Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
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| Nº Convencional: | JTRC | ||
| Relator: | FERNANDA ALMEIDA | ||
| Descritores: | INSOLVÊNCIA VERIFICAÇÃO E GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS IMPUGNAÇÃO À RELAÇÃO DE CRÉDITOS RECONHECIDOS E NÃO RECONHECIDOS FINALIDADE CASO JULGADO | ||
| Data do Acordão: | 11/20/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | JUÍZO DE COMÉRCIO DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA | ||
| Texto Integral: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Legislação Nacional: | ARTIGOS 129.º, 130.º, 154.º A 156.º DO CIRE, 615.º E 620.º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL | ||
| Sumário: | A impugnação à relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos, apresentado pelo administrador da insolvência para dar lugar ao apenso de verificação e graduação de créditos do insolvente, deve ser aí apresentada, nos termos do art. 130.º CIRE, e não se confunde, nem visa a mesma finalidade que a impugnação da lista provisória de créditos apresentada ao abrigo do disposto nos arts. 154.º e 156.º CIRE. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
| Decisão Texto Integral: | Relator: Fernanda Almeida Adjuntos: Catarina Gonçalves Chandra Gracias * Acordam os juízes abaixo-assinados da 1.ª secção, cível, do Tribunal da Relação de Coimbra:
RELATÓRIO Por apenso aos autos de insolvência em que, por sentença de 11.3.2025, foi declarada a insolvência de A..., LDA, NIF ...71, com sede na Rua ..., ..., loja ..., ..., ..., foi constituído o presente apenso B, relativo à reclamação de créditos. Neste apenso B, foi proferida sentença a 7.7.2025, onde se consignou, além do mais: “Nos termos do artigo 130.º, n.º 3, do CIRE, não havendo impugnações, deve homologar-se a lista de credores reconhecidos e efetuar-se a correspondente graduação em atenção ao que dela conste. Como in casu não foram apresentadas quaisquer impugnações, homologo a lista apresentada pelo senhor Administrador de insolvência, que aqui se dá por integralmente reproduzida”. Acrescentou-se que: “O pagamento deverá começar a ser feito pelo produto da venda dos bens garantidos e privilegiados e só depois pelo produto da venda dos bens sobre os quais não recaia qualquer garantia ou privilégio e de acordo com os seguintes critérios: - os créditos garantidos e privilegiados são pagos até ao valor da garantia respetiva ou ao valor do bem objeto do privilégio, com respeito pela prioridade que caiba a cada um desses créditos, sendo que os que não fiquem integralmente pagos passam a ter a natureza de créditos comuns (artigos 174.º, n.ºs 1 e 2, e 175.º, n.º 2, ambos do CIRE); - os créditos comuns são pagos na respetiva proporção, se a massa for insuficiente para a sua satisfação integral (artigo 176.º do CIRE); - o pagamento aos credores subordinados só tem lugar depois de integralmente pagos os créditos comuns e na ordem a que alude o artigo 48.º do CIRE (cf. artigo 177.º do CIRE). * No caso vertente, de acordo com a lista de créditos apresentada nos autos, existem créditos privilegiados e comuns: a)- Os créditos do trabalhador emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação. A graduação dos créditos laborais faz-se pela seguinte ordem: o crédito com privilégio mobiliário geral é graduado antes do crédito referido no n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil (alínea a)); o crédito com privilégio imobiliário especial é graduado antes do crédito referido no artigo 748.º do Código Civil e de crédito relativo a contribuição para a segurança social (alínea b)). b) os créditos de IRC, relativos aos últimos 3 anos, gozam de privilégio mobiliário geral e imobiliário geral sobre os bens existentes no património do devedor à data da penhora ou ato equivalente. Na insolvência, e de acordo com o artigo 97.º, n.º 1, alínea a), do CIRE, o pagamento dos créditos IRC constituídos dentro dos 12 meses até à data do início do processo é garantido pelos bens móveis e imóveis existentes na massa falida, extinguindo-se os demais. c) - O IVA constituído dentro dos 12 meses antes do início do processo de insolvência, mais os respetivos juros, beneficia do privilégio creditório mobiliário geral, de acordo com o disposto no artigo 97º, nº 1, a), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, juntamente com os juros dos dois últimos anos (cf. artigos 735.º, n.º 1, e 734.º do Código Civil). d) - Conforme decorre do artigo 204.º do Decreto-Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro, os créditos da segurança social por contribuições, quotizações e respetivos juros de mora mantiveram o privilégio mobiliário geral, passando, no entanto, a ser graduados nos termos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 747.º do Código Civil, ou seja, a par com a Fazenda Nacional. Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 11.º, «Os créditos pelas contribuições, independentemente da data da sua constituição, e os respetivos juros de mora gozam de privilégio imobiliário sobre os bens imóveis existentes no património das entidades patronais à data da instauração do processo executivo, graduando-se logo após os créditos referidos no artigo 748.º do Código Civil». e) - O artigo 98.º, n.º 1, do CIRE prevê que o crédito não subordinado do credor a requerimento de quem a situação de insolvência tenha sido declarada (no caso, o crédito do credor B..., Companhia de Seguro de Créditos, S.A.) beneficia de privilégio creditório geral, graduado em último lugar, sobre todos os bens móveis integrantes da massa insolvente, relativamente a um quarto do seu montante, num máximo correspondente a 500 unidades de conta. f) - Por último, para satisfação do imposto e das coimas resultantes da violação ao disposto no Código do Imposto Único de Circulação (Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho), bem como das despesas de remoção e armazenagem do veículo, a Fazenda Pública goza de privilégio mobiliário especial sobre o veículo tributável - cf. artigo 22.º, n.º 3, do aludido diploma legal -, sendo que, no caso dos autos, verifica-se que foi reconhecido IUC incidente sobre veículos que ainda não foram apreendidos para a massa insolvente. Como tal, e caso a apreensão dos aludidos veículos se concretize, deve o respetivo crédito de IUC sobre cada um dos veículos apreendidos ser graduado para ser pago sobre o produto destes bens com preferência sobre os demais créditos que não beneficiem de garantia ou privilégio especial. * Os restantes créditos reclamados são créditos comuns, devendo ser pagos rateadamente pelo remanescente do produto dos bens apreendidos».
Desta sentença, apresentou recurso a própria insolvente, A..., visando a sua nulidade: (…).
Apresentaram contra-alegações os credores AA e BB, dizendo: (…).
Objeto do recurso: Se é admissível no apenso de reclamação, verificação e graduação de créditos a impugnação à lista provisória de credores apresentada no apenso de insolvência, onde já foi decidido não ser de a conhecer, por despacho transitado em julgado.
FUNDAMENTAÇÃO Fundamentação de facto Factos provados Extraídos dos autos de insolvência: Extraídos dos autos de verificação de créditos: Assim, como se refere no ac. RP., de 19.9.2019, Proc. 213/19.1T8AMT-B.P1 (citado já em despacho nos autos de insolvência): I - A lista provisória de credores prevista no art. 154.º CIRE, integra como anexo o relatório apresentado pelo Administrador da Insolvência e vai servir de base à definição da participação e votação dos credores nas deliberações que à Assembleia de Credores compete tomar. II - Uma impugnação apresentada àquela lista não é atendível no âmbito do apenso de reclamação de créditos, não desobrigando o interessado de apresentar nos termos e no prazo previstos no art. 130.º do CIRE a impugnação que tenha por conveniente à lista de credores reconhecidos e não reconhecidos que vier ser apresentada pelo Administrador da Insolvência em cumprimento do art. 129.º do CIRE. Quer isto dizer que, apesar de lapso ostensivo (que dá origem à simples retificação - art. 249.º CC), por o AI ter apresentado nos autos de insolvência lista provisória que fez reportar aos arts. 153.º a 155.º a verdade é que a intitulou expressamente como lista provisória, nestes termos: JJ, Administrador de Insolvência nos autos de Insolvência de: A..., Lda, no processo indicado a correr termos por esse Juízo vem: REQUERER a V. Exªs que se digne ordenar a junção aos autos do Relatório, Lista Provisória de Credores e Inventário. Além disso, a insolvente veio impugnar essa lista, aceitando uns créditos e não outros, bem como pondo em causa algumas garantias e, logo nessa oportunidade, o tribunal a quo foi claro: não era ali o tempo de apresentar reclamação à lista provisória e que seria a propósito da apresentação da lista a respeito do processo a que alude o art. 129.º que essa impugnação poderia ser apresentada. Não concordando com o teor deste despacho, a insolvente poderia ter dele recorrido, mas a verdade é que não admitiu a reclamação aí apresentada e isso constitui caso julgado nos autos (art. 620.º CPC). Ademais, repare-se que nos autos de verificação e graduação de créditos, o AI apresentara a relação dos créditos definitivamente reconhecidos, a 16.6.2025 (do que até terá dado conhecimento a todos os intervenientes por e-mail de 15.6.2025), dispondo o art. 130.º/1 CIRE que os interessados dispõem do prazo de 10 dias para impugnar tais créditos, ou seja, até, pelo menos (contando o prazo extra de 3 dias úteis) 30.6.2025. Ora, nos autos corretos – apenso B – a devedora não impugnou a lista definitiva dos credores reconhecidos, tendo antes aguardado pela decisão judicial a proferir nos autos de insolvência, sobre a putativa reclamação à lista provisória. Tendo vindo a ser proferido tal despacho, a 7.7.2025, a devedora com ele se conformou, deixando-o transitar em julgado, numa altura em que sequer já não poderia impugnar os créditos definitivamente reconhecidos neste apenso B. Assim, de duas, uma das atitudes processuais cabia à recorrente, auxiliada por advogado: impugnar a lista definitiva dos créditos reconhecidos, nos autos respetivos (os atuais); não se conformar, no apenso de insolvência, com o despacho de 7.7.2025 e dele recorrer. E nem se diga que era inútil nova reclamação no apenso correto porque nem os créditos aqui apresentados têm que coincidir com os provisórios, nem a graduação provisória destes últimos, ao contrário do que sucede no apenso B, por mandamento legal (art. 129.º/1 CIRE), implica igualmente uma proposta do AI de graduação dos credores reconhecidos, que tenha por referência a previsível composição da massa insolvente e respeite o disposto no n.º 2 do artigo 140.º e na alínea d) do n.º 1 do artigo 241.º. Agora, sobre a sindicância do despacho de 7.7.2025, proferido nos autos apensos, não constitui o mesmo, como é óbvio, objeto do presente recurso, pelo que nada sobre o mesmo se nos impõe decidir. Não pode é decidir-se que a sentença proferida nestes autos está inquinada de qualquer nulidade, mormente as previstas no art. 615.º/ c) e d) CPC (não à posição entre os fundamentos e a decisão destes autos sendo absolutamente inteligível o dispositivo, tendo sido apreciadas todas as questões colocadas), primeiro porque a argumentação do recorrente é da existência de contradição entre duas decisões que, na sua essência, versam temas distintos; depois porque não era objeto da sentença recorrida conhecer de uma impugnação à lista definitiva que a recorrente nunca apresentou. Por se não tratar de uma impugnação à lista definitiva de créditos, mas da lista provisória, não cabia ao juiz, no processo apenso, remeter para estes autos aquela reclamação, em nome de qualquer dever de cooperação. Não concordando com a decisão, o que cabia à devedora era apresentar recurso dessa decisão. Ademias, diga-se que o putativo relevo da reclamação quanto aos direitos dos credores provisórios deve ser exercido na assembleia de credores e é igualmente matéria que exorbita do recurso à sentença de graduação de créditos, devendo ser conhecida no processo onde tal assembleia terá lugar, como resulta do art. 156.º CIRE, onde o devedor estará presente (ar. 83.º CIRE). Podia tê-lo feito- renovar a impugnação anterior – na ata de assembleia de credores ocorrida a 12.8.2025, convocada nos termos do art. 75.º CIRE, o que não fez, sendo certo que se acha designada uma nova assembleia de credores.
DISPOSITIVO Pelo exposto, decidem os Juízes deste Tribunal da Relação julgar o recurso improcedente e manter a sentença recorrida. Custas pela recorrente. 20.1.2025
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