Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
204/14.9JAGRD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA PILAR DE OLIVEIRA
Descritores: PROVAS
REQUERIMENTO
JULGAMENTO
CONTESTAÇÃO
REQUISITOS
TRIBUTAÇÃO
PROCESSO PENAL
INCIDENTES ANÓMALOS
Data do Acordão: 11/16/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA (SECÇÃO CÍVEL E CRIMINAL DA INSTÂNCIA CENTRAL DA GUARDA - J2)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA, PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTS. 283.º, N.º 3, AL. F), 315.º, N.º 3, 340.º E 524.º, DO CPP; ART. 7.º, N.º 8, DO RCP (DL N.º 34/2008, DE 26-02, NA REDACÇÃO DADA PELA LEI N.º 7/2012, DE 13-02)
Sumário: I - Quer a prova requerida em julgamento, quer a prova a produzir na fase de julgamento e requerida na contestação, não podem colidir com o interesse da realização da justiça penal, justificando-se em ambos os casos a aplicação do disposto no artigo 340.º do CPP, sendo decisivo para tal conclusão o teor dos artigos 283.º, n.º 3, alínea f) e 315.º, n.º 3, do CPP.

II - A tese da irrestrita possibilidade de apresentação de meios de prova a produzir na fase de julgamento consentiria a realização de diligências inúteis para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, podendo conduzir, no limite, à própria frustração da justiça penal.

III - Estando as provas requeridas na contestação (com excepção da testemunhal e por declarações de peritos ou consultores técnicos) sujeitas a controle judicial, nos termos do artigo 340.º do CPPP, impende sobre o requerente o ónus de alegar e demonstrar em concreto a sua necessidade para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.

IV - A correcção da decisão recorrida, que indeferiu a produção daquela prova, apenas pode ser avaliada com os elementos que o tribunal a quo tinha para decidir e não com os novos argumentos, não utilizados na contestação, que o arguido-recorrente aduziu em sede de recurso.

V - Perante o disposto no artigo 524.º do CPP, é aplicável no âmbito do processo penal a norma inscrita no n.º 8 do artigo 7.º do RCP; consequentemente, os procedimentos ou incidentes anómalos, definidos no último dos dois referidos preceitos legais, são tributados, autonomamente, dentro dos parâmetros quantitativos fixados na tabela II anexa ao DL n.º 34/2008, de 26-02, na redacção dada pela Lei n.º 7/2012, de 13-02.

Decisão Texto Integral:

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

I. Relatório

No processo comum colectivo nº 204/14.9JAGRD da Comarca da Guarda, Instância Central da Guarda, Secção Cível e Criminal, J2, o arguido A...., devidamente identificado nos autos e sujeito à medida de coacção de prisão preventiva desde 20 de Novembro de 2014, foi submetido a julgamento por tribunal de júri pronunciado pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131º, 132º, n.ºs 1 e 2, alíneas b), e) e j) do Código Penal e de um crime de sabotagem informática, previsto e punido pelo artigo 5º, n.º 2 da Lei nº 109/2009 de 15 de Setembro (Lei do Cibercrime), em concurso ideal com um crime de dano informático, previsto e punido pelo artigo 4.º, n.º 1 da mesma Lei.

C... , devidamente identificada nos autos, mãe da falecida vítima do imputado crime de homicídio, B... , constituiu-se assistente.

Os pais da citada vítima, D... e C... , devidamente identificados nos autos, deduziram contra o arguido pedido de indemnização cível, por danos patrimoniais na quantia líquida de € 3.575,00 e em quantia a liquidar em execução de sentença.

E... e F... , filhas do arguido e da referida vítima, devidamente identificadas nos autos, por si e na qualidade de legítimas e universais herdeiras de sua mãe, representadas pelos seus avós maternos (os supra referidos demandantes) deduziram contra o arguido pedido de indemnização cível, pugnando pela sua condenação, no pagamento global de € 480.265,22, por danos patrimoniais e não patrimoniais.


1º Recurso Interlocutório


O arguido apresentou contestação escrita e arrolou diversos meios de prova por requerimento que consta de fls. 2230 a 2238 (meios de prova a fls. 2271 a 2238).

Por despacho proferido em 20 de Outubro de 2015 o Mmº Juiz indeferiu parcialmente as diligências de prova requeridas pelo arguido na referida peça processual.

Inconformado com o teor desse despacho, dele interpôs recurso o arguido, condensando a respectiva motivação nas seguintes conclusões:

1. O arguido apresentou a sua contestação.

2. A contestação pode ser acompanhada do rol de testemunhas assim como da indicação do dever de notificar peritos e consultores técnicos para comparecerem em audiência.

3. O juiz-presidente, com o devido respeito, não dispõe de qualquer poder para admitir ou recusar a convocação das testemunhas, dos peritos e dos consultores técnicos.

4. Na audiência de julgamento, a prova é produzida conforme o disposto na alínea e) do artigo 341 °, no artigo 348º e no artigo 350° do CPP.

5. O arguido faz acompanhar com a sua contestação o rol de testemunhas, conforme o n° 1 do artigo 315° do CPP.

6. No julgamento, são admitidas todas as provas que não forem proibidas por lei conforme o artigo 125° do CPP.

7. Não cabe ao juiz-presidente filtrar a prova, afastando aquela que decide não dever ser produzida.

8. A alínea f) do nº 3 do artigo 283º do CPP distingue entre a prova a produzir e a prova a requerer.

9. A prova a requerer não está sujeita a indeferimento.

10. O arguido na sua contestação indica provas, oferece provas, que não estão sujeitas ao crivo da análise sobre a sua pertinência, por parte do juiz-presidente, que não elabora nenhuma triagem sobre as diligências probatórias,

11. O princípio da igualdade de armas entre o Ministério Público e o arguido tem de ser respeitado.

12. A igualdade de armas está bem presente no artigo 341.º do CPP, que trata o Ministério Público e o arguido da mesma forma quando refere:

- “apresentação dos meios de prova indicados pelo Ministério Público”

13. Não é afastado ao arguido o direito de oferecer outras provas que sejam admitidas por lei, conforme o artigo 125.º do CPP.

14. O arguido indica as provas que são produzidas, pura e simplesmente, sem mais.

15. Não deve haver indeferimentos, triagens, filtragens, seleções ou recusas das provas a produzir e indicadas pelo arguido.

16. Os meios de prova apresentados no decurso da audiência são submetidos ao princípio do contraditório, conforme o disposto no n.º 2 do artigo 327.º do CPP.

17. O Tribunal errou ao não apreciar a utilidade da prova oferecida pelo arguido na sua contestação.

18. A prova indicada na contestação é compatível com o suposto dever de apreciar utilitariamente os meios de prova e de obtenção de prova

19. O objeto do processo não é determinado pelo tribunal, mas sim pela acusação e pela defesa conforme o n.º 4 do artigo 339.º do CPP, sendo que, a prova indicada pela acusação e pela defesa tem que ser útil para o objeto que por elas é escolhido.

20. O Meritíssimo Juiz a quo errou em recusar a utilidade das provas indicadas pelo arguido.

21. Cada uma das provas apresentadas pelo arguido tem extrema importância a nível de conexão com o objeto do processo.

22. Porque viola o nº 1 do artigo 32° da constituição, a norma ínsita no nº 3 do artigo 315° do código de processo penal é inconstitucional) quando interpretada no sentido de que apenas permite que o arguido apresente um rol de testemunhas e indique peritos e consultores técnicos, podendo meramente sugerir outros meios de prova que serão ou não admitidos pelo juiz-presidente.

23.Normas jurídicas violadas:

- Da Constituição: - n.º 1 artigo 32.º.

Do Código de Processo Penal:

- n.º 4 do art. 187.º

-n.º 1 do artigo 150.º

- alínea f) do n.º 3 do artigo 283.º

- alínea b) do n.º 2 do artigo 284.º

- n.º 2 do artigo 308.º

- n.º 3 do artigo 315.º

- alínea a) e e) do artigo 341.º

- artigo 348.º

- artigo 350.º

- artigo 355.º do CPP.

23.Termos em que requer a revogação do despacho recorrido, ordenando-se a produção de prova indicada pelo arguido na sua contestação.

O recurso foi objecto de despacho de admissão a fls. 3261.

O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo o seguinte:

1 - Por douto despacho proferido a 20.10.2015, o Senhor Juiz Presidente admitiu as diligências requeridas pelo arguido, em sede de contestação, que considerou com utilidade para o objeto do julgamento e indeferiu as diligências e perícias que, pela forma como foram requeridas, considerou terem natureza meramente dilatória, irrelevantes ou supérfluas, inadequadas aos fins visados, de obtenção impossível ou muito duvidosa.

2 - O Senhor Juiz Presidente fundamentou, com rigor e correção, o indeferimento das diligências requeridas na contestação que decidiu não admitir.

3 - Compete ao Juiz Presidente a apreciação formal e utilitária da prova a requerer indicada pela acusação e pela contestação, devendo indeferir as diligências irrelevantes ou supérfluas, inadequadas ao fim pretendido, de obtenção impossível ou muito duvidosa ou meramente dilatórias, em conformidade com o disposto no n.º 4, do art. 340º, do Código de Processo Penal.

4 - O despacho recorrido assegurou ao arguido as garantias de defesa que lhe são constitucional e legalmente reconhecidas, pois que, deferiu a realização de todas as diligências requeridas pelo arguido que se apresentavam formalmente úteis para a prova ou infirmação dos factos vertidos quer na pronúncia quer na contestação.

5 - Não foi violado qualquer imperativo legal ou constitucional.

Assim sendo, entendemos que a douta decisão recorrida não enferma de qualquer vício nem censura, pelo que, deverá sem integralmente mantida.

Termos em que deverá o recurso ser julgado improcedente, nos termos acima expostos.    Assim se fazendo JUSTIÇA.

A assistente respondeu ao recurso, concluindo o seguinte:

1. O douto despacho recorrido que indeferiu algumas diligências de prova requeridas em sede de Contestação, é claro e linear na sua elaboração, não enfermando de qualquer vício ou ilegalidade que possa inquiná-lo e fundamentar a sua revogação, sendo por isso injusta a censura que lhe é dirigida pelo Recorrente.

2. O recurso interposto pelo Recorrente reporta-se a uma decisão interlocutória que indeferiu algumas diligências de prova requeridas pelo Arguido na Contestação, pelo que o mesmo deve ser sujeito ao regime de subida diferida, a subir com o recurso que vier a ser interposto da decisão final.

3. A nossa lei penal apenas faz subir os recursos cuja utilidade se perderia em absoluto se a sua subida fosse deferida, evitando-se, dessa forma um atropelo da normal tramitação de um processo com sucessivos envios ao Tribunal da Relação para apreciação de meras decisões interlocutórias, como é o caso dos presentes autos.

4. No caso concreto, foram observados no despacho recorrido todos os direitos de defesa do arguido, por reporte ao objeto dos autos, ressalvando-se inclusive a possibilidade de, em face da prova que se for produzindo e do decurso da audiência de julgamento, poderem ser, como aliás já foram, mobilizados novos meios de prova e de obtenção de prova que se reputem necessários à boa decisão da causa.

5. Porque no caso em apreço a retenção do recurso interposto pelo Recorrente não o torna absolutamente inútil, deve o mesmo subir nos próprios autos, a final com o eventual recurso que venha a ser interposto da decisão que tiver posto termo à causa (n.º 3, do art.º 407.º do CPP), e com efeito devolutivo.

6. Apesar de não ser a fase de apreciação de prova, bem andou o Mmo. Juiz Presidente ao entender que sobre ele impendia o dever de apreciar, formal e utilitariamente, os meios de prova e de obtenção de prova requeridos pelos sujeitos processuais, tendo por base o objeto do processo, ressalvando que qualquer pedido de produção de prova ou exame de meios de prova deve ser acompanhado da respectiva justificação, o que impunha à parte requerente o dever de indicar o(s) facto(s) que se pretende(m) provar.

7. Teve ainda o cuidado de referir que o Tribunal apenas pode atender às diligências probatórias que, atenta a forma como são formuladas, lhe permitem razoavelmente aferir do facto que as mesmas pretendem provar ou infirmar, uma vez que a maioria das diligências requeridas pelo Arguido se não mostravam justificadas.

8. Ficou ainda consignado no despacho recorrido que, no que respeita às diligências probatórias, no decurso de audiência de julgamento, atenta a prova que se for produzindo o Tribunal sempre terá a possibilidade de determinar as diligências de prova que reputar necessárias ao apuramento da verdade material,

9. O que efectivamente tem vindo a fazer na sequência de novos requerimentos do Arguido com vista à realização de outras diligências de prova que não havia requerido em sede de contestação, bem como de outras que já havia requerido mas agora com outro fundamento (de que é exemplo a reconstituição dos factos e a exumação do cadáver), os quais aguardam apreciação do Tribunal.

10. Se por um lado o Arguido defende que o Juiz Presidente não pode apreciar a utilidade ou inutilidade da prova oferecida na contestação; por outro, defende que o Tribunal errou ao não apreciar a utilidade da prova oferecida por si na Contestação (vide conclusão 17). Então, em que ficamos? O Tribunal não podia ter apreciado a utilidade da prova ou podia mas errou ao não apreciar a sua utilidade?

11. O juiz Presidente tem o poder-dever de, no momento em que recebe a Acusação e a Contestação - portanto, antes da realização do julgamento -, apreciar o requerimento de prova que dela conste, porquanto o disposto no art. 340.º do Código de Processo Penal vale, por interpretação extensiva, para efeitos de admissão de meios de prova antes ou fora da audiência de julgamento e, designadamente, apreciação dos requerimentos de prova juntos às contestações (Cfr. anotação 7 ao art.º 340.º do CPP, Comentário do Código de Processo Penal, Paulo Pinto de Albuquerque).

12. O Mmo. Juiz Presidente podia e devia pronunciar-se ainda antes da abertura da audiência de julgamento sobre as inúmeras diligências de prova requeridas pelo Arguido, sem que com isso tivesse violado qualquer direito de defesa do Arguido.

13. Ao Juiz Presidente compete, em acto prévio ao julgamento ou no decurso do mesmo, apreciar a utilidade das diligências probatórias requeridas tendo sempre por base o objecto do processo, desde logo, para evitar a realização de actos inúteis ou proibidos, não se circunscrevendo tal poder­-dever à prova requerida pelo Arguido, mas também à requerida pelo Ministério Público e pelo Assistente.

14. O Tribunal recorrido decidiu exemplarmente, deixando bem claro no despacho que admitiu o recurso interposto “que o ordenamento jurídico-processual português não é compatível com uma admissão irrestrita e acrítica de toda a prova que ao arguido ocorra indicar ou requerer em sede de contestação, tendo sido observados no despacho recorrido todos os direitos de defesa do arguido, por reporte ao objeto dos autos ... (sublinhado nosso).

15. O Tribunal apreciou de forma exaustiva o seu requerimento de prova, tendo deferido todas as diligências relativamente às quais foi possível antever alguma utilidade para a descoberta da verdade material e para a boa decisão da causa, indeferindo outras por as considerar supérfluas, irrelevantes, inadequadas para o fim pretendido, de obtenção impossível ou muito duvidosa ou com finalidade meramente dilatória, tudo de acordo e com respeito pelo disposto no art. 340.º do CPP.

16. Assegurou, dessa forma, todas as garantias de defesa que são constitucional e legalmente reconhecidas ao Arguido.

17. O que motivou que o Mmo. Juiz Presidente deferisse ou indeferisse as diligências probatórias por requeridas pelo Arguido teve por base a fundamentação que consta da sua Contestação, pelo que no mesmo está naturalmente impedido, nesta fase, de "reparar" o seu requerimento de prova, com vista a obter o seu deferimento.

18. O Tribunal recorrido não violou qualquer imperativo legal ou constitucional, pelo que carece de fundamento a pretensão do Recorrente,

Termos em que, nos termos e com os fundamentos supra alegados, negando provimento ao recurso interposto pelo Arguido A... , por manifesta improcedência dos seus propósitos, mantendo incólume e reafirmando o Despacho recorrido de 20.10.2015 no que respeita ao indeferimento de algumas diligências probatórias requeridas na Contestação,

Fará esse Venerando Tribunal a Costumada JUSTIÇA!



(....)

6º Recurso Interlocutório

Em 8 de Fevereiro de 2016 o arguido apresentou requerimento constante de fls. 3830 a 3836 em que requer que da acta constem todos os relacionamentos que a testemunha H... manteve com o arguido, mormente os mal sucedidos, os serviços que prestou como advogado e as quantias cobradas nessa qualidade a vendedores e compradores de imóveis, na qualidade de circunstâncias relevantes para avaliar a credibilidade do depoimento, que o depoimento da testemunha prossiga presencialmente no Tribunal da Guarda e que seja declarada a invalidade da prova testemunhal de H... por violação do dever imposto pelo artigo 92º do EOA.

Por despacho exarado na acta da sessão da audiência de julgamento do dia 10 de Fevereiro de 2016 o Tribunal decidiu indeferir o requerido.

Inconformado recorreu o arguido, condensando a respectiva motivação nas seguintes conclusões:

 1. O arguido interpôs requerimento, inicialmente enviado por fax e constante de fls. 3830 a 3836, que atualmente consta em fls. 3897 a 3903.

2. O arguido requereu que da ata constem especificadamente, todos os relacionamentos a nível pessoal ou profissional, que a testemunha H... manteve com o arguido.

3. O arguido requer que o depoimento da testemunha H... prossiga presencialmente, no Tribunal da Guarda.

4. O arguido requer que seja declarada a invalidade da prova testemunhal, conforme o dever imposto pelo artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

5. O testemunho do Il. Dr. H... não devia ser realizado por meio de teleconferência, uma vez que, não apresentou motivos graves que impedissem a sua deslocação.

6. A deslocação da testemunha ao Funchal, em trabalho não constitui fundamento suficiente para deixar de cumprir a convocatória judicial.

7. O dever de testemunhar sobrepõe-se ao trabalho e, quem presta depoimento, não vai trabalhar.

8. O Tribunal indeferiu o requerido, condenando o arguido em custas de incidente anómalo, fixadas em 1 UC, conforme o exposto no n.º 1 do artigo 513.º do Código de Processo Penal e n.º 4 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais.

9. O Tribunal errou ao proferir a douta decisão recorrida, uma vez que o requerimento interposto pelo arguido não visava finalidades meramente dilatórias nem o protelamento do normal curso do processo.

10. A condenação em custas só existe se existir condenação em primeira instância, aplicando-se uma única taxa de justiça, sucedendo a final, conforme disposto no artigo 513.º do Código de Processo Penal.

11. O regime de custas em processo penal encontra-se expressamente previsto no disposto nos artigos 513.º a 524.º do Código de Processo Penal e no artigo 8.º, conjugado com a tabela III, do Regulamento das Custas Processuais.

12. O Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, com o Relator António João Latas, datado de 20 de janeiro de 2015, decidiu que:

“A tributação da atividade processual anómala não deve ser abrangida pela tributação própria do processo, mas que pela sua relevância e autonomia, deva ser tributada (em taxa a fixar entre 1 e 3 UC) de acordo com os princípios da causalidade ou do proveito, com a tributação punitiva ou sancionatória da atividade manifestamente injustificada e negligente, cuja taxa de justiça será fixada entre 2 e 15 UC nos termos do 10.º do RCP:,.

13.A testemunha deveria ter sido convocada, pela forma mais expedita, para comparecer no Tribunal da Guarda e aí prestar o seu depoimento, de forma presencial, dando-se cumprimento ao disposto no n ° 3 do artigo 318.º do CPP.

14. Entre a testemunha e o arguido existia um relacionamento profissional.

15. A testemunha Dr. H... , no âmbito da sua profissão, tem de agir em conformidade com o artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

16. O arguido está ciente de que o contra-interrogatório das testemunhas de defesa pelo MP seguirá um critério exigente.

17. Está em causa a credibilidade do depoimento enquanto menção das relações profissionais.

18. O Tribunal entende que:

“se a testemunha, em algum momento do seu depoimento, incorrer na violação do estatuído, entre outros, no artigo 92° do EOA, não deixará de extrair as necessárias consequências, máxime ao nível da proibição de valoração do depoimento nessa parte”.

19. Um advogado indicado como testemunha e admitido a prestar o seu depoimento deve recusar prestar o seu depoimento, conforme o dever que lhe é imposto pelo artigo 92° do EOA.

20. O arguido quando arrolou a testemunha na sua contestação, não sabia que a mesma teria sido eleita como advogado da assistente e do demandante.

21. Com efeito, a testemunha tem como função e como dever a comunicação ao Tribunal de todos os factos sobre que seja interrogada e de comunicá-los em termos totalmente isentos e objetivos.

22. Contrariamente ao que o douto Tribunal decidiu, as perguntas sobre a vida do arguido e da falecida em Faro e em Vilamoura, elaboradas pelo IL Defensor do arguido, são legalmente admissíveis.

23. O Exmo. Juiz-presidente tem o poder de impedir a formulação de perguntas legalmente inadmissíveis, conforme o disposto na alínea f) do artigo 323.º do CPP.

24. A decisão do Tribunal a quo acerca desta matéria não foi devidamente fundamentada, conforme o n.º 5 do artigo 97.º do CPP.

25.As perguntas eram legalmente admissíveis.

26. É essencial apurar qual o relacionamento profissional entre o arguido, a testemunha, a ofendida e a empresa K... .

27.A ofendida trabalhava no escritório da testemunha H... , onde ganhava mensalmente cerca de €1 000,00 brutos, o que resultava em aproximadamente €700,00 líquidos.

28. As relações profissionais entre o arguido e a testemunha H... , nunca teve consequências nas ligações entre a ofendida e a testemunha H... .

29. A testemunha H... é indispensável para refutar todos os factos que apontam ao arguido um caráter violento, controlador e possessivo, assim como um relacionamento que se foi sucessivamente degradando.

30. As testemunhas depõem sobre o que constitui objeto da prova e de que tenham conhecimento direto (n.º 1 do artigo 128.º do CPP).

31. Constituem objeto da prova todos os factos juridicamente relevantes para a existência de crime e determinação da pena (n.º 1 do artigo 124.º do CPP).

32. Os factos alegados na pronúncia integram o objeto do processo (n.º 4 do artigo 339.º do CPP).

33.Ao abrigo do n.º 2 do artigo 411.º do CPP, é passível de recurso a decisão que indeferiu a formulação de perguntas que a lei admite.

34. Porque viola o n.º 1 do artigo 32.º da constituição, as normas ínsitas na alínea f) do artigo 323.º e no n.º 1 do artigo 513.º do Código de Processo Penal e n.º 4 do artigo 7.º do Regulamento das Custas Processuais são inconstitucionais, quando interpretadas no sentido de que o douto Tribunal, errou ao considerar que as perguntas são legalmente inadmissíveis, não fundamentando o Exmº Juiz­ Presidente acerca desta matéria, como é obrigatório conforme o n.º 5 do artigo 97.º do CPP, condenando o arguido nas custas de incidente anómalo fixadas em 1UC.

35. Normas jurídicas violadas:

- Da Constituição: - n.º 1 artigo 32.º.

Do Código de Processo Penal:

- n.º 5 do artigo 97.º

- alínea e) do n.º 3 do artigo 99.º

- n.º 1 do artigo 124.º

- artigo 125.º

- n.º 1 do artigo 128.º

- n.º 3 do artigo 138.º

- n.º 3 do artigo 318.º

- alínea f) do artigo 323.º

- n.º 4 do artigo 339.º

- n.º 3 do artigo 348.º

- n.º 1 do artigo 513.º

- artigo 524.º

Do Estatuto da Ordem dos Advogados:

- artigo 92.º

Do Regulamento das Custas Processuais:

- n.º 4 do artigo 7.º

- n.º 8 do art. 7.º

Termos em que devem ser revogadas as decisões que ora se impugnam, por via de recurso.

O Recurso foi admitido por despacho exarado a fls. 5037.

O Ministério Público respondeu ao recurso interposto, concluindo o seguinte:

1 - As conclusões de recurso estão assinadas por uma Advogada Estagiária que não tem poderes de representação do arguido e não foram ratificadas pela pessoa em nome quem o ato foi praticado (o arguido), nos termos do disposto nos artigos 268º, n.º 1, 465º e 471 º, todos do Código Civil), o que deverá conduzir ao indeferimento do recurso.

2 - A parte do recurso em que vem recorrer de uma advertência efetuada pelo Mmo. Juiz Presidente, no decurso da inquirição da testemunha levada a cabo pelo Ilustre Defensor do arguido, em nosso entender, não deve ser admitida, por se tratar de uma atuação no âmbito dos poderes de direção e disciplina da audiência, com o qual o recorrente se conformou, pois que, nesse conspecto, o recorrente não desencadeou uma efetiva decisão do Tribunal.

3 - O arguido/recorrente não tem interesse em agir na parte do recurso em que vem recorrer da decisão que relegou para momento posterior a apreciação da alegada invalidade do depoimento da testemunha H... , na medida em que não foi proferida decisão contra pretensão do recorrente.

4 - A douta decisão que indeferiu que da ata passassem a constar outras especificações, relativamente às alegadas e não comprovadas relações da testemunha com o arguido, e indeferiu que a continuação do depoimento da testemunha H... seja prestado presencial na Comarca da Guarda apresenta-se devidamente fundamenta e não viola qualquer preceito legal.

5 - O arguido/recorrente com o seu requerimento, junto a fls, 3830 a 3826, desencadeou uma tramitação do processo desnecessária, pois que a questão da inquirição da testemunha por videoconferência já estava decidida no processo, não existia qualquer fundamento para requerer a invalidade da prova e constituiu um incidente anómalo e autónomo que deve ser tributado em custas, nos termos do n.º 4 e 8, do art. 7°, do Regulamento das Custas Processuais.

Assim sendo, entendemos que as doutas decisões recorridas não enfermam de qualquer vício, não violam qualquer das disposições legais indicadas no recurso nem merecem censura, pelo que, devem sem integralmente mantidas.

Termos em que deverá o recurso ser julgado improcedente, nos termos acima expostos. Assim se fazendo JUSTIÇA.

A assistente respondeu ao recurso, concluindo o seguinte:

1. As decisões ora colocadas em crise pelo Arguido encontram-se devidamente fundamentadas (de facto e de direito), não padecendo de qualquer vício ou ilegalidade, sendo injusta e infundada a censura que lhe é dirigida pelo Recorrente, pelo que devem ser mantidas na íntegra.

2. No caso em apreço a retenção do recurso interposto pelo Recorrente não o torna absolutamente inútil - já que se reporta a decisões interlocutórias que indeferiram um conjunto de pretensões do Arguido - pelo que bem andou o Tribunal a quo ao ter decidido que o mesmo deve subir nos próprios autos, a final com o eventual recurso que venha a ser interposto da decisão que tiver posto termo à causa (n.º 3, do art.º 407. º do CPP), e com efeito devolutivo.

3. A ratificação das conclusões apresentadas que consta dos autos não foi subscrita pelo Arguido, mas sim pelo seu Defensor, pelo que, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 268.º do Código Civil, a mesma não pode produzir quaisquer efeitos.

 4. Tendo as conclusões apresentadas sido subscritas por Advogada Estagiária, sem procuração nos autos, e não tendo o acto de ratificação sido subscrito pelo próprio Arguido (pessoa em nome da qual o acto foi praticado), estas não poderão ser admitidas o que, consequentemente, deverá conduzir ao indeferimento do recurso, ao abrigo do disposto na al. b) do n.º 1, do art.º 420.º do CPP.

5. O Tribunal não impediu à Defesa de formular novas questões à testemunha H... , sequer proferiu qualquer decisão, antes fez várias advertências ao Defensor do Arguido no sentido deste cingir as suas perguntas ao objecto do processo.

6. Não estando perante uma verdadeira decisão, antes e tão só perante uma advertência que deve ser equiparada a um acto de mero expediente irrecorrível ao abrigo do disposto na al. a) do n.º 1 do art.º 400. 0 do CPP, já que visou assegurar o prosseguimento normal dos trabalhos.

7. Mesmo a entender-se que a posição assumida pelo Tribunal reveste a natureza de acto decisório, nenhuma censura é de apontar à sua actuação que encontra o seu fundamento no poder/ dever de direcção e disciplina da audiência de julgamento e tem enquadramento legal no art.º 323.º do CPP.

8. Não tendo o Tribunal deferido ou indeferido qualquer pretensão da Defesa, pois que não decidiu contra qualquer pretensão do Recorrente no que toca ao pedido da alegada invalidade do depoimento de H... , antes relegou a sua apreciação para momento ulterior, carece o Arguido de legitimidade e de interesse legal em agir para, do mesmo, interpor recurso, o qual deverá, sem mais, ser rejeitado nos termos do disposto nos artigos 414.º, n.0 2 (falta de condições necessárias para recorrer) e 420. º, n.0 1, al. b) do Código de Processo Penal.

9. Resulta claramente do teor da oposição à continuação do depoimento da testemunha H... por videoconferência a partir de um Tribunal diferente daquele onde se iniciou a sua inquirição, que a intenção da Defesa era, mais uma vez, protelar o normal andamento do julgamento, pelo que bem andou o Tribunal ao ter indeferido a sua pretensão através de despacho fundamentado.

10. O requerimento da Defesa de fls. 3830 a 3836 constituiu, de facto, um incidente anómalo e perturbador do normal decurso da audiência, já que o Defensor do Arguido bem sabia que a sua pretensão era desprovida de qualquer fundamento e iria causar actividade processual escusada, pelo que nenhuma censura é de apontar à decisão do Tribunal de o ter condenado em custas, o que aliás, se impunha!

11. Não tem aplicação o disposto no art. 513.º do CPP, na parte em que refere que apenas há lugar ao pagamento da taxa de justiça quando ocorra condenação em 1.ª instância, porquanto está em causa a condenação do Recorrente em custas pelo incidente anómalo a que deu lugar e não a sua condenação em taxa de justiça.

12. O Tribunal recorrido, que decidiu de forma fundamentada, tanto de facto como de direito, nos vários despachos que proferiu em julgamento no dia 10.02.2016, não violou qualquer imperativo legal ou constitucional - designadamente os invocados na motivação -, pelo que carece de fundamento a pretensão do Recorrente.

VI - Do Pedido

Nestes termos e nos melhores de Direito que W. Exas. doutamente suprirão, deve:

a) Serem indeferidas as conclusões apresentadas por falta de ratificação pelo Arguido e, consequentemente, ser rejeitado, sem mais, o recurso interposto por este nos termos da alínea b), do n.º 1 do art.º 420.º do Código de Processo Penal,

Ou quando assim se não entender,

b) Ser rejeitado o recurso interposto pelo Arguido na parte em que se limitou a advertir o Defensor a cingir a sua instância ao objecto do processo, por se tratar de um acto de mero expediente irrecorrível nos termos da alínea a), do n.º 1 do art.º 400.º do Código de Processo Penal,

Ou quando assim se não entender,

a) Ser rejeitado o recurso interposto pelo Arguido no que toca ao pedido da alegada invalidade do depoimento de H... , por falta de legitimidade e de interesse legal em agir, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 414.º do Código de Processo Penal,

Sempre e em qualquer caso,

b) Ser negado provimento ao recurso Interposto pelo Arguido A... , por manifesta improcedência dos seus propósitos, mantendo incólumes e reafirmando as doutas decisões proferidas em acta de julgamento no dia 10.02.2016,

Por essa forma fazendo esse Venerando Tribunal a Costumada JUSTIÇA!

(….).

Nesta Relação o Exmº Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos.

Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos legais teve lugar audiência de julgamento a requerimento do recorrente, cumprindo apreciar e decidir.


***

II. Fundamentação – Apreciação dos Recursos

(….).

Vistas as conclusões dos recursos interpostos, as questões que reclamam solução são as seguintes:

1º Recurso Interlocutório

- Se os meios de prova cuja produção se requer na contestação, sejam de natureza testemunhal ou por declarações de peritos e consultores técnicos, sejam de outra natureza, não estão sujeitos a apreciação utilitária nos termos do artigo 340º do Código de Processo Penal, não podendo ser objecto de indeferimento;

- Se os meios de prova indicados na contestação e indeferidos eram úteis à descoberta da verdade e deviam ser admitidos.

- Se ocorre interpretação inconstitucional do artigo 315º, nº 3 do Código de Processo Penal;

6º Recurso Interlocutório

(….).

- Se não se verificam os pressupostos de condenação do arguido em custas de incidente anómalo;

- Se o despacho recorrido peca por falta de fundamentação no que respeita a condenação em custas;

- Se ocorre interpretação normativa inconstitucional dos artigos 323º, alínea f), 513º, nº 1 e 7º, nº 4 do R.C.P.;

(….).

Apreciando os recursos:

1º Recurso Interlocutório

O inconformismo do arguido começa por manifestar-se em recurso de despacho que indeferiu diligências probatórias que requereu na sua contestação.

O despacho recorrido é do seguinte teor:

Das diligências probatórias requeridas pelo arguido,

As múltiplas diligências probatórias vertidas em sede de contestação apresentada pelo arguido convocam-nos a consignar duas notas prévias à sua apreciação, sendo certo que relativamente às testemunhas, esclarecimentos periciais e indicação de consultores técnicos o Tribunal já se pronunciou em despacho de fls. 2300 a 2302.

A primeira, na esteira aliás do expendido pela assistente, vai no sentido de que “…qualquer pedido de produção ou exame de meios de prova ou de meios de obtenção de prova deve ser acompanhado da respetiva justificação, isto é, do facto que se pretende provar, para os efeitos do artigo 340º, nº 4. É assim durante a audiência e também na contestação” (cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do CPP”, Univ. C.P., 3ª Ed., pág. 806).

Neste sentido, aliás, entendeu o tribunal convidar o arguido a esclarecer em conformidade com o vertido no despacho de fls. 2300 a 2302.

A segunda para relembrar que não sendo esta a fase de apreciação da prova, impende sobre o presidente o dever de apreciar, formal e utilitariamente, os meios de prova e de obtenção de prova requeridos pelos sujeitos processuais, tendo por base o objeto do processo.

Dito isto, importa reter que, relativamente ao rol de diligências probatórias requeridas pelo arguido (assim como pelo assistente mais adiante), e tendo em conta que muitas delas não se mostram justificadas nos termos sobreditos, o tribunal apenas poderá atender àquelas que, atenta a forma como são formuladas, lhe permitam razoavelmente aferir do facto que com as mesmas pretendem provar ou infirmar.

Uma vez cumprido o contraditório neste particular, seja junto da assistente, seja junto do Ministério Público, apreciemos, então, cada uma de per se:

1.

»Obtenção das mensagens de texto (SMS) e multimédia (MMS) enviadas dos números (...) e (...) (utilizados pela ofendida) para os números (...) e (...) (utilizados por D... ), (...) (utilizado por C... ) e (...) (utilizado por J...) e destes quatro para aqueles (...) e (...) (utilizados pela ofendida), desde 15 de março de 2014 a 18 de novembro de 2014.

»Obtenção das mensagens de texto (SMS) e multimédia (MMS) enviadas pelos números (...) e (...) (utilizados pela ofendida) para os números (...) e (...) (utilizados por L... ) e destes dois para aqueles (...) e (...) (utilizados pela ofendida), desde 15 de março de 2014 a 18 de novembro de 2014.

»Obtenção das mensagens de texto (SMS) e multimédia (MMS) enviadas do número (...) (utilizado pela ofendida) para o número (...) (utilizado pelo arguido) e entre este e aquele, desde 1 de julho de 2013 a 18 de novembro de 2014.

»Obtenção das mensagens de texto (SMS) e multimédia (MMS) enviadas do número (...) (utilizado pela ofendida) para o número (...) (utilizado por I... ) e entre este e aquele, desde 1 de julho de 2013 a 18 de novembro de 2014.

»Obtenção das mensagens de texto (SMS) e multimédia (MMS) enviadas e recebidas no número (...) (utilizado pela ofendida) entre 29 de março de 2014 e 1 de abril de 2014.

É comummente aceite que estes meios de obtenção de prova assumem uma elevada relevância no plano jurídico-constitucional, uma vez que está em causa a danosidade social, concretamente, o direito à reserva da intimidade privada e o direito à inviolabilidade das comunicações (nesse sentido, COSTA ANDRADE, “Sobre o regime processual penal das escutas telefónicas”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano I, Fasc. 3, Julho-Setembro 1991, pp. 380-382).

Assim, considerando o melindre da matéria em causa, deverá ter-se em conta o plasmado no nº 4 do artigo 34º da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual: É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência e nas telecomunicações, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.”

Ademais, como forma de obviar a violação do preceito invocado, o nº.8 do artigo 32º do mesmo diploma legal, dispõe ainda que: “São nulas todas as provas obtidas mediante (…) abusiva intromissão (…) nas telecomunicações”.

O art.º 34.º, n.º 4 da CRP remete para a lei processual penal a definição dos casos em que é admitida a ingerência nas telecomunicações e demais meios de comunicação, excecionalmente admitida no art.º 18º da CRP.

Resulta do art.º 187.º, do Código de Processo Penal que o juiz pode ordenar a interceção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas, se houver razões para crer que tal diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter.

Por via do artigo 189º do diploma citado, desde que estejam em causa os crimes previstos no nº 1 do artigo 187º Código de Processo Penal, os pressupostos deste artigo aplicam-se também às situações ali plasmadas (conversações ou comunicações feitas por qualquer meio, como por exemplo, o correio eletrónico ou outras e bem assim, a obtenção e junção de dados sobre a localização celular ou dos registos de realização de conversações ou comunicações).

A obtenção e junção aos autos de dados sobre localização celular ou de registos da realização de conversações ou comunicações só podem ser ordenadas ou autorizadas, em qualquer fase do processo, por despacho do juiz, quanto a crimes previstos no n.º 1 do artigo 187.º e em relação às pessoas referidas no n.º 4 do mesmo artigo.

Já em sede de instrução se havia considerado que no caso vertente e por reporte a mensagens alegadamente enviadas pela ofendida, estávamos fora do âmbito legalmente permitido pelo n.º 4 do art.º 187º do CPP, atendendo à inexistência de consentimento, efetivo ou presumível, da vítima, pessoa identificada como emissora ou recetora da mensagens cujo teor se pretende ver exposto.

Estamos, pois, em face do concretamente pretendido, fora do âmbito do n.º 4, do artigo 187.º do CPP, e logo, como também aflorado pelo Ministério Público, perante prova legalmente inadmissível.

Ao exposto importa aduzir, conforme salientado na promoção que antecede, que a fls. 507 já foram solicitados à operadora MEO a faturação detalhada de chamadas efetuadas e recebidas, bem como a localização celular das chamadas efetuadas, no período compreendido entre 01.09.2014 e 18.11.2014, do número (...) utilizado pelo arguido A... e do número (...) , utilizado pela vítima B... , tendo a MEO junto tais elementos (cfr. fls. 549) aos autos, os quais foram objeto de tratamento e análise pelo Serviço de Telecomunicações e Informática e pelo Grupo de Análise e Cooperação da Polícia Judiciária, nos termos vertidos nos relatórios juntos de fls. 1172 a 1209 e 1347 a 1381.

Se a esta panóplia de elementos relativos às comunicações telefónicas aduzirmos a circunstância do arguido não ter, ainda que minimamente, circunstanciado factualmente o propósito de tais diligências, não se vislumbra qualquer propósito ou utilidade no seu deferimento.

Indefere-se, assim, a obtenção de tais elementos.

2.

Oficiar à Polícia Judiciária para que esclareça quando foi criado o contacto "M...) no telemóvel do arguido, o registo da marcação da consulta médica para 18 de novembro de 2014.

Tendo em conta a factualidade imputada ao arguido e a circunstância da pessoa em causa estar arrolada como testemunha, não se justificando qual o âmbito factual visado com tal diligência, à mesma não se reconhece ou vislumbra utilidade relacionada com o objeto do processo.

Considerando que do seu deferimento apenas poderia advir dilação e perturbação processual, indefere-se a mesma.

3.

Perícia a deferir à unidade de telecomunicações e informática da polícia judiciária, com o seguinte objeto:

-nos telemóveis utilizados pela ofendida estavam instaladas rotinas informáticas ou programas informáticos maliciosos denominados spyware com a finalidade de registar e transmitir para aparelhos informáticos do arguido e permitir a posterior consulta do histórico de comunicações ou com o objetivo de aceder ao conteúdo de todas as comunicações efetuadas pela ofendida?

-qual a data da instalação dos programas CCleaner e Wise Registry Cleaner Free 5.35?

-qual a data da última utilização dos programas CCleaner e Wise Registry Cleaner Free 5.35?

-em que consistem os programas CCleaner e Wise Registry Cleaner Free 5.35?

-trata-se de um software cuja única finalidade é a eliminação de registos digitais?

-nos computadores apreendidos nos autos foi instalado e feito o download de um programa denominado Wondershare Dr. Fone for iOs? Em que data? Foi utilizado? Em que datas?

-nos computadores apreendidos nos autos existe um ficheiro designado como Mensagens SMS M... e L... ? Qual o respetivo teor?

Já foi salientado em sede de instrução pelo Serviço de telecomunicações e informática da Polícia Judiciária foi realizada uma perícia aos computadores e telemóveis apreendidos nos autos e junto o respetivo relatório (cfr. fls. 1171 a 1208).

Todavia, conforme sublinha o Ministério Público, este relatório não se parece referir aos telemóveis remetidos para exame, pelo que importa solicitar àquele serviço da Polícia judiciária que, em complemento do relatório, responda nos moldes pretendidos pelo arguido.

Entendemos igualmente justificado e relevante oficiar àquele serviço também nos moldes promovidos, no sentido de esclarecerem se in casu:

-seria possível ao arguido aceder aos registos de comunicações efetuadas através dos telefones de B... sem a instalação de um programa informático malicioso no telemóvel da vítima, apenas com programas instalados no seu computador;

-de que forma o arguido poderia ter obtido os registos das comunicações efetuadas através do telemóvel da vítima, que constam de fls. 351 e 351.

4.

Perícia a deferir ao núcleo de investigação de acidentes rodoviários do instituto superior técnico da universidade de Lisboa, com o seguinte objeto:

- os airbags da viatura apreendida nos autos de matrícula (...) UQ encontravam-se em boas condições de funcionamento?

- as janelas dianteiras baixam apenas com um toque no respetivo botão?

- pode esse toque ser acidental, por movimentação do condutor no decurso do acidente?

- o veículo foi empurrado ou encontrava-se em marcha até se imobilizar?

- por que motivo o veículo se imobilizou?

«Reconstituição, com vista a apurar se era possível o arguido ter empurrado a viatura e a mesma seguir deslizando, desgovernada e ficar imobilizada no local onde parou, sem que houvesse capotamento.

Sem prejuízo da prova a produzir em julgamento poder vir a justificar a mobilização de alguma perícia por reporte à dinâmica/estado do veículo, não se justifica, por um lado, em que medida o objeto proposto carece de apreciação pericial, ou a que factualidade se destina.

Com efeito, saber se as janelas dianteiras baixam apenas com um toque no respetivo botão não só não reveste as características inerentes à produção de prova pericial (podendo o arguido obter tal informação junto do fabricante ou importador), como, conforme se já sublinhou em sede instrutória, a resposta a tal questão escapa ao objeto dos autos, uma vez que em lado algum se refere que tenha sido um toque ou mais toques a baixar os vidros.

Por outro lado, saber se “o veículo foi empurrado ou encontrava-se em marcha até se imobilizar” tão pouco parece ser suscetível do juízo técnico, in casu científico, inerente à prova pericial pois, como já se fez constar nos autos, para o veículo se imobilizar teria que estar em marcha, sendo que se não vislumbra em que medida possa uma perícia assegurar se o veículo foi, ou não, empurrado e por quem, cabendo tal conclusão ao Tribunal.

O mesmo se diga quanto a saber “porque motivo o veículo se imobilizou”, bastando visualizar os registos fotográficos para perceber o local onde o veículo parou e os obstáculos que ali existiam.

Tão pouco se alcança, porque não avançada, a razão de ser do apurar se os airbags da viatura apreendida nos autos se encontravam em boas condições de funcionamento, sendo que os mesmos não se mostram acionados, como se alcança do registo fotográfico, e não se lhes imputa qualquer relevância no processo causal, seja na pronúncia, seja na contestação.

Os considerandos acima tecidos são aplicáveis, mutatis mutandis, a propósito da reconstituição pretendida.

Como refere o Ministério Público, dos elementos documentais carreados para os autos resulta que o veículo Opel Zafira saiu da estrada, seguiu pela encosta, sem que tenha existido capotamento ou danos relevantes, e ficou imobilizado no local onde foi encontrado pelas autoridades, junto da vítima mortal.

Neste sentido, a reconstituição do facto para apurar se o veículo podia ter deslizado pela encosta sem capotamento, circunstância relativamente à qual nenhuma das peças processuais alude como tendo ocorrido, constitui uma diligência sem qualquer utilidade para a descoberta da verdade.

Acresce que para que se pudesse fazer uma reconstituição dos factos realmente útil teriam de se reunir elementos e circunstâncias que se desconhecem e não foram aportadas pelo requerente no requerimento em causa, como sejam a velocidade de que ia animado o veículo; quem o conduzia e em que moldes; o local exato em que o automóvel saiu da estrada entre outros.

Ao exposto acrescem dificuldades práticas relacionadas com a necessidade de dispor do veículo no estado em que este se encontrava antes do acidente, de obter as mesmas condições de piso e climatéricas, para além da própria vegetação e envolvência.

Para além do exposto, conforme também se já sublinhou em sede instrutória, estando em causa um local sem qualquer caminho ou percurso pré-definido, a marcha do veículo mostra-se como imprevisível, podendo variar de múltiplos detalhes do relevo, não se alcançando em que medida o seu resultado seria útil à descoberta da verdade material, não se justificando por isso, nos moldes requeridos, a sua realização.

Indefere-se, pois, tal reconstituição.

5.

Perícia a deferir ao instituto nacional de medicinal legal e ciências forenses ou ao laboratório de policia científica da polícia judiciária, com o seguinte objeto:

- a que horas ocorreu a morte da falecida B... ?

- há vestígios hemáticos de sangue nas janelas das portas dianteiras do veículo, nomeadamente nos vidros, nas borrachas e nos feltros?

- o vestuário pertencente ao arguido é compatível com a sua intervenção no acidente como mero passageiro?

-qual a explicação para os padrões de limpeza e de fluxo de fls. 627?

-os vestígios encontrados no vestuário e no calçado da ofendida são compatíveis com uma rotação do corpo efetuada pelo arguido e por G... após o sinistro?

Sendo certo que do relatório de autópsia, junto a fls. 816 e 817, não consta a hora do óbito, resulta do certificado de óbito, junto a fls. 17, que a morte de B... foi confirmada pelas 15 horas, do dia 18.11.2014.

O seu momento aproximado apenas se poderá apurar da conjugação destes com os demais elementos probatórios já recolhidos nos autos, designadamente os indicados pelo Ministério Público, para o que podem contribuir os esclarecimentos a prestar pelos senhores peritos e consultores técnicos já indicados.

Com efeito, os esclarecimentos acima solicitados podem ser formulados aos Srs. Peritos a ouvir nos autos, nos moldes já deferidos, não justificando, de per se, a realização de novas perícias para o efeito.

Note-se que se os mesmos não puderem, naquela ocasião, esclarecer em conformidade com o pretendido, seja por necessitarem de maior estudo, seja por carecerem da realização de exames complementares, tal será então apreciado.

Por outro lado, e como já antes sublinhado nos autos, quanto à existência de vestígios hemáticos de sangue nas janelas das portas dianteiras do veículo (nomeadamente nos vidros, nas borrachas e nas feltros) tal já se mostra aferido nos autos; se o vestuário do arguido é compatível com a sua intervenção no acidente como mero passageiro será conclusão que se não alcança como possa depender de um juízo técnico científico; quanto a saber a explicação para os padrões de limpeza e de fluxo de fls. 627, a resposta já se encontra a fls. 626; e se os vestígios encontrados no vestuário e no calçado da ofendida são compatíveis com uma rotação do corpo efetuada pelo arguido e por G... após o sinistro importa reter que tal poderá ser esclarecido em sede de julgamento, sem carecer de nova perícia.

Acompanhando neste particular o Ministério Público, salientando-se que o pretendido poderá ser esclarecido em sede de audiência de julgamento, não se vislumbra necessidade nestas concretas perícias, pois que o seu propósito poderá ser alcançado nos termos sobreditos, assim se indeferindo.

6.

»Perícia a deferir ao laboratório de polícia científica da polícia judiciária, com o seguinte objeto:

-o calçado da ofendida no dia dos factos apresenta vestígios lofoscópicos, impressões digitais ou palmares?

-tais vestígios encontrados no calçado da ofendida correspondem às impressões digitais ou palmares de G... ?

-há vestígios lofoscópicos no exterior e interior da viatura, mormente na alavanca do travão de parqueamento de mão, na alavanca das mudanças, nos botões na porta do condutor que acionam os vidros das janelas?

-tais vestígios correspondem às impressões digitais ou palmares do arguido?

-onde foram encontrados tais vestígios?

Antes de mais e acompanhando a promoção do Ministério Público neste particular, solicite à Polícia Judiciária que informe se foram recolhidos e preservados elementos que permitam realizar uma perícia com este objeto e, na positiva, proceda em conformidade, dando previamente disso conta nos autos.

7.

Oficiar à Polícia Judiciária para que envie o relatório correspondente à pedra de fls 330.

Importa reter, neste particular, que da pronúncia não consta que tenha sido aquela pedra (ou mesmo com uma pedra) que o arguido desferiu as pancadas, mas sim com um objeto não concretamente determinado.

Não obstante o informado a fls. 329 e 330, no sentido de que “efetuados os exames tidos como necessários à pedra, tais como a pesquisa de vestígios hemáticos, resultaram negativos”, importará esclarecer que exames foram realizados e, a existir um relatório específico sobre tal diligência, o mesmo seja junto aos autos, o que se determina.

8.

Oficiar à Polícia Judiciária para que faça juntar aos autos as publicações "Inspecção Judiciária - Manual de Procedimentos", 1ª edição, Lisboa 2009 e "Terminologia Recomendada", 2011.

Não vislumbrando qual a razão de ser e factualidade visada com esta diligência, para além de não ter sido invocada qualquer causa para a sua não obtenção diretamente pelo arguido, estando em causa “publicações” como o mesmo refere, impõe-se o seu indeferimento, o que se determina.

9.

Oficiar à Polícia Judiciária para que remeta a carta manuscrita pelo arguido entregue à ofendida em 17 de novembro de 2014, cuja cópia digitalizada consta do computador de linha branca apreendido nos autos.

Pese embora se não refira a relevância da aludida carta, sendo que se limita o requerente a fazer uma alusão à mesma a fls. 2239 da contestação, ficando por se saber, como refere o Ministério Público, a razão do arguido ter digitalizado uma carta manuscrita “de amor”, solicite à Polícia Judiciária que proceda à sua junção aos autos, caso a mesma seja localizada no computador referido.

10.

Oficiar à polícia judiciária para fazer juntar aos autos o histórico das pesquisas efetuadas entre 11 e 15 de novembro de 2014 de ambos os computadores apreendidos nos autos.

Por reporte à factualidade alegada na pronúncia e na contestação, caso se mostre viável a sua obtenção, oficie à Polícia Judiciária, em particular junto de quem efetuou o exame aos computadores apreendidos, que proceda em conformidade.

11.

Oficiar à Polícia Judiciária para que junte aos autos as publicações feitas pela ofendida no facebook desde 2013.

Conforme referido pelo Ministério Público e assistente, inexistindo qualquer fundamentação seja dos factos visados com a diligência, seja das suas razões, indefere-se o requerido.

12.

Oficiar à Polícia Judiciária, no sentido de esclarecer:

-significado de GMIC;

-significado de dossier em análise (N 4)

-esclarecimento se a alusão ao presente relatório concerne ao documento de fls 1236-1266 ou a outro diverso desse

-identificação do inquérito referido, designadamente se é o 204/14.JAGRD.

Tendo em vista o esclarecimento cabal de tal informação, oficie à Polícia Judiciária para esclarecer em conformidade.

Prazo: 5 dias.

13.

Oficiar à Polícia Judiciária para que informe a data de instalação de todos os programas inseridos naquele computador.

Inexistindo qualquer fundamentação seja dos factos visados com a diligência, seja das suas razões, estando em causa “todos os programas” o que é manifestamente despiciendo para a factualidade em apreço, indefere-se o requerido.

14.

Oficiar à unidade de saúde familiar de S (...) , para comprovação do que da marcação da consulta médica do arguido no dia dos factos.

Atendendo ao teor da contestação neste particular e pese embora se não indique qual a causa da impossibilidade do arguido em obter tal comprovativo, oficie junto daquele Centro de Saúde no sentido de proceder à informação em causa e da data do seu agendamento, devendo esclarecer a identidade de que requereu a sua marcação.

Prazo: 10 dias.

15.

Oficiar à Polícia Judiciária para que esclareça se houve exames lofoscópicos realizados na viatura e, no caso de os mesmos não se terem realizado, ordenar para que sejam feitos procedendo a comparação com as impressões digitais do arguido.

Resulta do inquérito que foram realizados exames lofoscópicos na viatura e os seus resultados estão juntos aos autos pelo que se não compreende o requerido neste particular.

Para além disso, e como já feito constar nos autos, do teor da sua contestação não se alcança que o arguido negue que fosse na viatura; que não tivesse mexido na mesma, sendo que ao ser um dos utilizadores da viatura é perfeitamente natural que a mesma tenha impressões digitais suas.

Atento o exposto, indefere-se o requerido.

16.

Oficiar à PT, à EDP e ao IPMA, para das falhas de eletricidade e a este último quanto ao índice cerâunico.

Inexistindo qualquer fundamentação seja dos factos visados com a diligência, seja da sua razão de ser, nem sequer estando temporal ou espacialmente balizado o pretendido, indefere-se o requerido.

Importa aduzir que tão pouco nada é referido no sentido de que a PT, a EDP e o IPMA se tenham recusado a informar o supra solicitado, sempre podendo o arguido requerer diretamente às entidade competentes o ora solicitado, uma vez que não há recusa e o próprio poderá solicitar tais dados que lhe digam respeito.

17.

Obtenção da faturação detalhada de todas as chamadas telefónicas de voz, texto e MMS do dia 2 de março de 2014, a partir do telefone da ofendida.

São aqui plenamente aplicáveis os considerandos tecidos em 1., que nessa medida se dão por integralmente reproduzidos, estando em causa comunicações da vítima e não do arguido.

Por outro lado, conforme sublinha o Ministério Público, a data indicada – 2.03.2014 – escapa ao objeto do processo, não revelando os autos qualquer especial ocorrência no dia em causa, não podendo assim e sem mais o Tribunal considerar que o conhecimento das comunicações efetuadas através do telemóvel da ofendida, naquele particular dia, se apresenta como relevante para a descoberta da verdade.

Note-se que ainda que se concluísse pela legalidade desta pretensão, daqui apenas redundariam números para onde a vítima terá ligado.

Nestes termos, indefere-se também esta diligência.

18.

Oficiar à Polícia Judiciária para que faça juntar aos autos os SMS a que N... alude no seu e-mail.

Não se compreende a renovação de tal solicitação na medida em que esta se mostra já deferida em sede de instrução, para além de que tão pouco se fundamenta em que medida as aludidas comunicações entre a vítima e a testemunha N... se mostram relevantes em face do objeto do processo.

19.

Oficiar à Polícia Judiciária para que informe detalhadamente sobre a concretização e os resultados do inquérito de proximidade.

Os inquéritos de proximidade realizados pelos OPC inserem-se dentro do seu âmbito de investigação e constituem, na maioria dos casos, conversas informais com vista a futura investigação.

Como refere o Ministério Público, compulsados os autos nenhum elemento permite concluir que a Polícia Judiciária realizou algum documento autónomo destes autos relativo a inquérito de proximidade (apenas foram vertidas para a informação de serviço, de fls. 9, os esclarecimentos recolhidos no meio sobre o relacionamento do casal constituído pelo arguido e pela vítima).

Por outro lado, da análise da contestação apresentada, temos que o arguido vem requerer a junção de uma diligência que nem sabe se existiu e da qual não há registos nos autos.

Impõe-se, pois, o seu indeferimento.

20.

Exumação do cadáver da ofendida, com perícia a deferir ao instituto nacional de medicina legal e ciências forenses, com o seguinte objeto:

-As lesões que causaram a morte da ofendida foram causadas pelo arguido?

Como também se já fez constar nos autos, já se encontra junto aos mesmos o resultado da autópsia efetuada ao cadáver da vítima, cujo resultado é também há muito do conhecimento do arguido, cfr. fls. 816 e 817.

Conforme sublinha o Ministério Público, a perícia médico-legal apenas pode identificar as lesões que causaram a morte e eventualmente a sua etiologia médico-legal sendo que, nas circunstâncias dos autos, não se vislumbra como a mesma possa identificar o autor das lesões que determinaram a morte.

Não se vê como se pode indicar como objeto de perícia aquilo que constitui o cerne da discussão de fato que no caso dos autos se impões e para a qual o arguido inclusive fez intervir o tribunal do júri.

Como também se já fez ver nos autos, compete ao julgador avaliar da bondade da conclusão supra referida pelo arguido, analisando para o efeito a prova a mobilizar em julgamento.

Por impossibilidade manifesta de objeto, indefere-se a exumação e perícia em causa.

21.

Obtenção das mensagens de texto (SMS) e multimédia (MMS) enviadas D... desde 1 de abril de 2014 a 18 de novembro de 2014.

São aqui plenamente aplicáveis os considerandos tecidos em 1., que nessa medida se dão por integralmente reproduzidos, estando em causa comunicações de terceiros e não do arguido.

Por outro lado, tão pouco se mostra minimamente fundamentada a razão de ser da diligência em causa e os factos que visa demonstrar ou infirmar, pelo que a obtenção das aludidas comunicações não se mostram relevantes para a descoberta da verdade, para além de legalmente inadmissíveis, pelo que se indeferem.

22.

Oficiar o INMLCF para que sejam juntos todos os elementos respeitantes ao exame tanatológico, incluindo apontamentos, registos, fotografias, documentos de trabalho, reportagem fotográfica completa, registo das lesões.

Caso existam elementos ainda não juntos aos autos no âmbito dos acima referidos, oficie ao INMLCF para proceder à sua junção, para o que se confere um prazo de 10 dias.

23.

Oficiar à PJ para que remeta o registo de fotografias da perícia às manchas de sangue.

Oficiar à PJ para que indique qual a mancha de sangue que se assinala na fotografia n.º 31 e para que se proceda ao competente teste de Kastle-Meyer.

Caso existam elementos ainda não juntos aos autos no âmbito dos acima referidos, oficie à Polícia Judiciária que em complemento dos registos fotográficos que já constam dos autos junte outros de que eventualmente disponha, devendo ainda informar se foi efetuado o teste Kastle-Meyer (ou equivalente) à mancha de sangue retratada na fotografia n.º 31 (fls. 624), juntando cópia do seu resultado.

24.

Oficiar à GNR para que remeta cópia do auto de notícia do acidente sofrido pela ofendida em 29 de março de 2014.

Conforme sublinha o Ministério Público, um eventual acidente ocorrido a 29.03.2014 não integra o objeto dos autos, nem se mostra justificado pelo requerente a razão e a factualidade relativamente à qual tal auto possa relevar, motivo pelo qual se indefere tal diligência.

Note-se que, caso o arguido o pretenda, poderá sempre proceder à sua obtenção diretamente junto daquela entidade, e requerer a sua ulterior junção aos autos.

 

Importa consignar que, no que concerne às diligências probatórias, no decurso de audiência de julgamento, atenta a prova que se for produzindo, sempre o Tribunal terá a possibilidade de determinar as diligências de prova que reputar necessárias ao apuramento da verdade material.

Insurge-se o recorrente contra o transcrito despacho, contestando em primeiro lugar a aplicabilidade do disposto no artigo 340º do Código de Processo Penal aos meios de prova indicados na contestação. A tese do recorrente é no sentido de que o juiz não dispõe de qualquer poder para admitir ou recusar as provas que foram indicadas pelo arguido na contestação, sendo admitidas todas as provas que não forem proibidas por lei nos termos do artigo 125º do Código de Processo Penal.

Convoca nesse sentido o princípio da igualdade de armas, mais invocando a inconstitucionalidade do artigo 315º, nº 3 quando interpretado no sentido de que apenas permite que o arguido apresente rol de testemunhas e indique peritos e consultores técnicos, podendo meramente sugerir outros meios de prova que serão ou não admitidos pelo juiz presidente, por violação do artigo 32º da Constituição.

A questão proposta não dispensa um breve excurso sobre o objecto e finalidades do processo penal em que é manifesta uma tensão entre a necessidade de realizar a justiça criminal (punindo os autores de crimes como meio essencial de defesa e pacificação da vida em sociedade) e de garantir aos suspeitos da prática de crimes efectivas garantias de defesa consentâneas com a total possibilidade de prova da inocência ou de instalar a dúvida sobre a culpabilidade (cfr. artigos 32º, nº 1 e 2 da CRP).

Nos termos do artigo 18º, nº 2 da Constituição a equação está sempre na necessidade de harmonização entre direitos liberdades e garantias e outros interesses constitucionalmente protegidos, admitindo-se as restrições necessárias de uns para salvaguardar outros. Esta filosofia deve determinar tanto as soluções legislativas como a sua interpretação (cfr. Constituição Portuguesa Anotada, Jorge Miranda – Rui Medeiros, Tomo I, em anotação ao citado preceito).

O processo penal inicia-se com a notícia de um crime, seguindo-se a fase de inquérito destinada a investigar os factos e a sua autoria com o fim de fixar o objecto de futuro julgamento ou de, na impossibilidade de reunir indícios do crime noticiado ou do seu autor, proceder ao respectivo arquivamento. Fase, que em função do seu específico fim, é dominada pelo princípio da oficialidade sendo o contraditório limitado (cfr. artigo 32º, nº 5 da CRP) extensível apenas a determinados actos nos termos previstos no Código de Processo Penal.

Note-se que o Ministério Público que dirige esta fase do processo está sempre subordinado ao princípio da legalidade, sendo sua obrigação ordenar o arquivamento do processo na falta de indícios; de prova que sustente uma acusação. E estando a acusação posteriormente sujeita a controle que resultará pelo menos da realização do julgamento não se vislumbra o seu interesse na indicação de meios de prova que não tenham por objecto os factos acusados e que não tenham idoneidade para a sustentar.

É essencial ao exercício da acção penal a liberdade de indicação dos meios de prova que a sustentam, sendo certo que se trata de uma liberdade adstrita ao princípio da legalidade que deve impedir não só a indicação de meios de prova não legalmente admissíveis como de meios de prova inócuos. Mas o que está essencialmente em causa na acusação é a indicação de meios de prova já produzidos no decurso do inquérito (embora a prova oral deva ser (re)produzida em julgamento) e que sustentam a decisão de deduzir acusação, sendo certo que, além desses, pode o Ministério Público requerer a produção de outros, conforme se estipula no artigo 283º, nº 3, alínea f) do Código de Processo Penal.

Mas se a acusação não colher manifestamente apoio nos meios de prova indicados, tem desde logo o arguido a possibilidade de o demonstrar através de requerimento de instrução e conduzir desse modo ao arquivamento do processo.

Também na instrução os meios de prova que o arguido pretenda produzir estão sujeitos a apreciação judicial no sentido da sua utilidade para a decisão, devendo ser produzidos apenas aqueles que forem úteis; relevantes para a decisão instrutória de pronúncia ou não pronúncia (cfr. artigo 291º, nº 1 do Código de Processo Penal).

O que justifica que apenas devam ser produzidos os meios de prova relevantes para a boa decisão da causa é a necessidade do eficaz exercício da acção penal que podia ser seriamente comprometido com a irrestrita admissão de todos os meios de prova indicados, ainda que completamente inúteis e até com objectivo de entorpecer o processo.

A pedra de toque da distinção está, como resulta do exposto, em que os meios de prova que sustentam a acusação foram previamente produzidos e não têm aptidão para entorpecer a celeridade processual, enquanto os meios de prova a produzir na fase de julgamento podem ter essa potencialidade, importando, portanto, produzir apenas os que efectivamente sejam necessários para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.

Ora, desde já adiantamos uma conclusão.

Na indicação de meios de prova inúteis para a boa decisão da causa não se pode encontrar o verdadeiro exercício do direito de defesa e este será sempre perfeitamente acautelado com solução legal que admita a produção dos meios de prova relevantes para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, sem que isso represente qualquer compressão inadmissível à luz da constituição. Antes será solução que se impõe pela necessidade de compatibilização do direito de defesa e do efetivo exercício da acção penal.

Quanto a meios de prova a produzir, nos quais se incluem quer os indicados pelo Ministério Público, nos termos do citado preceito, quer os indicados pelo arguido na contestação o tratamento é absolutamente idêntico, tendo em consideração que a prova oral indicada pelo Ministério Público será novamente produzida em julgamento.

Quanto a meios de prova a indicar na contestação dispõe o artigo 315º, nº 1 do Código de Processo Penal que esta é acompanhada do rol de testemunhas e o nº 2 do preceito que juntamente com o rol de testemunhas o arguido indica os peritos e os consultores técnicos que devem ser notificados para a audiência.

Ou seja, relativamente a prova oral a posição do Ministério Público e do arguido é exactamente a mesma, só não o será relativamente a prova de outra natureza, ou seja, a prova já produzida nas fases processuais anteriores ao julgamento e que se encontram adquiridas sem necessidade de repetição no julgamento (exemplo da prova pericial apenas susceptível de esclarecimentos orais pelos peritos e consultores técnicos).

No mais, quer a prova que o Ministério Público requeira, quer a prova que o arguido requeira para ser produzida na fase de julgamento está sujeita ao disposto no artigo 340º do Código de Processo Penal.

Sendo certo que a mencionada disposição legal se encontra inserida nas disposições da audiência de julgamento, não deixa de ser aplicável a toda a prova que pela primeira vez vai ser produzida e que não se encontra subtraída expressamente a esse regime.

A tese da irrestrita possibilidade de apresentação de meios de prova a produzir na fase de julgamento e que consentiria, portanto, a realização de diligências inúteis para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, poderia conduzir no limite à própria frustração da justiça penal.

E se tanto a prova requerida em julgamento, como aquela a produzir na fase de julgamento e requerida na contestação não podem colidir com o interesse da realização da justiça penal, tanto se justifica a aplicação do disposto no artigo 340º a uma como a outra, sendo decisivo para tal conclusão o teor já salientado dos artigos 283º, nº 3, alínea f) e 315º, nº 3 do Código de Processo Penal.

Nos termos do artigo 340º do Código de Processo Penal devem ser indeferidos, entre o mais, os requerimentos de prova que não se afigure necessária à descoberta da verdade e boa decisão da causa (nº 1) provas ou meios de prova legalmente inadmissíveis (nº 3) e as provas ou meios de prova que notoriamente são irrelevantes ou supérfluos, inadequados, de obtenção impossível ou muito duvidosa ou que tenham finalidade meramente dilatória.

Como não se pode vislumbrar o exercício efectivo do direito de defesa em provas não necessárias à descoberta da verdade, cremos ser manifesto que o preceito citado na interpretação pugnada não atenta contra o disposto no artigo 32º da CRP, nomeadamente o disposto no seu nº 1 quando consagra que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa.

Aliás, o nº 2 do mesmo artigo estipula que o arguido deve ser julgado no mais curto prazo compatível com o exercício do direito de defesa, numa clara manifestação constitucional de que não se pode vislumbrar o exercício do direito de defesa no requerimento de provas não necessárias à descoberta da verdade e que tenham como única virtualidade retardar o julgamento.  

Também contesta o arguido os fundamentos para o indeferimento das diligências de prova que requereu, entendendo que todas eram úteis.

Certamente por lapso refere na motivação a “perícia a deferir à unidade de telecomunicações e informática da P.J.” que foi objecto de deferimento (cfr. ponto 3 do despacho recorrido) a “perícia a deferir ao LPC” em relação à qual foi proferido despacho no sentido de indagar da possibilidade da sua realização (cfr. ponto 6 do despacho recorrido) a solicitação de carta manuscrita pelo arguido que foi deferida (cfr. ponto 9 do despacho recorrido) solicitação do histórico de pesquisas efectuadas entre 11 e 15.11.2014 dos computadores apreendidos que foi deferida (cfr. ponto 10 do despacho recorrido) informação sobre consulta marcada no dia dos factos que foi deferida (confrontar ponto 14 do despacho recorrido).

Começamos por salientar que estando as provas requeridas na contestação (com excepção da testemunhal e por declarações de peritos ou consultores técnicos) sujeita a controle judicial nos termos do artigo 340º do Código de Processo Penal, impende sobre o requerente o ónus de alegar e demonstrar em concreto que as provas requeridas são necessárias à descoberta da verdade e boa decisão da causa, o que o recorrente na realidade omitiu completamente em alguns casos.

E a correcção da decisão recorrida apenas pode ser avaliada com os elementos que o Tribunal a quo tinha para decidir e não com os novos argumentos, não utilizados na contestação, que em recurso (exclusivamente na motivação) o recorrente vem aduzir no sentido da utilidade dos meios de prova que requereu e foram indeferidos.

Vejamos em concreto.

Quanto à requerida obtenção de mensagem de texto SMS e MMS de telemóveis da ofendida (pontos 1 do despacho recorrido) o indeferimento fundou-se no disposto nos artigos 187º, nº 4 e 189º, nº 1 do Código de Processo Penal, ou seja, na falta de autorização da ofendida, mas também se consignou a falta de indicação do propósito da diligência e a indemostração da sua utilidade.

Entende-se que o disposto nos referidos preceitos não é aplicável a mensagens já recebidas e que se encontram gravadas na memória do telemóvel. Como refere Costa Andrade, Bruscamente no Verão Passado, págs. 156 e segs quando a mensagem atinge a esfera de domínio do destinatário, este deixa de estar na situação de perigo presente no sistema de comunicações, passando a dispor de meios de autotutela, como entre o mais, a possibilidade de apagar a mensagem.

Isto significa que a protecção em causa visa o sistema de comunicações à distância enquanto a comunicação é estabelecida, subsistindo, no caso de mensagem até que seja recebida e lida pelo destinatário. A partir desse momento a mensagem passa a ter o mesmo valor que qualquer escrito e merecerá o mesmo tratamento (cfr. Código de Processo Penal, António Henriques Gaspar e outros, 2014 e doutrina citada em anotação ao artigo 189º).

Não obstante, o recorrente nada alegou na contestação de que se pudesse extrair a utilidade processual da diligência probatória, pelo que em qualquer caso merecia indeferimento.

O mesmo se diga quanto à requerida “obtenção das mensagens de texto (SMS) e multimédia (MMS) enviadas D... desde …” (ponto 21 do despacho recorrido) de cuja leitura nem se consegue entender quem é o autor das mensagens.

No que respeita à solicitação à P.J. para esclarecer quando foi criado o contacto “ M... ” no telemóvel do arguido e registo de marcação de consulta (ponto 2 do despacho recorrido) não se encontra qualquer justificação directa ou indirecta na contestação para a sua realização, nem cotejando o objecto do processo (acusação/contestação) se consegue entrever que seja útil para a descoberta da verdade, sendo óbvio que devia ser indeferida como foi.

No que respeita à perícia para determinar se os airbags da viatura baixam apenas com o toque, se esse toque pode ser acidental, se o veículo foi empurrado ou se encontrava em marcha até se imobilizar e à reconstituição com vista a determinar se era possível o arguido ter empurrado o carro e a mesma seguir deslizando e ficar imobilizada no local onde parou sem que houvesse capotamento:

Como bem salienta o Mmº Juiz a quo a perícia requerida não é necessária para demonstrar o funcionamento dos vidros das janelas dianteiras do veículo, como através de perícia a realizar no momento em causa se poderia determinar com segurança que os airbags estavam ou não em boas condições, não se conseguindo alcançar que relevância teria o facto.          Por outro lado, revela-se patente a impossibilidade de determinar por essa via se o veículo foi empurrado ou seguiu deslizando, menos ainda sendo possível determinar por esse meio se foi o arguido que o empurrou.

Quanto à reconstituição, para além do mais consignado no despacho recorrido, basta atentar nas circunstâncias decisivas de ser praticamente impossível reconstituir a situação física do local à data (não completamente conhecida porque não descrita e ainda que o fora) ou encontrar um veículo exactamente nas mesmas condições para concluir que o respectivo resultado nunca seria fiável, portanto, útil para a descoberta da verdade, sendo eloquente nesse sentido o despacho recorrido.

Perícia a realizar pelo INML ou ao LPC para se determinar a que horas faleceu a vítima, se há vestígios hemáticos de sangue nas janelas das portas dianteiras do veículo, nomeadamente nos vidros, nas borrachas e nos feltros, se o vestuário pertencente ao arguido é compatível com a sua intervenção no acidente como mero passageiro, qual a explicação para os padrões de limpeza e de fluxo de fls. 627 e se os vestígios encontrados no vestuário e calçado da vítima são compatíveis com uma rotação do corpo efectuada pelo arguido e por G... após o sinistro:

Se não foi possível determinar a hora exacta do óbito na altura em que foi constatada, muito menos o seria à posteriori através de perícia, havendo a conclusão possível que ser retirada do que consta do assento de óbito tal como se consigna no despacho recorrido ou de esclarecimento a prestar em audiência.

Relativamente aos restantes aspectos, para além do mais que consta do despacho recorrido e que se subscreve na íntegra, realça-se que o veículo foi inspeccionado quanto à existência de vestígios de sangue, a roupa do arguido foi igualmente sujeita a perícia que consta de fls. 627 e todos os aspectos que se mostrem menos esclarecidos poderão sê-lo na audiência de julgamento através da audição dos peritos e consultores técnicos.

Temos, pois, mais uma diligência probatória não necessária à descoberta da verdade nos termos em que foi requerida.

Solicitação à Polícia Judiciária das publicações Inspecção Judiciária – Manuel de Procedimentos:

Em suma, o recorrente pretende a junção de um livro aos autos, estando inexplicado que relevância terá para a descoberta da verdade e porque deve ser efectuada tal solicitação ao invés de o próprio proceder à junção.

O requerido fala por si sobre a falta de fundamento da pretensão.

Oficiar à P.J. para que junte aos autos as publicações feitas pela ofendida no Facebook em 2013:

   Não justifica o requerente e ora recorrente que relevância teriam para a descoberta da verdade as referidas publicações do ano anterior ao do falecimento da vítima e menos tal resulta dos autos.

Mais uma diligência de prova que com toda a evidência devia ser indeferida, como foi.

Solicitar à Polícia Judiciária informação da data de instalação de todos os programas inseridos no computador do arguido:

Nova diligência probatória que o recorrente requereu na contestação sem indicar que factos pretende provar através dela, o que não permite avaliar da sua utilidade para a descoberta da verdade que, evidentemente, não resulta do teor da diligência, antes causando estranheza o requerido na medida em que se refere a todos os programas.

É manifesto que apenas merecia indeferimento.

Oficiar à P.J. para que esclareça se houve exames lofoscópicos na viatura e, no caso de não terem sido realizados, ordenar que sejam feitos procedendo a comparação com as impressões digitais do arguido:

Dir-se-ia que o recorrente não conhecia as diligências probatórias já realizadas nos autos, entre as quais pontuavam, já à data do requerido, a recolha de impressões digitais na viatura e o seu exame. Ainda que assim não fora, nas circunstâncias em causa a presença de impressões digitais na viatura não seria susceptível de produzir qualquer esclarecimento útil sobre as circunstâncias da morte da vítima, tanto mais que se trata de veículo a que o arguido tinha acesso e da presença das suas impressões digitais no mesmo, nenhuma conclusão definitiva se poderia extrair ligada ao evento em causa.

Oficiar à PT e EDP para averiguar de falhas de electricidade (não refere na motivação a informação a solicitar ao IPMA):

Não se vislumbra qualquer ligação, ainda que remota, entre eventuais falhas de electricidade e os factos em discussão nos autos e também nada alegou o recorrente nesse sentido no momento próprio, sendo certo que não estava impedido de solicitar as informações directamente a tais entidades.

Mais uma diligência probatória de que não se alcança a utilidade para a boa decisão da causa e que, portanto, devia ser indeferida, como foi.

Obtenção de facturação detalhada de todas as chamadas telefónicas de voz, texto e MMS do dia 2 de Março de 2014 a partir do telefone da ofendida:

Embora não se concorde com o teor do despacho recorrido quando remete para a aplicabilidade do que foi exposto quanto a mensagens, porque ao caso seria aplicável o disposto no artigo 189º, nº 2 do Código de Processo Penal que prevê a obtenção de registos da realização de conversações ou comunicações mediante autorização do juiz, questiona-se tal como no despacho recorrido, a sua utilidade para a descoberta da verdade, posto que não só o recorrente nada alegou no momento próprio, como se estranha que a solicitação diga respeita a um único dia em que não se consegue entrever qualquer acontecimento significativo que ainda, para mais, possa ser explicado com uma lista de de comunicações efectuadas.

Também esta diligência probatória devia ser indeferida.

Quanto ao ponto 18 do despacho recorrido, que o recorrente directamente não contesta, como se colhe da motivação, cabe salientar que a diligência requerida já havia sido efectuada, constando de fls. 1876 a 1889 as mensagens em causa.       

Oficiar à PJ para que informe detalhadamente sobre a concretização do inquérito de proximidade:

Tendo em consideração que o inquérito de proximidade é uma realidade anterior ao inquérito judicial que se destina a averiguar previamente da necessidade deste, sempre teria interesse muito difuso a sua junção porque a ter colhido elementos que sustentam o início do inquérito judicial, eles necessariamente estão traduzidos no processo.

Acresce que nem resulta dos autos que esse inquérito tenha sido realizado, nem o recorrente alega que interesse teria o requerido para a descoberta da verdade.

Manifesto é que o requerido só podia merecer indeferimento.

Exumação do cadáver da ofendida para esclarecer se as lesões que causaram a morte foram causadas pelo arguido.

Sendo certo que foi realizada autópsia no momento devido, o recorrente pretende esclarecer circunstância que a exumação não é idónea a esclarecer.

Não podia a exumação ser ordenada com o âmbito indicado.

Pelas razões expostas, impõe-se concluir que as indicadas diligências probatórias não mereciam deferimento e que o recurso não merece provimento em qualquer das suas vertentes, não ocorrendo as ilegalidades e inconstitucionalidade alegadas.

Nos termos dos artigos 513º, nº 1 do Código de Processo Penal e 8º, nº 9 do Regulamento das Custas Processuais o decaimento no recurso implica responsabilidade tributária, fixando-se a taxa de justiça em 4 unidades de conta.

(….).

6.º Recurso interlocutório

Neste recurso insurge-se o recorrente contra despacho que indeferiu as suas pretensões de da acta constarem todos os relacionamentos da testemunha com o arguido e a empresa Enoagarv, os serviços prestados como advogado e as quantias cobradas nessa qualidade a vendedores e compradores de imóveis, de o depoimento prosseguir presencialmente no Tribunal da Guarda.

Ainda se insurge quanto ao segmento do despacho que relegou o conhecimento da invocada a invalidade desse depoimento para momento posterior.

O despacho recorrido é do seguinte teor:

Da ata do julgamento, maxime da forma escrita, mas também no respetivo registo áudio, constam já os elementos a que se reportam os art.ºs 99º, n.º 3, 138º, n.º 3 e 348º, n.º 3 do CPP.

É ainda desconhecido o exato teor do auto de diligência deprecado de videoconferência, sendo certo que as questões a que se reportam os sobreditos normativos foram igualmente formuladas em audiência pelo Tribunal deprecante.

Quanto ao concretamente peticionado neste particular, exceção feita às exatas quantias alegadamente cobradas pela testemunha, que nenhum relevo revestem no caso, e para além do já perguntado e registado nos autos, poderá o Ilustre Defensor do arguido continuar a inquirição da testemunha em questão, ficando tais esclarecimentos de igual forma documentados no registo áudio deste julgamento, aliás como promovido pelo Ministério Público.

No sentido do seu indeferimento pronunciou-se agora o assistente, nos termos que antecedem, embora restrito à questão da invocada invalidade da prova testemunhal, situação a que voltaremos na apreciação do III ponto do requerimento em análise.

Em face do exposto, indefere-se a primeira parte do requerido, salientando-se que já se mostram registados, também na respetiva gravação, os esclarecimentos prestados pela testemunha aos costumes, como aliás permite o art.º 101º do CPP.

- Relativamente à continuação do depoimento da testemunha H... , desta feita presencialmente, importa reter que a sua realização por videoconferência foi já judicialmente determinada nos autos, garantido o respetivo contraditório, mantendo-se os pressupostos em que assentou.

Ao exposto acresce, como se salientou no despacho que antecede, não se vislumbrar qualquer prejuízo para a produção da prova ou para o exercício dos direitos dos vários sujeitos processuais na continuação do seu depoimento em tribunal distinto daquele onde teve início a transmissão por videoconferência, atenta a justificação apresentada e a sua viabilidade.

Deliberou, pois, o Tribunal indeferir o novamente pretendido pelo arguido no que a esta testemunha concerne (lembremos que o mesmo já se havia oposto à realização deste depoimento por videoconferência a fls. 2554 a 2556), que assim constitui incidente anómalo, perturbador do normal decurso da audiência e causador de atividade processual escusada.

Custas do incidente pelo arguido que se fixa em 1 UC (cfr. art.ºs 513º, n.º 1 do CPP e 7º, n.º 4 do RCP e respetiva tabela anexa).

- A invalidade da prova testemunhal em curso, na sua vertente potencial, foi já objeto de apreciação e decisão no despacho proferido na anterior audiência, em termos que aqui se dão por reproduzidos e se mostram, por ora, aplicáveis ao ora requerido.

Caso o Tribunal entenda que a testemunha, em algum momento do seu depoimento, incorre na violação do estatuído, entre outros, no art.º 92º do Estatuto da Ordem dos Advogados, não deixará de extrair as necessárias consequências, maxime ao nível da proibição de valoração do depoimento nessa parte.

De igual forma, caso a testemunha se escuse a responder a qualquer questão suscitando o sigilo profissional, como já referido no anterior despacho, o Tribunal avaliará tal situação nos termos do art.º 135º do CPP.

Mostrando-se assim extemporânea a apreciação do ora requerido, pois que a testemunha ainda está a prestar depoimento, o Tribunal delibera relegar para momento ulterior, maxime na análise que nos cumpre levar a cabo das provas na deliberação final, a apreciação da invalidade suscitada.

Notifique.

Antes de mais importa realçar o seguinte. Nas conclusões 22ª a 33ª o recorrente insurge-se porque, segundo alega, não lhe foi facultada a possibilidade de formular perguntas à testemunha em causa sobre a vida do arguido e da vítima em Faro, rematando que a decisão que indeferiu a formulação de perguntas que a lei admite é recorrível ao abrigo do artigo 411º, nº 2 do Código de Processo Penal.

O que consta da acta de audiência de julgamento a fls. 3891 é que durante a inquirição da testemunha o Defensor do arguido foi advertido verbalmente mais de uma vez o que se mostra registado na gravação áudio e, na sequência da última advertência, o Defensor do arguido ditou para a acta que não se conforma com o impedimento de formular perguntas e interpõe recurso da decisão.

O exercício dos poderes de disciplina e direcção da audiência é por natureza oral, não toma a forma de despacho e não tem sequer que ficar registado em acta. Com efeito, dispõe o artigo 322º, nº 2 do Código de Processo Penal que as decisões relativas à disciplina da audiência e à direcção dos trabalhos são tomadas sem formalidades, podem ser ditadas para a acta e precedidas de audição contraditória se o presidente entender que isso não põe em causa a tempestividade e eficácia das medidas a tomar.

Aliás, de outro modo a adopção da forma escrita para qualquer intervenção de disciplina e direcção inviabilizaria em muitos casos a realização do julgamento. Este processo é sintomático nesse sentido.

Quando as partes não se conformam com o modo de exercício desses poderes basta que ditem para a acta o pertinente requerimento, suscitando assim uma decisão formal reduzida a escrito (despacho – cfr. artigos 96º, nº 4 e 97º do CPP).

Não foi esse o procedimento do Defensor do arguido que, afinal, recorreu de uma decisão inexistente para efeitos de recurso.

Como resulta do disposto no artigo 399º do Código de Processo Penal apenas os despachos, sentenças e acórdãos são susceptíveis de recurso. Despachos são actos decisórios reduzidos a escrito, mesmo que oralmente comunicados e não intervenções orais em audiência no âmbito dos poderes de direcção e disciplina.

 Pelo exposto não pode nesta parte o recurso ser objecto de conhecimento. Caso fosse esse o único objecto do recurso, mereceria rejeição nos termos dos artigos 399º e 414º, nº 2 por maioria de razão (se o recurso não é admitido quando a decisão não admite recurso por maioria de razão não é admitido se não existe sequer decisão) e 420º, nº 1, alínea b) do Código de Processo Penal).

Outro segmento do recurso merece apreciação prévia da sua admissibilidade.

O arguido recorre da parte do despacho recorrido que relega para momento posterior a apreciação da invalidade de depoimento que invocou e que, portanto, não decidiu a pretensão formulada.

Despacho que não conhece da pretensão do recorrente e relega para momento posterior o seu conhecimento, não tem a natureza de acto decisório susceptível de recurso, tratando-se, a nosso ver, de um despacho de mero expediente que, nos termos do artigo 400º, nº 1, alínea a) do Código de Processo Penal, não admite recurso.

Por definição despacho de mero expediente é aquele que deixa intocados os direitos ou deveres das partes e destina-se apenas a ordenar os termos do processo, tendo presente que as questões de invalidade da prova podem ser decididas até ao momento em que lhe incumbe deliberar sobre os factos nos termos dos artigos 368º, nº 2 e 374º, nº 2 do Código de Processo Penal.  

Caso o recurso se limitasse a este aspecto seria caso da sua rejeição nos termos do artigo 420º, nº 1, alínea b) por remissão para o artigo 414º, nº 2, ambos do Código de Processo Penal. Como incide sobre outros aspectos a irrecorribilidade implica em todo o caso que não possa ser objecto de conhecimento.

 No que concerne à questão sobre a especificação de todos os relacionamentos que a testemunha H... manteve com o arguido e eventual violação do disposto no artigo 138º, nº 3 do Código de Processo Penal na parte em que determina que a inquirição incida sobre as relações de parentesco e interesse com o arguido e de quaisquer circunstâncias relevantes para avaliação da credibilidade do depoimento, do despacho recorrido apenas resulta a exclusão da inquirição da testemunha sobre as exactas quantias alegadamente cobradas pela mesma, tendo-se permitido todas as restantes perguntas nesse âmbito, para além do mais que se consignou em acta ou ficou gravado.

Ora, é manifesto que “as quantias cobradas na qualidade de advogado a vendedores e compradores de imóveis” era circunstância que extravasava completamente o que o dito preceito legal impõe.

No que concerne à pretensão de continuação da audição da testemunha presencialmente no Tribunal da Guarda, importa esclarecer que havia sido decidida a audição de testemunha através de teleconferência, embora com oposição do arguido.

Sendo certo que o Tribunal mantém a possibilidade de determinar a presença da testemunha no tribunal, tal apenas se pode justificar se, entretanto, concluir que a presença da testemunha é essencial à descoberta da verdade por ter surgido durante a inquirição qualquer situação que apenas possa ser esclarecida desse modo.

Do mesmo modo se exige a quem requer nesse sentido que concretize que aspectos essenciais à descoberta da verdade só podem ser esclarecidos com a presença da testemunha, o que manifestamente o requerente não fez, suscitando por isso um incidente anómalo.

Embora o artigo 513º do Código de Processo Penal apenas preveja a condenação do arguido em custas em caso de condenação em 1ª instância e decaimento total em recurso, o artigo 524º do mesmo diploma estabelece a aplicação subsidiária do Regulamento das Custas Processuais, sem indicação concreta das normas aplicáveis, o que significa que são aplicáveis todas as normas do regulamento que não tenham campo de aplicação exclusivo a outro tipo de processo.

Ora no artigo 7º, nº 8 do RCP definem-se como procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributadas segundo os princípios que regem a condenação em custas e o nº 4 estipula que devem ser tributados, autonomamente, de acordo com a tabela II.

 Trata-se de norma aplicável a qualquer tipo de processo, também ao processo penal, sempre que neste surjam incidentes anómalos, como o presente em que o recorrente, sem a invocação de fundamento legal que o justifique, pretende suscitar do Tribunal uma decisão que contrarie outra já tomada.

Também neste particular não merece censura o despacho recorrido.

Nos termos dos artigos 513º, nº 1 do Código de Processo Penal e 8º, nº 9 do Regulamento das Custas Processuais o decaimento no recurso implica responsabilidade tributária, fixando-se a taxa de justiça em 3,5 unidades de conta.

(….).


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III. Decisão

Nestes termos e com tais fundamentos, acordam em:

- Rejeitar o terceiro recurso interlocutório, condenando o recorrente na importância de cinco UC;

- Rejeitar o segundo recurso interposto do acórdão condenatório;

- Negar provimento aos demais recursos interlocutórios, mantendo os despachos recorridos;

- Negar provimento ao recurso de despacho de rectificação, mantendo esse despacho;

- Negar provimento ao recurso do acórdão, mantendo integralmente o decidido.

- Ordenar a correcção do acórdão com inclusão dos elementos tendentes à identificação dos demandantes e assistente;

Pelo seu decaimento nos recursos interlocutórios (com excepção do rejeitado) e no recurso do despacho de rectificação, condena-se o recorrente em custas, fixando a taxa de justiça devida por cada um:

- primeiro recurso 4 UC;

- segundo recurso 3 UC;

- quarto recurso 3 UC;

- quinto recurso 3,5 UC;

- sexto recurso 3,5 UC;

- sétimo recurso 4,5 UC;

- oitavo recurso 4 UC,

- nono recurso 3,5 UC;

 - décimo recurso 3 UC;

- recurso do despacho de rectificação 3 UC;

Pelo seu decaimento no recurso da decisão final condena-se o arguido em custas, fixando a taxa de justiça devida em cinco UC.

Comunique-se de imediato a presente decisão ao Tribunal recorrido; processo de acompanhamento da medida de coacção por menção do seu dispositivo e, quando possível, com o envio de cópia do presente acórdão. 


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Coimbra, 16 de Novembro de 2016

(Texto elaborado e integralmente revisto pela relatora)

[Maria Pilar de Oliveira - relatora]

[José Eduardo Martins - adjunto]

[Alberto Mira - presidente da 5.ª Secção (Criminal)]