Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
28/19.7T8MBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR
RESTITUIÇÃO PROVISÓRIA DA POSSE
ESBULHO
VIOLÊNCIA
CONVOLAÇÃO
Data do Acordão: 04/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU - M.BEIRA - JUÍZO C. GENÉRICA - JUIZ 2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTS. 362, 368, 377, 378, 379 CPC, 255, 1261, 1277, 1279 CC
Sumário: 1. Para deferir a restituição provisória da posse, a violência, caracterizadora do esbulho, poderá ser exercida sobre pessoas e/ou sobre coisas, mas neste caso desde que ela se repercuta nas pessoas em termos de intimidá-las ou coagi-las.

2. Se a acção recair sobre coisas e não directamente sobre pessoas, esta só poderá ser havida como violenta se, indirectamente, coagir o possuidor a permitir o desapossamento, pois apenas assim estará em causa a liberdade de determinação humana.

3. Não verificados todos os requisitos para aquele procedimento especificado, a pessoa desapossada pode recorrer ao procedimento cautelar comum, nos termos previstos no art.º 379° do CPC, para obter uma intervenção urgente do poder judicial, desde que a manutenção dessa situação ilícita lhe cause prejuízos graves e de difícil reparação.

4. Não estão reunidos os requisitos do esbulho violento nem se justifica a convolação dita em 3., se se demonstrar, apenas, que determinada parcela de terreno foi ocupada e acrescentada à via pública adjacente pela Junta de Freguesia (com o intuito, que foi consumado, de alargar a via pública confinante pelo lado nascente) privando assim a herança-requerente de, através dos respectivos herdeiros, aceder à mesma e de a usar como alegada proprietária e possuidora, indiciando-se, ainda, que a questão da propriedade da parcela integrada na via pública irá constituir o objecto central do litígio na acção declarativa comum.

Decisão Texto Integral:





            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I. 1. Em 17.01.2019, Herança Ilíquida e Indivisa Aberta por Óbito E (…) representada pela respectiva cabeça-de-casal M (…) intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Viseu (Juízo de Competência Genérica de Moimenta da Beira), o presente procedimento cautelar de restituição provisória de posse contra Freguesia de (...) , pedindo que lhe seja restituída a posse de uma parcela de terreno com a área de cerca de 230 m2, que faz parte do prédio inscrito na matriz sob o art.º (...) da freguesia de (...) , do Concelho de (...) e que a requerida ocupou e integrou na via pública adjacente.[1]

2. Alegou, nomeadamente:

a) A herança é proprietária do prédio constituído por terra de vinha com oliveiras, sito no lugar de (...) , na povoação e freguesia de (...) , concelho de (...) , que confronta do norte e do poente com o caminho, do sul com (…) e de nascente com a estrada[2], inscrito na respectiva matriz sob o art.º (...) e descrito na Conservatória do Registo Predial (CRP) de (...) sob o n.º 1997 daquela freguesia;

b) A propriedade deste imóvel está inscrita definitivamente na dita Conservatória a favor dos referidos herdeiros em comum e sem determinação de parte ou direito, pelo que eles gozam, e também a herança, da presunção se serem os respectivos proprietários;

c) Sendo os proprietários, na qualidade de herdeiros, deste terreno, também estão a possuí-lo desde há mais de um ano e granjeiam-no ao longo de todo o ano, por si ou por trabalhadores que contratam, e na época própria colhem os respectivos frutos que fazem seus, e nele se recreiam numa parte afecta a logradouro do seu prédio urbano confinante, actos que praticam à vista e com o conhecimento de todas as pessoas de (...) e da Requerida;

d) Este terreno[3] tem uma parcela com a área de cerca de 460 m2, que também serve e completa o logradouro da casa de habitação de dois pavimentos, propriedade da requerente, sita na Rua (...) , na dita (...) , que confronta de nascente com a estrada nacional n.º 222, inscrita na respectiva matriz sob o art.º (...) e descrita na CRP de (...) sob o n.º (...) ;

e) No dia 10.12.2018, a Junta de Freguesia, agindo na qualidade de órgão executivo da Requerida, ordenou, através do seu Presidente, o despejo de grande quantidade de terra para dentro desta parcela de terreno, sem o consentimento e o conhecimento da Requerente, o que efectivamente foi feito com o intuito, que foi consumado, de alargar a via publica confinante pelo lado nascente, sendo que, em consequência desta actuação foram ocupados cerca de 230 m2 de terreno, integrando toda a área que estava delimitada a partir do muro que separava esta parcela do empedrado da via pública, e foram integrados nesse caminho adjacente (tendo até derrubado uma árvore - tília - que estava implantada no terreno e também ficou coberta a boca dum poço de água que lá existe);

f) Tal situação ainda se mantém, com circulação de pessoas e veículos sobre o terreno da Requerente que foi acrescentado à via pública com a ocupação, e privando a Requerente de, através dos respectivos herdeiros, aceder e usar tereno que lhe pertence como proprietária e possuidora que é.

3. Por decisão de 21.01.2019, a Mm.ª Juíza a quo fixou o valor da causa em € 1 500 e indeferiu liminarmente o procedimento cautelar.

Inconformada, a requerente apelou, terminando a alegação com as seguintes conclusões:

1ª - A Requerente/Recorrente atribuiu a este procedimento o valor de € 15 000 e por considerar que os 230 m2 do seu terreno ocupado por acção da Requerida têm hoje esse valor e vista a sua afectação a logradouro de casa de habitação situada no perímetro urbano de (...) .

2ª - A Mm.ª discordou daquele valor e fixou-o em € 1 500, tomando por base o valor patrimonial inscrito na matriz rústica e situações que disse idênticas.

3ª - Mas aquele valor matricial (€ 475,05 para todo o prédio rustico) reporta-se a 1989, ou seja, é o valor calculado há 30 anos, acrescendo que a Mm.ª não especificou quais os casos idênticos em que baseou a sua decisão.

4ª - Face a esta débil (com o respeito devido) fundamentação, o valor fixado pela Requerente/Recorrente, ou seja o de € 15 000 deve ser mantido e revogado o despacho que o alterou.

5ª - Está alegado que o terreno da Requerente/Recorrente se situa em plano inferior à via publica que o limita pelo lado nascente e que no mesmo foi despejada, por ordem da Requerida, grande quantidade de terra com o intuito, que foi consumado, de alargar a via pública confinante pelo lado nascente.

6ª - Com esta actuação da Requerida e por via daquele aterro foram ocupados 230 m2 do terreno da Requerente e esta área foi integrada na via publica adjacente.

7ª - Actuação desenvolvida sem o consentimento e o conhecimento da Requerente e, em consequência, a Requerente está impedida de, através dos respectivos herdeiros, aceder e usar terreno que lhe pertence como proprietária e possuidora.

8ª - O que configura um esbulho violento nos termos e para os efeitos dos art.ºs 1279º, 1261º-2 e 255º-2 do Código Civil (CC) e na interpretação prevalecente que lhes é dada pela jurisprudência do STJ, e também nos termos e para os efeitos do art.º 377º do Código de Processo Civil (CPC).

9ª - Não existe fundamento para o indeferimento liminar decretado o qual teve por base uma má interpretação dos factos alegados e, por esse motivo, a não aplicação aos mesmos daquelas normas legais, pelo que o mesmo deve ser revogado.

            Remata dizendo que deverão ser revogados “os dois despachos recorridos”, mantendo o valor da causa em € 15 000 e ordenando que a “providência” siga os seus demais termos.

            A requerida não foi citada (cf. os art.ºs 378º e 641º, n.º 7 do CPC).

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e decidir: a) valor do procedimento cautelar; b) se os factos invocados pela requerente permitem a utilização do procedimento cautelar de restituição provisória de posse (sendo a questão essencial a apreciar a da existência ou não de violência no esbulho) ou a sua convolação para procedimento cautelar comum.


*

II. 1. Para a decisão do recurso releva o que se descreve no antecedente relatório.

            2. Cumpra apreciar e decidir com a necessária concisão.

            Preceitua o art.º 304º, n.º 1 do CPC que o valor dos incidentes é o da causa a que respeitam, salvo se o incidente tiver realmente valor diverso do da causa, porque neste caso o valor é determinado em conformidade com os artigos anteriores; e dispõe o n.º 3, alínea b) do mesmo art.º que o valor do procedimento cautelar de restituição provisória de posse é determinado pelo valor da coisa esbulhada.

A Mm.ª Juíza a quo, considerando que a requerente pede a restituição provisória de posse contra a requerida, de parte de um prédio cujo valor patrimonial que consta da matriz predial é de € 475,05, determinado no ano de 1989 (cf. o “documento n.º 2” junto com a p. i.), decidiu, nos termos e para os efeitos do art.º 306.º, nºs 1 e 2 do CPC, “e tendo por base a localização do prédio, e situações idênticas às dos autos” (sic), fixar “à causa o valor de 1 500€ (mil e quinhentos euros)”.

Se é certo que a questão em apreço não influi na admissibilidade e no conhecimento do presente recurso (art.º 629º, n.º 3, alínea c) do CPC), afigura-se, contudo, salvo o devido respeito por opinião em contrário, que a Mm.ª Juíza a quo não concretizou/especificou o critério subjacente à fixação do valor do procedimento cautelar (maxime, os casos idênticos em que baseou a sua decisão), sendo de admitir que a situação dos autos reclamará, porventura, a adopção das diligências previstas nos art.ºs 308º e 309º do CPC.

Assim, por ora, e face aos elementos dos autos, não resta alternativa à manutenção do valor indicado pela requerente na petição inicial (€ 15 000 - referindo a requerente que traduzirá o valor de mercado da parcela ocupada “vista a sua afectação a logradouro de casa de habitação situada no perímetro urbano de (...) ”), naturalmente, sujeito a eventual correcção em sede de acção principal.

3. No caso de esbulho violento, pode o possuidor pedir que seja restituído provisoriamente à sua posse, alegando os factos que constituem a posse, o esbulho e a violência (art.º 377º do CPC).

O possuidor que for perturbado ou esbulhado pode manter-se ou restituir-se por sua própria força e autoridade, nos termos do artigo 336º, ou recorrer ao tribunal para que este lhe mantenha ou restitua a posse (art.º 1277º do CC).

 O possuidor que for esbulhado com violência tem o direito de ser restituído provisoriamente à sua posse, sem audiência do esbulhador (art.º 1279º do CC).

 4. A restituição provisória de posse tem natureza antecipatória, assegurando a satisfação provisória do possuidor e deverá ter lugar quando o juiz se convença da séria probabilidade da verificação dos requisitos da posse e do esbulho violento (cf. os art.ºs 368º, n.º 1 e 378º do CPC), dependendo, pois, da verificação cumulativa de três requisitos: a posse, o esbulho e a violência.

É possuidor esbulhado quem foi privado da posse (enquanto poder de disponibilidade fáctica ou empírica de determinado bem) que tinha e que é impedido de continuar a exercer (foi colocado em condições de não poder continuar a exercer a posse; o possuidor ficou privado do exercício ou da possibilidade de exercício dos poderes correspondentes à sua posse), e, em regra, o Réu/requerido/esbulhador terá de restituir a coisa, fazendo cessar a posse iniciada com o esbulho.[4]

Para que o esbulho possa servir de fundamento ao pedido de restituição provisória de posse é ainda necessário que este seja violento e,
ao contrário do que sucede em relação à definição de esbulho, que não consta da lei, a doutrina e a jurisprudência entendem que o conceito de violência que para aqui releva se mostra definido no n.º 2 do art.º 1261º do CC, onde se estatui que se considera violenta a posse
quando, para obtê-la, o possuidor usou de coacção física, ou de coacção moral nos termos do art.º 255º do mesmo diploma[5].

A coacção moral, na hipótese de esbulho, ocorre quando o possuidor da coisa é forçado à sua privação pelo receio de um mal de que foi ilicitamente ameaçado, mal esse que tanto pode respeitar à sua pessoa como à sua honra ou fazenda ou de terceiro (art.º 255º do CC), enquanto a coacção física supõe a completa ausência de vontade por parte daquele a quem a posse foi usurpada.[6]

5. Não suscita qualquer dúvida que o uso de violência sobre as pessoas, quer seja pelo uso da força física, quer seja através da coacção moral, pelas formas da intimação e da ameaça, é relevante para, caracterizando o esbulho como violento, fundamentar o deferimento do procedimento cautelar de restituição provisória de posse.

Considerando-se que a violência a que se refere o art.º 1261º do CC tem de exercer-se sobre as pessoas, e não apenas sobre as coisas que constituem um obstáculo à privação da posse (e a ameaça pode respeitar às pessoas ou aos bens, mas há-de exercer-se sobre a pessoa do coacto), as dúvidas podem-se colocar no tocante à violência sobre as coisas.

Embora estejamos perante questão não isenta de dificuldades (algumas das quais, cremos, poderão ser ultrapassadas se tivermos uma real/adequada configuração da situação controvertida), afigura-se defensável, como regra, o entendimento de que a violência contra as coisas só é relevante se com ela se pretende intimidar, directa ou indirectamente, a vítima da mesma, não devendo, por isso, qualificar-se como tal os meros actos de destruição ou danificação desprovidos de qualquer intuito de influenciar psicologicamente o possuidor - a violência sobre as coisas que estorvam a privação apenas relevará para este fim quando o agente usou, pelo menos de dolo eventual, quando previu, como normal consequência da sua conduta, que iria constranger psicologicamente o possuidor e, todavia, não se absteve de a assumir, conformando-se com o resultado.[7]

Assim, para deferir a restituição provisória da posse, a violência sobre as coisas só releva se tiver por fim intimidar o possuidor, limitando a sua liberdade de determinação, i. é, se a acção recair sobre coisas e não directamente sobre pessoas, esta só poderá ser havida como violenta se, indirectamente, coagir o possuidor a permitir o desapossamento, pois apenas assim estará em causa a liberdade de determinação humana.[8] 

6. A referida perspectiva quanto à utilização do procedimento cautelar de restituição provisória de posse, numa interpretação restritiva dos preceitos que o prevêem, justifica-se pela diminuição das garantias de defesa do requerido, que não é chamado a defender-se e a contraditar os factos e as provas do requerente previamente à decisão e pela desnecessidade da existência de qualquer prejuízo do requerente - a utilização do procedimento cautelar de restituição provisória da posse, pela diminuição de garantias de defesa do requerido e pela desnecessidade de existência de qualquer prejuízo do requerente, só deve ser permitida em casos em que a violência atingiu pessoas, e não quando apenas se exerceu sobre coisas, pois só aquelas situações revestem uma gravidade que justifica a utilização daquele meio de intervenção draconiano.[9]

Daí que só deva ser permitido nos casos em que a violência, mesmo quando apenas incida directamente sobre coisas, atinja a pessoa do desapossado. E se tal não ocorre, a restituição provisória da posse não deve ser decretada, sem prejuízo da defesa da posse mediante providência não especificada, verificados os respectivos requisitos - nas situações em que só coisas foram violentadas, sem qualquer constrangimento de pessoas, revela-se suficiente a possibilidade de utilizar o procedimento cautelar comum, para se obter a restituição provisória do bem ocupado (cf. os art.ºs 362º, n.º 1 e 379º do CPC[10]).[11]

7. Atendendo à factualidade alegada na p. i. é irrecusável que a requerente (sua representante e demais herdeiros) ficou impedida/impossibilitada de aceder à parcela de terreno em causa, admitindo-se, pois, a posse e o esbulho.

Porém, não vemos configurado um esbulho violento, uma vez que o desapossamento foi obtido através de uma acção que não incidiu sobre a requerente, representada pela cabeça-de-casal e/ou restantes herdeiros, já que não se verificou directamente qualquer ofensa física à pessoa destes, nem se verificou, directa ou reflexamente, qualquer ofensa psicológica à sua liberdade de determinação, colocando-os na impossibilidade material de agir, ou inibindo-lhes qualquer capacidade de reacção, por receio de algum mal.

Não ocorrendo esbulho violento, é de concluir pelo não preenchimento de todos os pressupostos de que depende o deferimento do procedimento cautelar de restituição provisória de posse.

Daí que se concorde com a posição assumida na decisão recorrida de que os factos alegados na p. i. não justificavam a utilização do procedimento cautelar de restituição provisória de posse.

8. Na ausência de prova dos pressupostos do deferimento da providência concretamente requerida pela recorrente, e na impossibilidade de convolação para a providência cautelar comum, por inexistência dos pressupostos de que dependia o seu decretamento - manifestamente improcedente, porquanto, além do mais, a recorrente nada alegou susceptível de caracterizar o periculum in mora, ou seja, o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do direito até à sua definição na acção declarativa correspondente (susceptível de determinar uma intervenção urgente do poder judicial) -, nada será de objectar ao decretado indeferimento liminar do procedimento cautelar.[12]

9. Na verdade, a mencionada parcela de terreno foi acrescentada à via pública adjacente (situada a nascente) com a ocupação [e refere-se na “conclusão 5ª”/ponto I. 3., supra: “(…) com o intuito, que foi consumado, de alargar a via pública confinante pelo lado nascente”], privando assim a herança-Requerente de, através dos respectivos herdeiros, aceder à mesma e de a usar como alegada proprietária e possuidora.

Todavia, não se verificou esbulho violento no apontado sentido [cf. II. 5., supra] e não vemos invocado perigo de lesão grave e dificilmente reparável do direito até à sua definição na acção declarativa.

Ademais, indicia-se que a questão da propriedade do terreno integrado na via pública irá constituir, por certo, o objecto central do litígio das partes na acção declarativa comum, sendo que na versão apresentada na p. i. deste procedimento já se entrevê e evidencia tal problemática, envolta nalguma dúvida… [veja-se, principalmente, o ponto I. 2. e), supra].  

10. Soçobram, desta forma, as demais “conclusões” da alegação de recurso (“5ª a 9ª”, ponto I, supra).


*

III. Pelo exposto, revoga-se o decidido quanto à fixação do valor do procedimento cautelar, como se indica em II. 2., supra, e mantém-se a decisão de indeferimento liminar.

Custas do recurso pela requerente/apelante, sendo estas posteriormente atendidas na acção principal, nos termos do art.º 539..) º do CPC.


*

11.4.2019


Fonte Ramos ( Relator )

Maria João Areias

Alberto Ruço


[1] Consta ainda da parte final do pedido: “(…) restituído à posse da aqui Herança-Requerente que, por isso, poderá nele [terreno] executar as obras que considere adequadas ao exercício da sua posse sobre o mesmo.
[2] Sublinhado nosso, como o demais a incluir no texto.
[3] Constando da inscrição matricial e da descrição predial que tem uma área total de 2 500 m2.
[4] Vide, de entre vários, Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. I, 3ª edição, Coimbra, 1982, pág. 669; Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, Vol. III, 2ª edição, Coimbra Editora, 1987, pág. 49; Henrique Mesquita, Direitos Reais, Sumário das Lições ao Curso de 1966/1967, Coimbra, 1967, pág. 126 e J. Lebre de Freitas, e outros, CPC Anotado, vol. 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 70.
[5] Preceitua o art.º 255º do CC: “1. Diz-se feita sob coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração. 2. A ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de terceiro. 3. Não constitui coacção a ameaça do exercício normal de um direito nem o simples temor reverencial.”
   Vide, entre outros, Henrique Mesquita, ob. cit., págs. 127 e seguinte.
[6] Vide Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, Vol. III, cit., pág. 23.

[7] Vide Orlando de Carvalho, Introdução à Posse, RLJ, ano 122º, pág. 293.

   Nesta perspectiva, exigindo que a violência, mesmo quando exercida sobre coisas, tenha um efeito de constrangimento sobre pessoas, vide, ainda, nomeadamente, J. Dias Marques, Prescrição aquisitiva, 1º vol., edição de 1960, pág. 277 e J. Lebre de Freitas, e Outros, CPC Anotado, vol. 2º, cit. págs. 72 e seguintes.

  Dando-nos uma perspectiva da evolução da jurisprudência e da dificuldade em concretizar o conceito de “esbulho violento”, cf., também, A. Abrantes Geraldes, Temas da reforma do processo civil, vol. IV, 3ª edição, Almedina, 2006, págs. 45 e seguintes.
[8] Cf., de entre vários, e naquele que se antolha ser o entendimento maioritário da jurisprudência, os acórdãos da RP de 04.7.1995-processo 9520375, 03.11.1997-processo 9750946, 16.10.2006-processo 0655160 [aresto que também nos dá uma larga perspectiva histórico-jurídica da matéria] e 12.11.2013-processo 1213/13.0TBVRL-C.P1, da RC de 20.5.2014-processo 84/14.4TBNLS.C1 e da RL de 24.9.1998-processo 0051476, publicados no “site” da dgsi.

   Apontando para um entendimento porventura mais alargado do conceito de “violência” no esbulho, cf., designadamente, os acórdãos do STJ de 07.7.1999, da RG de 03.11.2011-processo 69/11.2TBGMR-B.G1 [tendo-se concluído: «II- Na acção cautelar de restituição provisória de posse, quando a actuação do esbulhador sobre a coisa esbulhada é de molde a, na realidade, tornar impossível a continuação da posse, seja através de obstáculos físicos ao acesso à coisa, seja através de meios que impedem a utilização pelo possuidor da coisa esbulhada, estaremos perante um caso de esbulho violento; III- A violência no esbulho pode traduzir-se numa acção física exercida sobre as coisas como meio de coagir o esbulhado a suportar uma situação contra a sua vontade.»], da RP de 28.10.2013-processo 1880/13.5TBSTS.P1 [assim sumariado: «I - Efectuando-se o acesso ao prédio da requerente desde há mais de 30 anos, à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que fosse, por uma faixa de terreno no início da qual se encontrava um portão fechado à chave, e tendo os requeridos, donos do prédio confinante, retirado o portão e construído um muro, tapando a entrada e apropriando-se da referida faixa, encontram-se reunidos os requisitos enunciados no n.º 1 do artigo 393º do CPC [de 1961]. II - A constituição de um obstáculo físico que impede o possuidor de aceder ao objecto da sua posse, e, consequentemente, inviabiliza totalmente a sua fruição, integra o requisito da violência exigido no normativo citado.»] e da RC 25.5.2010-processo 1230/09.5T2AVR-A.C1 [com o seguinte sumário: «III - Para efeitos de restituição provisória de posse, a violência sobre a coisa é relevante quando a coisa violada pela actuação do esbulhador constituía um obstáculo ao esbulho que teve de ser vencido. IV - A violência sobre coisas pode abranger, nomeadamente, os actos consistentes na mudança de fechaduras de portas do próprio prédio objecto de esbulho. »] - aresto subscrito pelo aqui relator e pelo relator do anterior acórdão (como 1º adjunto) -, publicados, o primeiro, no BMJ 489º, 338 e, os restantes, no “site” da dgsi.

   Aludindo às dificuldades que a matéria tem suscitado, inclusive, no nosso mais alto Tribunal, e adoptando entendimento porventura mais ecléctico e alargado, cf. o acórdão do STJ de 19.10.2016-processo 487/14.4T2STC.E2.S1 [tendo-se sumariado: «IV - A respeito do requisito da “violência”, a jurisprudência firmada no STJ oscilou ao longo dos anos entre a tese do acórdão recorrido - que considerou violência relevante aquela que é exercida contra a pessoa do possuidor - e a tese do acórdão-fundamento - que considerou bastante para integrar o requisito em causa a violência exercida sobre a coisa. (…) VI - A violência aqui retratada não implica necessariamente que a ofensa da posse ocorra na presença do possuidor. Basta que o possuidor dela seja privado contra a sua vontade em consequência de um comportamento que lhe é alheio e impede, contra a sua vontade, o exercício da posse como até então a exercia – pelo que se sufraga a acepção mais lata de esbulho violento. VII - A interpretação mais restritiva seria redutora e deixaria sem tutela cautelar o possuidor privado da sua posse por outrem que, na sua ausência e sem o seu consentimento, actuou por forma a criar obstáculo ou obstáculos que o constrangem, nomeadamente, impedindo-lhe o acesso à coisa. VIII - Não pode deixar de se considerar esbulho violento a vedação com estacas de madeira e rede com uma altura de 1,50 m executada pelos requeridos como um obstáculo que constrange, de forma reiterada, a posse dos requerentes, impedindo-os de a exercitar como anteriormente faziam, merecendo, por conseguinte, tutela possessória cautelar no âmbito do procedimento de restituição provisória de posse.»], também citado pela requerente, publicado no “site” da dgsi.
[9] Cf. o cit. acórdão da RP de 16.10.2006-processo 0655160.
[10] Estatui o mencionado art.º: “Ao possuidor que seja esbulhado ou perturbado no exercício do seu direito, sem que ocorram as circunstâncias previstas no artigo 377º, é facultado, nos termos gerais, o procedimento cautelar comum.

[11] Cf., entre outros, os citados acórdãos da RP de 12.11.2013-processo 1213/13.0TBVRL-C.P1 e da RC de 20.5.2014-processo 84/14.4TBNLS.C1.
[12] Vide, neste sentido, A. Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, IV Volume, cit., págs. 57 e 68 e, entre outros, os acórdãos da RC de 01.02.2005, in CJ, XXX, 1, 18 e o cit. acórdão da RP de 16.10.2006-processo 0655160.