Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
248/13.8JACBR-A.C3
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: ACUSAÇÃO
NULIDADE
Data do Acordão: 09/24/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE ALVAIÁZERE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 311.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
Sumário: Não tendo sido requerida instrução (o arguido poderia sempre requerê-la - art. 287 n.º 1, al. a), do CPP), a nulidade arguida só é de conhecer no despacho a que se reporta o art. 311.º do CPP.
Decisão Texto Integral: Acordam  no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.

            No processo supra identificado, em que é arguido A..., foi proferido despacho que relegou o conhecimento de arguição da nulidade da acusação para o momento do saneamento do processo, nos termos do disposto no art. 311 do CPP.


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Inconformado, desse despacho interpôs recurso o arguido formulando as seguintes conclusões na motivação do mesmo e, que delimitam o objeto:

B1. O presente recurso deve ser admitido a subir de imediato (art. 407°-1 cpp), em separado (art. 406°-2 do mesmo diploma) e com efeito suspensivo da decisão recorrida (art. 408°-2, in fine).

B2. O despacho da M.ma Juíza diferindo o conhecimento da nulidade da acusação, oportunamente suscitada, para o momento da prolação do despacho a que se refere o art.° 311° do CPP, viola o disposto no art. 17.° do mesmo diploma legal e bem assim o art. 32.°-1 da Constituição da República Portuguesa,

B3. Comando este nos termos do primeiro dos quais, cabe ao Juiz referido no art. 17.°-1, "todas as funções jurisdicionais até à remessa do processo para julgamento".

B4. Como assim, o despacho da M.ma Juíza, bem vistas as coisas, denegou pronúncia e, nessa medida, é nulo por violação do disposto no art. 379.°-1, c) do CPP, vício este a invocar nos termos do disposto no art.° 379. °-2 deste diploma legal.    

B5.Pelo que, dando-se provimento ao presente recurso, deverão V. Exas desde já conhecer da questão da nulidade oportunamente suscitada.

Respondeu o Magistrado do Mº Pº, concluindo:

1) O Douto Despacho objeto de recurso não violou qualquer dos normativos legais indicados pelo recorrente.

2) Nesta medida, o despacho em crise que diferiu o conhecimento da nulidade invocada pelo arguido para o momento da prolação do despacho previsto no artigo 311.° do CPP não viola o disposto nos artigos 17.° do CPP e 32.°, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.

3) Pelo exposto, o recurso interposto pelo arguido não merece provimento, devendo manter-se na íntegra o Douto Despacho recorrido.

Nesta Relação, o Ex.mº PGA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Improcedendo a alegada nulidade, deve ser julgado improcedente o recurso.

Foi cumprido o art. 417 do CPP.

Foi apresentada resposta na qual se reafirmam os fundamentos do recurso.

Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir:


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É do seguinte teor o despacho recorrido:

“III - Requerimento do arguido de fls. 1646 a 1651 (enviado via e-mail a 29.05.2014) - Da invocada nulidade da acusação

Aguarde-se o saneamento do processo, que terá lugar após o decurso do prazo para requerer a abertura de instrução (artigo 311.° do CPP).

Notifique.


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            Conhecendo:

            A questão suscitada no recurso respeita a:

            - Competência para proferir decisão sobre requerimento de arguição de nulidade da acusação.


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Conforme preceitua o art. 17 do CPP, compete ao juiz de instrução “proceder à instrução, decidir quanto à pronúncia e exercer todas as funções jurisdicionais até à remessa do processo para julgamento, nos termos prescritos neste Código”.

E, os atos da competência do juiz de instrução e, a praticar por este ou a ordená-los, encontram-se de forma genérica enumerados nos arts. 268 e 269 do CPP, havendo outros previstos de forma expressa, arts. 68 nº 3, 116, nº 2 etc., sendo que a enumeração se baseou nos arts. 205 e 206 da CRP.

As nulidades processuais de caracter geral encontram-se previstas nos arts. 119 e 120 do CPP.

As nulidades da acusação estão previstas no art. 283 do mesmo diploma e, as nulidades da sentença encontram-se previstas no art. 379, conforme consta da epígrafe do art., “nulidade da sentença”.

Sendo que qualquer nulidade processual penal tem de ter cominação legal (princípio da taxatividade das nulidades processuais) – art. 118 do CPP.

A nulidade da acusação deve ser deduzida perante quem a subscreveu ou, perante o seu superior hierárquico e, não o sendo perante a entidade dominus do inquérito, só poderá ser conhecida nos termos do disposto no art. 311.º do CPP.

“Uma consequência da estrutura acusatória do processo é a independência do Ministério Público em relação ao juiz na formulação da acusação.

Da consagração da estrutura acusatória resulta inadmissível que o juiz possa ordenar ao MP os termos em que deve formular a acusação. Por maioria de razão, não pode também o juiz suprir os vícios de que a acusação padeça” – Ac. desta Relação, de 22-05-2003, no proc. 368/07.8TALRA.C1.

Conforme refere Maia Gonçalves em anotação ao art. 17, no seu CPP anotado e comentado, “nos processos em que não há instrução e em que houver acusação, aplicar-se-á o disposto no art. 311 nº 2”.

No sentido do exposto, o ac. do STJ de 28-02-2013, proferido no proc. nº 1/12.6YGLSB.SI-A. Aí se refere:” III- Ora, compete ao juiz de instrução “proceder à instrução, decidir quanto à pronúncia e exercer todas as funções jurisdicionais até à remessa do processo para julgamento, nos termos prescritos neste Código” (art.º 17.º do CPP).

IV- Por isso, deduzida acusação particular, a arguição de uma nulidade do inquérito, feita em simultâneo com tal acusação, só poderá caber ao juiz competente para proferir despacho nos termos do art.º 313.º do CPP e não ao juiz de instrução, salvo se o arguido, notificado de tal acusação, vier requerer instrução.

V- Assim, a arguição de nulidade, que até nem foi dirigida ao juiz de instrução, não poderia ter sido apreciada pelo Exm.º Conselheiro a exercer funções de juiz de instrução, por falta de competência material para esse efeito.

VII- A arguição da dita nulidade será apreciada pelo juiz que se revelar posteriormente competente, que decidirá se dela toma conhecimento ou não, que poderá vir a ser, ou o juiz de instrução, caso essa fase processual venha a ser requerida pelo arguido, ou então o que, por nova distribuição, for designado para proferir despacho nos termos do art.º 313.º do CPP”.

No caso concreto e, não tendo sido requerida instrução (o arguido poderia sempre requerê-la - art. 287 nº 1 al. a), do CPP), a nulidade arguida só seria de conhecer no despacho a que se reporta o art. 311 do CPP.

Assim que bem andou o juiz da instrução ao não conhecer da nulidade alegada e diferir o conhecimento da mesma para momento posterior, recebimento da acusação e, caso não viesse a ser requerida a instrução.


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            Assim, que se julgam improcedentes todas as conclusões do recurso e, consequentemente, este.

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Decisão:

Face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação e Secção Criminal em, julgar improcedente o recurso do arguido A... e, em consequência, mantém-se na íntegra o despacho recorrido.

Custas pelo recorrente, com 3 Ucs de taxa de justiça.

Coimbra, 24 de Setembro de 2014

Jorge Dias (relator)

Orlando Gonçalves (adjunto)