Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
461/17.9T8GRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO – PROMOÇÕES
Data do Acordão: 04/20/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA– JUÍZO DO TRABALHO DA GUARDA
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO DE APELAÇÃO - SECÇÃO SOCIAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Legislação Nacional: CCT ENTRE A APED E A FEPCES E OUTROS
Sumário:
I – Por força do disposto nos nºs 4 e 5 da cláusula 7ª do CCT celebrado entre a APED e a FEPCES e outros, publicado bo BTE nº 22, de 15/06/2008, os trabalhadores das categorias de 2ª e de 1ª, constantes dos níveis aí referidos, são promovidos, decorridos três anos, às respetivas categorias do nível imediatamente superior. Tal referência a promoções às respetivas categorias do nível imediatamente superior aponta para uma promoção automática a ocorrer na mesma categoria profissional, entendimento este que é também mais conforme com o exercício das correspondentes funções, posto que a progressão automática, de 3 em 3 anos, tem presente a experiência adquirida com o decurso do tempo e que, necessariamente, não é a mesma quando o trabalhador muda de categoria profissional.
II – Conforme resulta do nº 2 da cláusula 8ª do mesmo CCT, ‘os trabalhadores que por força das alterações na designação da categoria sejam reclassificados manterão na nova categoria a antiguidade que já tinham anteriormente’.
III – Este normativo não pode desligar-se do disposto no seu nº 1, ou seja, de uma reclassificação obrigatória aí prevista e, por outro lado, diz respeito às reclassificações que ocorram por força das alterações na designação da categoria, ou seja, as previstas no CCT (como as do citado nº 1 da cláusula 8ª) e não às que se verificam por força de uma mudança de categoria profissional, como ocorre no caso de uma trabalhadora operadora de supermercado de 2ª que em maio de 2008 é transferida para a secção de padaria e em outubro do mesmo ano é reclassificada como panificadora de 2ª.
Decisão Texto Integral:
Acordam Relatora – Paula Maria Roberto
Adjuntos – Ramalho Pinto
Felizardo Paiva na Secção Social (6ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - Relatório

A…, residente em B…,

intentou a presente ação de processo comum contra

R…, com sede em C…

alegando, em síntese que:
Trabalha para a Ré desde 07/07/2004 desempenhando as funções de panificadora especializada desde 07/07/2014 e auferindo o salário de € 587,32; à relação laboral aplica-se o CCT entre a APED e a FEPCES; foi contratada com a categoria profissional de operador ajudante de 1º ano, em 07/07/2005 passou para a categoria de operador ajudante de 2º ano e em 07/07/2006 para a categoria de operador de supermercado de 2ª; em maio de 2008 foi transferida para a secção de padaria e reclassificada em 07/10/2008 como panificadora de 2ª; em 07/07/2012 subiu para a categoria de panificadora de 1ª, tendo em 07/07/2014 até à presente data a categoria profissional de panificadora especializada; foi reclassificada em 07/10/2008 como panificadora de 2ª quando teria que ser reclassificada em 07/07/2008, em 07/07/2009 passaria a panificadora de 1ª e em 07/07/2012 a panificadora especializada (e não em 07/07/2014), última promoção na carreira; a Ré reclassificou mal a A., pelo que, deve-lhe as diferenças salariais inerentes à reposição da sua situação, no montante global de € 1.367,97.
Termina, dizendo que a presente ação deve ser julgada procedente por provada e, em consequência, ser a Ré condenada a reclassificar a A. conforme alegado e a pagar-lhe as diferenças salariais no vencimento base, no subsídio de domingo, no subsídio de feriado e no subsídio de trabalho nocturno, no valor total de € 1.367,97, acrescido de juros de mora à taxa legal desde o respectivo vencimento e até integral pagamento.
*
A Ré contestou alegando, em sinopse, que:
Cumpriu integralmente o disposto no CCT a respeito de promoções e a sua cláusula 8ª não tem aplicação no caso concreto, porquanto se trata de uma cláusula de transição entre IRCT`s que dispõe especificamente para situações que surgem ex novo na redacção mais atual; a situação em causa não se refere a nenhuma das novas categorias previstas naquela cláusula nem a qualquer outra que tenha sofrido redenominação; no que respeita à cláusula 7ª a mesma prevê a promoção automática dentro da categoria e não inter categorias, pelo que, os tempos de promoção automática que a A. reclama apenas seriam aplicáveis caso a mesma se tivesse mantido dentro da categoria de origem, no caso, operadora de supermercado; ao operar uma mudança de categoria profissional a contagem para a promoção automática dentro da categoria deverá efectuar-se nos tempos previstos na cláusula 7ª, a partir da alteração da categoria, o que fez, não são devidos quaisquer valores a título de diferenças salariais.
Termina, dizendo que a contestação deverá ser considerada procedente por provada e, em consequência, ser a Ré absolvida do pedido.
*
Foi proferido o despacho saneador/sentença de fls. 66 e segs. e cujo dispositivo é o seguinte:
Em face do exposto decide o Tribunal:
I.
Julgando improcedente a ação intentada por A…, absolver a ré R… do pedido.”
*
A A., notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:
(…)
*
A apresentou resposta, concluindo nos seguintes termos:
(…)
*
O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 87 e 88 no sentido de que o recurso deve obter provimento.
*
A Ré veio responder a este parecer concluindo que o recurso deve improceder e a sentença recorrida mantida nos precisos termos em que foi proferida.
*
Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
*
II – Questões a decidir:
Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (artigo 639.º, n.º 1, do C.P.C. na redação da Lei n.º 41/2013 de 26/06), com exceção das questões de conhecimento oficioso.
Assim, cumpre apreciar a questão suscitada pela A. recorrente, qual seja:
Se a A., por força do disposto nas cláusulas 7ª e 8ª do CCT, em julho de 2009 deveria ter acedido à categoria profissional de panificador de 1ª e em julho de 2012 à de panificador especializado.
*
*
III – Fundamentação
a) Factos provados constantes da decisão recorrida:
(…)
*
*
b) - Discussão
Apreciando a questão suscitada pela A. recorrente:
Se a A., por força do disposto nas cláusulas 7ª e 8ª do CCT, em julho de 2009 deveria ter acedido à categoria profissional de panificador de 1ª e em julho de 2012 à de panificador especializado.
Como já referimos a A. não se conforma com a decisão recorrida pois entende que por força do disposto nos n.ºs 4 e 5 da cláusula 7ª e do CCT celebrado entre a APED e a FEPCES, publicado no BTE, n.º 22, de 15/06/2008, os trabalhadores das categorias de 2ª e de 1ª são promovidos decorridos 3 anos mesmo se tiverem sido reclassificados para outra categoria profissional, o que lhe aconteceu quando passou de operador de supermercado de 2ª para panificador de 2ª (em 2008). Mais alega que o n.º 2 da cláusula 8ª do mesmo CCT, ao contrário do decidido na sentença recorrida, não se aplica apenas às categorias profissionais referidas no seu n.º 1, referindo-se a reclassificações em geral, não existindo qualquer ligação entre o n.º 1 e o n.º 2 e reforça a sua posição quando nela se refere que manterão na nova categoria a antiguidade que já tinham anteriormente.
Vejamos, então, se assiste razão à recorrente.
A este propósito consta da sentença recorrida, além do mais, o seguinte:
A divergência das partes assenta na aplicação ou não à autora da regra estabelecida no nº 2 da clª 8ª, ou seja, se esta norma se aplica a qualquer caso de alteração na designação da categoria profissional ou se tem o âmbito restrito de aplicação às categorias profissionais aludidas no nº 1 da mesma clª 8ª.
Ora, a nosso ver, a leitura que se afigura mais correta é aquela que considera que o nº 2 da clª 8ª tem um âmbito limitado de aplicação.
Neste sentido podemos, desde logo, apontar, ainda que sem caráter decisivo, a circunstância de as partes contratantes não terem conferido um cunho geral à norma em questão, não a separando da previsão do nº 1.
Caso as partes pretendessem atribuir aquele caráter geral, em regra, estabeleceriam a previsão do nº 2 da clª 8ª numa cláusula autónoma.
A opção tomada aponta mais no sentido da existência de uma conexão entre a previsão do nº 1, que estabelece uma reclassificação limitada e a previsão do nº 2.
Mas essencialmente a posição deste Tribunal assenta no critério da necessidade de previsão do nº 2 da clª 8ª.
Se atentarmos no nº 2 da clª 5ª, verificamos que as partes acordaram na alteração da denominação da categoria profissional de operadores de hipermercado/supermercado, que passou a designar-se por operador de hipermercados/supermercado/loja.
Trata-se de uma simples alteração de denominação, uma vez que aí se consignou que os trabalhadores mantinham o mesmo nível e consequentemente o mesmo índice remuneratório.
Em tal caso, a norma do nº 2 da clª 8ª não era, de modo algum, necessária.
Isto significa que esta norma veio abranger as situações em que, além da simples alteração de denominação da categoria profissional, se verificaria uma alteração do nível na tabela salarial.
Ora, esses são precisamente os casos previstos no nº 1, as categorias profissionais de analista de sistemas e de gestor de produtos, em que, nessas categorias, se verificou um desdobramento, passando a incluir o nível de analista de sistemas A (nível III) e de analista de sistemas B (nível IV) e de gestor de produtos comercial A (nível IV) e de gestor de produtos comercial B (nível V).
Pretenderam assim as partes outorgantes que, nestes específicos casos, a antiguidade dos trabalhadores não fosse afetada pela alteração de designação da categoria ou, dito de outro modo, por força do desdobramento das funções das indicadas categorias.
Idêntica solução havia já sido adotada aquando da celebração do contrato coletivo de trabalho entre a «APED – Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição» e a «FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços» e outros, publicada no Boletim do Trabalho Emprego nº 33/2000, de 8 de setembro, abarcando então um número substancialmente mais elevado de categorias profissionais.
A situação da autora não se enquadra assim no âmbito de aplicação da norma da clª 8ª, nº 2, do contrato coletivo de trabalho, uma vez que não esteve em causa uma alteração da designação da categoria profissional, por força da alteração do contrato coletivo de trabalho.”
*
Como se decidiu no Acórdão do STJ, de 23/02/2012, disponível em www.dgsi.pt:
<<I – A categoria assume a natureza de conceito normativo, no sentido em que circunscreve, positiva e negativamente, as funções a exercer em concreto pelo trabalhador, ou, noutros termos, que nela se subsumem as tarefas prometidas e se excluem actividades diferentes, e, por conseguinte, se estabelece uma relação de necessidade entre o exercício de certa função e a titularidade de certa categoria. (…)>>
Às relações laborais existentes entre a A. e a Ré aplica-se o CCT outorgado entre a APED – Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição e a FEPCES – Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritórios e Serviços e outros, publicado no Boletim do Trabalho Emprego n.º 22, de 15/06/2008.
No que respeita à carreira profissional e admissões regem as cláusulas 3.ª a 8.ª, sendo que, com relevo para o caso em análise, dispõe a cláusula 7.ª, sob a epígrafe acessos:
“1 – Os trabalhadores das categorias constantes do nível XIII do anexo II são promovidos, decorrido um ano, às categorias correspondentes do nível XII.
2 – Os trabalhadores das categorias constantes do nível XII do anexo II são promovidos, decorrido um ano, às categorias correspondentes do nível X.
3 – O operador de armazém-B após três anos no nível XI é promovido a operador de armazém-A, nível X.
4 – Os trabalhadores das categorias de 2.ª constantes do nível X, anexo II, são promovidos, decorridos três anos, às categorias constantes do nível IX.
§ único. O operador informático estagiário será promovido a operador estagiário de 2ª, decorrido seis meses de permanência naquela categoria.
5 – Os trabalhadores das categorias de 1.ª constantes do nível IX e o operador informático de 2ª do anexo II são promovidos decorridos três anos às respectivas categorias do nível VIII.
6 – Os trabalhadores das categorias de servente/ajudante de motorista e contínuo, decorridos três anos de permanência na categoria, serão remunerados pelo nível X da tabela salarial.”
Já no que respeita às reclassificações, rege a citada cláusula 8.ª nos seguintes termos:
“1 – No prazo de 90 dias contados a partir da data de entrada em vigor do presente contrato, as empresas procederão às reclassificações a seguir identificadas:
Analista de sistemas — em analista de sistemas A e analista de sistemas B;
Gestor de produto — em gestor de produtos comercial A e gestor de produto comercial B.
2 – Os trabalhadores que por força das alterações na designação da categoria sejam reclassificados manterão na nova categoria a antiguidade que já tinham anteriormente.”
Uma vez que a A. em julho de 2006 detinha a categoria de operadora de supermercado de 2ª e, após a transferência para a padaria em maio de 2008, foi reclassificada em outubro do mesmo ano para a categoria de panificadora de 2ª, estão apenas em causa os n.ºs 4 e 5 da cláusula 7.ª posto que remetem para o Anexo II, níveis X, IX e VIII nos quais aquelas se encontram previstas.
Posto isto, dúvidas não existem de que os trabalhadores abrangidos por este contrato serão obrigatoriamente classificados numa das categorias profissionais constantes do anexo I.
Por outro lado, por força do disposto nos n.ºs 4 e 5 da cláusula 7.ª do citado CTT, os trabalhadores das categorias de 2ª e de 1ª, constantes dos níveis aí referidos, são promovidos, decorridos três anos, às respetivas categorias do nível imediatamente superior.
Impõe-se, assim, questionar, desde já, se esta progressão automática na carreira se encontra prevista apenas para a situação de permanência na mesma categoria profissional, como defende a Ré, ou se, ao invés também será de aplicar quando ocorra uma reclassificação como a da A. recorrente, o que esta propugna.
Vejamos:
A A. em julho de 2006 encontrava-se classificada como operadora de supermercado de 2ª; em maio de 2008 foi transferida para a padaria e, em outubro de 2008, foi reclassificada como panificadora de 2ª.
Ora, as funções de operadora de supermercado e de panificadora, conforme descrição constante do Anexo I, são essencialmente distintas.
Acresce que, nos citados n.ºs 4 e 5 faz-se referência a promoções às respetivas categorias do nível imediatamente superior, pelo que, é nosso entendimento que a redação de tal norma aponta para uma promoção automática a ocorrer na mesma categoria profissional.
Este entendimento é também mais conforme com o exercício das correspondentes funções, posto que, a progressão automática, de 3 em 3 anos, tem presente a experiência adquirida com o decurso do tempo e que, necessariamente, não é a mesma quando o trabalhador muda de categoria profissional, como ocorreu com a A. recorrente.
Por outro lado, a A. recorrente entende que lhe é aplicável o disposto no n.º 2 da cláusula 8.ª do CCT em análise.
Na verdade, “os trabalhadores que por força das alterações na designação da categoria sejam reclassificados manterão na nova categoria a antiguidade que já tinham anteriormente”.
Acontece que, este normativo não pode desligar-se do disposto no seu n.º 1, ou seja, de uma reclassificação obrigatória aí prevista e, por outro lado, diz respeito às reclassificações que ocorram por força das alterações na designação da categoria, ou seja, as previstas no CCT (como as do citado n.º 1 da cláusula 8.ª) e não às que se verificam por força de uma mudança de categoria profissional, como ocorreu com a A. (operadora de supermercado de 2ª) que em maio de 2008 foi transferida para a secção de padaria e em outubro do mesmo ano reclassificada como panificadora de 2.ª.
Aliás, como se refere na decisão recorrida, neste sentido aponta o disposto no n.º 2 da cláusula 5.ª quando estabelece que <<os trabalhadores classificados com a denominação de operadores de hipermercado/supermercado passam a ser designados por operador de hipermercados/supermercado/loja, mantendo-se no mesmo nível”. As partes acordaram na alteração da designação da categoria, no entanto, também estabeleceram que mantinham o mesmo nível e, consequentemente, a mesma remuneração, o que demonstra a desnecessidade da norma constante do n.º 2 da cláusula 8.ª.
Reclassificados serão os analistas de sistemas e o gestor de produto como se determina no n.º 1 da cláusula 8.ª e que, por força do desdobramento aí previsto, serão incluídos nos níveis III ou IV e IV ou V, respetivamente, compreendendo-se a preocupação das partes outorgantes no sentido de a antiguidade destes trabalhadores não ser afetada por força da alteração da designação da categoria, mantendo-se na nova categoria a antiguidade que já tinham anteriormente.
Em suma, não assiste qualquer razão à A., posto que, em julho de 2009 não tinha permanecido 3 anos no desempenho das funções correspondentes à categoria profissional de panificadora de 2ª (que exerceu desde maio de 2008) e a sua reclassificação não ocorreu por força de uma alteração na designação da categoria operada pelo CCT mas sim devido a uma mudança para outra secção e respetivas funções e, consequentemente, não lhe são aplicáveis as normas constantes dos n.ºs 4 e 5 da cláusula 7ª nem o n.º 2 da cláusula 8.ª do CCT supra mencionado.
Improcedem, desta forma, as conclusões da recorrente.
*
Assim, na improcedência das conclusões da recorrente, impõe-se a manutenção da sentença recorrida em conformidade.
*
V – DECISÃO
Nestes termos, sem outras considerações, na total improcedência do recurso, acorda-se:
- em julgar improcedente a apelação mantendo-se a sentença recorrida.
*
Sem custas por delas estar isenta a A. recorrente (artigo 4.º, n.º 1, h), do RCP).
*
Coimbra, 2018/04/20 __________________
(Paula Maria Roberto)
____________________
(Ramalho Pinto)
_____________________
(Felizardo Paiva)