência de apenso ou auto de apreensão de bens (…) pensamos que nos haveremos de louvar (à falta de qualquer outro elemento) no inventário que foi elaborado pela Sra. Administradora de Insolvência e que consta de fls. 233 a 244 dos autos principais».

Como se constata, o aqui apelante não só não se opôs ao «inventário» elaborado pela Sra. Administradora no âmbito do processo principal, como na sua reclamação de créditos, e por referência ao m0ntante de € 667.617,82; defendeu que se encontrava garantido pelo penhor de uma máquina e pelo penhor das mencionadas 197,047 acções.

Reconhecido o crédito que suporta o penhor de valores mobiliários, o Tribunal a quo na alínea B) da decisão recorrida – folhas 92 – consignou que «pelo produto da eventual venda das 197.047 acções denominadas por Banco A…, SA em nome de …» são pagos os seguintes credores:

Ø Em primeiro lugar os créditos reclamados pelos trabalhadores da insolvente, constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pelo Banco A…, S.A. na parte garantida por penhor (no valor de €667.617,82), constante do n.º 11 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quarto lugar, indiferentemente, os créditos relativos a IRS e IVA, constantes do n.º 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quinto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os restantes créditos constantes da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes, com excepção dos créditos subordinados.

Ø Em sexto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os créditos de natureza subordinada constantes dos nºs 1, 25, 27, 29, 34 e 65 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes.

Não questionamos, considerando o item 16 da reclamação de créditos – folhas 47 – que as acções pertencem a terceiros estranhos à sociedade insolvente e daí que não pudessem ser indicadas, como foram, como pertença da sociedade insolvente. Também para este equívoco deve ter contribuído a falta de apenso de apreensão de bens, todavia, no inventário elaborado ao abrigo do artigo 153º do CIRE não constam as acções como pertencentes à sociedade insolvente pelo que a sua inclusão na sentença de verificação e graduação de créditos viola o artigo 46º, nº 1 do CIRE.

De resto na sequência dos despachos de folhas 20 e 31 a Sra. Administradora atravessou nos autos a informação de folhas 37 na qual e por referência ao Banco A…, SA e ao crédito de € 667.617,82 explicita que existe um único penhor sobre a máquina de corte e furação modelo F-750 Kaltenbach não fazendo qualquer alusão às 197.047 acções denominadas por Banco A…, SA por não estarem em nome da insolvente mas sim em nome de ...

A ser assim, como nos parece que é, as 197.047 acções denominadas por Banco A…, SA estão em nome de terceiros alheios à insolvente e por isso não podem ser objecto de venda e com o seu produto serem os credores ressarcidos porque não são passíveis de integrar a massa nos termos do artigo 46º do CIRE.

Embora seguramente influenciado pela sua descrição no requerimento de reclamação do Banco A…, SA, o que seguramente se terá ficado a dever a lapso do reclamante, o Tribunal cometeu igual lapso ao levar à graduação a alínea B) – folhas 92 – na qual referiu e citamos: pelo produto da eventual venda das 197.047 acções denominadas por Banco A…, SA em nome de …» são pagos os seguintes credores (…).

Como se vê o Tribunal a quo atribuiu a titularidade das acções a terceiros e por isso nunca as podia ter incorporado na sentença de verificação e graduação de créditos por não pertencerem à massa insolvente.

Assim e na procedência do recurso elimina-se a alínea B) do pronunciamento decisório


*

                Conclusão:

I. Concorrendo sobre o produto da venda de um bem móvel integrante da massa falida créditos dotados de privilégio mobiliário geral como sucede com os créditos emergentes do contrato de trabalho, sua cessação ou violação – alínea a) do nº 1 do artigo 333º do CT – e um crédito garantido por penhor, deve este último nos termos do disposto no artigo 666º, nº 1 e artigo 749º, nº 1 ambos do CC ser graduado em 1º lugar e consequentemente pago preferentemente relativamente aos demais créditos mobiliários que incidam sobre a coisa que foi objecto de penhor.

II. As 197.047 acções denominadas por Banco A…, SA inscritas em nome de terceiros alheios à insolvente, não podem ser objecto de venda e com o seu produto serem os credores ressarcidos porque não são passíveis de integrar a massa nos termos do artigo 46º do CIRE.


*

                Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos acordam os Juízes dar provimento ao recurso e consequentemente:

1. A graduação de créditos por referência ao produto da eventual venda da máquina de centro de corte e furação modelo F-750 Kaltenbach passa a ser a seguinte:

Ø Em primeiro lugar o crédito reclamado pelo Banco A…, S.A. na parte garantida por penhor (no valor de €667.617,82), constante do n.º 11 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar os créditos, dos trabalhadores da insolvente, constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência.

Quanto à restante graduação mantém-se a que consta da alínea A) da decisão recorrida. 


*

                2. Eliminam a alínea B) do pronunciamento decisório que tem a seguinte formulação:

Que pelo produto da eventual venda das 197.047 acções denominadas por Banco A…, SA em nome de … são pagos os seguintes credores:

Ø Em primeiro lugar, em primeiro lugar os créditos reclamados pelos trabalhadores da insolvente, constantes dos nºs 8, 9, 42, 43, 45, 46, 47, 52, 59 e 63 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em segundo lugar o crédito reclamado pelo Instituto de Segurança Social, IP, constante do n.º 35 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em terceiro lugar o crédito reclamado pelo Banco A…, S.A. na parte garantida por penhor (no valor de €667.617,82), constante do n.º 11 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quarto lugar, indiferentemente, os créditos relativos a IRS e IVA, constantes do n.º 26 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência;

Ø Em quinto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os restantes créditos constantes da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes, com excepção dos créditos subordinados.

Ø Em sexto lugar, em igualdade de circunstâncias, todos os créditos de natureza subordinada constantes dos nºs 1, 25, 27, 29, 34 e 65 da lista apresentada pela Sra. Administradora de insolvência, nos termos dela constantes.

                Custas a cargo da massa insolvente – artigo 304º do CIRE.

                Notifique.


Jacinto Meca  (Relator)

Falcão de Magalhães

Sílvia Pires


[1] Que não sofreu alterações por referência à redacção vazada no artigo 377º da Lei nº 99/2003, de 27.8 que aprovou o Código do Trabalho que tinha a seguinte redacção: Privilégios creditórios 1 — Os créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, gozam dos seguintes privilégios creditórios: a) Privilégio mobiliário geral; b) Privilégio imobiliário especial sobre os bens imóveis do empregador nos quais o trabalhador preste a sua actividade. 2 — A graduação dos créditos faz-se pela ordem seguinte: a) O crédito com privilégio mobiliário geral é graduado antes dos créditos referidos no nº1 do artigo 747ºdo Código Civil; b) O crédito com privilégio imobiliário especial é graduado antes dos créditos referidos no artigo 748º do Código Civil e ainda dos créditos de contribuições devidas à segurança social.
[2] Código Civil Anotado, I, 3ª edição – Coimbra Editora, pág. 738.
[3] Neste sentido Ac. RC, datado de 25 de Janeiro de 2011, processo nº 825/08.9 TBMGR-K.C1, relatado pelo Sr. Juiz Desembargador Falcão de Magalhães e publicado no endereço electrónico www.dgsi.pt.