Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1898/16.6T8FIF-C.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: PROCESSO TUTELAR CÍVEL
DECISÃO EQUITATIVA
RESIDÊNCIA DE FILHO MENOR
SUPERIOR INTERESSE DO MENOR
Data do Acordão: 07/08/2021
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DA FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 1906º, Nº 5 C. CIVIL.
Sumário: 1. Nos processos tutelares cíveis, com a natureza de jurisdição voluntária, o tribunal deve proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa (mais conveniente e oportuna), a que melhor serve os interesses em causa.

2. O tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste (art.º 1906º, n.º 5 do CC).

3. Sendo primordial proteger e promover os interesses da criança, com vista ao seu desenvolvimento integral e harmonioso, deverá a mesma continuar confiada à guarda do pai se, nomeadamente, demonstrar verdadeira preocupação pelo estado de saúde daquela, reunindo as (demais) condições indispensáveis para o seu crescimento e desenvolvimento integral, colaborando, inclusive, para manutenção e o fortalecimento das ligações afetivas com a mãe.
Decisão Texto Integral:





            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I.  Em 01.9.2020, D... requereu a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais (RERP) contra L..., relativamente ao jovem J..., nascido a 14.8.2008, filho de ambos, nos termos dos art.ºs 179º a 188º da petição (nomeadamente, quanto à guarda), alegando e concluindo, num extenso arrazoado, que o requerido não cuida do bem-estar físico e psíquico do J...

            Foi realizada a conferência dos pais (não se logrando obter acordo), com a audição do menor.

Requerente e requerido apresentaram alegações.[1]

Realizado o julgamento, o Tribunal a quo, invocando o preceituado nos art.ºs 40º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível/RGPTC (aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 08.9) e 1905º, 2004º e 2006º, do Código Civil (CC), decidiu julgar improcedente o pedido deduzido, absolvendo o requerido.

Inconformada, a progenitora/requerente interpôs a presente apelação formulando as seguintes conclusões:  

...

55ª - Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo não respeitou o superior interesse da criança, uma vez que permite que o menor continue sujeito à mesma situação de aumento exponencial de peso com os consequentes problemas de saúde que isso implica, não só no momento presente como no futuro da criança.

56ª - A sentença violou o disposto nos art.ºs 154º, n.º 2, 607º, n.ºs 3 e 4, 602º e 411º do CPC bem como o art.º 42º do RGPTC ao considerar que não existem circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração da regulação das responsabilidades parentais, mormente nos termos peticionados pela Recorrente.

Remata dizendo que deverá revogar-se a sentença recorrida, estipulando a alteração da Regulação das Responsabilidades Parentais nos termos peticionados.

O M.º Público respondeu à alegação concluindo pela improcedência do recurso.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa reapreciar, principalmente: a) nulidade da sentença; b) impugnação de facto; c) guarda/residência do menor.

II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:

...

2. E deu como não provado:

...

3. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

a) A Requerente/apelante diz “arguir a nulidade da sentença proferida nos presentes autos nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, al. b), c) e d) do CPC”; a seguir, considera, sobretudo, que “a fundamentação da sentença ou é inexistente ou está em clara oposição com a decisão proferida” (cf., v. g., as “conclusões 1ª a 3ª, 11ª, 21ª e 32ª”, ponto I., supra).

Preceitua o art.º 615º, n.º 1, do CPC, que “é nula a sentença quando: não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (b); os fundamentos estejam em oposição com a decisão (c), 1ª parte)”.

b) Tradicionalmente, invocando-se os ensinamentos do Professor Alberto Reis, é recorrente a afirmação de que o vício da mencionada alínea b) apenas se verifica quando ocorre falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito.[2]

No entanto, no actual quadro constitucional (art.º 205º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa), em que é imposto um dever geral de fundamentação das decisões judiciais, ainda que a densificar em concretas previsões legislativas, para que os seus destinatários as possam apreciar e analisar criticamente, designadamente mediante a interposição de recurso, nos casos em que tal for admissível, parece que também a fundamentação de facto ou de direito insuficiente, em termos tais que não permitam ao destinatário da decisão judicial a percepção das razões de facto e de direito da decisão judicial, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e, consequentemente, determinar a nulidade do acto decisório[3]

Por outro lado, eventuais insuficiências na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, que envolvam factos essenciais, deverá ser dilucidada à luz do disposto no art.º 662º, n.º 2, alínea d) do CPC, pois uma coisa é uma nulidade da sentença, por eventual não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (art.º 615º, n.º 1, alínea b) do CPC), outra (diversa, prevista naquele normativo) é um eventual vício da decisão da matéria de facto, por indevida fundamentação de factos essenciais.[4]

c) No tocante à referida alínea c) o vício em causa verifica-se sempre que exista contradição dos fundamentos com a decisão, quanto os fundamentos de facto e de direito invocados conduzirem logicamente a resultado oposto ou diverso daquele que integra o respectivo segmento decisório.

Isso significa que os fundamentos de facto e de direito da sentença devem ser logicamente harmónicos com a pertinente conclusão ou decisão e que tal se não verifica quando haja contradição entre esses fundamentos e a decisão nos quais assenta.

Contudo, uma coisa é a contradição lógica entre os fundamentos e a decisão da sentença [vício na construção da sentença, vício lógico nessa peça processual], e outra, essencialmente diversa, o erro de interpretação dos factos ou do direito ou na aplicação deste [a errada valoração da prova produzida ou errada determinação ou interpretação das normas legais aplicáveis/o erro de julgamento/a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário] que não raro se confunde com aquela contradição.[5]

d) Perante o descrito enquadramento normativo e analisada a sentença sob censura, concluiu-se que a Mm.ª Juíza a quo indicou adequadamente (de forma clara e com desenvolvimento bastante) os fundamentos de facto [a motivação da decisão de facto - sem prejuízo do explanado na parte final da precedente alínea b) - encontra-se a fls. 58 anverso, in fine, a 61 verso[6], sendo que a recorrente não indica, propriamente, qualquer concreta falha ou deficiência que deva ser corrigida ou eliminada] e de direito subjacentes à decisão proferida; a respectiva fundamentação conduz à solução encontrada para a problemática submetida à apreciação do Tribunal, ou seja, a conclusão decisória está logicamente encadeada com a motivação fáctico-jurídica desenvolvida pelo Tribunal recorrido.

Por conseguinte, não ocorrem os apontados vícios na sentença recorrida, os quais, como se sabe, não se confundem com eventuais falhas/erros da decisão de facto ou “erros de julgamento”.

4. a) A Requerente/recorrente, no que respeita à matéria de facto (dada como provada ou como não provada), começa por dizer que alguns dos factos considerados provados são irrelevantes para o presente apenso de alteração (cf., nomeadamente, as “conclusões 4ª e 9ª”, ponto I., supra) e, depois, aparentando insurgir-se quanto a outros domínios da realidade fáctica, não concretiza ou indica os factos que considera erradamente tidos como provados ou como não provados [à excepção, dos factos mencionados em II. 1. bbb) e ccc) e II. 2. a), supra, o último, marcadamente conclusivo e de sentido contrário a parte da factualidade dada como provada] e, menos ainda, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as (pretensas) questões de facto impugnadas (a posição sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação) - cf., sobretudo, as “conclusões 37ª a 40ª, 43ª a 45ª e 54ª”, ponto I., supra).

Porque não podemos deixar de atender aos ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto previstos no art.º 640º do CPC, ex vi dos art.ºs 32º, n.º 3 e 33º, n.º 1 do RGPTC (ainda que, porventura, com uma menor ortodoxia face ao processo declarativo comum), é irrecusável que não se antolha possível qualquer modificação da decisão de facto.

Ademais, ao fim e ao cabo, a recorrente acaba por se conformar com a generalidade dos factos que a Mm.ª Juíza a quo deu como provados, e discorda, apenas, da relevância que diz terem merecido na fundamentação da sentença e no desfecho do presente apenso (cf., por exemplo, as “conclusões 11ª, 21ª, 24ª a 29ª, 31ª e 32ª”, ponto I., supra).

b) Quanto aos factos que a recorrente considera irrelevantes, sempre se dirá que, não sendo porventura “essenciais” para a decisão deste apenso, nada impede que nele figurem, tanto mais que os processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária, pelo que há que atender à realidade pretérita e a todo o devir da vida do menor e seus progenitores, proferindo-se, sempre, a decisão mais conveniente e oportuna e dando o devido relevo às circunstâncias supervenientes[7] - cf. os art.ºs 12º do RGPTC e 987º e 988º, n.º 1, do CPC.

c) Por último, também se dirá que, não obstante a resposta acima indicada para a aparente impugnação da decisão de facto, esta Relação, dados os (relevantes) interesses em presença, não deixou de verificar/analisar toda a prova produzida nos autos e em audiência de julgamento, podendo concluir, com suficiente segurança, que não existem especiais razões para ponderar, por exemplo, a invocada “alienação parental”.

Além do mais, as declarações do menor/jovem prestadas no decurso da conferência dos pais apontam no sentido de que terá uma boa noção da realidade familiar, mantém um bom relacionamento com ambos os pais (que ama e respeita, inclusive, fazendo o que considera poder contribuir para a felicidade de todos e a manutenção desse bom relacionamento) e não se sente propriamente constrangido pela actuação de qualquer um deles (e que possa prejudicar o relacionamento com o outro progenitor).

Daí, salvo o devido respeito por opinião em contrário, será porventura excessivo o consignado em II. 1. jj), supra, e que reclama se atenda ao circunstancialismo da sua “transmissão/revelação” à progenitora e ao demais referido pelo jovem, mormente no decurso da sua audição na conferência de 15.10.2020.[8]

De resto, a prova testemunhal (nomeadamente, os depoimentos dos técnicos da Segurança Social, ...) também aponta, claramente, para a inexistência de factos que indiciem essa anomalia na relação parental.

5. Na sentença, o exercício das responsabilidades parentais é regulado de harmonia com os interesses da criança, devendo determinar-se que seja confiada a ambos ou a um dos progenitores, a outro familiar, a terceira pessoa ou a instituição de acolhimento, aí se fixando a residência daquela (art.º 40º, n.º 1 do RGPTC). É estabelecido regime de visitas que regule a partilha de tempo com a criança (n.º 2, 1ª parte).

Quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, (…), ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais (art.º 42º, n.º 1 do RGPTC).

6. Segundo o art.º 1906°, n.° 5, do CC (na redacção conferida pela Lei n.° 61/2008), aplicável por força do disposto no n.º 1 do art.º 1912º, do mesmo Código, o tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro. E nos termos do n.º 8 (na renumeração da Lei n.º 65/2020, de 04.11), do mesmo art.º, o tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles. [9]

7. A lei não define o que deva entender-se por interesse do menor, cabendo ao juiz em toda a amplitude que resulta daqueles preceitos legais identificar e definir, em cada caso, esse interesse superior da criança, por alguns já definido como “o direito do menor ao desenvolvimento são e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade”[10] ou como tratando-se de uma “noção cultural intimamente ligada a um sistema de referências vigente em cada momento, em cada sociedade, sobre a pessoa do menor, sobre as suas necessidades, as condições adequadas ao seu bom desenvolvimento e ao seu bem estar material e moral”.[11]

8. As “responsabilidades parentais” não são “um conjunto de faculdades de conteúdo egoísta e de exercício livre, ao arbítrio dos respectivos titulares, mas um conjunto de faculdades de conteúdo altruísta que tem de ser exercido de forma vinculada, de harmonia com a função do direito, consubstanciada no objectivo primacial de protecção e promoção dos interesses do filho, com vista ao seu desenvolvimento integral”.[12]

Estão, pois, em causa o exercício de poderes-deveres visando a promoção do interesse da criança, a que se reportam diversos normativos da lei ordinária (cf. ainda, v. g., os art.ºs 1885º, n.º 1 e 1918º, n.º 1, do CC, que estabelecem o dever dos pais de promoverem o desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos e de não colocarem em perigo a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação do menor) e da Lei Fundamental (cf., v. g., os art.ºs 36º, n.º 5 e 69º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa/CRP, consagrando, o primeiro, o direito fundamental da criança à protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral e, o segundo, o poder-dever dos pais de educação e manutenção dos filhos).

9. A Mm.ª Juíza a quo concluiu que “não se verifica prova de alteração das circunstâncias subjacentes à última revisão de 2017, em que o jovem passou a residir com o pai”.

Salientou, designadamente:

 - O jovem está integrado no espaço escolar, familiar e social; em termos de saúde, ainda que tenha tendência para o encorpamento físico, mantém o possível acompanhamento médico; beneficia de cuidados personalizados em ambiente familiar e acompanhamento próximo e constante por parte do pai; expressou que, de forma ponderada, preferia continuar a residir com o pai, ainda que tivesse lugar o alargamento possível dos tempos de convívio com a mãe.

- O pai dedica-se exclusivamente a este filho, fruto, também, da sua situação de disponibilidade profissional; dispõe da ajuda preciosa da avó paterna do J. em ambiente doméstico; acordou, na última sessão de julgamento, sem tergiversações, no esticamento possível das cláusulas convivenciais entre filho e mãe; de todo o modo, este pai - porque mais próximo fisicamente do filho, em tempo letivo - deve vigiar as tendências alimentares e os hábitos de vida deste filho; a boa evolução do jovem em dezembro de 2018 e no verão de 2019 não poderá ser atribuída exclusivamente aos cuidados da mãe, porquanto se tratou de tempos igualmente compartilhados pelo jovem com cada um dos progenitores; continua a ser o pai e continuam a ser as suas circunstâncias de vida a oferecer-nos melhores garantias de crescimento equilibrado do jovem em tempo escolar.

- A mãe encontra-se numa fase profissional de recomeço e investimento, com a consequente necessidade de investimento pessoal; o dito projeto profissional envolve igualmente um companheiro, com quem mantém uma ligação que não tem sequer dois anos de duração; desconhecem-se, por se terem recusado a revelá-las a progenitora e o seu companheiro, as fontes de rendimento de ambos que têm permitido sustentar o seu ´modus vivendi` atual; não obstante a legítima preocupação com a saúde atual e futura do J..., certamente a ingestão em demasia de alimentos, por parte do J., constitui uma tendência sua, pelo que é necessário um processo mental de desabituação que carece da sua total adesão, e é mais fácil consegui-lo com acompanhamento pessoal próximo. Para esse desiderato, afigura-se-nos que o pai tem mais disponibilidade de tempo do que a mãe. Aliás, sendo este jovem carente afetivo – como reconhecidamente é -, a comida funciona como compensação.

10. A descrita fundamentação no sentido do menor continuar ao cuidado e à guarda do pai revela adequação, razoabilidade e bom senso, pois os elementos disponíveis, ao contrário do expendido e concluído na petição, dizem-nos, claramente, que o requerido está verdadeiramente comprometido com o crescimento saudável e harmonioso do seu filho, mormente ao nível do acompanhamento médico/hospitalar [cf., designadamente, II. 1. tt), uu) e vv), supra], sendo que a circunstância de a requerente haver promovido, com (algum) sucesso, práticas para uma vida saudável [cf., designadamente, II. 1. ee), gg) e hh), supra], de per si, não justifica a pretendida atribuição da guarda/residência.

E se é igualmente importante atentar na realidade descrita, nomeadamente, em II. 1. r) a aa), supra, também não se poderá olvidar o que consta, por exemplo, em II. 1. bbb), ccc), eee) e ggg), supra.

Tudo ponderado, por ora, não se justifica modificar o regime da guarda do menor; menos ainda, a alteração pretendida inicialmente (fls. 12 verso e 13).

Constituindo um interesse superior do menor poder privar e manter contactos com ambos os progenitores - quando estes tenham capacidade para assegurar o desenvolvimento psico-afectivo da criança -, de modo a assegurar o seu bem-estar e desenvolvimento integral (art.º 1906º, n.º 8, do CC)[13], naturalmente, aquele (e qualquer) regime deverá ser ajustado se e quando as circunstâncias o ditarem.

E foi o bom-senso e a colaboração dos progenitores, no final da audiência de julgamento (a 17.12.2020), que ditaram um (bom) acordo de alteração da regulação, em benefício de todos!

11. Voltando à problemática descrita em II. 4. c), supra, dir-se-á, ainda, que o que ficou mencionado em II. 1. ll) (2ª parte) e mm) (2ª parte), supra, nada poderá abonar a favor do requerido e tudo aconselha a que não se repita; idêntico juízo negativo poderia recair sobre um pai que devesse cumprir a regulação aventada e pretendida no início deste apenso, ou sobre uma tal correlativa e injustificada pretensão duma ex-companheira! 

Contudo, como resulta dos autos, ali e aqui, tivemos apenas, segundo se crê, algumas (pontuais) manifestações negativas do modo-de-ser do pai e da mãe do menor (próprias do “errar é humano”! - também admitido pelo próprio menor, em 15.10.2020), mas que não se antolham fundamentais para a avaliação que estes progenitores merecem e lhes é devida, inclusive, a partir do juízo do jovem J..., seu filho.

12. Soçobram, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.       

III. Face ao exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pela requerente/apelante.


08.7.2021





[1] Desconhece-se se foi proferido o despacho previsto no art.º 28º, n.º 1 da Portaria n.º 280/2013, de 26.6, mas não constam do “suporte físico do processo as referidas alegações e as actas da “tentativa de conciliação” e das sessões da audiência de julgamento…
[2] Veja-se o Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, reimpressão, Vol. V, pág. 140.
[3] Neste sentido, o acórdão do STJ de 02.3.2011-processo 161/05.2TBPRD.P1.S1, publicado no “site” da dgsi.
[4] Cf., nomeadamente, o acórdão da RC de 31.3.2020-processo 22/17.2T8CLB.C1 (subscrito pelos aqui relator e 1º adjunto), publicado no “site” da dgsi.                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                             
[5] Vide, de entre vários, Antunes Varela, e Outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, pág. 671 e os acórdãos do STJ de 21.5.1998, 22.6.1999, 30.9.2004-processo 04B2894 e 06.7.2011-processo 7295/08.0TBBRG.G1.S1, in CJ-STJ, VI, 2, 95; BMJ 488º, 296 e “site” da dgsi, respectivamente.

[6] Sob o enquadramento “CONVICÇÃO DO TRIBUNAL”, a Mm.ª Juíza  a quo  aludiu, nomeadamente, aos diversos documentos juntos (respeitantes a, nomeadamente, relatórios médicos, análises clínicas e consultas médicas ao menor) e aos depoimentos das testemunhas ... (conhecidos e amigos do requerido e do J..., da zona de residência de ambos/F...), ... (acompanhou o jovem nos 3º e 4º anos da Escola, na F…, dando conta do facto de o pai do J... ser presente e muito preocupado consigo), ... (referiu as condições residenciais do requerido e a sua disponibilidade para com o filho - em audiência e no relatório junto aos autos), ... (SATT de B…, que também elaborou relatório social dos autos), ... (médica aposentada com experiência enquanto juíza social e com outras intervenções no domínio da jurisdição de família e menores; aludiu às necessidades de crescimento na idade do J..., pelo que não se alarmava com a compleição física deste - pelo contrário, não recomendava dietas rígidas nestas idades; referiu que a dieta que o nutricionista contratado pela mãe sugeriu para o J... afigura-se excessiva).

[7] Isto é, no dizer da lei, tanto as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão como as anteriores, que não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso (art.º 988º, n.º 1, 2ª parte, do CPC).
[8] Na verdade, sabendo das divergências dos progenitores quanto à sua guarda e depois de ter afirmado que “nunca se vão entender” e “fui eu que causei isto tudo” (segundo o J..., terão sido as conversas que teve com a mãe, no Verão de 2020, que a terão levado a instaurar este apenso…), começou por afirmar que, junto do Psicólogo e no contexto de uma pretensa “pressão psicológica”, “tinha que dizer aquilo e era aquilo que eu tinha que dizer”, pois o pai referia que devia transmitir “querer ficar comigo, que gostas do pai, que o pai não te faz mal…”. Porém, acabou por afirmar “eu não dizia aquilo que ele mandava dizer!” [ao contrário do que se reproduz na “conclusão 44ª”, ponto I., supra] e, questionado pela Exma. Advogada, afirmou que é “verdade que ele (pai) gosta de mim” e, depois, na sequência da pergunta “dizias o que sentias?”, respondeu “claro, como estou a dizer agora!”…

[9] Estatuição que faz lembrar os Princípios 2 e 8 da Recomendação n.º R (84) sobre as responsabilidades parentais, adoptada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa em 28.02.1984, na 367ª reunião dos Delegados Ministeriais, e que havia sido preparada pelo Comité de Peritos sobre o Direito da Família instituído sob os auspícios do Comité Europeu de Cooperação Jurídica - Qualquer decisão da autoridade competente relativa à atribuição das responsabilidades parentais ou ao modo como essas são exercidas, deve basear-se, antes de mais, nos interesses dos filhos. O progenitor com quem a criança não reside deve, pelo menos, ter a possibilidade de manter relações pessoais com o filho, excepto quando essas relações prejudiquem seriamente os interesses deste.

[10] Vide Almiro Rodrigues, Interesse do Menor – Contributo para uma Definição, Revista de Infância e Juventude, n.º 1, 1985, págs. 18 e seguinte.
[11] Vide Rui Epifânio e António Farinha, Organização Tutelar de Menores – Contributo para uma visão interdisciplinar do direito de menores e de família, Almedina, 1987, pág. 326.
[12] Vide Armando Leandro, Poder Paternal: natureza, conteúdo, exercício e limitações. Algumas reflexões de prática judiciária, Temas do Direito da Família – Ciclo de Conferências no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, Almedina, pág. 119.
[13] Cf., de entre vários, o acórdão da RP de 24.10.2019-processo 23739/15.1T8PRT-E.P1, onde se argumenta que «o direito ao convívio não pode ser visto como um direito unilateral e exclusivo dos pais ou um interesse seu, mas, sobretudo, como um direito autónomo do filho menor, ordenado ao seu desenvolvimento psíquico e emocional. Tal direito só não deve ser exercido quando contenda com este desiderato».