Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1722/19.8T8PBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO RUÇO
Descritores: MENOR
PERIGO
MEDIDA DE PROTECÇÃO
CONFIANÇA COM VISTA À ADOPÇÃO
Data do Acordão: 12/18/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA - LEIRIA - JUÍZO FAM. MENORES - JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.36, 69 CRP, 1978 CC, 35 Nº1 G), 38-A, 62-A LEI Nº 147/99 DE 1/9
Sumário: I - O critério para decidir se se deve ordenar a confiança de um menor com vista a futura adoção consiste em apurar se ocorre uma situação em que se verifica a inexistência de vínculos afetivos próprios da filiação entre pais e filhos ou uma situação em que tais vínculos estejam «seriamente comprometidos».

II - Se os progenitores não conseguem cumprir os deveres de pais e os filhos não podem estar na sua companhia, com isto impedem no presente a formação dos “vínculos próprios da filiação” e idêntico prognóstico tem de ser feito para o futuro quando não há factos que indiciem alteração do seu comportamento para futuro, pelo que o interesse dos filhos indica que o caminho a seguir é o da adoção (artigos 1978.º-A do Código Civil, 35.º, n.º 1, alínea g), e 38.º-A e 62.º-A da LPCJP).

Decisão Texto Integral:











I. Relatório

a) O presente recurso insere-se num processo especial promovido pelo Ministério Público com vista à aplicação de medida de promoção e proteção (Lei n.º 147/99, de 01 de setembro – Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo) relativamente à menor D (…), que nasceu em 23 de dezembro de 2017, sendo filha dos recorrentes M (…) e P (…).

Como fundamento foi alegado que os pais vivem em união de facto, mas sem residência fixa, pois têm vivido em situação de «sem abrigo», em casas que ocupam, sem título, com total falta de condições a todos os níveis, designadamente de higiene, sem quaisquer hábitos de trabalho e limitando-se durante o dia a percorrer as ruas dos locais onde residem, na companhia da filha, vasculhando contentores de lixo em busca de comida e roupa.

A CPCJ de x... (onde então todos residiam, vindos da zona de y... ), em agosto de 2018, foi aplicada em benefício da criança, com acordo dos pais, a medida de acolhimento residencial, tendo a menor sido colocada em 4.9.2018 no CAT da Santa Casa da Misericórdia de (...) , onde permanece até ao presente.

No desenvolvimento do processo, não tendo surgido alternativa a esta situação, após observância do contraditório o Ministério Público promoveu a aplicação da medida de confiança da menor a instituição com vista a futura adoção.

A seu tempo procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento e depois foi proferido acórdão, com o seguinte dispositivo:

«Pelo exposto, o Tribunal decide:

Aplicar à menor D (…) a medida de confiança a instituição (CAT da Santa Casa da Misericórdia de (...) ) com vista a futura adopção, nos termos do disposto nos artigos 35.º, n.º 1, alínea g), 38.º-A e 62.º-A da LPCJP.

Como efeito necessário dessa medida e nos termos do disposto no artigo 1978.º-A do Código Civil inibir, totalmente, os pais da menor M (…) e P (…) do exercício das responsabilidades parentais, sendo ela representado pelo director da instituição de acolhimento não havendo, nos termos do disposto no artigo 62.º-A, n.º 2 da LPCJP lugar a visitas de qualquer familiar da menor.

Sem custas».

b) E desta decisão que vem interposto recurso por parte dos pais da menor, cujas conclusões são as seguintes:

Recurso da mãe da menor.

«1. Por acórdão datado de 03 de outubro de 2019 foi decidido nos presentes autos aplicar à D (…), a medida de promoção e protecção de "confiança a instituição com vista a futura adopção", concretamente na instituição Centro de Acolhimento Temporário “Santa Casa da Misericórdia de (...) ”, sito em (...) , nos termos dos art.º 35º, n.º 1, al. g), 38º. A e 62º A da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º 147/99, de 01/09);

2. É desta medida aplicada que vem a progenitora, no exclusivo interesse da menor, discordar, por se entender que a mesma não acautela, nem segue o seu superior interesse.

3. O processo de promoção e protecção visa a protecção e a manutenção da família biológica.

4. Devendo a intervenção ser orientada de modo a que os pais assumam os seus deveres para com a criança, e, em primeira linha dar prevalência à família biológica através de medidas que integrem as crianças ou jovens na sua família biológica.

5. Em situações em que possa haver perigos para os menores têm que se encontrar vias que possibilitem que os mesmos sejam ultrapassados, sem que sejam retirados os menores da sua família.

6. Para tal existem medidas que se adequam a alcançar os objectivos propostos como sendo as medidas de apoio junto da família ou instituição.

7. A aplicação destas medidas é temporária, pois o pressuposto da sua aplicação é sempre o de corecção dos problemas existentes no núcleo familiar e da entrega dos menores à família biológica reestruturada.

8. A adopção só pode surgir depois de esgotadas as possibilidades de integração na família biológica.

9. A recorrente tem vínculos afetivos fortes com a menor que não cremos estarem comprometidos.

10. As visitas entre a menor e a mãe são assíduas e agradáveis.

11. Na aplicação pelo Tribunal de uma medida de promoção e protecção deve observar-se o princípio da proporcionalidade, contemplado no art. 4.º, alínea e), da Lei 147/99 (LPCJP).

12. E é este o entendimento da nossa jurisprudência, designadamente do Acórdão da Relação de Coimbra de 02/10/2012, Proc. n.º 732/10.5TBSCD, que supra se deixou transcrito e que aqui se dá por integralmente reproduzido.

13. Após avaliação de todas as circunstâncias e sopesando, quer as condições de vida anteriores dos progenitores, bem como as suas actuais condições e o facto da menor se encontrar institucionalizada, afigura-se-nos que a medida que mais se adequa é a da manutenção da menor a instituição onde se encontra, no decurso da qual e sempre com a avalisada supervisão da Sr.ª Técnica da Segurança Social que tem acompanhado a menor, seria de implementar um regime de visitas gradualmente mais aberto.

14. Não obstante ser nosso entendimento, que os pais de momento não reúnem as condições necessárias e adequadas para acolherem a menor, a medida de adoção sempre será manifestamente excessiva e irreversível, quebrando definitivamente os laços familiares e afetivos com a menor.

15. Desta forma entende-se que será salvaguardado o verdadeiro interesse da menor, dando primazia às medidas que não envolvam o afastamento dos pais da criança.

16. Assim, e tendo em conta o supremo interesse da menor, V.(s) Exª(s) farão JUSTIÇA, aplicando à menor, a medida de manutenção do acolhimento em instituição, prevista na al. f) do art. 35.º da LPCJP.

Termos em que se requer que o recurso seja julgado procedente e, consequentemente, seja o acórdão recorrido revogado e substituído por outro que aplique a medida de manutenção da menor em acolhimento em instituição pelo período de 1 (um) ano, com regime de visitas preconizado,

Assim se fazendo Justiça!»

Recurso do pai da menor.

O pai da menor também recorreu, sendo as conclusões do seu recurso as seguintes:

«1. Por acórdão datado de 03 de outubro de 2019 foi decidido nos presentes autos aplicar à D (…), a medida de promoção e protecção de "confiança a instituição com vista a futura adopção", concretamente na instituição Centro de Acolhimento Temporário “Santa Casa da Misericórdia de (...) ”, sito em (...) , nos termos dos art.º 35º, n.º 1, al. g), 38º. A e 62º A da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º 147/99, de 01/09);

2. É desta medida aplicada que vem o progenitor, no exclusivo interesse da menor, discordar, por se entender que a mesma não acautela, nem segue o seu superior interesse.

3. O processo de promoção e protecção visa a protecção e a manutenção da família biológica.

4. Devendo a intervenção ser orientada de modo a que os pais assumam os seus deveres para com a criança, e, em primeira linha dar prevalência à família biológica através de medidas que integrem as crianças ou jovens na sua família biológica.

5. Em situações em que possa haver perigos para os menores têm que se encontrar vias que possibilitem que os mesmos sejam ultrapassados, sem que sejam retirados os menores da sua família.

6. Para tal existem medidas que se adequam a alcançar os objectivos propostos como sendo as medidas de apoio junto da família ou instituição.

7. A aplicação destas medidas é temporária, pois o pressuposto da sua aplicação é sempre o de correção dos problemas existentes no núcleo familiar e da entrega dos menores à família biológica reestruturada.

8. A adopção só pode surgir depois de esgotadas as possibilidades de integração na família biológica.

9. O recorrente tem vínculos afetivos fortes com a menor que não cremos estarem comprometidos.

10. As visitas entre a menor e o pai são assíduas e agradáveis.

11. Na aplicação pelo Tribunal de uma medida de promoção e protecção deve observar-se o princípio da proporcionalidade, contemplado no art. 4º, alínea e), da Lei 147/99 (LPCJP).

12. E é este o entendimento da nossa jurisprudência, designadamente do Acórdão da Relação de Coimbra de 02/10/2012, Proc n.º 732/10.5TBSCD, que supra se deixou transcrito e que aqui se dá por integralmente reproduzido.

13. Após avaliação de todas as circunstâncias e sopesando, quer as condições de vida anteriores dos progenitores, bem como as suas actuais condições e o facto da menor se encontrar institucionalizada, afigura-se-nos que a medida que mais se adequa é a da manutenção da menor a instituição onde se encontra, no decurso da qual e sempre com a avalisada supervisão da Sr.ª Técnica da Segurança Social que tem acompanhado a menor, seria de implementar um regime de visitas gradualmente mais aberto.

14. Não obstante ser nosso entendimento, que os pais de momento não reúnem as condições necessárias e adequadas para acolherem a menor, a medida de adoção sempre será manifestamente excessiva e irreversível, quebrando definitivamente os laços familiares e afetivos com a menor.

15. Desta forma entende-se que será salvaguardado o verdadeiro interesse da menor, dando primazia às medidas que não envolvam o afastamento dos pais da criança.

16. Assim, e tendo em conta o supremo interesse da menor, V.(s) Exª(s) farão JUSTIÇA, aplicando à menor, a medida de manutenção do acolhimento em instituição, prevista na al. f) do artº 35º da LPCJP.

Termos em que se requer que o recurso seja julgado procedente e, consequentemente, seja o acórdão recorrido revogado e substituído por outro que aplique a medida de manutenção da menor em acolhimento em instituição pelo período de 1 (um) ano, com regime de visitas preconizado, assim se fazendo Justiça !».

C) O Ministério Público contra-alegou, tendo concluído que os pais da menor não reúnem condições para terem a filha com eles e a situação de acolhimento não é futuro adequado para a criança pelo que o interesse desta aponta para a adoção, o que implica a improcedência dos recursos.

II. Objeto do recurso.

Tendo em consideração que o âmbito objetivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (artigos 639.º, n.º 1, e 635.º, n.º 4, ambos do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, o presente recurso coloca apenas a seguinte questão:

Verificar se se justifica a medida adotada no acórdão recorrido que consistiu na confiança da menor a instituição com vista a futura adoção, medida esta prevista no artigo 1978.º do Código Civil e artigo 35.º, alínea g), da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP), ou se, ao invés, como defendem os pais, esta medida deve ser substituída pela medida de manutenção da menor em acolhimento em instituição pelo período de 1 (um) ano, com regime de visitas.

III. Fundamentação

A) 1. Matéria de facto – Factos provados

1. D (…) nasceu a 23.12.2017 e é filha de M (…) e P (…).

2. Os progenitores de D (…) vivem em união de facto há sensivelmente dois anos, dessa união tendo nascido a mencionada criança.

3. Os cuidados pré-natais foram inexistentes, até às 30 semanas de gestação, período em que a progenitora referiu ter-se apercebido da gravidez.

4. À data o casal era acompanhado pela Equipa da RLlS de Pernes (Rede Local de Intervenção Social), que sinalizou o caso ao Serviço Social do Centro Hospital de (...) e ao Hospital Distrital de (...) .

5. O intuito seria reter a bebé, em meio hospitalar e sinalização da situação à CPCJ, da área de residência dos progenitores.

6. Tal procedimento não se veio a efetivar e D (…) após alta clínica integra o agregado familiar dos progenitores.

7. Nesse período, o casal frequentemente alternava de residência, quer pela conflitualidade latente com os avós maternos, quer com os tios paternos de D (...) , sendo as opções casas devolutas, propriedades privadas, ocupações indevidas, sem o mínimo de condições de habitabilidade.

8. Nenhum dos membros do casal trabalhava ou lhe havia alguma vez sido conhecida ocupação duradoura, apresentando P (…) uma carreira contributiva de 7 dias e M (…), no período compreendido entre 01/1993 a 05/2019, apresenta uma carreira contributiva de dias, equivalente a 5/6 anos.

9. Limitavam-se, então durante o dia a percorrer as ruas dos locais onde residiam, um com o outro e depois na companhia da filha, vasculhando contentores de lixo em busca de comida e roupa.

10. Existiam referências de consumo imoderado de bebidas alcoólicas por parte de ambos e de estupefacientes por parte do pai.

11. M (…) e P (…), não obstante a intervenção e o acompanhamento sistemático das entidades da comunidade (Acção Social, RLlS, CPCJ, Centro de Saúde, Cantina Social da Santa Casa da Misericórdia, IEFP) não respeitavam as orientações emanadas, a fim de ultrapassar a situação de grande fragilidade e vulnerabilidade social, subsistindo abaixo do limiar da pobreza.

12. A dita situação, foi sinalizada à CPCJ de x... (onde então todos residiam, vindos da zona de y... ) em agosto de 2018, na sequência do que, por acordo, foi aplicada em benefício da criança a medida de acolhimento residencial, que veio a ser executada em 4.9.2018, com integração de D (...) no CAT da Santa Casa da Misericórdia de (...) , onde permanece até ao presente, fruto de decisão de revisão/prorrogação da medida referida datada de 28.1.2019.

13. No dia do acolhimento D (...) apresentava sinais reveladores de negligência, tanto ao nível da sua higiene pessoal bem como do seu vestuário, que se não era adequado às condições climatéricas (estava calor e a criança apresentava-se vestida com um bódi e umas colãs, transpirando abundantemente);

14. Não obstante o acolhimento da filha, o casal permaneceu reativo a toda a tentativa de acompanhamento para melhorar a sua situação.

15. A perspetiva de P (…) e M (…) assenta no facto de que todos os serviços os perseguem o que tem inviabilizado qualquer intervenção técnica.

16. Atualmente o casal perpetua idêntica postura, emitindo opiniões de que os Serviços não os apoiam, os técnicos não prestam, "Só se preocupam com quem não devem, apoiam apenas os ciganos e quem eles querem", são perseguidos pela comunidade, GNR e população em geral "Toda a gente olha de lado".

17. Os progenitores de P(…) são ambos invisuais, há sensivelmente 31 a 32 anos, o progenitor na sequência de acidente de trabalho e a progenitora por motivos de saúde, Glaucoma, não se constituindo como alternativa autónoma o que o próprio elemento feminino reconhece.

18. Embora nunca antes, até à fase judicial o tenham alvitrado, os progenitores quando questionados sobre a existência de alternativas para o projeto de vida de D (…) referenciaram os progenitores de P (…) apresentando o singelo argumento de que se foram capazes de criar P (…), também serão capazes de criar a neta.

19. Acrescentam, contudo, que a opção apresentada, a ser aplicada, não seria para os progenitores de D (…) integrarem o agregado familiar, pois isso não é viável, uma vez que não se dão com eles.

20. Reconhecem não terem condições para ter a filha consigo, embora mencionem que irão tratar disso, começando por arranjar trabalho, ele na vindima e ela a fazer umas horas de limpeza que lhe geram há volta de 200€ mensais.

21. Tais projetos são pouco credíveis, não só porque a época da vindima já se encontrava no fim quando a afirmação foi feita como um dos locais onde a progenitora iria trabalhar e que representava o grosso do rendimento, não representava uma ocupação permanente ou sequer duradoura, uma vez que visava apenas substituir uma trabalhadora temporariamente ausente, do que a própria ou não tinha consciência ou não quis revelar.

22. Os progenitores de M (…) já faleceram, tem cinco irmãos, dois encontram-se emigrados, três residem em x... , com quem não mantêm boa relação, caracterizado pelos Serviços da comunidade como de grande conflitualidades e episódios de agressividade, que por vezes necessitam da intervenção das Forças Policiais, não se constituindo como alternativa para projeto de vida de D (…)

23. Os progenitores visitam a filha semanalmente, não contactando telefonicamente, alegando motivos económicos.

24. Não obstante a regularidade e frequência dos contactos a qualidade relacional das visitas segundo a Equipa Técnica é diminuta, mostrando a criança desprendimento e desvinculação face aos pais e este escasso interesse com o estado de saúde e desenvolvimento da filha que não questionam.

25. M (…) e P (…) residem atualmente na vila de x (...) , em prédio/moradia devoluta, ocupação indevida sem o mínimo de condições de habitabilidade. M (…) progenitor de D (…) referiu-se ao espaço onde vive como: "uma autêntica espelunca",

26. O único rendimento regular do casal é de €5,00/dia, referente ao trabalho de limpeza, de um talho em x (...) .

27. Não conseguem apresentar valores de despesas regulares.

28. Durante o período de acolhimento de D (…) não promoveram modificações nas suas vidas pessoais, que tivessem por objetivo o retorno da filha ao seio do seu agregado familiar, não obstante terem sido encaminhados para solicitarem apoios de carater económico, alimentar, emprego/formação, saúde, material e psicossocial que os Serviços disponibilizaram o que declinaram.

29. Não foram identificados outros familiares com capacidade para se constituírem alternativa à situação da criança em apreço.

2 – Factos não provados

Não há.

B) Apreciação da questão objeto do recurso

Recapitulando, a questão colocada no recurso consiste em verificar se deve ser mantida a medida adotada no acórdão recorrido que consiste na confiança dos menores a instituição, com vista a futura adoção, tomada ao abrigo do disposto no artigo 1978.º do Código Civil e no artigo 35.º, alínea g), da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, ou se, ao invés, esta medida deve ser substituída pela medida de manutenção da menor em acolhimento em instituição pelo período de 1 (um) ano, com regime de visitas por parte dos pais.

Vejamos então.

(I) ■ Nos termos do n.º 6 do artigo 36.º da Constituição da República Portuguesa, «Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial».

Por seu turno, o n.º 1 do artigo 69.º, da mesma Constituição, proclama que «As crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições».

Estes textos legais dizem-nos, portanto, que o lugar dos filhos, principalmente enquanto são recém-nascidos e crianças, é, em regra, junto dos pais.

O interesse dos filhos aponta no sentido, aliás ancestral, de deverem crescer junto dos pais.

Esta é a regra.

Mas esta situação regra não pode manter-se nos casos em que os progenitores não cumprem os seus deveres fundamentais de pais e com essa sua postura impedem no momento, a médio ou a longo prazo, que se formem os laços afetivos entre pais e filhos próprios da filiação, podendo, nestes casos, justificar-se a implementação de uma medida que passe por retirar os filhos do convívio dos pais para que esses laços se estabeleçam com outras pessoas que substituam os pais biológicos nesse desiderato.

O direito internacional aponta no mesmo sentido.

A Convenção Sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de Novembro de 1989, ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990, também dispõe, no n.º 1 do seu artigo 7.º, que a criança tem o direito de conhecer os seus pais e de «...ser educada por eles» e no n.º 1 do artigo 9.º declara que «…a criança não é separada de seus pais contra a vontade destes, salvo se as autoridades competentes decidirem (…) que essa separação é necessária no interesse superior da criança. Tal decisão pode mostrar-se necessária no caso de, por exemplo, os pais maltratarem ou negligenciarem a criança…», acrescentando, no n.º 1 do seu artigo 19.º, que «A responsabilidade de educar a criança e de assegurar o seu desenvolvimento cabe primacialmente aos pais e, sendo caso disso, aos representantes legais. O interesse superior da criança deve constituir a sua preocupação fundamental».

A lei ordinária nacional segue os mesmos princípios.

Nos termos do artigo 34.º da Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, «As medidas de promoção dos direitos e de proteção das crianças e dos jovens em perigo, adiante designadas por medidas de promoção e proteção, visam:

a) Afastar o perigo em que estes se encontram;

b) Proporcionar-lhes as condições que permitam proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvi­mento integral;

c) Garantir a recuperação física e psicológica das crianças e jovens vítimas de qualquer forma de exploração ou abuso».

Tais medidas de promoção e proteção são as que constam do artigo 35.º da mesma lei, a saber:

a) Apoio junto dos pais;

b) Apoio junto de outro familiar;

c) Confiança a pessoa idónea;

d) Apoio para a autonomia de vida;

e) Acolhimento familiar;

f) Acolhimento residencial e

g) Confiança a pessoa selecionada para adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista à adoção.

(II) ■ No caso dos autos, a decisão sob recurso aplicou a medida de confiança a instituição com vista a futura adoção.

A decisão baseou-se, em traços largos, no facto dos pais da menor revelarem reiterada incapacidade para educarem a filha e investirem positivamente num projeto de vida para ela, porquanto, como se refere no acórdão, o modo de vida dos progenitores é como o de alguém «sem abrigo», que vai vivendo ocupando sem autorização espaços alheios devolutos, sem projetos futuros, sem hábitos de trabalho e com a precaridade a todos os níveis que este modo de vida traz consigo, sendo incompatível com o ambiente familiar considerado adequado para o crescimento de um recém-nascido ou criança.

Entendeu-se que esta situação preenchia o condicionalismo previsto no artigo 1978.º, n.º 1, alínea d), do Código Civil, por manifestar um sintoma objetivo no sentido de se encontrar comprometido o relacionamento afetivo futuro característico e normal entre pais e filhos.

(III) ■ A medida aplicada está prevista no artigo 38.º-A da mesma lei, onde se determina que «A medida de confiança a pessoa selecionada para a adoção ou a instituição com vista a futura adoção, aplicável quando se verifique alguma das situações previstas no artigo 1978.º do Código Civil, consiste:

a) Na colocação da criança ou do jovem sob a guarda de candidato selecionado para a adoção pelo competente organismo de segurança social;

b) Ou na colocação da criança ou do jovem sob a guarda de instituição com vista a futura adoção».

Por sua vez, o artigo 1978.º (Confiança com vista a futura adoção) do Código Civil, tem a seguinte redação, na parte que interessa a este caso:

«1 - Com vista a futura adoção, o tribunal pode confiar o menor a casal, a pessoa singular ou a instituição quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de qualquer das seguintes situações:

a) (…); b) (…);

d) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento do menor;

e) Se os pais do menor acolhido por um particular ou por uma instituição tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança.

2 - Na verificação das situações previstas no número anterior o tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses do menor.

3 - Considera-se que o menor se encontra em perigo quando se verificar alguma das situações assim qualificadas pela legislação relativa à proteção e à promoção dos direitos dos menores.

4 – (…). 5 – (…). 6 – (…)».

Sobre esta matéria a jurisprudência tem decidido, nomeadamente:

«I - A confiança judicial de menor com vista à adoção justifica-se, por exemplo, quando os progenitores puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento do menor, sendo indiferente que o façam com dolo ou negligência ou independentemente de qualquer culpa.

II - Importante é a constatação dessas situações, não importando as incapacidades dos pais» - Acórdão Tribunal da Relação do Porto de 16-07-2007, em http://www.gdsi.pt

No acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 24-11-2009, ponderou-se que «Sendo manifesto, perante a factualidade provada, que qualquer dos progenitores descurou os cuidados de saúde e de higiene de que cada um dos seus filhos necessitava, pondo em perigo a sua saúde, a sua formação, a educação e bem assim o seu desenvolvimento harmonioso e equilibrado, tudo se resumindo na incapacidade dos progenitores na manutenção e educação dos filhos, mostram-se preenchidos os pressupostos de facto da al. d) do art.º 1978.º/1 do C. Civil» - http://www.gdsi.pt, processo 75/08.4TMLSBL.

Por sua vez, o Tribunal da Relação de Guimarães, em acórdão de 21-05-2009, decidiu que «Revelando os pais biológicos manifesta incapacidade para cuidarem da sua filha menor, com perigo grave para o seu desenvolvimento integral, saúde, educação e formação, justifica-se decretar a confiança judicial da menor a instituição com vista a futura adopção» - http://www.gdsi.pt., processo n.º 2308/06.2TBVCT.

O critério para decidir se se deve ordenar a confiança de um menor com vista a futura adoção consiste, pois, em apurar se ocorre uma situação em que se verifica a inexistência de vínculos afetivos próprios da filiação entre pais e filhos ou uma situação em que tais vínculos estejam «seriamente comprometidos».

O que pretende a lei dizer com isto?

Transcrevendo do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 25 de Outubro de 2011, proferido no processo n.º 559/05.6TMCBR (relatado pelo ora relator) «Um “vínculo” significa o mesmo que “ligação entre dois ou mais polos” e tratando-se de um vínculo afetivo, ficamos a saber que a sua natureza pertence à realidade mental, emocional da pessoa, tratando-se, pois, de um estado mental relativo a sentimentos.

Tratando-se de vínculo afetivo próprio da filiação estamos então perante um sentimento que nasce e se desenvolve entre os filhos e os pais e vice-versa, recíproco, resultante do facto dos filhos descenderem biologicamente dos pais e se estabelecer naturalmente uma convivência que se inicia imediatamente a seguir ao seu nascimento, gerando sentimentos mútuos de pertença e união, diferentes de quaisquer outros, reforçados ainda pela própria sociedade que os valoriza e institucionaliza como algo de positivo e de perene, como fazendo parte da “natureza das coisas”, exigindo e esperando a sociedade, em qualquer caso, a sua verificação.

Trata-se, pois, de uma zona da realidade pertencente ao mundo da mente o que implica, dada a sua natureza, que não possa ser apreendida diretamente pelos nossos sentidos.

Por conseguinte, quando tal vínculo existe (ou quando não existe) só pode ser detetado por terceiros quando se revela na atuação dos pais ou dos filhos, de forma consciente, intencional e livre, no sentido de, tratando-se dos pais, zelarem pelos filhos, disponibilizando-lhes meios de subsistência e segurança enquanto deles necessitarem e na manifestação de um sentimento de amor paternal que tende a perdurar pela vida inteira, colocando os pais os interesses dos filhos em primeiro lugar e os seus, em iguais domínios, em segundo lugar.

E, nos filhos, revela-se no facto de tratarem os progenitores por pais, querendo estar com eles, esperando deles o sustento, a segurança e manifestações de afetividade filial.

Sentindo uns e outros a falta física ou emocional do outro como algo de negativo e sofrendo ou rejubilando emocional e reciprocamente com as respetivas desventuras ou sucessos.

Dada a natureza imaterial destes vínculos, para aferirmos da sua existência ou da sua não existência ou, ainda, da medida dessa existência, resta-nos, como se disse, a interpretação das ações dos pais e dos filhos, daquelas ações com capacidade para revelarem a existência de tais vínculos ou para os negarem.

As situações enumeradas nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil, mostram, precisamente, situações objetivas que indiciam a ausência de tais vínculos ou o seu sério comprometimento.

Sintetizando:

Os “vínculos afetivos próprios da filiação», a que alude o n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil, são o resultado de um processo que se prolonga no tempo, sujeito, inclusive, a retrocessos e que, por isso, exige para se formarem e manterem que os pais se dediquem aos filhos de forma permanente, verificando e satisfazendo as suas necessidades físicas e emocionais, corrigindo-lhes as suas ações desadequadas e mostrando-lhes por palavras e ações o afeto que sentem por eles e fazendo-lhes sentir que eles têm valor para os pais e que aquela relação tem existido assim, existe e existirá para sempre.

As ações dos pais e dos filhos, na sua mútua convivência, são factos que expressam os seus estados mentais, cognitivos e afetivos, e revelam se esses “vínculos próprios da filiação” existem, não existem, estão em processo de construção, de consolidação ou desagregação e permitem, ainda, efetuar um juízo de prognose sobre se no futuro tais vínculos serão ou não algo de existente, de real, de efetivo.

Se os pais não conseguem cumprir os deveres de pais e com isso impedem no presente a formação dos “vínculos próprios da filiação” e idêntico prognóstico é feito para o futuro, o interesse dos filhos indica que o caminho a seguir é o da adoção.

Nas ações dos pais também se compreende o seu próprio comportamento declarativo, aquilo que eles dizem a propósito desta matéria. Assim, como os compromissos que eles assumem; aquilo que dizem pretender fazer, cumprindo, no entanto, ter na devida conta que aquilo que os pais dizem pode não corresponder ao que eles têm, na verdade, em mente, seja porque dizem aquilo que sabem dever ser dito, para evitarem a censura social, seja por qualquer outro motivo, como seja o caso de garantirem o acesso a prestações sociais.

E, mesmo quando há correspondência entre o que dizem e o seu genuíno desejo, podem não ter força de vontade para, depois, no dia-a-dia, dirigirem a sua ação de acordo com aquilo que sabem ser os seus deveres, não sendo de colocar de parte casos de ausência de capacidade permanente para cumprir os deveres da paternidade.

Daí que, dada a natureza não percecionável de tais vínculos, o artigo 1978.º do Código Civil, aluda, no seu n.º 1, à inexistência ou comprometimento sério dos vínculos afetivos próprios da filiação e de seguida enumere situações factuais, suscetíveis de revelarem a inexistência ou o comprometimento desses vínculos».

(IV) ■ Vejamos agora o caso concreto.

Resulta dos factos provados que a menor tem pouco mais de dois anos e que os seus pais vivem em união de facto também há cerca de dois anos.

Que após o nascimento da menor esta foi entregue aos pais e viveu com estes em várias residências, desde a habitação dos avós maternos, dos tios paternos e em casas devolutas de terceiros, sem autorização dos donos e sem o mínimo de condições de habitabilidade.

Quanto ao modo de vida quotidiano dos pais verifica-se que não têm tido hábitos regulares de trabalho, não lhes sendo conhecida qualquer ocupação duradoura, ocupando parte do tempo a percorrer as ruas dos locais onde residiam, um com o outro e depois na companhia da filha, vasculhando contentores de lixo em busca de comida e roupa.

Em agosto de 2018, com acordo dos pais, foi aplicada em benefício da criança a medida de acolhimento residencial, com integração de menor no CAT da Santa Casa da Misericórdia de (...) , onde permanece até ao presente.

O casal não tem sido colaborante com a segurança social, no sentido de verem melhorada a respetiva situação social (factos provados 14, 15 e 16) e não se submetem as orientações emanadas das entidades dedicadas à solidariedade social que os ajudam.

Os avós maternos são ambos invisuais há sensivelmente 31 a 32 anos; os avós paternos já faleceram e os cinco tios paternos da menor não são alternativa viável para o seu acolhimento familiar, não se conhecendo outros familiares com capacidade para se constituírem alternativa à situação da criança em apreço.

Quanto aos progenitores reconhecem que não têm condições para ter a filha consigo, prometendo que irão promover tal situação; visitam a filha semanalmente.

A equipa técnica assinala desprendimento e desvinculação da criança face aos pais e estes não perguntam pelo estado de saúde e desenvolvimento da filha.

Atualmente os pais vivem em x (...) , num prédio devoluto, sem autorização do dono e sem o mínimo de condições de habitabilidade. Não promoveram modificações nas suas vidas pessoais e o único rendimento regular do casal é de €5,00/dia, referente ao trabalho de limpeza, de um talho em x (...) .

Face a este quadro, verifica-se que existe incapacidade dos pais para proporcionar à filha um meio ambiente familiar seguro, não só em termos de cuidados de alimentação, como de saúde e de afetividade, pois todos eles são interdependentes.

Não é adequado ao desenvolvimento de uma criança um meio familiar caraterizado pela errância habitacional e doméstica e pela incerteza permanente relativamente à satisfação das necessidades de uma criança.

E se é certo que a pobreza material só por si não inviabiliza a criação de filhos, também é certo que os recorrentes não têm manifestado, através de ações concretas, vontade efetiva de mudar de vida, o que passava por alterar o modo de vida e aderir intimamente, de modo continuado e definitivo, às orientações da segurança social, de modo a sair da situação precária em que vivem, procurando casa e trabalho remunerado, ou qualquer outro tipo de ocupação, naturalmente com a ajuda das entidades públicas e privadas que oferecem apoios nestas áreas.

Por conseguinte, a menor não pode regressar ao seio deste casal e a vida numa instituição social não é projeto de vida para uma criança, que aí permanece apenas por não ter uma família onde possa crescer.

É sabido que é fundamental para o desenvolvimento salutar do corpo e da dimensão espiritual do ser humano que a criança viva integrada numa família onde se possa auto-perceber como alguém que tem valor, que é amada e respeitada, pois só vivendo estes sentimentos estará em condições de os retribuir no futuro a outros, de os colocar em prática na sua vivência social quando for jovem e depois adulto.

Estamos, pois, perante uma situação subsumível ao disposto na al. d) do n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil, atrás já transcrito, onde se prevê a hipótese dos pais colocarem seriamente em risco a formação dos vínculos afetivos próprios da filiação, porquanto, por ação ou omissão, vêm colocando em perigo grave a segurança, a saúde e o desenvolvimento afetivo da filha.

Por outro lado, não é viável a medida preconizada pelos recorrentes que passa por manter a criança institucionalizada.

Ora, um dos modos mais seguros ou pelo menos mais viáveis de prognosticar o futuro é olhar, quando isso é possível, para o passado e verificar o que ocorreu no passado.

O que ocorreu no passado acabou de ser mencionado e consta da matéria de facto.

Verifica-se que não se vislumbram indícios que apontem no sentido do futuro vir a ser diferente do passado, ou seja, que os pais irão «sair da rua» e da vida sem compromissos que têm levado quanto à vida laboral e doméstica.

Por conseguinte, é previsível que, dependendo dos pais, a institucionalização da criança se torne definitiva, até à sua maioridade.

Não é este o caminho que se pretende para as crianças, pois por muito que se esforcem os funcionários das instituições de acolhimento eles cumprem horários de trabalho e a sua função não é serem pais.

As crianças, como se disse, carecem de uma família onde possam experimentar o amor paternal e retribuí-lo, sob pena de serem amputadas de uma vivência fundamental para a respetiva formação e realização pessoal futura.

Concluindo.

Como os ora progenitores não conseguem cumprir os deveres de pais e a filha não pode estar na sua companhia, com isto impedem no presente a formação dos “vínculos próprios da filiação” e idêntico prognóstico tem de ser feito para o futuro, pois não há factos que indiciam alteração do seu comportamento, pelo que o interesse da filha indica que o caminho a seguir é o da adoção.

Cumpre, pelo exposto, julgar os recursos improcedentes e manter a decisão recorrida.

IV. Decisão

Considerando o exposto, julgam-se os recursos improcedentes e mantém-se a decisão recorrida. Sem custas.


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Coimbra, 18 de dezembro de 2019


Alberto Ruço ( Relator)

Vítor Amaral

Luís Cravo