Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2445/05.0TBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BARATEIRO MARTINS
Descritores: EMPREITADA
CAUSA DE PEDIR
INSUFICIÊNCIA
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
ÓNUS DA PROVA
AUSÊNCIA
CAUSA JUSTIFICATIVA
Data do Acordão: 10/15/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA – 5.º JUÍZO CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: 208º, 342º Nº 2, 405º, 473º, 883º, 1211º E 1213º DO CC, 1429º DO CPC
Sumário: 1 – Numa acção decorrente dum contrato de empreitada, o A./empreiteiro, para expor devidamente os factos concretos que hão-de fundamentar a sua pretensão, deve começar por alegar o regulamento contratual combinado, identificando as obras a realizar, os preços combinados e/ou os critérios para os mesmos, após o que deve dizer quais foram exacta e concretamente os trabalhos/obras executados (em função da unidade ou medida de cada um deles e, se for o caso, detalhar o preço, por trabalho e quantidade, que conduziu ao valor de cada uma das facturas emitidas).

2 – A mera remissão para facturas emitidas e juntas é insuficiente (principalmente, quando as mesmas se ficam por uma descriminação vaga e genérica), uma vez que a causa de pedir é constituída pelos concretos negócios/contratos celebrados e não pelas facturas (que não passam de documentos para fins contabilísticos e fiscais).

3 – Insuficiência que fica patente quando as facturas dizem respeito a uma parte mal definida da relação contratual e quando, tendo ocorrido pagamentos efectuados pelo dono da obra, se coloca a questão de saber, em face da divergência entre as partes, onde – em que facturas – imputá-los; uma vez que só conhecendo toda a relação contratual, combinada e executada, se está em condições de efectuar com rigor tal imputação.

4 – Identicamente, ultrapassando os pagamentos provados o valor das facturas peticionadas, também não poderá ocorrer a condenação do empreiteiro com fundamento em enriquecimento sem causa, uma vez que, ignorando-se a totalidade da relação contratual, não pode dizer-se que está positivamente provado ter havido montantes/pagamentos sem causa justificativa.

Decisão Texto Integral: Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

A..., residente em (...) Monte Redondo, intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra “B..., Lda.”, com sede em (...), Porto de Mós, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 21.794,53, acrescida de juros de mora vencidos à taxa de 12% (desde o vencimento das 2 facturas) no montante de € 4.529,73 e dos juros que se vencerem até efectivo e integral pagamento.

Alegou que, no exercício da sua actividade de execução de trabalhos de construção, a pedido da R., executou os serviços descriminados nas facturas n.º 018 e 042, datadas de 4/06/2002 e de 10/12/2003, das quais resultou um saldo credor de € 21.794,53, que a R. não pagou.

A R. contestou, começando por admitir que o A. lhe prestou os serviços descriminados nas facturas n.º 018 e 042, sustentando, porém, que efectuou pagamentos não só para “liquidar” a totalidade de tais facturas como, inclusivamente, para além da globalidade dos serviços prestados pelo A. no âmbito da relação de subempreitada (em 3 obras) havida entre ambos; razão porque, a título reconvencional, pediu a condenação do A. a devolver-lhe a quantia de € 6.522,24, entregue por conta de serviços que o A. nunca efectuou.

Ainda em reconvenção, alegou que o A. não concluiu os serviços identificados nas facturas juntas com a PI (uma vez que abandonou as subempreitadas) e que o que executou padece de imperfeições e defeitos que não eliminou, razão porque a R. está a sofrer prejuízos, cuja liquidação remete para execução de sentença por ainda continuar a executar alguns desses trabalhos deficientemente realizados pelo A.

Finalmente, ainda em reconvenção, invoca ter fornecido ao A. mercadoria diversa do seu comércio, a que se reportam as facturas que junta, do que resultou um saldo credor a favor da R. de € 6.714,50.

Concluiu pois “pedindo” a total improcedência da acção, a condenação do A. como litigante de má-fé; e, a título reconvencional, pediu que o A. seja condenado:

A pagar-lhe a quantia de € 6.522,24 (a título de pagamentos respeitantes a serviços não efectuados), acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos, no valor de € 1.061,38, e vincendos até integral pagamento;

A pagar-lhe uma indemnização respeitante aos prejuízos resultantes dos trabalhos incorrectamente realizados, cuja liquidação remeteu para execução de sentença;

A pagar-lhe a quantia de € 6.714,54 (da mercadoria entregue e não paga pelo A.), acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos, no valor de € 2.369,43, e vincendos até integral pagamento

Replicou o A., impugnando os pagamentos em excesso (mantendo que as facturas 018 e 042 se encontram em dívida); negando o abandono das obras, quaisquer defeitos e imperfeições nas mesmas, acrescendo que nunca os mesmos lhe foram denunciados e invocando expressamente a caducidade dum pretenso e eventual direito indemnizatório; e, quanto à mercadoria que a R. lhe forneceu, alegou ter procedido ao seu pagamento.

Concluiu pois do mesmo modo que na PI e, ainda, pela total improcedência do pedido reconvencional; “pedindo” ainda que a R. seja condenada como litigante de má fé, no pagamento de “multa e indemnização exemplares”.

A R. treplicou, mantendo a posição assumida na contestação/reconvenção.

Foi admitida a reconvenção, foi proferido despacho saneador – em que se julgou a instância totalmente regular, estado em que se mantém, e em que nada se disse (relegando-se implicitamente para final o seu conhecimento) sobre a caducidade do direito indemnizatório invocada pelo A. – foi organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa e foi instruído o processo e realizada a audiência; após o que a Exma. Juíza proferiu sentença em que concluiu do seguinte modo:

“ (…)

a) julgo improcedente, a acção e, em consequência, absolvo a R. do pedido de condenação contra ela formulada pelo A.

b) julgo parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência, condeno o A. a pagar à R.:

- a quantia de € 6.522,24, acrescida de juros à taxa que resultar da aplicação da Portaria 597/2005, de 19.7, nos termos antes fixados, desde 27/5/2005 até integral e efectivo pagamento;

- a quantia de € 6.655,79 (seis mil, seiscentos e cinquenta e cinco Euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora calculados

- sobre o montante de € 966,84 desde 15/5/2002;

- sobre o montante de € 258,44 desde 20/5/2002;

- sobre o montante de € 490,60 desde 21/5/2002;

- sobre o montante de € 747,88 desde 25/5/2002;

- sobre o montante de € 911,42 desde 1/6/2002;

- sobre o montante de € 44,52 desde 21/6/2002;

- sobre o montante de € 1.317,65 desde 4/7/2002;

- sobre o montante de € 777,74 desde 15/7/2002;

- sobre o montante de € 93,49 desde 22/7/2002;

- sobre o montante de € 188,44 desde 23/7/2002;

- sobre o montante de € 446,28 desde 19/8/2002;

- sobre o montante de € 91,53 desde 20/8/2002;

- sobre o montante de € 141,69 desde 18/10/2002;

- sobre o montante de € 179,27 desde 20/3/2003.

à taxa de 12% até 30/9/2004 e desde aí à que resultar da aplicação da Portaria 597/2005, de 19.7, nos termos antes fixados, até integral e efectivo pagamento;

- absolvo o A. do demais peticionado em sede reconvencional.

c) condeno o A. como litigante de má fé no pagamento de uma multa que fixo em 20 (vinte) U.C.;

d) mais absolvo a R. do pedido de condenação como litigante de má fé. (…)”

Inconformado, interpôs o A. recurso de apelação, visando a revogação parcial da sentença e a sua substituição por outra que julgue a acção totalmente procedente, que julgue improcedente o primeiro pedido reconvencional, que proceda à compensação entre o pedido formulado na acção e o terceiro pedido reconvencional e que o absolva da condenação como litigante de má fé.

Terminou a sua alegação com uma “segunda alegação” a que chamou “conclusões”[1], que pela sua redundância e extensão (19 páginas e 99 “conclusões”) nos dispensamos de aqui reproduzir.

A R. não apresentou qualquer resposta.

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.


*


II – “Reapreciação” da decisão de facto

Como “questão prévia” à enunciação dos factos provados, importa – atento o âmbito do recurso dos AA/apelantes, delimitado pelas respectivas conclusões (art. 684º/3 e 690º/1 do CPC) – analisar as questões a propósito da decisão de facto colocadas a este Tribunal.

No caso vertente, os diversos depoimentos prestados em audiência, nos quais a 1ª instância se baseou para decidir a matéria de facto, foram gravados; constando assim do processo todos os elementos probatórios com que aquela instância se confrontou, quando decidiu a matéria de facto, pelo que é possível modificar aquela decisão, se enfermar de erro de julgamento[2].

Faculdade – de modificar a decisão de facto – em cujo uso, costumamos “avisar”, é nosso dever ser contidos, cautelosos e prudentes, uma vez que existem elementos intraduzíveis e subtis, como a mímica e todo o processo de exteriorização e verbalização dos depoentes, não importados para a gravação, susceptíveis de influir, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhes. O que, porém – salienta-se e enfatiza-se, para que não haja quaisquer equívocos interpretativos sobre o que se acabou de dizer – não significa que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto apenas envolve a correcção de pontuais, concretas e excepcionais erros de julgamento; efectivamente, a Relação, quando aprecia as provas – e pode para tal atender a quaisquer elementos probatórios (cfr. art. 712.º/2 do CPC) – faz um novo julgamento da matéria de facto, vai à procura da sua própria convicção, assegura o duplo grau de jurisdição em relação à matéria de facto (ou seja, a actividade da Relação não se pode/deve circunscrever a um mero controlo formal da motivação efectuada na 1.ª Instância).

Efectuado tal prévio e “tabelar” esclarecimento, debruçando-nos sobre as concretas questões – tendo presente as posições assumidas pelas partes nos articulados, analisados os documentos juntos aos autos e ouvido o registo, efectuado em CD, das sessões de julgamento – concluímos, antecipando a solução, que não existe na parte decisiva e essencial razão ao A/apelante.

Vejamos:

Segundo o A/apelante, foram incorrectamente julgados os factos constantes dos quesitos 2.º, 3.º, 12.º, 13.º, 14.º, 17.º, 18.º, 21.º, 26.º, 28.º e 31.º da base instrutória.

Só na aparência, porém, são 11 as questões de facto colocadas em crise; como relevante e essencial, temos efectivamente uma única questão de facto, representando vários dos quesitos facticidade meramente instrumental e explicativa/justificativa da questão de facto realmente essencial.

E a questão de facto, realmente essencial e decisiva, circunscreve-se ao modo como se devem imputar os pagamentos efectuados pela R. ao A.; sendo tudo o resto acessório e instrumental[3].

Questão esta, essencial e decisiva, a que, como já o antecipámos, respondemos do mesmo modo que a 1.ª Instância.

Pelo seguinte:

Começando pelo princípio, registemos o modo como o A. apresenta o litígio, a R. lhe “responde” e o A. lhe replica.

Numa PI de 9 artigos e página e meia[4], diz o A. que prestou os serviços descriminados nas facturas 18 e 42 (em que a descriminação é bastante vaga e genérica) e pede que a R. seja condenada a pagar-lhe o montante inscrito em tais duas facturas e os respectivos juros de mora.

Ao que a R. “responde”, dizendo, no que aqui releva, que admite a prestação dos serviços (genericamente descriminados nas facturas 18 e 42), acrescentando que já pagou o preço de tais serviços, assim como fez/antecipou pagamentos de serviços que não chegaram a ser efectuados.

E ao que o A. por sua vez replica, mantendo o não pagamento das facturas 18 e 42, dizendo que não recebeu quaisquer pagamentos por conta de serviços ainda por executar e que os pagamentos a que a R. se refere foram para pagar as facturas anteriores 15, 16 e 17.

Ou seja, toda a questão está marcada pela congénita insuficiência e escassez da PI/réplica na exposição e concretização da matéria de facto, tendo em vista o êxito da pretensão deduzida pela A.

A causa de pedir – é pacífico – “é o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido[5], o que quer dizer que o A. deve fazer a indicação dos factos concretos constitutivos do direito invocado, não bastando sequer a indicação da relação jurídica abstracta[6].

Foi isto – o conceito de causa de pedir acabado de delinear – que o A. não cumpriu devidamente, uma vez que se limitou a aludir genericamente aos trabalhos que disse ter efectuado (nunca identificando sequer os concretos e exactos trabalhos que disse ter efectuado[7]).

Numa acção como a presente, o A., para expor devidamente os factos concretos que hão-de fundamentar a sua pretensão, deve começar por alegar o regulamento contratual combinado (isto é, no caso e ao que parece, os elementos essenciais do(s) contrato(s) de subempreitada), identificando as obras a realizar, os preços combinados e/ou os critérios para os mesmos; após o que deve dizer quais foram exacta e concretamente os trabalhos/obras executados (em função da unidade ou medida de cada um deles e, se for o caso, detalhar o preço, por trabalho e quantidade, que conduziu ao valor de cada uma das facturas).

Só assim o A. expõe devidamente os factos que fundamentam o pedido; ao limitar-se a remeter para facturas, cujos conteúdos não concretizam nem o que foi combinado nem o que foi executado (que não acrescentam nada ao alegado no texto da PI), não estará até a permitir o direito de defesa da parte contrária e a respeitar o princípio do contraditório (que impõe que ao R. seja dado conhecimento dos factos fundamentadores da pretensão contra ele formulada).

Enfim – é onde se pretende chegar – do confronto entre a omissão quase completa e total do que em rigor jurídico-processual devia ser alegado pelo A. e a repetitiva alusão a facturas, fica-se claramente com a ideia que se cuidou (pelo menos, até à alegação recursiva[8]) que a mera emissão e junção de facturas é o fundamento (causa de pedir) da pretensão deduzida, quando, como é evidente, o fundamento está nos concretos negócios/contratos celebrados que as facturas documentam para fins contabilísticos e fiscais.

E o que acaba de ser dito – pensar o A. que as facturas são o fundamento (causa de pedir) da pretensão deduzida – acaba por contribuir decisivamente para a apreciação crítica dos factos e para a decisão de facto.

Tendo o A. pecado por insuficiência (no mínimo) no cumprimento do disposto no art. 467.º/1/d) do CPC, não tendo sido proferido o despacho de aperfeiçoamento do art. e 508º/1 e 3 do C.P.C.[9] e prosseguindo os autos em tal “estado” para julgamento, este acabou por ser feito a partir e com base na insuficiente e escassa exposição e concretização da matéria de facto.

E se uma parte significativa de tal insuficiência ficou como que “sanada” com a posição assumida pela R. na “resposta” (ao admitir a prestação dos serviços e os preços constantes das duas facturas), outro tanto não ocorreu em relação à parte respeitante à questão de facto sob impugnação e reapreciação, isto é, ao modo de imputar os pagamentos efectuados pela R..

Não sabemos – não foi alegado, nem minimamente discutido em audiência – o que foi combinado em termos de programas contratuais e muito menos o que foi executado de tais programas contratuais; foram juntos, é certo, os documentos/contratos de fls. 235 a 237 e de fls. 239 a 240, porém, para além do seu conteúdo não ter sido alvo de qualquer discussão ao longo de todo o julgamento (e de não conhecermos sequer o “escrito” respeitante ao 3.º contrato), dá-se o caso de não sabermos com o mínimo de rigor e detalhe o que dos mesmos foi cumprido/executado e que preços diriam/dizem respeito à parte que foi cumprida/executada.

Ora – é o ponto – para podermos imputar a totalidade dos pagamentos noutras e diferentes (das 18 e 42) facturas, como pretende o A./apelante, temos que, naturalmente, conhecer os trabalhos, combinados e executados, que terão sido contabilizados noutras facturas (e que absorverão, na íntegra, na versão do A/apelante, todos os pagamentos efectuados/recebidos).

Uma tal imputação – totalmente no pagamento de outras facturas – não pode ser feita “no ar”, por suposição ou por mero “palpite”.

Ao invés, as respostas aos quesitos têm que reflectir o que temos de palpável e seguro, ou seja, os montantes das entregas efectuadas pela R. ao A., bem como, naturalmente, o facto de a R. “confessar” que as entregas diziam respeito também a outras facturas, sobrando, todavia, um montante (€ 6.522,24, segundo a R.) entregue por excesso.

E, quanto às entregas efectuadas e respectivas montantes, o A./apelante não beneficia a sua posição processual com as novas tergiversações e impugnações constantes da alegação recursiva.

Em nada o A./apelante se favorece ao dizer que os quesitos 13.º, 14.º e 17.º não estão provados, quando ele próprio, no seu depoimento de parte, confessou ter recebido os montantes inscritos nos cheques constantes de tais quesitos.

E fez tal confissão num longo depoimento, em que começou por procurar ser evasivo nas respostas[10] – a ponto de, a determinado momento, a Exma. Juíza ter suspendido a audiência[11], para ele conferenciar com a sua mandatária, analisar os documentos que tinha consigo e poder responder como é suposto ser de responder aos factos pessoais que lhe estão a ser perguntados e que mais do que isso se sabe, antecipadamente, que lhe serão forçosamente perguntados[12] – acabando por admitir, perguntado circunstanciadamente sobre cada quesito, todas as entregas/recebimentos dados como provados.

É certo que na assentada final, de fls.231, não constam os quesitos 13.º, 14.º e 17.º[13], porém, tratou-se de lapso, como aliás resulta do despacho que fixou a matéria de facto, em que se diz explicitamente que tais quesitos ficaram provados por “confissão”

O que aconteceu, como o A. referiu, é que alguns de tais cheques eram ainda em escudos, pelo que nalguns casos recebeu, não os euros de que se fala (designadamente no quesito 13.º), mas, como referiu, as quantias correspondentes em escudos, isto é, no caso do quesito 13.º, 600 contos[14]

O que aconteceu, isso sim, como o A. também não se cansou de referir, sempre que admitia mais uma entrega, é que tais entregas diziam respeito, segundo o A., a outras facturas, pelo que, ainda segundo o A., não “liquidariam” as facturas 18 e 42 e muito menos representaram entregas em excesso.

Mas – é o ponto decisivo – sobre as entregas provadas dizerem respeito, todas elas, ao pagamento de outras facturas, além da mera e simples declaração do A., não foi produzida qualquer outra prova.

Como não é demais referir, desconhecemos a globalidade da relação contratual havida entre A. e R.. O A. não a alegou do modo detalhado que o caso exigia; nos articulados limitou-se a aludir às facturas 15, 16 e 17 e no seu depoimento não a explicitou minimamente, limitando-se a dizer conclusivamente, insiste-se, que os pagamentos que recebeu respeitavam a outras facturas.

Ora, como já se deu a entender de diversas maneiras, o A., em face dos pagamentos invocados pela R. (e que, como o A. por certo sabia, não podia deixar de confessar), não tinha outro “remédio” senão o de recuar no tempo (até ao início da relação contratual com a R.) e colocar em “pratos limpos” toda a relação contratual; tinha que dizer tudo o que foi combinado, em termos de trabalhos e de preços, tinha que dizer tudo o que executou e os preços correspondentes ao que executou e, finalmente, concluir (e permitir a conclusão) que os pagamentos recebidos não cobrem/pagam tudo o que havia sido executado (e respectivos preços), razão por que ainda estariam em dívida os € 21.794,53 reflectidos nas duas facturas peticionadas (tão simples e linear que até se nos apresenta como excessivo tudo que já levamos escrito sobre a questão).

Tanto mais que a R. não se limitou a invocar entregas/pagamentos no “ar”, procedendo à junção da sua conta corrente com o A. (fls. 232, 28 e 41), conta corrente que inclui, na versão da R., a totalidade da relação (desde o seu inicio em 2011), que inclui as facturas 16, 17 e 18, que inclui as duas facturas peticionadas pelo A., que inclui as entregas/pagamentos invocados e que, ainda assim, termina com um saldo favorável à R. de € 6.522,24.

No mínimo, o A. tinha que se ter comportado do mesmo modo, ou seja, procedendo à junção da sua versão da conta corrente com a R., demonstrando que, pelo menos na sua conta corrente, que tinha necessariamente que incluir todos os pagamentos confessados pelo A., o saldo lhe era favorável no valor das duas facturas aqui peticionadas.

Mínimo este que, porém, como se percebe do depoimento da testemunha Carlos Alexandre (TOC do A., desde 2001/02), o A. não terá cumprido por tal conta corrente não existir e/ou por a sua organização/desorganização não lho permitir.

Aliás, tal testemunha (TOC do A.) admitiu que a escrita do A. era deficiente e que havia recibos que não estavam lançados na mesma; disse mesmo que chegou a ter uma reunião com a TOC da R. e que chegaram a um valor/saldo favorável ao A. de € 7.083; reunião que a TOC da R. (testemunha Célia Sousa) confirmou, afirmando que se apercebeu em tal reunião de que havia documentos que o seu colega (TOC do A.) não tinha.

Enfim, é desde logo patente a inconciliabilidade existente entre os € 21.794,53 peticionados na PI e os € 7.083 que o seu TOC diz ter encontrado numa reunião com o TOC da parte contrária. E uma de duas: ou, numa visão benigna, tudo é o resultado da completa desorganização do A. ou, noutra perspectiva, tudo é porventura tributário de algum de tipo de facturação paralela[15], porém, como é evidente, nenhuma de tais explicações se apresenta como favorável à tese do A/apelante, uma vez que da desorganização não pode tirar vantagem (sibit imputat)[16] e visto que se há/houve facturação paralela devia ter começado por expor e regularizar a situação (estando vedado ao tribunal conjecturar e aceitar que os pagamentos se destinaram a pagar trabalhos não facturados e que por conseguinte não têm que ser explicados, “nem são para aqui chamados”).

Em conclusão, relatados os meios de prova produzidos[17], recorrendo a todas as circunstâncias envolventes, a todos os detalhes, munindo-nos de todo o sentido crítico e analítico, fazendo uso de toda a perspicácia e experiência, a “reconstituição do passado” – a “análise crítica das provas e dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do tribunal” (cfr. art. 653.º, n.º 2, parte final, do CPC) – e o sentido e a avaliação da prova produzida não podem ser outros senão o de considerar que os pagamentos/entregas efectuadas pela R. se destinaram a pagar os trabalhos de construção que o A. andava a efectuar e que se encontram facturados nas facturas 18 e 42; sem prejuízo de também se considerar que houve outros trabalhos e facturas e que, segundo a conta corrente apresentada pela R., os pagamentos excediam, em 31/12/2003, em € 6.522,24, os trabalhos executados pelo A.

Não sendo decisivo e impressionante o confronto entre as datas dos pagamentos e as datas das facturas[18], uma vez que se os pagamentos, segundo a conta corrente, excedem os montantes facturados tem, necessariamente, que haver, a tal propósito, alguma dissonância.

E não estando minimamente em causa uma questão de distribuição (e de violação) do ónus da prova, como o A/apelante repetidamente invoca; uma vez que a questão do ónus da prova vem só depois, no momento imediatamente a seguir à fixação dos factos, e é ainda neste momento, da fixação dos factos, que nos encontramos. Em todo o caso – e como epílogo de tudo o que vimos de expor – sempre poderemos dizer, recorrendo e adaptando a lógica/raciocínio típicos do ónus da prova, que terá sido o A. que não alegou, que não discutiu, que não provou, tudo aquilo que havia combinado com a R. e tudo aquilo (do combinado) que executou; ou seja, recorrendo à lógica/raciocínio típicos do ónus da prova, o “ónus da prova” que não terá sido cumprido diz respeito aos factos constitutivos.

Por conseguinte, as respostas aos quesitos colocados em crise reflectem e exprimem com fidelidade a prova produzida; com excepção da resposta ao quesito 12.º, que, sem relevante alteração, rectificamos para “provado que a factura n.º 18 identificada em C) foi paga através de montantes entregues pelos cheques referidos 8), 10) e 12) e da resposta ao quesito 17.º em que, por manifesto lapso material, se escreveu na BI € 4.497,98 quando se pretendia escrever € 4.987,98, pelo que agora se corrige tal lapso, sendo a resposta “provado”, que se mantém, por reporte ao valor corrigido.

É o que há a dizer e concluir sobre o recurso de facto, que assim improcede no essencial, apenas procedendo em pequena parte (quanto às rectificações às respostas aos quesitos 12.º e 17.º) nos termos que acabaram de ser referidos e estabelecidos.


*

III – Fundamentação de Facto

Os factos, devidamente alinhados, são os seguintes:

1. O A. dedica-se à actividade de construção civil – alínea A) dos Factos Assentes;

2. No exercício da sua actividade o A. prestou à R., a seu pedido, serviços de mão-de-obra numas moradias sitas em Azóia e Porto de Mós e num pavilhão em São Jorge, tendo procedido, entre o mais, à execução de rebocos e caixas, à construção de muros de betão, à colocação de manilhas e ao isolamento de caleiras e chaminés – alínea B) dos F.A.;

3. Pelos trabalhos referidos em B), o A. emitiu as facturas n.º 018, datada de 4/6/2002, no valor de € 7.003,12, e n.º 042, datada de 10/12/2003, no valor de € 14.791,41 – alínea C) dos F.A.;

4. Estas facturas foram recebidas pela R. – resposta ao ponto 1 da Base Instrutória;

5. No dia 28/3/2002, a R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 87105, sacado sobre o Banco Espírito Santo, no valor de € 2.500,00 – ponto 6 da B.I.;

6. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 7 da B.I.;

7. No dia 3/4/2002, a R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 087122.8, sacado sobre o BES, no valor de € 5.000,00 – ponto 8 da B.I.;

8. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 9 da B.I.;

9. No dia 3/5/2002, a R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 088314.5, sacado sobre o BES, no valor de € 5.000,00 – ponto 10 da B.I.;

10. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 11 da B.I.;

11- A factura n.º 18 identificada em C) foi paga através de montantes entregues pelos cheques referidos 5), 7) e 9)

12 A R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 2837365, datado de 12/10/2001, no valor de € 2.992,79 – ponto 13 da B.I.;

13. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 14 da B.I.;

14. A R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 7549801, datado de 2/1/2002, sacado sobre o BES, no valor de € 4.489,18 – ponto 15 da B.I.;

15. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 16 da B.I.;

16. A R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 49, datado de 19/2/2002, sacado sobre o BTA, no valor de € 4.987,98 – ponto 17 da B.I.;

17. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 18 da B.I.;

18. A R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 7820580, datado de 22/3/2002, sacado sobre o BES, no valor de € 2.500,00 – ponto 19 da B.I.;

19. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 20 da B.I.;

20. A R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 216301, datado de 12/4/2002, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos, no valor de € 3.500,00 – ponto 22 da B.I.;

21. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 23 da B.I.;

22. A R. emitiu e entregou ao A. o cheque n.º 091005, datado de 3/1/2003, sacado sobre o BES, no valor de € 1.500,00 – ponto 24 da B.I.;

23. Tal quantia foi recebida pelo A. – ponto 25 da B.I.;

24. As entregas das quantias indicadas nos pontos 13, 15, 17, 19, 22 e 24 da B.I. serviram para pagar o montante titulado pela factura n.º 042 identificada em C) – ponto 26 da B.I.;

25. A R. foi efectuando pagamentos ao A. por conta de serviços de construção civil que este lhe prestava, nomeadamente os identificados em B) – ponto 28 da B.I.;

26. Por força do procedimento dado como assente na resposta ao ponto 28 da BI a conta corrente elaborada pela R. apresenta, em 31/12/2003, um saldo favorável de € 6.522,24 – ponto 31 da B.I.;

27. Para executar os trabalhos de construção civil a que o A. se havia obrigado perante a R. esta forneceu-lhe, em 30/3/2002, 133 distanciadores com 30 cm e um estancia caout’chou – pontos 44 e 45 da B.I.;

28. Em 15/5/2002, a R. forneceu ainda ao A. 24 m2 de dom poll amarelo, 24 m2 de dom poll azul, 6 m3 de brita n.os 1 e 2, 6 m3 de areia de mosteiros, 6 m3 de areia crivada p. pedra, 20 varas de ferro de 8 mm, 100 estribos 9x20, 120 sacos de cimento portland normal, 70 tijolos 30x20x7 – 1.ª, 20 kg de arame queimado, 200 unidades de estribos 20x35, 100 unidades de estribos 20x20 e 50 unidades de estribos 15x20 – pontos 47 a 59 da B.I.;

29. Para pagamento destes materiais o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 1.204,09 em 15/5/2002 – pontos 60 e 125 da B.I.;

30. Em 20/5/2002, a R. forneceu ao A. 6 m3 de brita n.os 1 e 2, 6 m3 de areia de mosteiros, 150 unidades de estribos 35x20 e 50 kg de pregos quadrados para construção – pontos 61 a 64 da B.I.;

31. Para pagamento destas mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 258,44 em 20/5/2002 - pontos 65 e 126 da B.I.;

32. Em 21/5/2002, a R. forneceu ao A. a areia, a brita, os estribos e o cimento que constam do documento de fls. 46 – ponto 65-A da B.I.;

33. Para pagamento destas mercadorias o A. tinha que entregar à R. € 490,60 – ponto 65-B da B.I.;

34. Em 25/5/2002, a R. forneceu ao A. 6,5 m3 de brita n.os 1 e 2, 6,5 m3 de areia de mosteiros, 7 m3 de areia crivada p. pedra, 1230 tijolos 30x20x11 – 1.ª, 240 tijolos 30x20x9 – 1.ª, 160 tijolos 30x20x15 – 1.ª, 8 m de vigas B3 piso 12 e 8 paletes – pontos 66 a 73 da B.I.;

35. Para pagamento destas mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 747,88, em 25/5/2002 – pontos 74 e 127 da B.I.;

36. Em 31/5/2002, a R. forneceu ao A. 24 m2 de dom poll azul, 40 sacos de cimento portland normal, 10 paletes, 1640 tijolos 30x20x11 – 1.ª, 240 tijolos 30x20x9 – 1.ª, 160 tijolos 30x20x15 – 1.ª e 320 tijolos 30x20x7 – 1.ª – pontos 75 a 81 da B.I.;

37. Para pagamento destas mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 911,42, em 1/6/2002 – pontos 82 e 128 da B.I.;

38. Em 21/6/2002, a R. forneceu ao A. 2 m3 de brita n.º 2 e 1 m3 de areia mosteiros – pontos 83 e 84 da B.I.;

39. Para pagamento destas mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 44,52, em 21/6/2002 – pontos 85 e 129 da B.I.;

40. Em 4/7/2002, a R. forneceu ao A. 7 m3 de areia crivada p. pedra, 40 sacos de cimento portland normal, 1,5 m3 de areia mata fina, 1680 telhas margon, 150 unidades de remate margon e 6 paletes – pontos 86 a 91 da B.I.;

41. Para pagamento destas mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 1.317,65, em 4/7/2002 – pontos 92 e 130 da B.I.;

42. Em 15/7/2002, a R. forneceu ao A. 1,5 m3 de areia mosteiros, 1,5 m3 de brita n.os 1 e 2, 5 paletes, 40 sacos de cimento portland normal, 45 tamancos, 12 telhões, 64 m2 de boltherm ref 131, 205 tijolos 30x20x11 – 1.ª, 480 tijolos 30x20x9 – 1.ª e 320 tijolos 30x20x7 – 1.ª - pontos 93 a 102 da B.I.;

43. Para pagamento destas mercadorias, o A. tinha que entregar à R, a quantia de € 777,74, em 15/7/2002 – pontos 103 e 131 da B.I.;

44. Em 22/7/2002, a R. forneceu ao A. 7 m3 de areia crivada p. pedra – ponto 104 da B.I.;

45. Para pagamento de tal mercadoria o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 93,49, em 22/7/2002 – pontos 105 e 132 da B.I.;

46. Em 23/7/2002, a R. forneceu ao A. 100 tijolos 30x20x7 – 1.ª, 280 telhas lusa, 1 telha romana e 5 sacos de cal hidratada PO – pontos 106 a 109 da B.I.;

47. Para pagamento destas mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 188,44, em 23/7/2002 – pontos 110 e 133 da B.I.;

48. Em 19/8/2002, a R. forneceu ao A. 70 sacos de cimento portland normal, 2 paletes e 7 m3 de areia crivada p. pedra – pontos 111 a 113 da B.I.;

49. Para pagamento destas mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 446,28, em 19/8/2002 – pontos 114 e 134 da B.I.;

50. Em 20/8/2002, a R. forneceu ao A. 6 m3 de terra para jardim cd – ponto 115 da B.I.;

51. Por tal mercadoria o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 91,53, em 20/8/2002 – pontos 116 e 135 da B.I.;

52. Em 18/10/2002, a R. forneceu ao A. 7 m3 de areia crivada p. pedra e 90 unidades de telha margon – pontos 117 e 118 da B.I.;

53. Por tais mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 141,69, em 18/10/2002 – pontos 119 e 136 da B.I.;

54. Em 20/3/2002, a R. forneceu ao A. 280 unidades de telha margon, 11 unidades de telhão e 45 unidades de remate – pontos 120 a 122 da B.I.;

55. Por tais mercadorias o A. tinha que entregar à R. a quantia de € 179,27, em 20/3/2003 – pontos 123 e 137 da B.I..

56. O A. recebeu as facturas emitidas pela R. com os n.os A 020764, A 021181, A 021217, A 021231, A 021272, A 021305, A 021468, A 021565, A 021573, A 021663, A 021757, A 021769, A 022002, A 022007, A 022014, A 022573, A 022576 e A 030633 – alínea D) dos F.A.;

57. A R. emitiu estas facturas e a n.º A 021583 em consequência do fornecimento de mercadorias que fez ao A., identificados de 44 a 123 da base instrutória – ponto 139 da B.I.;

58. Em 26/12/2002, a R. emitiu uma nota de devoluçao a favor do A. no montante de € 178,50.


*

Finalmente, ao abrigo do “exame crítico” imposto pelos art. 659.º/3 e 713.º/1, ambos do CPC, adita-se ainda o seguinte facto:

59. Além dos trabalhos e facturas referidos em 3), foram pelo A. executados para a R. outros e diversos trabalhos, designadamente, os das facturas 15, 16 e 17 (mencionadas na folha 2 da conta corrente apresentada pela R.).


*

IV – Fundamentação de Direito

O presente recurso, delimitado pelas conclusões da alegação do A/apelante, circunscreve-se, como já se referiu no relatório, à acção, ao 1.º pedido reconvencional, às repercussões compensatórias (ou não) sobre o 3.º pedido reconvencional e à questão da má fé; o que significa, no seu “avesso”, que estão estabilizadas quer a absolvição do A. em relação ao 2.º pedido reconvencional (por não ter havido recurso por parte da R/reconvinte) quer a condenação do A. respeitante ao 3.º pedido reconvencional (por o A. se conformar com tal condenação, pedindo apenas que se operem e retirem as devidas consequências compensatórias – entre o crédito que agora, segundo sustenta, lhe virá concedido com a revogação do sentenciado quanto à acção e o crédito emergente do 3.º pedido reconvencional da R.).

Em síntese, esquecendo a má fé, acabamos por estar na presente apelação perante uma única questão, uma vez que a acção e o 1.º pedido reconvencional acabam por ser o verso e o reverso duma mesma questão e problemática.

Assim, preenchendo, nesta questão/problemática, o recurso de facto a parte mais relevante (e o ponto de partida das considerações expendidas pelo A/apelante) e não havendo, como explicámos, qualquer alteração relevante nos factos (uma vez que o recurso sobre a decisão de facto foi essencialmente improcedente), poderá parecer que, não havendo novos factos, nada haverá, em termos estritamente jurídicos – de aplicação do direito aos factos provados – de relevante a acrescentar ao que foi exposto na decisão impugnada, restando corroborá-la e confirmá-la.

Não é, porém, assim.

Como os factos provados se apresentavam na sentença recorrida e se mantêm, bem absolvida foi a R. do pedido formulado na acção, porém, o desfecho do pedido formulado no 1.º pedido reconvencional (julgado procedente) não pode manter-se, impondo-se absolver o A. de tal pedido.

Numa síntese, porventura não imediatamente compreensível, podemos dizer que na base da sua improcedência (do 1.º pedido reconvencional) está um raciocínio do mesmo tipo do supra exposto e que levou à improcedência do recurso de facto, ou seja, da mesma forma que só conhecendo toda a relação contratual, combinada e executada, é que podemos dizer e concluir que todos os pagamentos confessados/provados dizem respeito a trabalhos/facturas não incluídos nas facturas 18 e 42, também, aqui e agora, só conhecendo toda a relação contratual, combinada e executada, é que podemos dizer “positivamente” que os pagamentos efectuados em excesso não têm qualquer “causa justificativa” (com o sentido que o art. 473.º do C. Civil lhe dá); o que demonstra o carácter judicioso do direito e significa que A. e R., tendo em vista o seu próprio desiderato/pretensão, tinham ambos que colocar toda a relação contratual em “pratos limpos”.

Expliquemo-nos:

Em matéria de contratos, domínio em que o princípio da autonomia privada se manifesta em toda a sua plenitude (cfr. art. 405.º do C. Civil), não podem as partes deixar de estabelecer/alegar os seus elementos essenciais (sob pena de, v. g., não individualizando a obra a realizar, não se chegar a formar um contrato válido de subempreitada - cfr. art. 280.º do C. Civil, segundo o qual o objecto do contrato deve ser, além de possível e lícito, “determinado” ou pelo menos “determinável”[19]).

Efectivamente, sobre os elementos essenciais do regulamento contratual, a lei, em regra, não intervém com previsões substitutivas que tomem o lugar da vontade ausente dos sujeitos privados; e compreende-se que assim seja, uma vez que tratando-se dos elementos essenciais, dos elementos que definem a própria lógica da operação, a sua substância e o seu racional económico, é óbvio que a respectiva determinação deve competir, por regra, aos interessados.

É isto que as partes têm que ter presente quando apresentam um litígio emergente dum contrato, ou seja, devem alegar um “regulamento contratual” em que não faltem os elementos essenciais; doutro modo – se assim não procederem – podem estar a impedir “ab initio” a validade da operação económica estabelecida, o mesmo é dizer, do contrato.

Vem isto a propósito da questão, já referida, do A. não haver exposto devidamente os factos fundamentadores da sua pretensão; de, como já se referiu, não haver alegado o “regulamento contratual” combinado. Irregularidade/insuficiência que, como também já referimos, ficou como que “sanada” com a posição assumida pela R. na “resposta”, quando admitiu a prestação dos serviços (genericamente indicados pelo A.) e os preços constantes das duas facturas

Podemos pois dizer que o alegado insuficientemente na acção, é juridicamente qualificável (com os contributos da R.) como subempreitada (ou como várias subempreitadas); que, por definição legal (art. 1213º/1 do C. Civil), é o contrato pelo qual “um terceiro se obriga para com o empreiteiro a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou parte dela”, mediante um preço; que é um contrato típico idêntico ao de empreitada e ao qual se aplicam “grosso modo” as mesmas regras.

Temos pois, retomando o que se referiu, que a retribuição é um elemento essencial do conceito/contrato de subempreitada (um elemento essencial da fase estipulativa e estática do contrato); e que tal retribuição/preço, elemento essencial do contrato, como resulta dos art. 1211.º e 883.º do C. Civil, pode ser fixado por convenção das partes – quer à forfait (em que é ajustado um preço para a totalidade da obra), quer por artigo/unidade a executar ou por medida (hipótese em que a remuneração do empreiteiro resulta da aplicação dos preços unitários ou das quantidades efectivamente executadas) – ou que, caso não haja tal convenção, “se o preço não for fixado por entidade pública (o que não será frequente nas empreitadas de direito provado), valerá como preço aquele que o empreiteiro normalmente pratica à data da conclusão do contrato; na falta deste, ter-se-á em conta o preço comummente praticado, para a realização de obras daquele tipo, no momento e lugar do cumprimento da prestação do comitente. Não sendo estes critérios suficientes, recorre-se ao art. 400.º e o preço é determinado pelo tribunal segundo juízos de equidade [sendo que] o processo para a determinação judicial do preço da empreitada vem regulado no art. 1429.º CPC.”[20]

Ou seja, antes de entrar na fase executiva e dinâmica do contrato – antes de se saber e apurar se um A. executou todos os trabalhos acordados e sem defeitos ou vícios – devem estar alegados e provados os elementos essenciais (da fase estipulativa) dos concretos contratos (de subempreitada) invocados, competindo depois provar os concretos trabalhos/obras executados, bem como o preço dos mesmos.

Acaba por ser tudo isto, repete-se, que a referida posição assumida pela R. na “resposta”, admitindo a prestação dos serviços (genericamente indicados pelo A.) e os preços constantes das duas facturas, permite dar como provado e assente, podendo dizer-se, concluindo neste ponto sem grande aprofundamento jurídico, que o A. provou os elementos constitutivos do direito às retribuições (€ 21.794,53) invocadas/pedidas.

Direito esse que, porém, se encontra extinto pelo pagamento (cfr. 342.º/2 do C. Civil), uma vez que, como resulta dos factos 11 e 24 deste acórdão, tais preços/retribuições já foram satisfeitos pela R. ao A.; o que conduz, directa e inevitavelmente, à improcedência da acção e à confirmação do a tal propósito decidido na sentença a quo.

O que, isto exposto, nos permite passar para o “reverso” da questão, ou seja, para o 1.º pedido reconvencional.

O R/apelado, como se escreveu na sentença recorrida, “para sustentar o pedido de condenação no pagamento da quantia de € 6.522,24, (…) invoca as regras do enriquecimento sem causa (…)” que tem o seu regime jurídico estabelecido nos art. 473.º a 482.º do Código Civil, em que se dispõe que “aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou” (473.º/1), dependendo o seu funcionamento da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a) a existência de um enriquecimento; b) que esse enriquecimento não tenha causa que o justifique; c) que ele seja obtido à custa do empobrecimento de quem pede da restituição; d) que a lei não faculte ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído.

Isto dito, observou-se ponderou-se na sentença recorrida “que, em face da posição de cada uma das partes e dos factos provados, se justifica a aplicação do instituto em apreço previsto, em especial, como se viu, para os casos em que se verifica que alguém recebeu algo em virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou”; assim, ainda segundo a sentença recorrida, “a R. foi efectuando pagamentos ao A. por conta de serviços de construção civil que este lhe prestava, de modo que, em 31/12/2003, apurou-se um saldo favorável à R. no montante de € 6.522,24. Ora, se o A. recebeu este montante por conta de serviços que ia prestando à R., mas que não chegou a prestar em volume equivalente à quantia recebida, impõe-se concluir que recebeu aquela quantia tendo em vista um efeito (a realização de trabalhos de construção civil por conta da R. ou para a R.) que não chegou a ocorrer. Deve, pois, o A. devolver à R. a quantia que recebeu por conta de trabalhos que nunca realizou, no caso € 6.522,24.”

Ora – reside aqui a nossa divergência – não podem ser feitos, nem têm cabimento a partir dos factos provados o último raciocínio e ponderação efectuados.

É verdade, em face do que se provou, que a R. foi efectuando pagamentos ao A. por conta de serviços de construção civil que este lhe prestava; e é igualmente verdade que, em 31/12/2003, a conta corrente da R. apresentava um saldo que lhe era favorável no montante de € 6.522,24.

Porém, não é de modo algum verdade que esteja positivamente provado que o A. tenha recebido montantes por conta de serviços que não chegou a executar; e só assim se pode falar e dizer que está positivamente provado que tais pagamentos não têm causa justificativa.

A resposta positiva/restritiva dada ao ponto 31 da BI (facto 26 deste acórdão) apenas considera como provado o que na conta corrente consta e está escrito e não que todos os seus lançamentos sejam exactos e verdadeiros; a tal propósito – sobre a exactidão e veracidade dos lançamentos – só se discutiram e escrutinaram os lançamentos referidos nos anteriores 25 quesitos e estes são apenas uma parte de todos os lançamentos constantes das 3 folhas da conta corrente elaborada pela R., pelo que, naturalmente, não pode o seu saldo ser dado/considerado como exacto e verdadeiro.

Não se trata de estar a observar que a conta corrente é um documento particular sem qualquer especial força probatória[21], uma vez que, claramente, não é este sequer o ponto de vista (que seria incorrecto) da sentença recorrida; trata-se, isso sim, de surpreender o exacto sentido da resposta (correctamente restritiva) dada ao quesito 31.º, que, claramente, não se pronuncia sobre o mérito substantivo de todos e de cada um dos movimentos[22].

E as coisas não mudam sequer de figura se considerarmos apenas os lançamentos escrutinados e provados.

É certo que a soma dos pagamentos dados como provados (pelas respostas aos quesitos 6.º a 28.º) ultrapassa a soma das duas facturas peticionadas na acção, porém, está mais do que assente nos autos que foram executados outros trabalhos – designadamente, os das facturas 15, 16 e 17 – pelo que não é possível dizer que tal saldo (entre os pagamentos escrutinados e os montantes das duas facturas peticionadas) corresponde à prova positiva do A. ter recebido montantes por conta de serviços que não chegou a executar.

E só assim se poderia dizer que ficou positivamente provado que tais pagamentos não têm “causa justificativa” – com o sentido previsto no art. 473.º do C. Civil.

Percebe-se agora claramente a afirmação inicialmente efectuada de só a partir de toda a relação contratual, combinada e executada, conseguirmos afirmar “positivamente” que houve pagamentos efectuados em excesso e que os mesmo são despidos de qualquer “causa justificativa”, fundamentando por isso o nascimento da obrigação de restituir do enriquecimento sem causa.

O que conduz, directa e necessariamente, à improcedência do 1.º pedido reconvencional e à revogação do que a tal propósito foi decidido na sentença a quo.

Resta pois – prejudicada a questão de compensação também suscitada – analisar a questão da condenação ou não do A. como litigante de má fé:

Deve ser considerado litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave, tiver, designadamente, deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar ou quem tiver alterado a verdade dos factos relevantes para a decisão da causa (cfr. 456.º do CPC).

É justamente o caso do A./apelante.

O A. veio a tribunal pedir a condenação da R. no pagamento de duas facturas que se provou já estarem pagas; ademais, tendo a R. por sua vez pedido (último pedido reconvencional) o pagamento de diversos fornecimentos efectuados ao A., este alegou ter já procedido ao seu pagamento (art. 41.º da réplica), o que, como confessadamente admitiu no seu depoimento de parte, era falso.

Tratou-se, evidentemente, num caso e noutro, da invocação de factos – o peticionado na PI e o invocado na réplica – que o A. bem sabia não corresponderem à verdade; configurando uma posição processual não aceitável e não desculpável.

Justificou-se pois, em relação ao A./apelante, o juízo de reprovação em que a condenação como litigante de má fé se traduz.

Condenação/multa em que não se pode perder de vista a expressão económica da causa em que tal má fé foi cometida. Ademais, convém ponderar, para a sua justa fixação, as condições económicas daquele que será sancionado com a multa; condições económicas a extrair e deduzir dos elementos dos autos e que, à míngua de elementos concludentes, deve respeitar o princípio da proibição do excesso, sem necessidade de recorrer a uma específica averiguação sobre a situação económica dos litigantes de má fé.

Enfim, tudo visto e ponderado, usando de proporcionalidade e razoabilidade, indo a multa a fixar entre 2 e 100 U.C. (cfr art. 27.º/3 do RCP, ex vi art. 8.º/2 e 3 da Lei 7/2012, de 13-2), entende-se ajustado – no contexto de todo o litígio – reduzir para metade o montante da multa aplicada, isto é, para 10 UC.


*

V - Decisão

Pelo exposto, decide-se julgar parcialmente procedente a apelação e, consequentemente, revoga-se a sentença, na parte recorrida (o decidido quanto à acção e quanto ao 1.º pedido reconvencional), que se substitui pela total absolvição do A. do 1.º pedido reconvencional, mantendo-se a absolvição do R. quanto ao pedido formulado na acção[23].

Quanto à condenação em má fé, que se mantém, reduz-se a multa, em que o A/apelante é condenado como litigante de má-fé, fixando-se a mesma em 10 UC.

Custas da acção, em ambas as instâncias, pelo A.; e da reconvenção, em ambas as instâncias, pela R. e pelo A. em partes iguais.


*

Coimbra, 15/10/13

 (Barateiro Martins - Relator)

(Arlindo Oliveira)

(Emídio Santos)


[1] Ao arrepio do disposto no art. 690.º/1 do CPC em que se diz que o recorrente “ (…) concluirá, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”. Deficiência que, é verdade, dá lugar a convite a aperfeiçoamento (cfr. art. 690.º/4 do CPC), mas que não conduzindo, em boa verdade, a uma imediata e efectiva sanção processual – razão pela qual já “desistimos” do convite ao aperfeiçoamento – leva a que, hoje em dia, rara seja a alegação cujas conclusões não se apresentem como um evidente desrespeito pela referida “forma sintética” imposta pela lei.
[2] Cfr. Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 2000, pág. 154 e António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II Volume, 1997, pág. 254.

[3] Embora, evidentemente, a resposta à questão de facto essencial transporte/implique, no seu caminho, respostas à facticidade meramente instrumental.

[4] Em absoluto contraste com a peça recursiva de 55 páginas, sendo 19 só de conclusões.
[5] Antunes Varela, Manual de Processo, pág. 234.

[6] Não correspondendo ao cumprimento do ónus de exposição/alegação dos factos que servem de fundamento à pretensão (cfr. 467.º/1/d) do CPC) a simples referência a conceitos legais ou a afirmação de certas conclusões sem o suporte e enquadramento em factos subjacentes – cfr. Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil, Vol. I, pág. 204 e ss., local em que explica as diferenças entre a teoria da individualização e da substanciação (esta última consagrada, desde 1939, no nosso C. P. C.).
[7] Quem for processualmente severo, até poderá dizer que o A., para fundamentar a sua pretensão, se limitou a dizer que é credor da R. em razão de trabalhos de construção civil que lhe efectuou; isto é, que se limitou a invocar a relação jurídica abstracta ou fez, quando muito, uma indicação vaga ou genérica dos factos que haviam de fundamentar a sua pretensão (e mesmo esta é recondutível à falta de causa de pedir - Antunes Varela, Manual citado, nota 3, pág. 234). Para o caso tanto monta, uma vez que nulidade a que se refere o art. 193.º do CPC é apreciada no despacho saneador (cfr. 206.º/2/1.ª parte).
[8] Onde se veio dizer, tardiamente, parte do que devia ter sido dito antes.
[9] Embora se trate dum poder/dever não constitui uma nulidade a ser aqui, para mais oficiosamente, conhecida.

[10] Evasividade que procurou manter quando perguntado sobre os quesitos 44.º e ss. – sobre os fornecimentos recebidos da R. – começando por dizer “não estou recordado”, “não trouxe as facturas (estão em casa) para aqui”; acabando, quando mais circunstanciadamente instado, a admitir que recebeu todo o material e que o comprou “para abater a dívida” da R..

[11] Uma vez que estava a procurar refugiar-se em respostas do tipo “não tenho aqui”, “tenho que ir consultar”, “posso ter recebido, mas não tenho a certeza”.
[12] O A estava ali justamente apenas e só para responder sobre tais factos.
[13] Assim como não consta o quesito 21.º, julgado “não provado”; em relação ao qual, por isso, o A. se equivoca ao impugnar também a sua resposta e ao dizer que o tribunal errou ao dá-lo como “provado”.

[14] A propósito do cheque referido no quesito 13.º são vários os minutos de diálogo, com o A. a consultar os seus documentos e a dizer que recebeu o cheque n.º 2837365 de 600 contos; não se percebendo, insiste-se, como é que agora se vem dizer que se devia ter respondido não provado a tal quesito.

[15] Ambos os TOC foram, é certo, enfáticos a dizer/responder que todos os serviços eram facturados, porém, fazer tal pergunta a um TOC – não é sequer uma crítica e decerto já todos em tribunal colocámos tal tipo de questão – é perguntar-lhes se costumam infringir os deveres legais e estatuários a que estão sujeitos (ou se fecham os olhos às infracções dos seus clientes), pelo que, natural e compreensivelmente, a resposta é sempre negativa.

Em todo o caso, a circunstância da terceira e última folha da conta corrente (fls. 41 dos autos) andar para trás no tempo (em relação à 2.ª folha da conta corrente – fls. 28), contendo o registo de 7 pagamentos que, com rigor, deviam ter sido registados nas folhas 1 e 2 da conta corrente é bastante “suspeito” e indiciador de que algo de irregular se terá passado na relação contratual entre A. e R..

Teria sido interessante perceber quando tais 7 pagamentos registados tardiamente na conta corrente da lavra da R. foram registados (dados como efectuados) na contabilidade da R..
[16] Permitindo até que se instale uma ideia de desconfiança e descrédito em relação à exactidão da sua versão factual.
[17] Os outros depoimentos testemunhais não deram quaisquer contributos válidos para o esclarecimento da questão/impugnação sub-judice.

[18] Tanto mais que – regista-se também – não é nada seguro que a factura 42, emitida 18 meses após a factura 18, diga respeito a trabalhos acabados de executar tão só em Dezembro de 2003.
[19] Como refere Menezes Cordeiro, Tratado, Parte Geral, Tomo I, 1999, pág. 414, “do conteúdo deve distinguir-se o objecto; este tem não a ver com a regulação em si, mas com o quid sobre que irá recair a relação negocial propriamente dita. (…) a doutrina troca, muitas vezes, o conteúdo pelo objecto, utilizando esta última expressão de modo informe. O próprio C. Civil, no seu art. 280.º, menciona o objecto negocial com o fito de referenciar o conteúdo e o objecto propriamente dito”.
[20] Pedro Romano Martinez, Contrato de Empreitada, pág. 109.
[21] Para mais uma conta corrente que, como supra se observou, até “anda para trás” no tempo.

[22] Repare-se que se fosse este o sentido da pronuncia/resposta – sobre o mérito substantivo de todos e de cada um dos movimentos – tal resposta até estaria em oposição com a resposta negativa dada ao quesito 21.º, uma vez que para os € 6.522,24 estarem substantivamente correctos teriam os € 350,00 (não provados pelo quesito 21.º) que ter sido entregues/recebidos.
[23] Subsistindo assim, por não fazer parte do objecto da presente apelação, a condenação do A. (constante da decisão recorrida) respeitante ao 3.º pedido reconvencional.