Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
639/13.4TBPBL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VÍTOR AMARAL
Descritores: PROVIDÊNCIA CAUTELAR INJUSTIFICADA
RESPONSABILIDADE CIVIL DO REQUERENTE
Data do Acordão: 10/12/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA – JUIZ 3
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMAR
Legislação Nacional: ARTº 374º, Nº 1 DO NCPC.
Sumário: 1. - Na parte fáctica da sentença apenas devem ter assento factos, com exclusão, assim, de enunciados meramente conclusivos e valorativos – estes com repercussão no desfecho da ação –, os quais, insuscetíveis de prova, só podem ter lugar na fundamentação jurídica da decisão (no confronto entre factos e direito).

2. - A previsão de responsabilidade do requerente de procedimento cautelar, constante da norma especial de responsabilidade civil do art.º 374.º, n.º 1, do NCPCiv., define que, caso a providência seja, a final, julgada injustificada e dela resultem consequências danosas, há obrigação indemnizatória se tal requerente não tiver agido com a prudência normal, o que remete para uma conduta anterior ao levantamento da providência, mormente para o tempo da instauração do procedimento, sendo esse o âmbito temporal a considerar para aferição do dano.
3. - Se o fundamento da ação indemnizatória fundada naquele art.º 374.º, n.º 1, respeita, não ao tempo da instauração da providência cautelar (ou da sua audiência e decisão), mas a um tempo posterior à decisão definitiva da mesma, com reporte ao incumprimento desta decisão, é excedido o âmbito daquela previsão normativa, determinando a improcedência da ação.
4. - Nesse caso a pretensão indemnizatória só poderia ter cabimento no âmbito das normas gerais da responsabilidade civil (art.ºs 483.º e segs. do CCiv.).
5. - Agir sem a prudência normal, de molde a causar culposamente um dano, implica uma conduta (com dolo ou mera culpa) de ocultação ou deturpação de factos, de sonegação de provas ou de uso de meios probatórios forjados, com vista a convencer da existência do direito, apesar de faltarem os requisitos legais de decretamento da medida provisória, podendo também tratar-se de erro grosseiro na averiguação, alegação e prova dos factos, não bastando, porém, um simples erro de apreciação ou a dedução de pretensão cautelar infundamentada.
6. - Não agem sem a prudência normal, considerando as circunstâncias do caso, os requerentes de procedimento cautelar em que obtiveram ganho de causa na 1.ª instância que, perante decisão adversa no âmbito do respetivo recurso, se recusam a entregar parte do imóvel que constitui a sua casa de morada de família, agindo na sequência de negociação anterior entre as partes, em que fundaram a convicção de que esse espaço lhes pertencia, tendo ficado provado que, nas negociações preliminares e no dia da escritura de compra e venda, a contraparte nos autos sempre afirmou, por assim ter sido convencionado, que o negócio não incluía tal espaço, usado como habitação.
Decisão Texto Integral:






Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

M..., LDA”, com os sinais dos autos,

intentou a presente ação declarativa de condenação, com a forma de processo comum, contra

J... e mulher, M..., também com os sinais dos autos,

pedindo a procedência da ação, de molde a:

«a) Serem os Réus condenados (n)a quantia de 196.821,57 (cento e noventa e seis mil oitocentos e vinte e um euros e cinquenta e sete cêntimos);

b) Serem os Réus condenados a pagar todos os custos que a Autora tenha que suportar com a desmontagem e remoção da cozinha provisória, assim que a mesma puder voltar a ter a situação anterior ao Procedimento Cautelar supra referido, completamente reposta.

c) Serem os Réus condenados a pagar a quantia de 750 Euros mensais até à efetiva entrega de todas as divisões que ficaram afetadas com a tapagem ocorrida no âmbito do procedimento cautelar supra mencionado.

d) Serem os Réus condenados a pagar a quantia que se apurar em sede de liquidação de sentença das quantias gastas a título de custas e honorários por parte da Autora.

e) Serem os Réus condenados a pagar a quantia de 3.750,00 Euros mensais até à efetiva entrega de todas as divisões que ficaram afectadas com a tapagem supra mencionada.

f) Serem os Réus condenados a repor todos os elementos e divisões supra mencionados nos exatos termos em que os mesmos foram concebidos nos termos do projeto aprovado para a implantação do LAR.

g) Serem os Réus condenados a repor os equipamentos em pleno funcionamento de modo a que possam ser plenamente usados pela Autora para o efeito a que são destinados.

h) Serem os Réus condenados a pagar a quantia de 100 euros mensais até permitirem o acesso da Autora à torneira de segurança, instalarem canalização independente e requisitarem o respetivo contador independente.

i) Serem os Réus condenados a pagar, a título de indemnização compulsória, a quantia de 50 Euros por cada dia de atraso após serem condenados nos termos supra peticionados.

j) Serem os Réus condenados a pagar a quantia que se apurar em sede de liquidação de sentença correspondente o prejuízo decorrente da Autora não poder ter acesso ao crédito.».

Para tanto, alegou, em síntese, que:

- sendo a A. locatária, no âmbito de contrato de locação financeira, de um imóvel, que identifica, destinado a «Lar» (estando atualmente ali instalado o «Lar M...»), os RR. intentaram uma providência cautelar, com vista ao encerramento de parte desse «Lar», alegando terem sido ocupadas para o mesmo divisões pertencentes à moradia desses RR., afirmações que estes sabiam serem falsas;

- todavia, o Tribunal, enganado pelos RR., deferiu a providencia e ordenou a entrega da cozinha do «Lar» aos RR., o que foi cumprido no dia 30/04/2010, procedendo-se à entrega efetiva, com tapagem no local mediante a construção de uma parede, com o que ficou vedado o acesso da A. a: a) Cozinha; b) Wc; c) Dispensa; d) Hall de ligação à sala de refeições; e) Acesso ao exterior; f) Acesso ao gás; g) Acesso à distribuição da água, nomeadamente às torneiras de segurança;

- tendo a A. recorrido dessa decisão cautelar, o Tribunal da Relação de Coimbra (TRC) ordenou a reconstituição da situação anterior;

- Porém, os RR. não entregaram as divisões cujo acesso tinha sido vedado com a referida tapagem, conduta que provocou diversos prejuízos à A., nos moldes enunciados no pedido da ação.

Os RR. contestaram e deduziram reconvenção, alegando, em síntese:

- terem agido na convicção de que a «Fracção B», que prometeram vender e, depois, venderam, não englobava o rés-do-chão da sua vivenda (estavam convencidos de que os edifícios se encontravam separados, com constituição em regime de propriedade horizontal);

- a A., mesmo após a realização da escritura de compra e venda, continuou a afirmar que restituiria a cozinha aos RR., facto que levou estes a instaurar a providência cautelar a que a A. alude, bem como a respetiva ação principal;

- a A. tinha conhecimento de que os RR. usavam a parte restante do rés-do-chão como habitação, bem como que estavam convictos de que a mesma integrava a fração «A»;

- por a providência cautelar ter sido revogada, a A. entrou de imediato na posse da referida parcela, não tendo havido obstrução ao uso e fruição de quaisquer divisões do Lar, como não foram alteradas as divisões, nem impedido o acesso ao fornecimento de água, ou a qualquer parte do imóvel;

- através do seu comportamento no decurso do processo negocial, eivado de má-fé, a A. logrou comprar a referida fração por um montante muito inferior ao valor de mercado, sendo que não observou os deveres de informação, lealdade e honestidade durante a fase preparatória do contrato, com o objetivo de obter para si uma vantagem patrimonial injustificada, causando um correspondente prejuízo aos RR., superior a € 200.000,00.

Pugnam pela improcedência da ação e pela procedência do pedido reconvencional, com condenação da A./Reconvinda na quantia de € 200.000,00, a que acrescem os juros de mora vencidos, desde a data de notificação da reconvenção e até efetivo e integral pagamento.

Replicou a A., concluindo pela procedência da ação e improcedência do pedido reconvencional.

Em audiência prévia, foi admitido o pedido reconvencional, tendo ainda sido saneado o processo e enunciados o objeto do litígio e os temas da prova, após o que, tramitados os autos, se procedeu à audiência final.

Foi depois proferida sentença, julgando totalmente improcedentes a ação e a reconvenção, com decorrente absolvição dos respetivos pedidos.

Desta sentença veio a A., inconformada com o desfecho da ação, interpor o presente recurso, apresentando alegação e as seguintes

Conclusões ([1]):

...

CC) A sentença recorrida encerra manifesto erro de julgamento e viola, pois a norma constante do artigo 374.º do Código de Processo Civil, cuja relevância normativa impõe, em concreto, a responsabilização dos Recorridos pelos danos causados à Recorrente.

Por todo o exposto, nestes termos e nos melhores de direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por forma a revogar a sentença no que concerne à improcedência do pedido inicial, devendo os Recorridos ser condenados ao pagamento de € 196.821,57 (cento e noventa e seis mil oitocentos e vinte e um euros e cinquenta e sete cêntimos) a título de ressarcimento dos danos patrimoniais, com todas as legais consequências.».

Não foi junta contra-alegação de recurso.

***

O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foram mantidos o regime e o efeito fixados.

Nada obstando, na legal tramitação recursiva, ao conhecimento do mérito da apelação, cumpre apreciar e decidir.

II – Âmbito do Recurso

Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais, consabidamente, definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([2]) –, importa saber:

1. - Se, a ser admissível a impugnação, ocorreu erro de julgamento quanto à decisão relativa à matéria fáctica, com a decorrente necessidade de inclusão de materialidade adicional no quadro fáctico provado [cfr. conclusão W)];

2. - Se, por força de tal alteração fáctica e/ou por razões jurídicas, deve alterar-se a decisão de direito, condenando-se, em consequência, os RR. no pagamento da indemnização a que alude o pedido recursivo.

III – Fundamentação

A) Da admissibilidade da impugnação e do erro de julgamento quanto à decisão da matéria de facto

A questão que se coloca é, desde logo, a de saber se o Tribunal a quo avaliou erroneamente a prova testemunhal produzida, devendo, por isso, a matéria de facto fixada pela 1.ª instância ser alterada por esta Relação, nos segmentos invocados, que a Apelante pretende sejam julgados como provados.

Trata-se, pois, da seguinte materialidade [conclusão W) da Apelante], a que deveria caber juízo positivo/afirmativo:

a) Os RR./Recorridos tinham pleno conhecimento de que as dependências do imóvel cujo acesso vedaram – a) Cozinha; b) Wc; c) Dispensa; d) Hall de ligação à sala de refeições; e) Acesso ao exterior; f) Acesso ao gás; g) Acesso à distribuição da água, nomeadamente às torneiras de segurança – são parte integrante do lar alienado aos Autores, ora Recorrentes;

b) Os RR./Recorridos desrespeitaram uma decisão jurisdicional que os obrigava a restituir aquelas dependências, em manifesta violação dos seus deveres de zelo, prudência e boa-fé;

c) A conduta dos RR./Recorridos provocou danos patrimoniais avultados à Recorrente, no valor de € 196.821,57.

Reforça a Recorrente que foram os próprios Recorridos quem, inicialmente, adaptou e edificou as zonas do imóvel que restaram vedadas, a fim de serem cumpridos os requisitos do licenciamento administrativo ao funcionamento do lar residencial [conclusão X)].

Pelo que não poderiam ter realizado a venda do imóvel para tal finalidade se não conhecessem perfeitamente as divisões, uma vez que foram os próprios que as adaptaram e adjudicaram a esse fim [conclusão Y)], sendo manifesto que estavam plenamente cientes de que as zonas vedadas eram essenciais para o mínimo funcionamento do lar, uma vez que foram os próprios que as adjudicaram para criar e licenciar o lar residencial, o que não os inibiu de manter, indiligente e imprudentemente, o acesso vedado à Recorrente e aos seus utentes idosos [conclusão Z)].

Por se limitar a Recorrente, no âmbito objetivo fáctico, a este arrazoado com dimensão conclusiva, deve, desde logo, colocar-se a questão da (in)admissibilidade da empreendida impugnação da decisão de facto.

Com efeito, esperava-se que a Apelante esclarecesse devidamente, não só quais os factos que, na sua ótica, foram julgados erradamente, como ainda quais as concretas provas que, uma vez criticamente analisadas/valoradas, obrigavam a uma decisão diversa da adotada, no sentido de delimitar, de forma motivada, desde logo, o âmbito factual (para além do probatório) da impugnação de facto, devendo, ademais, indicar com exatidão, baseando-se em prova gravada, as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição ([3]), sem prescindir, em qualquer caso, da expressa indicação do sentido decisório pretendido (como tudo resulta do disposto no art.º 640.º do NCPCiv., que dispõe quanto aos obrigatórios ónus a cargo do recorrente impugnante da decisão de facto).

É que, em sede de impugnação da decisão de facto, cabe ao Tribunal de recurso verificar se o juiz a quo julgou ou não adequadamente a matéria litigiosa, face aos elementos a que teve acesso, tratando-se, assim, da verificação quanto a um eventual erro de julgamento na apreciação/valoração das provas (formação e fundamentação da convicção), aferindo-se da adequação, ou não, desse julgamento.

Para tanto, se o Tribunal de 2.ª instância é chamado a fazer o seu julgamento dessa específica matéria de facto, o mesmo é comummente restrito a pontos concretos questionados – os objeto de recurso, no mesmo delimitados, necessariamente no plano conclusivo –, procedendo-se a reapreciação com base em determinados elementos de prova, concretamente elencados, designadamente certos depoimentos indicados pela parte recorrente.

Como bem explicita Abrantes Geraldes ([4]):

“(…) a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;

(…) d) O recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto; (…)”.

Para depois concluir que a rejeição do recurso quanto à decisão de facto deve verificar-se, para além do mais, nas situações de falta “de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados”, tal como de falta “de posição expressa sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação”, constituindo, aliás, exigências que “devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo. Exigências que afinal devem ser o contraponto dos esforços de todos quantos, durante décadas, reclamaram pela atenuação do princípio da oralidade pura e pela atribuição à Relação de efectivos poderes de sindicância da decisão sobre a matéria de facto como instrumento de realização da justiça. Rigor a que deve corresponder o esforço da Relação quando, debruçando-se sobre pretensões bem sustentadas, tenha de reapreciar a decisão recorrida …” ([5]).

Ante este quadro referencial, parece notório – salvo o devido respeito por diverso entendimento – que a Apelante não observou cabalmente o ónus, a seu cargo, estabelecido no n.º 1, al.ª a), do art.º 640.º do NCPCiv., pois que omitiu, ao menos em parte, nas conclusões oferecidas, a necessária indicação dos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados.

Na verdade, deve a parte recorrente apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou a anulação da decisão (art.º 639º, n.º 1, do NCPCiv.), donde que, ao ónus de alegar, sempre acresça o ónus de concluir – sendo as conclusões que definem o objeto e delimitam o âmbito recursivo ([6]) –, com os fundamentos a terem de ser, primeiramente, expostos e desenvolvidos no corpo da alegação, para, depois, serem enunciados e resumidos, em jeito conclusivo, de molde a fundamentar a pretensão recursória (de alteração ou a anulação da decisão).

               Assim, como vem sendo entendido ([7]), o Tribunal ad quem tem de cingir--se às conclusões recursivas para determinar o objeto do recurso: só deve conhecer das questões ou pontos compreendidos nas conclusões, pouco importando a extensão objetiva dada ao recurso no antecedente corpo alegatório, sendo que tudo o que conste das conclusões sem corresponder a matéria explanada nas alegações propriamente ditas, não pode ser considerado e não é possível tomar conhecimento de qualquer questão que não esteja contida nas conclusões das alegações, ainda que versada no corpo alegatório prévio.

No acervo conclusivo da aqui Apelante, quanto a parte da materialidade invocada, não são indicados factos que sejam objeto de impugnação recursória, apenas se referindo aquela parte, vagamente, na dita conclusão W), a terem os RR./Recorridos desrespeitado uma decisão jurisdicional que os obrigava a restituir aquelas dependências, em manifesta violação dos seus deveres de zelo, prudência e boa-fé, bem como, nesse encadeamento, a ter a conduta dos RR./Recorridos provocado danos patrimoniais avultados à Recorrente, no valor de €196.821,57. O que constitui, salvo o devido respeito, uma formulação manifestamente conclusiva/valorativa.

Assim, sabido que o objeto do julgamento da matéria de facto são os factos – concretos – alegados, e não quaisquer enunciados conclusivos ou valorativos, posto só poderem ter assento na parte fáctica da sentença os factos da causa (como logo resulta do disposto no art.º 607.º, n.ºs 3 a 5, do NCPCiv., dispositivo este sempre reportado a «factos»), havendo as conclusões e valorações de ser extraídas a jusante (na fundamentação de direito, à luz dos factos previamente apurados, como é consabido), resta afirmar que, nesta parte, não foi indicado o objeto fáctico da impugnação.

Não podendo, pois, o Tribunal ad quem dar como provados ou não provados aqueles enunciados conclusivos – por não se tratar de factualismo a julgar de acordo com a prova, designadamente testemunhal (nunca se trataria de matéria a que as testemunhas pudessem responder, com base na sua perceção sensorial, mas antes de conclusões decorrentes de um juízo conclusivo/valorativo do sujeito) –, só pode agora afirmar-se não ter sido observado o ónus imposto pela norma imperativa daquele art.º 640.º, n.º 1, al.ª a), da lei adjetiva, o que obriga à imediata rejeição do recurso nesta parte.

Resta, então, saber, à luz da prova pessoal convocada pela impugnante, se os RR./Recorridos tinham pleno conhecimento de que as dependências do imóvel cujo acesso vedaram são parte integrante do lar alienado à Recorrente.

Trata-se aqui de um facto – não um enunciado conclusivo – reportado à esfera de conhecimento pessoal da parte, isto é, ao âmbito do concreto conhecimento dos RR. quanto a um objeto material, as ditas «dependências do imóvel».

Invoca a Apelante os depoimentos testemunhais de ... «ouvido em 13-11-2020, das 10:53:35h às 11:14:46h», ... «ouvido também em 13-11-2021, das 11:14:52h às 12:08:00h» e ... «ouvido em 29-01-2021, das 10:49:31h às 11:05:26h», para defender resultarem «bastante clarividentes os danos sofridos pela Recorrente, então Autora, e que merecem ressarcimento». Isto é, os danos invocados [matéria sobre que a impugnação fáctica não foi admitida, pelas razões já expostas], e não aquele facto específico do imputado conhecimento pessoal da contraparte [o agora em discussão].

Precisa até a Apelante que «ficamos a saber, pela boca da testemunha ..., aos 02:44 minutos da sua declaração, que toda a cozinha e equipamentos se encontra gravemente deteriorados; os equipamentos, inclusive, insuscetíveis de serem recondicionados, e mais questionado sobre as necessidades responde, ao minuto 04:08: – Paredes, rebocos, pinturas, tem que levar». Isto é, sempre na vertente dos danos e não no âmbito do dito facto do imputado conhecimento pessoal dos RR./Recorridos.

E acrescenta a impugnante – sempre nas suas conclusões de recurso – que houve «erro de julgamento ao desconsiderar, sem fundamentação, o testemunho da Arquiteta ... – aquela a quem, sublinhe-se, sobeja razão de ciência sobre a questão jurídica que aqui está em causa, e cujo testemunho foi exímio, isento, claro e objetivamente reconstitutivo da verdade material».

Ora – reitera-se –, as testemunhas não podem depor sobre «a questão jurídica que aqui está em causa», por se tratar de matéria de direito, subtraída, como tal, à economia da prova testemunhal, a qual apenas deve mostrar ao Tribunal o conhecimento – direto e pessoal – dos factos pelas testemunhas (não, obviamente, o seu conhecimento do direito, posto este caber, na sua aplicação, ao Julgador).

Em suma, não é indicada prova testemunhal sobre este discutido facto – o daquele imputado conhecimento pessoal dos RR./Recorridos –, nem, por consequência, quaisquer concretas passagens da gravação áudio da prova a deverem ser sindicadas a respeito pela Relação (quanto a essa específica factualidade).

O que sempre implicaria também a inobservância do ónus legal imperativamente estabelecido no art.º 640.º, n.º 2, al.ª a), do NCPCiv. – exata indicação das passagens da gravação implicadas –, com a consequência do não aproveitamento desta parcela recursiva, visto se tratar, em qualquer caso, de vício determinante da “imediata rejeição do recurso na respetiva parte”, como dispõe aquele preceito imperativo ([8]).

Todavia, ainda quanto aos ónus legais aqui em causa e às consequências da respetiva omissão, deve ter-se em conta o decidido no Ac. STJ de 19/02/2015 ([9]), em cujo sumário pode ler-se:

«1. Para efeitos do disposto nos artigos 640.º, n.º 1 e 2, e 662.º, n.º 1, do CPC, importa distinguir, por um lado, o que constitui requisito formal do ónus de impugnação da decisão de facto, cuja inobservância impede que se entre no conhecimento do objeto do recurso; por outro, o que se inscreve no domínio da reapreciação daquela decisão mediante reavaliação da prova convocada.

2. A exigência da especificação dos concretos pontos de facto que se pretendem impugnar com as conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio tem por função delimitar o objeto do recurso sobre a impugnação da decisão de facto.

(…)

4. É em vista dessa função que a lei comina a inobservância daqueles requisitos de impugnação com a sanção da rejeição imediata do recurso, nos termos do artigo 640.º, n.º 1, proémio, e n.º 2, alínea a), do CPC.

5. Nessa conformidade, enquanto que a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações (…)».

Ora, no corpo da alegação recursiva, a Apelante alude a algumas passagens da gravação do depoimento da testemunha ... a respeito deste discutido facto (imputado conhecimento pessoal dos RR./Recorridos), sob invocação de um «despacho normativo» e de ter sido o Recorrido J... a providenciar pelo processo de licenciamento do «Lar», o que era, por isso, do conhecimento dessa parte.

Em contrário, expendeu-se na fundamentação da convicção do Julgador:

«(…) sendo irrelevante para este efeito o depoimento da testemunha ..., que se limitou a afirmar, da análise documental que efectuou, que a venda não podia deixar de abranger as divisões aqui em causa porquanto as mesmas tinham sido objecto de licenciamento administrativo, bem como o depoimento da testemunha ..., que se limitou a constatar que os RR. aparentavam estar cientes do que estavam a vender – o que não se duvida, os RR. sabiam estar a vendar a fracção “B”, mas pensavam que tal fracção B, de acordo com a escritura de propriedade horizontal, não incluiria o rés-do-chão da sua moradia.

Neste último ponto, o Tribunal ficou efectivamente convicto de tal facto com base nos depoimentos das testemunhas ... (filha dos RR.), mas sobretudo de ... – todos retirados do sobredito processo n.º ..., cujos ficheiros áudio foram juntos pelos RR., ao abrigo do disposto no artigo 421.º do CPC.

Embora com óbvio prejuízo para o princípio da imediação – o Tribunal ouviu as suas palavras, mas não pôde apreciar a sua postura e linguagem não verbal – tais testemunhas relataram o contexto da negociação tendente à venda do Lar, entre A. e RR., numa altura em que a primeira era apenas arrendatária do mesmo, verbalizando as primeiras duas que lhes foi transmitido que a cozinha e áreas adjacentes não seriam objecto do negócio, confidenciando que a M... usufruiria da cozinha no piso inferior da moradia dos RR. durante um prazo de 3 ou 4 meses, até ser construída uma outra.

A exclusão dessas áreas do negócio seria mesmo condição sine qua non do negócio para os RR., pretendendo estes, ao alienarem o edifício do Lar, salvaguardar o recesso do seu domicílio da devassa que representaria a passagem de utentes e trabalhadores do Lar pelo piso inferior, que ademais dava acesso ao piso superior através de uma escadaria livremente acessível a partir daquele.

Mais relatou a testemunha ..., autor do projeto de licenciamento original do Lar, que no próprio dia da escritura de compra e venda foi confrontado pelos legais representantes da A. e pelos RR., que lhe disseram que tinham acabado de vender o edifício do Lar e que seria necessário efetuar uma alteração ao referido projeto, a fim de retirar do mesmo as divisões aqui em litígio, donde resulta com meridiana clareza que as mesmas não haviam sido objecto (pelo menos na representação das partes) do negócio acabado de celebrar.

Se a primeira das testemunhas indicadas é filha dos RR., sempre podendo tal relação familiar ser-lhe assacada como forma de pôr em causa a sua credibilidade, já as duas outras são pessoas sem qualquer interesse na causa, gozando de uma posição de equidistância, não havendo qualquer motivo para crer que viessem deliberadamente mentir a Tribunal em proveito dos RR. e prejuízo da A.

Coadjuvando esta conclusão, temos igualmente a significativa discrepância entre o valor de mercado daquilo que foi efectivamente vendido (cerca de 670.000€, de acordo com o relatório pericial) e o preço acordado pelas partes (400.000€). Ainda que se sopese a situação de saúde da R. mulher à data da venda e vontade dos RR. de se desfazerem do Lar, que poderá justificar alguma “pressa” na celebração do negócio e, consequentemente, a aceitação de um preço mais baixo, tal discrepância não é despicienda e, em nosso entender, reveladora de que aquilo que os RR. pensavam estar a vender não correspondia ao que estavam efectivamente a vender.».

Ora, perante o assim enunciado – incluindo o teor da alegação da Recorrente –, cabe concluir, efetivamente, que a testemunha ... se limitou, no essencial, a afirmar, perante a análise documental que efetuou, com pendor algo conclusivo, não poder a venda deixar de abranger as divisões aqui em causa, por as mesmas terem sido objeto daquele prévio licenciamento administrativo, sabido ainda quem o desencadeou.

Não resulta, pois, que esta testemunha conhecesse as negociações que foram estabelecidas – as supra mencionadas – tendentes à venda, pelo que lhe escapa todo o quadro negocial estabelecido/alimentado para tal venda, sendo este o que mais importa para determinação da intenção e esfera de conhecimento e expetativas das partes ([10]).

Sem esquecer, ademais, a existência de depoimentos testemunhais de pendor contrário, que, valorados pelo Tribunal recorrido para formação da sua convicção, mereceriam a atenção da Recorrente, no sentido de poder demonstrar a sua imprestabilidade ou fraqueza para alicerçar uma convicção idónea e ajustada, âmbito em que a impugnante optou por não entrar, termos em que se mantém de pé aqueloutra prova fundante da convicção do Julgador, não tendo esta Relação, por isso, de a apreciar, nem podendo, aqui chegados, alterar a matéria de facto à luz de um depoimento e na desconsideração dos que lhe são opostos.  

Portanto, tendo de ser rejeitada, ou havendo de improceder – por inconsistente –, a impugnação da decisão de facto, permanece inalterado o quadro fáctico fixado pela 1.ª instância.

B) Matéria de facto

1. - Na 1.ª instância foi considerada a seguinte factualidade como provada (que se mantém):

...

2. - E foi julgado como não provado:

...

C) O Direito

Da indemnização por atuação sem a prudência normal (ação culposa) no âmbito de procedimento cautelar

1. - Na sentença recorrida foram os RR./Apelados absolvidos, ao abrigo disposto no art.º 374.º, n.º 1, do NCPCiv. (sob a epígrafe normativa «Responsabilidade do requerente»), preceito – de pendor essencialmente substantivo, embora em compêndio adjetivo – que dispõe assim:

«1 - Se a providência for considerada injustificada ou vier a caducar por facto imputável ao requerente, responde este pelos danos culposamente causados ao requerido, quando não tenha agido com a prudência normal.» (itálico aditado).

A esta luz, e reconduzindo o caso para o campo dos pressupostos da «responsabilidade civil extracontratual» (mormente, art.ºs 483.º, n.º 1, e 487.º, n.º 2, ambos do CCiv.), argumentou assim o Tribunal a quo:

«Mas terão os aqui RR. e requerentes nesse procedimento exibido diligência aquém da que seria exigível a um “bom pai de família”?

Cremos que a resposta é manifestamente negativa.

Desde logo porque, como já dissemos em sede de matéria de facto, a censura que foi feita à decisão proferida em primeira instância prendeu-se única e exclusivamente com a falta do periculum in mora, expressando os Exmºs Srs. Desembargadores no aresto a sua concordância em relação à verificação do fumus boni iuris.

Ou seja, mesmo no entendimento do tribunal superior que revogou tal decisão, os aqui RR. lograram provar, do modo sumário próprio destas decisões cautelares, a existência do seu direito.

Paralelamente, ainda que na acção principal se tenha julgado que tais divisões eram parte integrante da fracção A, concluindo-se pela improcedência do pedido formulado pelos aqui RR., não se deslinda, na fundamentação da sentença aí proferida, qualquer vislumbre de culpa dos AA. na alegação de tais factos, destacando-se, novamente, que os aqui RR. até teriam logrado a anulação do contrato de compra e venda celebrado com a A. na acção que correu os seus termos com o n.º ..., não fosse a intervenção no negócio de uma locadora financeira (a qual, segundo aí se decidiu e ao contrário da A., desconhecia o equívoco dos aqui RR.) e o decurso do prazo de caducidade.

Portanto e em resumo, verifica-se aqui uma inobservância dos requisitos essenciais expressamente previstos no art. 374º do CPC, sendo, portanto, de concluir pela improcedência, na sua totalidade, do pedido formulado na petição inicial.».

Esgrime, ex adverso, a Recorrente com o incumprimento, que considera deliberado, pela contraparte, em sede de procedimento cautelar, «de decisão judicial que determinou a entrega» de «determinadas divisões da propriedade» em causa [conclusão B)], o que lhe ocasionou diversos danos, cuja indemnização peticiona [conclusões C) a G)].

Acrescenta que não é configurável conduta mais imprudente do que a adotada pelos Apelados, ao incumprirem a dita decisão judicial/ordem de entrega, com os inerentes prejuízos, que bem conheciam, sendo aqueles, ademais, quem devia conhecer o imóvel como ninguém, enquanto proprietários e residentes habituais [cfr. conclusões S) a V)], pelo que, na perspetiva da Recorrente, estão preenchidos todos os pressupostos de que depende a responsabilização dos demandados, ao abrigo do mencionado art.º 374.º, n.º 1, do NCPCiv., com a consequência de deverem estes ser condenados, sem mais, em indemnização no montante de €196.821,57.

Que dizer?

Desde logo, é pacífico que a responsabilização – em subsequente ação indemnizatória (como a presente) – do requerente do procedimento cautelar depende da prova (esta a onerar o autor/lesado) «dos factos geradores da responsabilidade civil:

- Injustificação ou caducidade da providência;

- Imputação ao requerente;

- Actuação dolosa do requerente ou fora das regras da prudência normal;

- Danos determinados pela providência requerida;

- Nexo de causalidade entre a conduta do requerente e tais danos.» ([11]).

Podendo acontecer – como in casu – que a injustificação da medida cautelar se revele no âmbito de recurso interposto da respetiva decisão de decretação, importa mostrar que «o beneficiário da providência agiu de forma dolosa ou imprudentemente, que sonegou ao tribunal elementos importantes para a formação da convicção, apresentou um quadro factual fora da realidade ou carreou para o processo meios probatórios forjados», pelo que não basta «o simples facto de ter sido julgada improcedente a acção principal» ([12]).

De notar ainda que a responsabilização pode fundar-se em «situações que configurem actuações imprudentes ou baseadas em erros grosseiros de apreciação que tenham influenciado positivamente o tribunal no momento da decisão cautelar» ([13]).

Também Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa aludem à «existência de comportamentos dolosos ou pautados pelo incumprimento dos deveres de diligência» a determinar «a responsabilização do requerente pelos danos causalmente provocados» ([14]).

Já, por sua vez, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre ([15]) esclarecem que está em causa apenas, no plano da responsabilidade civil culposa, a providência «cuja impugnação, depois de ela decretada, é julgada procedente», designadamente, como no caso dos autos, pela via do recurso, podendo, por outro lado, a atuação do requerente ter tradução quer na «ocultação intencional de factos ou na sua deturpação consciente, quer no plano da afirmação do direito de fundo, quer no da invocação do periculum in mora; mas pode igualmente consistir em imprudência ou erro grosseiro na alegação e na prova dos factos, de que o tribunal não se aperceba ao proferir a decisão cautelar, bem como em culpa leve: a prudência normal que lhe é exigida corresponde à diligência do bom pai de família (art. 497-2 CC) e este é responsável pelas atuações danosas que tenha com “mera culpa” (art. 483-1 CC), abrangendo esta a culpa leve», não podendo, todavia, «consistir em erro de apreciação, por grosseiro que seja», nem sequer «na dedução de pretensão cautelar infundamentada, mas não baseada em factos não verificados ou na omissão de factos relevantes, nem ainda em outra omissão do dever de cooperação ou no uso reprovável do processo, circunstâncias que podem apenas dar lugar à responsabilização por litigância de má fé (art. 542-2 CC)».

Também na jurisprudência vem sendo entendido que, neste âmbito, a responsabilização do requerente da providência cautelar depende da alegação e prova pelo lesado (requerido no procedimento cautelar), em subsequente ação indemnizatória, «dos pressupostos integrantes da responsabilidade civil, aludidos no artigo 483.º, n.º 1 do CCivil, para onde nos remete a letra e o espírito do artigo 374.º, n.º 1 do CPCivil» ([16]) ([17]).

E, quanto ao que deve entender-se por (ausência de) «prudência normal» – e ao momento a que deve reportar-se a ponderação a respeito –, já foi defendido:

«Para que o requerente de embargo de obra nova possa ser responsabilizado pelos danos emergentes da sua conduta, necessário se torna demonstrar que não agiu com a "prudência normal", ao requerer aquela providência.

Não basta, assim, que uma providência seja decretada pelo tribunal de 1ª instância e, posteriormente, essa mesma decisão seja revogada pela Relação, julgando a providência injustificada, inadequada ou inidónea para o fim em vista.

O requerente não age com a prudência normal quando não tenha procurado informar-se, com prudência ou cuidado do homem normalmente prudente ou cuidadoso, da verdadeira situação.» ([18]).

Ainda, especificamente, quanto ao momento a atender para aferição da falta de prudência normal do requerente do procedimento cautelar, foi entendido pelo STJ que:

«III - O momento a atender para se julgar acerca da falta de normal prudência do requerente é, essencialmente, aquele em que o requerente intenta o procedimento cautelar, assim se determinando se ocultou intencionalmente factos, ou os deturpou conscientemente, ou agiu imprudentemente, ou com erro grosseiro ou, até, com culpa ofensiva da prudência exigível do bom pai de família.» ([19]).

Ora, deve começar por dizer-se, fazendo incidir agora a nossa análise na problemática concreta do caso em apreciação, que se concorda com estas posições jurisprudenciais, mormente a última delas, no sentido de, em caso de providência considerada injustificada (apesar de inicialmente decretada), a verificação quanto ao requisito legal da falta de «prudência normal» dever ser reportada, no essencial, ao momento «em que o requerente intenta o procedimento cautelar».

É que, como explicado na fundamentação jurídica do aresto por último citado:

«O momento a atender para se julgar acerca da falta de normal prudência do requerente é aquele em que este age (tenha agido, diz a lei), ou seja, é, essencialmente, aquele em que o requerente intenta o procedimento cautelar; é este o momento em que o requerente age.

É em relação ao tempo em que o requerente agiu, essencialmente intentando a acção (podendo relevar ainda a conduta, no tempo em que se realizou a audiência), que haverá que determinar se o requerente ocultou intencionalmente factos, ou os deturpou conscientemente, ou agiu imprudentemente, ou com erro grosseiro ou, até, com culpa ofensiva da prudência exigível do bom pai de família.» (sic).

Com efeito, o preceito legal que contém esta previsão específica de responsabilidade do requerente parece ser claro – salvo o devido respeito – ao definir que, caso a providência seja, a final, julgada injustificada e dela resultem consequências danosas, há obrigação indemnizatória se tal requerente, cronologicamente, não tiver agido com a prudência normal. Isto é, uma ação lógica e ontologicamente anterior ao levantamento da providência (decisão final), por via da procedência da impugnação da contraparte.

Ora, o fundamento eleito pela A./Apelante no presente quadro recursivo (vistas as suas conclusões) prende-se, não tanto com o tempo da instauração da providência cautelar, mas com o tempo posterior à decisão definitiva da mesma (a decisão do TRC de improcedência do procedimento).

Efetivamente, o dano a que alude a Recorrente nas suas conclusões desta apelação é o resultante, apenas, do não cumprimento da decisão final (acórdão da Relação), aquela que determinou a entrega do espaço discutido à A./Apelante [cfr. conclusões B) e E) a G)]. Um dano, pois, posterior à decisão definitiva do processo cautelar, correspondente a uma ação/atuação, assim, que não se reporta ao tempo da instauração do procedimento, nem ao da sua decisão em 1.ª instância (altura em que até foi concedida razão, embora em termos sumários, aos ali Requerentes), mas a um tempo muito posterior, o tempo superveniente à decisão da 2.ª instância.

Assim sendo, não parece que seja a este tipo de danos – os decorrentes do invocado incumprimento da decisão final/definitiva de entrega do espaço predial – que se dirige a tutela do dito art.º 374.º, n.º 1, do NCPCiv., preceito direcionado para o momento da instauração do procedimento cautelar – embora podendo estender-se até ao tempo de realização da audiência – como o do âmbito temporal de aferição/julgamento quanto à falta de normal prudência da parte requerente.

É certo que tal parte pode continuar a «agir» após a decisão final do procedimento, designadamente, incumprindo o ali determinado, tratando-se, porém, de uma conduta futura em face da decisão de insubsistência/injustificação da providência, não contemplada pela previsão legal em apreço, que – reitera-se – se reporta à conduta anterior da parte requerente (através do uso legal da redação «não tenha agido»), a adotada ao tempo da instauração do procedimento e/ou, no limite, até à audiência e decisão definitiva deste.

O que se passar depois já extravasa a previsão legal específica de responsabilidade do art.º 374.º do NCPCiv., aquele em que a Apelante fez assentar toda a sua argumentação recursiva.

Perguntar-se-á, então: ficará em tal caso o lesado sem apoio legal para a sua pretensão de reparação do dano?

A resposta é, obviamente, negativa (solução diversa seria algo chocante, com laivos até de injustiça). O lesado tem sempre a proteção da lei (cfr. art.º 2.º, n.º 2, do NCPCiv.), nesse outro âmbito através da norma geral do art.º 483.º, n.º 1, do CCiv., em vez da norma especial do mencionado art.º 374.º, n.º 1, do NCPCiv..

Em suma, improcede a argumentação da Recorrente, por falta de cobertura legal na norma convocada – a considerada violada nas conclusões recursivas e a eleita como objeto do imputado erro manifesto de julgamento da 1.ª instância –, termos em que não pode acolher-se a pretensão recursiva.

2. - Mas mesmo que assim não fosse entendido, nem por isso a apelação poderia, a nosso ver, obter provimento.

É que não se vê que os RR./Apelados, no âmbito do procedimento cautelar (ali requerentes), tenham agido de forma manifestamente imprudente, de molde a causar danos à contraparte.

Como lembrado na sentença em crise, a providência cautelar foi julgada procedente em 1.ª instância, onde, por isso, foram considerados preenchidos os requisitos legais de procedência. E, se a Relação revogou o assim decidido, não foi por considerar inexistir o direito invocado, mas por falta do periculum in mora.

Assim, se os Apelados estavam convencidos do seu invocado direito, as instâncias concluíram – ambas – pela existência de tal direito, o que mais confortou aquela convicção, sabido que só na ação principal o conflito de interesses haveria de ser judicialmente solucionado em definitivo.

É certo que os ora RR./Recorridos não cumpriram o determinado, em sede de procedimento cautelar, no acórdão da Relação, conduta esta de ostensiva inobservância do imposto por um Tribunal Judicial, o que, obviamente, deve merecer censura, sendo os danos invocados, na perspetiva recursiva, decorrentes deste incumprimento (a jusante dele).

Mas para situações de incumprimento de uma decisão judicial existem mecanismos coercivos, processualmente regulados, que se impõem ao inadimplente, dos quais a ora A./Apelante podia, querendo, ter lançado mão, de modo a obter o cumprimento («reconstituição da situação anterior» à decretação da providência, mediante a entrega coativa, por ordem judicial e com o concurso, se necessário, da força pública, tanto mais que a decisão da Relação se tornou definitiva na esfera cautelar), o que só não fez por sua vontade/opção, com o que teria evitado o avolumar dos danos de que se queixa (cfr., designadamente, o art.º 375.º do NCPCiv., contemplando medidas adequadas à execução coerciva, como é apanágio, em geral, das decisões judiciais impositivas revestidas de caráter definitivo).

Perante o que não pode deixar de considerar-se a factualidade que vem provada, designadamente quanto à venda imobiliária no âmago do conflito, âmbito em que as negociações preliminares decorreram (diretamente) entre os legais representantes da A., em representação desta, e os RR., os quais acordaram as condições do negócio, preço e forma de pagamento, estando, por então e aquando da celebração da compra e venda, tais RR. convencidos de que a «Fracção B» (vendida) não englobava o rés-do-chão da sua vivenda (factos 37 a 39).

Com efeito, provou-se que os RR. estavam convencidos de que os edifícios se encontravam separados, enquanto realidades físicas distintas, porquanto, em 2008, solicitaram os serviços de uma advogada para proceder à respetiva cisão, através da constituição da propriedade horizontal (facto 40).

E que, de uma única realidade física, tinham surgido então, duas fracções, a “A” e a “B”, sendo que a primeira corresponderia ao edifício da vivenda, composta por rés-do-chão, primeiro andar e sótão e a segunda, pelo edifício do Lar, com cave, rés-do-chão e sótão (facto 41).

Aliás, quer nas negociações preliminares, quer no dia da escritura de compra e venda, os legais representantes da A. sempre afirmaram, porque isso havia sido convencionado com os RR., que o negócio não incluía o rés-do-chão da vivenda desta (facto 46), tudo num clima de bom entendimento e ambiente quase familiar (facto 47), sabendo a A. que os RR. usavam a parte restante do rés-do-chão como habitação (facto 49).

Acresce que a A., aceitando receber em locação financeira o imóvel referido, sabia que os RR. não pretendiam vender o rés-do-chão da vivenda e aceitou o negócio nos termos convencionados entre os RR. e a «Caixa …», acreditando que a mencionada fracção “B” não incluía aquela parcela (facto 51).

Seguro é ainda que os RR., se soubessem que o rés-do-chão da sua vivenda fazia parte do Lar (“Fração B”), fruto da forma como foi constituída a propriedade horizontal, não o teriam vendido à locadora financeira (facto 52).

Do exposto resulta que, a mais do dito clima/ambiente de grande proximidade entre as partes ao tempo da negociação ocorrida, A. e RR. se encontravam sob o mesmo horizonte de pressuposição negocial, aceitando/acreditando, reciprocamente, que a mencionada «fracção “B”» (vendida) não incluía aquela parcela respeitante ao rés-do-chão da vivenda de tais RR., tendo sido sempre afirmado entre A. e RR., por assim ter sido convencionado, que o negócio não incluía o rés-do-chão da vivenda destes (a sua casa de morada).

Perante um tal circunstancialismo, em que a realidade contratual entabulada não correspondeu à pressuposição reciprocamente aceite e às expetativas criadas, tal como às comunicações veiculadas, com os RR. e verem em jogo, de modo imprevisto/contraditório, parte da sua casa de habitação (casa de morada de família), a qual nunca pretenderam alienar, não se vê como possa concluir-se terem os mesmo agido, em sede de procedimento cautelar – e havia-lhes sido dada razão, reiteradamente, em 1.ª instância, nessa sede cautelar, com a oposição deduzida a ser julgada improcedente –, para efeitos de responsabilidade civil, à margem da prudência normal exigida pelas circunstâncias do caso e segundo o padrão do bom pai de família.

Aliás, não resultou demonstrado o alegado pela A. (na sua petição) no sentido de terem os RR. intentado a providência cautelar, com vista ao encerramento de parte do «Lar», alegando factos e fazendo afirmações que bem soubessem serem falsos.

Nem se mostra que tenha o Tribunal sido enganado pelos RR., só por isso – por força de tal engano – deferindo a providência e ordenado a entrega imobiliária.

Aliás, se engano houve, as vítimas do engano acabaram por ser, desde logo, os RR./Apelados, como se extrai dos factos 46, 47 e 49, já mencionados: nas negociações preliminares e no dia da escritura de compra e venda, os legais representantes da A. sempre afirmaram, porque isso havia sido convencionado com os RR., que o negócio não incluía o dito rés-do-chão da vivenda, sabendo a A. que os RR. usavam a parte restante do rés-do-chão como habitação.

Âmbito este em que – reitera-se – é sabido não justificar a responsabilidade do requerente o instaurar a providência com ausência de fundamento de facto ou de direito, ou com fundamento em errada ou discutível interpretação do direito, mas que, não obstante, conduza ao decretamento da providência (embora com posterior revogação da decisão) – cfr., ainda, o citado Ac. STJ de 26/09/2002, Proc. 02B1938.

Em suma, não colhem as conclusões da Apelante em contrário, havendo, por isso, de ser mantida a decisão recorrida.

IV – Sumário (art.º 663.º, n.º 7, do NCPCiv.):

1. - Na parte fáctica da sentença apenas devem ter assento factos, com exclusão, assim, de enunciados meramente conclusivos e valorativos – estes com repercussão no desfecho da ação –, os quais, insuscetíveis de prova, só podem ter lugar na fundamentação jurídica da decisão (no confronto entre factos e direito).

2. - A previsão de responsabilidade do requerente de procedimento cautelar, constante da norma especial de responsabilidade civil do art.º 374.º, n.º 1, do NCPCiv., define que, caso a providência seja, a final, julgada injustificada e dela resultem consequências danosas, há obrigação indemnizatória se tal requerente não tiver agido com a prudência normal, o que remete para uma conduta anterior ao levantamento da providência, mormente para o tempo da instauração do procedimento, sendo esse o âmbito temporal a considerar para aferição do dano.

3. - Se o fundamento da ação indemnizatória fundada naquele art.º 374.º, n.º 1, respeita, não ao tempo da instauração da providência cautelar (ou da sua audiência e decisão), mas a um tempo posterior à decisão definitiva da mesma, com reporte ao incumprimento desta decisão, é excedido o âmbito daquela previsão normativa, determinando a improcedência da ação.

4. - Nesse caso a pretensão indemnizatória só poderia ter cabimento no âmbito das normas gerais da responsabilidade civil (art.ºs 483.º e segs. do CCiv.).

5. - Agir sem a prudência normal, de molde a causar culposamente um dano, implica uma conduta (com dolo ou mera culpa) de ocultação ou deturpação de factos, de sonegação de provas ou de uso de meios probatórios forjados, com vista a convencer da existência do direito, apesar de faltarem os requisitos legais de decretamento da medida provisória, podendo também tratar-se de erro grosseiro na averiguação, alegação e prova dos factos, não bastando, porém, um simples erro de apreciação ou a dedução de pretensão cautelar infundamentada.

6. - Não agem sem a prudência normal, considerando as circunstâncias do caso, os requerentes de procedimento cautelar, em que obtiveram ganho de causa na 1.ª instância, que, perante decisão adversa no âmbito do respetivo recurso, se recusam a entregar parte do imóvel que constitui a sua casa de morada de família, agindo na sequência de negociação anterior entre as partes, em que fundaram a convicção de que esse espaço lhes pertencia, tendo ficado provado que, nas negociações preliminares e no dia da escritura de compra e venda, a contraparte nos autos sempre afirmou, por assim ter sido convencionado, que o negócio não incluía tal espaço, usado como habitação.
V – Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo, em consequência, a sentença impugnada.

Custas da apelação a cargo da A./Apelada (vencida).

Coimbra, 12/10/2021

Escrito e revisto pelo Relator – texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (ressalvadas citações de textos redigidos segundo a grafia anterior).

Assinaturas eletrónicas e em teletrabalho.

Vítor Amaral (Relator)

Luís Cravo

Fernando Monteiro


([1]) Que se deixam transcritas, com destaques retirados.
([2]) Excetuando questões de conhecimento oficioso, desde que não obviado por ocorrido trânsito em julgado.
([3]) Cfr. art.º 640.º do NCPCiv., bem como Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2013, ps. 126 e segs., e Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 3.ª ed., Almedina, Coimbra, p. 153, e ainda, no mesmo sentido, Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes, Dos Recursos, Quid Juris, Lisboa, ps. 253 e segs.. Vide também Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2008, p. 80. No mesmo sentido se tem pronunciado a jurisprudência do STJ, podendo ver-se, por todos, os Ac. desse Tribunal Superior de 04/05/2010, Proc. 1712/07.3TJLSB.L1.S1 (Cons. Paulo Sá), e de 23/02/2010, Proc. 1718/07.2TVLSB.L1.S1 (Cons. Fonseca Ramos), ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
([4]) Cfr. Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., ps. 126 e seg., com negrito aditado.
([5]) Cfr. op. cit., ps. 128 e seg., com sublinhado aditado.
([6]) Vide, Abrantes Geraldes, op. cit., p. 118.
([7]) Cfr., inter alia, Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V (reimpressão), Coimbra Editora, Coimbra, 1984, ps. 308 e segs. e 358 e segs., e Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil Anotado, vol. 3.º, Coimbra Editora, Coimbra, 2003, p. 33.

([8]) Como vem entendendo a jurisprudência dominante do STJ, “no âmbito do recurso de impugnação da decisão da matéria de facto, não cabe despacho de convite ao aperfeiçoamento das respectivas alegações” – cfr. Ac. STJ de 09/02/2012, Proc. 1858/06.5TBMFR.L1.S1 (Cons. Abrantes Geraldes), disponível em www.dgsi.pt, com itálico aditado, bem como demais jurisprudência ali citada. No mesmo sentido, à luz do NCPCiv., cfr. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., ps. 127 e seg..
([9]) Proc. 299/05.6TBMGD.P2.S1 (Cons. Tomé Gomes), disponível em www.dgsi.pt, com itálico e sublinhado aditados.
([10]) A existência e o conhecimento do processo de licenciamento existente do «Lar» não impedia a celebração, com liberdade contratual (de vinculação e estipulação de conteúdo), de um contrato de compra e venda de imóvel, nem, se necessário, futuras alterações ao status quo do licenciamento (de si, não imutável).
([11]) Cfr. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, III Vol., Almedina, Coimbra, 1998, ps. 267 e seg.. Este Autor alude ainda, neste âmbito, a situações em que as medidas cautelares sejam «baseadas em circunstancialismo fáctico inverídico», existindo «dolo ou negligência por parte do requerente», sendo configuráveis casos em que, «apesar de existir o direito, não existiam os requisitos legais para o decretamento da medida provisória, por exemplo, por faltar o justo receio de lesão grave e dificilmente reparável» (op. cit., ps. 263 e seg.).
([12]) V. ainda Abrantes Geraldes, op. cit., ps. 264 e seg..
([13]) Abrantes Geraldes, op. cit., p. 265.
([14]) V. Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, Coimbra, 2018, p. 441.
([15]) No seu Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, 4.ª ed., Almedina, Coimbra, 2019, ps. 75 e seg..
([16]) Assim, inter alia, o Ac. STJ de 26/02/2019, Proc. 618/12.9TVPRT.P1.S2 (Cons. Ana Paula Boularot), em www.dgsi.pt.
([17]) Veja-se também, já quanto a embargo de obra nova, o Ac. STJ de 16/10/2003, Proc. 03B3039 (Cons. Salvador da Costa), em www.dgsi.pt, aludindo a «uma conduta processual do requerente do procedimento cautelar que, prevalecendo-se do seu carácter urgente e sumária cognição, não tenha procurado informar-se da efectiva existência do seu direito substantivo com o cuidado de uma pessoa normalmente diligente».
([18]) V. Ac. STJ de 06/01/2000, Proc. 99B878 (Cons. Herculano Namora), com sumário em www.dgsi.pt e destaque aditado. Também no Ac. TRP de 23/11/2004, Proc. 0425933 (Rel. Alberto Sobrinho), em www.dgsi.pt, foi considerado que «Para que o requerente de uma providência cautelar considerada injustificada seja responsabilizada pelos eventuais danos causados ao requerido exige-se que aquele não tenha agido com a prudência normal, que tenha assumido uma conduta culposa quando tomou a iniciativa de a requerer» (destaques aditados), como no caso de não se ter informado previamente acerca do domínio sobre um muro (omissão de «averiguar o histórico do muro da discórdia»).
([19]) Vide Ac. STJ de 26/09/2002, Proc. 02B1938 (Cons. Sousa Inês), em www.dgsi.pt (com destaques aditados), onde se considerou, ainda, não serem «fundamento de responsabilidade do requerente o instaurar a providência com ausência de fundamento de facto ou de direito, ou com fundamento em errada ou discutível interpretação do direito mas que, não obstante, conduza ao decretamento da providência (embora com posterior revogação da decisão)».