Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1631/09.9TBVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MOREIRA DO CARMO
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
PROVA PERICIAL
ÍNDICE FUNDIÁRIO
Data do Acordão: 06/20/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU 2º J C
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ANULADA
Legislação Nacional: ARTS. 23, 26 C.EXP., 712 Nº4 CPC
Sumário: 1.- Não fornecendo o relatório pericial maioritário, em processo de expropriação, todos os elementos bastantes para se poder decidir com segurança, segundo as várias soluções plausíveis de direito, impõe-se que o tribunal de recurso considere deficientes as respostas dadas em tal relatório, assim se devendo anular, parcialmente, o referido laudo pericial, nos termos do art. 712º, nº 4, do CPC.

2. - Se o tribunal a quo tiver deixado de apurar elementos relevantes para o cálculo do valor de indemnização da parcela expropriada, designadamente os elementos atinentes ao índice fundiário, previsto no art. 26º, nº 7, do C. Expropriações, deverá ser ordenada a ampliação da matéria de facto, nos termos do mesmo artigo e número do CPC.

Decisão Texto Integral: I – Relatório

1. Por declaração inserta no D.R. nº 26, II Série de 6.2.2006, rectificado por despacho publicado no DR nº 98, II Série, de 22.5.2007, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação de uma parcela, a nº 3, com a área de 598 m2, a desanexar do prédio rústico sito na freguesia de Repeses, concelho de Viseu, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 365, e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 407/20011228, pertence a I (…) SA, para construção da obra “Acessos de Viseu ao IP3-Beneficiação da EN 2 a Sul de Viseu – Troço 1”.

Realizaram-se a vistoria “ad perpetuam rei memoriam” e a arbitragem, tendo o valor da parcela expropriada sido fixado em 37.498,90 € (cfr. fls. 27/31 e 52/59).

Veio a entidade expropriante “EP – Estradas de Portugal, S.A.” interpor recurso (fls. 72/75), no qual expressa a sua discordância em relação ao valor da indemnização encontrada, que entende ser de fixar em 6.270,01 €. Fundamentou a sua posição, em síntese, no facto de a parcela em causa ter aptidão meramente industrial, não se destinando a construção de habitação como consideraram os árbitros, defendendo diversa aplicação dos critérios utilizados pelos árbitros.

Também a expropriada I (…), SA, interpôs recurso da decisão arbitral (fls. 82/142), aceitando que a parcela expropriada constitui solo apto para construção, não aceitando, porém, alguns dos subcritérios alinhados no artigo 26º CE, nem a inconsideração de valores atendíveis, revelados pelo mercado local respeitante a terrenos para construção situados no perímetro urbano da cidade de Viseu. Considerou assim, que ao terreno expropriado deveria ser atribuído o valor de 62.310 €, valor ao qual deveria acrescer o do ónus “non aedificandi” da parcela sobrante que valorou em 19.698 €, e o montante de 6.300 € a título de indemnização por benfeitorias. Assim, solicitando a expropriada a fixação da indemnização devida em 88.310 €.

Expropriante e expropriada, apresentaram resposta ao recurso da outra, rebatendo os argumentos expendidos e pugnando pela fixação dos valores indemnizatórios por cada uma delas avançado.

Procedeu-se à avaliação da parcela expropriada. Ambas as partes apresentaram quesitos, que foram respondidos.

No relatório que apresentaram (fls. 209/225), quatro dos peritos (3 do tribunal e 1 da expropriada) que o subscreveram, atribuíram a quantia de 65.344,54 €, como sendo a que corresponde à justa indemnização da parcela expropriada. O perito da entidade expropriante considerou (fls. 217/218) ser de atribuir ao terreno expropriado o valor unitário de 16.630,38 €, declarando concordar com o cálculo dos valores das benfeitorias (calculadas pelos restantes peritos em 7.500 €).

A expropriada apresentou reclamação, solicitando esclarecimentos, ao perito da expropriante (fls. 232/234)), tendo o mesmo respondido (fls. 255).

A expropriada prescindiu da prova testemunhal que havia indicado, bem como da realização da inspecção ao local por si requerida.

Ambas as partes alegaram, tendo a expropriante reiterando o por si defendido no recurso da decisão arbitral, enquanto a expropriada se pronunciou no sentido de que deveria ser atribuído à parcela o valor fixado na perícia.

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Foi depois proferida sentença que fixou a indemnização devida pela expropriante EP – Estradas de Portugal, S.A., à expropriada I (…), S.A., em 71.296,01 €.

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2. A expropriante interpôs recurso, tendo apresentado as seguintes conclusões:

1.O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que condenou a expropriante no pagamento de uma indemnização no montante de €. 71.296,01
2.A expropriante não se conforma com a presente decisão, que partilhou na íntegra o relatório pericial maioritário. Ignorando contudo as provas vertidas no presente processo, bem como a correcta aplicação da lei. 

3.Os peritos aplicaram índices urbanísticos errados e não previsto no PDM para solo do tipo daquele que constituem a parcela a expropriar

4.Além de que aplicaram a Portaria incorreta para apurar o valor do solo, violando assim o estipulado no Código de expropriações.

5.Ainda erraram nas percentagens determinadas no n.º 6 e 7 do artigo 26.º, duplicando assim o valor do solo.

6.Acresce que o Tribunal a quo ignorou a aplicação do n.º 9 e 10 do artigo 26.º do CE. 

7.Assim como se demonstrou o Tribunal a quo colocou em causa os Princípios constitucionais da justa indemnização e da proporcionalidade, quando aderiu aos critérios defendidos no relatório dos peritos.

8.Pois mesmo atendendo que a determinação do valor do bem expropriado é uma questão essencialmente técnico-construtiva, e sendo verdade que deve o juiz dar a sua concordância ao parecer unânime dos peritos, não poderemos ignorar que esta não pode ser aplicada quando se suscitem questões de direito com relevância para o cálculo do valor do bem expropriado ou que existam elementos de prova suficientemente sólidos que habilitem o Tribunal a divergir dos peritos, o que é o caso.

9.Com tal decisão o Tribunal o quo violou os princípios constitucionais da proporcionalidade, dado que atribui uma indemnização superior ao valor das parcelas; da igualdade pois beneficiou os expropriados relativamente aos seus vizinhos e da justa indemnização, dado que tão injusta é a indemnização que peca por defeito, como a que peca por excesso.       
Assim e na posse de todos os elementos que agora se alegaram e de outros que fazem parte dos presentes autos, deve o recurso da expropriante ser julgado procedente por provado e em consequência ser revogada a sentença recorrida.
Desta forma fazendo a esperada JUSTIÇA.

3. A expropriada contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido.

II – Factos Provados

Os factos a considerar são os que resultam do relatório supra e do teor da sentença recorrida que abaixo se irá transcrever.

III – Do Direito

1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas (arts. 685º-A, e 684º, nº 3, do CPC).

Nesta conformidade, a única questão a resolver é a seguinte.

- Cálculo do montante da indemnização a atribuir (que se desdobra em 6 pontos, constantes das conclusões de recurso 3ª a 6ª).

2. Na sentença recorrida escreveu-se que:

“3.3. Nos termos do disposto no artigo 1310° do Código Civil, “havendo expropriação por utilidade pública (…), é sempre devida a indemnização adequada ao proprietário e aos titulares dos outros direitos reais afectados”. E segundo o artigo 23º, nº 1, do Código das Expropriações (5 Aprovado pela Lei nº 168/99, de 18-09), “a justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data”.

Para determinação do valor dos bens, e de acordo com os n° 2 e 3 da mencionada norma legal, não podem tomar-se em consideração a mais-valia que resultar da própria declaração de utilidade pública da expropriação para todos os prédios da zona em que se situa o prédio expropriado, nem “quaisquer factores, circunstâncias ou situações criadas com o propósito de aumentar o valor da indemnização”, designadamente licenças ou autorizações administrativas requeridas ou benfeitorias voluptuárias ou úteis realizadas após a notificação da resolução de requerer a declaração de utilidade pública da expropriação. Em qualquer dos casos, o valor dos bens deve corresponder ao seu valor real e corrente, numa situação normal de mercado, tendo sempre por referência a data da declaração de utilidade pública – nº 5 do artigo 23º e artigo 24º, nº 1.

(…)

3.4. Cumpre, pois, tecidas estas considerações gerais, determinar, no caso vertente, qual a justa indemnização a atribuir à parcela expropriada, tendo presente que essa justa indemnização, não tendo um significado exacto e preciso, deve ser determinada em função de um ou vários índices económicos, pondo, no entanto, de parte todos os factores de ordem especulativa, de modo a que o montante determinado constitua para os expropriados uma restauração séria do seu património. Não se deverá ainda esquecer que o valor de tal indemnização há-de ser apurado atendendo ao valor que o bem expropriado teria na livre concorrência, de modo a que corresponda ao valor normal que, no mercado, atinjam os bens equivalentes aos expropriados (art. 23º, nº5, do C.E - …).

No caso vertente, ficou consignado no auto de vistoria “ad perpetuam rei memoriam” que o prédio onde se situa a parcela a expropriar se caracteriza como rústico, sendo constituído por uma parcela de terreno de quintal, com a área de 590 m2, com latas de videiras suportadas por armação metálica, já muito degradadas, uma mesa de cimento com alguns bancos também em cimento a rodeá-la, uma laranjeira, uma tangerineira adultas, um tanque em tijolo coberto com uma latada em mau estado de conservação, com um muro de vedação e um portão de ferro com chapa de zinco ondulada.

A parcela em questão situa-se em área de Espaço Industrial de acordo com o P.D.M. de Viseu, não possuindo, no entanto, a zona envolvente as normais características de uma zona industrial, possuindo os espaços industriais e de armazenagem aí encontrados uma ampla área comercial de exposições e venda, associadas a espaços de apoio administrativo.

Daí que se nos afigure correcta a determinação do valor do solo em função da sua capacidade “aedificandi”, no âmbito do artigo 26º CE. Como acertado se afigura que, sendo o terreno avaliado em face da referida pelos peritos “potencialidade construtiva” se valorizem unicamente as benfeitorias correspondentes à reposição da vedação, não sendo consideradas outras benfeitorias de cariz agrícola.

A posição da entidade expropriante revela-se, a nosso ver, destituída de fundamento, pois não se mostra objectivado nos elementos colhidos que o solo se inclua dentro de espaços tipicamente industriais, gravemente afectado pela qualidade ambiental. Também não foram colhidos elementos que permitam concluir pela necessidade de reforço de infra estruturas.

Não podendo ignorar estes pressupostos e fundamentos para a avaliação, os peritos nomeados determinaram o valor da parcela, nos termos expostos a fls. 209 e ss, encontrando o valor de € 65.344,54, como o valor da justa indemnização devida pela entidade expropriante.

Ora, é sabido que, em termos gerais, a indemnização por expropriação, em caso de recurso, se deverá fundamentalmente buscar nos valores dados nos laudos e relatórios periciais - com especial destaque para os dos peritos escolhidos pelo tribunal, no caso de disparidade entre eles e quaisquer outros - em atenção à competência que o julgador lhes deve reconhecer e que fundamenta o laudo pericial.

No caso em apreço, tal critério e directriz assume toda a pertinência e relevância, considerando que o laudo dos peritos do tribunal obteve a concordância de quatro dos cinco peritos que o subscreveram. A este propósito, não podemos deixar de reafirmar que apesar de o julgador fixar livremente a força probatória das respostas dadas pelos peritos, no fundo o poder que lhe cabe é o de controlo dos critérios por eles utilizados. Em hipóteses como a presente em que os peritos não encontraram um valor indemnizatório único, será de considerar preferencialmente a posição dos peritos do tribunal, expressa em posição maioritária, perspectivando a sua imparcialidade e desapego a quaisquer interesses subjectivos, tanto mais que inexistem quaisquer elementos probatórios irrefutáveis que imponham diversa conclusão – neste sentido, Ac RC de 14/12/2010 (11 proferido no processo nº 4714/07.6TBVIS.C1, disponível na internet no site do Itij) e de 30/11/2010 (12 proferido no processo nº 3029/08.7TBVIS.C1, também disponível na internet, no site do Itij).

Concluindo, perspectivando os pressupostos e fundamentos da avaliação, expostos a fls. 209, afigura-se-nos correctamente alcançado o valor ali atribuído, por maioria, à parcela expropriada”- fim de transcrição parcial.

Concorda-se com a sentença recorrida quando afirma que será de considerar preferencialmente a posição dos peritos do tribunal, expressa em posição maioritária, perspectivando a sua imparcialidade e desapego a quaisquer interesses subjectivos, como é jurisprudência corrente e praticamente pacífica dos tribunais superiores. Aliás, o relator da presente decisão subscreveu, como adjunto, os dois Acórdãos desta Relação indicados na dita sentença como sustentáculo de tal posição.

Mas isso não significa que o relatório pericial maioritário não tenha que ser bem fundamentado, explícito e claro nas opções que toma, ou seja, não pode haver uma adesão não ponderada em concreto ao enunciado laudo pericial. Vejamos então. 

2.1. Os 6 pontos, em que se desdobra a análise da única questão recursiva, postos à consideração e apreciação deste tribunal ad quem, por parte da recorrente, são, como decorrem das conclusões de recurso da mesma, os seguintes: a) o índice urbanístico de construção; b) o valor do custo de construção; c) o índice fundiário do art. 26º, nº 6, do CE; d) o índice fundiário do art. 26º, nº 7, do CE; e) a eventual dedução do art. 26º, nº 9, do CE; f) o factor correctivo do art. 26º, nº 10, do CE.

Está dado por assente e aceite por ambas as partes que a parcela a expropriar se deve considerar como solo apto para construção, e se situa em área de espaço industrial de acordo com o PDM de Viseu. Aí se considera quer para unidade industrial quer para unidade de armazém que o índice de implantação máximo é de =«50%, com um índice volumétrico de =«3,500 m3/m2, sendo a volumetria base correspondente a um piso com o máximo de 6 m de altura no plano lateral.

Sobre o 1º ponto defende a recorrente que de acordo com aquele PDM, o mencionado índice de implantação de toda a construção possível (armazéns e escritórios) não deverá ultrapassar 0,42 m2/m2, sendo 0,36 m2/m2 para armazéns e 0,06 m2/m2 para escritórios. No relatório pericial, no laudo maioritário, elaborado pelos 3 peritos nomeados pelo tribunal e perito indicado pela expropriada (vide fls. 213/215), refere-se que por m2 se pode construir por m2 de terreno 0,50 m2, mais 0,25 m2 para zona de exposição e vendas, mais 0,25 m2 para escritório e apoio administrativo, o que perfaz 1 m2/m2, ficando a zona de escritórios localizada em piso superior que aproveita o elevado pé direito necessário ao espaço de armazém, não constituindo por isso um acréscimo à percentagem da área de implantação, enquanto no laudo minoritário, elaborado pelo perito indicado pela expropriante se refere uma percentagem de 0,45% (vide fls.218).

Aquele laudo maioritário não é totalmente claro, ficando duas dúvidas, que importa dissipar.  Assim, como o PDM de Viseu para unidade de armazém só permite volumetria correspondente a um piso, com um pé direito alto, o referido espaço para escritório e espaço administrativo ficaria situado acima do espaço térreo de armazém, num segundo piso superior, mas dentro da indicada volumetria de 6 m ou não ? Em caso negativo em que espaço ? E a zona de exposição e vendas ficaria situada onde ? O índice de implantação do apontado PDM de 0,5 m2 é de toda a construção possível, abrangendo armazém, escritório e zona de exposição/venda, como defende a recorrente ? Ou não, tendo em conta que a construção possível concreta indicada por tais peritos acaba por ascender a 1 m2/m2 ? Importa, por isso, dissipar tais dúvidas. 

Quanto ao 2º ponto, o laudo maioritário encontrou como valores do custo de construção, os de 350 €/ m2 para armazém, 550 €/ m2 para zona de exposição e vendas, e 620 €/ m2 para escritório e apoio administrativo, o que multiplicado pelos apontados índices de construção para as referidas três tipos de tipologias acaba por dar um valor de construção por m2 de terreno de 467,50 € (vide fls. 215), enquanto no laudo minoritário se indicou o valor de 521,30 €, com base na Portaria 233/2005 de 25.2. (vide fls.218), enquanto a recorrente propõe o valor de 443,11 €/m2, considerando tal Portaria e o habitual factor de 15% de conversão de área útil em área bruta de construção. Considerando que no art. 26º, nº 5, do CE, se determina que o custo da construção se atenderá, como referencial, aos montantes fixados administrativamente para efeitos de aplicação dos regimes de habitação a custos controlados ou de renda condicionada, porque razão ignoraram os peritos maioritários tais montantes administrativos, não fazendo qualquer referência aos mesmos no seu laudo ? Ao invés, ao referirem no seu laudo “Os valores unitários de construção considerados correspondem ao normal valor de mercado para as diversas tipologias atrás referidas tendo em atenção as características comuns em espaços semelhantes”, dada a manifesta generalidade do discurso, os peritos querem significar o quê em concreto ? E com base em que dados/factos concretos ?

É necessário, pois, esclarecer e explicar tal matéria.

Quanto ao 3º ponto - índice fundiário previsto no art. 26º, nº 6, do CE - os peritos no laudo maioritário apontam para uma percentagem de 12% (vide fls. 216), enquanto o laudo minoritário indica 11% (vide fls.218, e melhor justificação a fls.255) e a recorrente 9%. Acontece que os peritos maioritários não justificam minimamente a opção por tal percentagem no seu laudo, apenas tendo referido (vide fls. 223), em resposta a quesito formulado pela expropriada (o 17º), que “entendem que a percentagem considerada reflecte de forma correcta as condições de localização, qualidade ambiental e proximidade a equipamentos”. Dado o patente juízo conclusivo, fica-se sem saber em que elementos objectivos se basearam tais peritos para considerarem os aludidos pressupostos legais atinentes às condições de localização, qualidade ambiental e proximidade de equipamentos ? O que importa apurar, pois o citado art. 26º, nº 6, do CE, é impositivo ao estatuir que o valor do solo apto para construção deverá corresponder a um máximo de 15% do custo da construção, variando, nomeadamente, em função da localização, da qualidade ambiental e dos equipamentos existentes na zona, valor esse que terá de ser “devidamente fundamentado”. O que circunstancialmente não se alcança.

Sobre o 4º ponto – índice fundiário previsto no art. 26º, nº 7, do CE – o laudo maioritário considerou (vide fls.216) a percentagem de 9,5%, sustentada nas alíneas a), c) a i), enquanto o laudo minoritário apenas considerou a percentagem de 4,5% (vide fls.218), aceitando a recorrente nas presentes alegações de recurso que a percentagem é de 6,5%, rejeitando, porém, a consideração dos items referentes a estação depuradora, prevista na citada g), e a rede de gás, prevista na h), ambos estes items não considerados, também, no laudo minoritário. É certo que os peritos maioritários referem no seu laudo a existência dessas duas infra-estruturas, e quanto à última dizem que deriva de “conhecimento do local”.

Trata-se, contudo, de matéria factual que é controvertida. Repare-se que a própria expropriada no recurso que interpôs da decisão arbitral embora considerando a existência de estação depuradora não considerou a existência de rede de gás (vide fls. 89). E a expropriante na resposta que apresentou a tal recurso impugnou a existência daquela (vide fls. 181).  

Consequentemente, tal acervo factual terá de ficar submetido ao respectivo crivo probatório, por ser relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, nos termos dos arts. 511º, nº 1, e 513º do CPC. O que o tribunal a quo omitiu por completo, não dando tal matéria por provada ou não provada, ou indicando na sentença sob recurso se tais factos estavam provados (ou não provados), o que deveria ter feito, caso estivessem provados, como o impõe claramente o art. 659º, nº2, do CPC, ao dispor que “seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados…”.

Aliás a sentença recorrida só dá por provados os factos relativos à natureza da parcela a expropriar e a área da mesma, a sua integração no espaço industrial previsto no PDM de Viseu e a envolvente comercial, e mesmo assim tudo mesclado com a fundamentação de direito, não indicando autonomamente, como devia, quais são afinal os factos que ficaram provados.

Assim, quanto àquelas duas rubricas a factualidade respectiva terá de ser apurada.             

E, finalmente, quanto ao 6º ponto, o laudo maioritário aplicou um factor correctivo de 3,75% (vide fls. 216), enquanto o laudo minoritário aplicou um factor de 10% (vide fls. 218), pretendendo a recorrente que se aplique o máximo legal de 15%.

Ora, o laudo maioritário limita-se a dizer que fixou tal factor tendo em conta “a referida diminuta dimensão da parcela, e a apetência do mercado por aquela zona”. O que quer dizer em concreto, para que seja perceptível ás partes e ao tribunal, para escolher um factor correctivo tão diminuto ?  É necessário esclarecê-lo.   

2.2. Tudo visto, e não fornecendo o relatório pericial maioritário todos os elementos bastantes para se poder decidir com segurança, segundo as várias soluções plausíveis de direito, impõe-se que este tribunal, relativamente às respostas dadas no laudo pericial maioritário, aos referidos 1º a 3º e 6º pontos, as considere deficientes, assim anulando parcialmente o referido laudo pericial maioritário, nos termos do art. 712º, nº 4, 1ª parte, do CPC (vide no mesmo sentido P. Elias da Costa, Guia das Expropriações por Utilidade Pública, 2ª Ed., pág. 212). Consequentemente, se tornando necessário fundamentar mais aprofundadamente tal laudo no que a tais pontos diz respeito, e referentemente às dúvidas em concreto especificadas e seleccionadas no presente Acórdão.

Já quanto ao 4º ponto, no sentido de apurar a enumerada matéria de facto, impõe-se que este tribunal de recurso ordene a ampliação da matéria de facto, nos termos do mesmo artigo e número.

3. Sumariando (art. 713º, nº 7, do CPC):

i) Não fornecendo o relatório pericial maioritário, em processo de expropriação, todos os elementos bastantes para se poder decidir com segurança, segundo as várias soluções plausíveis de direito, impõe-se que o tribunal de recurso considere deficientes as respostas dadas em tal relatório, assim se devendo anular, parcialmente, o referido laudo pericial, nos termos do art. 712º, nº 4, do CPC;

ii) Se o tribunal a quo tiver deixado de apurar elementos relevantes para o cálculo do valor de indemnização da parcela expropriada, designadamente os elementos atinentes ao índice fundiário previsto no art. 26º, nº 7, do C. Expropriações, deverá ser ordenada a ampliação da matéria de facto, nos termos do mesmo artigo e número do CPC.

IV – Decisão

Pelo exposto, determina-se a anulação parcial do relatório pericial maioritário, que deverá ser completado nos termos referidos em 2.1, da parte III deste Acórdão, relativamente aos indicados pontos 1º a 3º e 6º, bem como se ordena a ampliação da matéria de facto, como aludido no ponto 4º, em 2.1. da mesma parte deste Acórdão, em consequência se anulando a sentença recorrida.  

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Custas pela parte vencida a final.

Moreira do Carmo ( Relator )

Carlos Marinho

Alberto Ruço