Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ABÍLIO RAMALHO | ||
Descritores: | DECISÃO RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA | ||
Data do Acordão: | 12/10/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | CANTANHEDE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO | ||
Legislação Nacional: | ART.º 417.º, N.º 8, DO CPP; ART. 652.º, N.º 3, DO CPC | ||
Sumário: | I - O direito de accionamento do mecanismo jurídico-processual de reclamação para a conferência (prevenida sob os arts. 417.º, n.º 8, do CPP – e 652.º, n.º 3, do CPC), e da consequente manifestação de vontade de desencadeamento de colegial revisão do acto reclamado não comporta e/ou pressupõe qualquer legitimação de eventual desautorização do relator. II - Mas antes, evidentemente, tão-só a oportunidade para a respectiva submissão a plural escrutinação da sua (despacho reclamado) racional conformação à adequada legalidade, pela deliberativa avaliação de pertinente, esclarecida e precisa argumentação técnico-jurídica que o reclamante necessária e responsavelmente aduza no respectivo acto reclamativo no sentido demonstrativo da objectiva ilicitude da concernente decisão do relator. III - A figura jurídica de reclamação – em qualquer ramo do direito cuja disciplina a contemple –, sempre se haverá que constituir numa especial prerrogativa legal-procedimental de controlo, de fundamentada impugnação do acto decisório a que se reporte, posta à disposição do destinatário que por ele se considere prejudicado, tendente à referente revogação, modificação ou substituição, por eventual ilegalidade, por si exercitável, se e enquanto se não tiver conformado – expressa ou tacitamente – com o atinente acto. | ||
Decisão Texto Integral: |
Acordam – em conferência – na 4.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra:
I – INTRODUÇÃO 1 – Pugnando pela respectiva revogação, recorreu o cidadão-arguido A... (pela peça de fls. 3825/3837 deste processo incidental, cujo teor nesta sede se tem por reproduzido) do despacho documentado a fls. 3802/3805, por cujo conteúdo se lhe irreconheceu a suscitada prescrição do respeitante procedimento criminal pelo assacado cometimento dum ilícito criminal de insolvência dolosa – p. e p. pelo art.º 227.º, n.º 3 [com referência aos ns. 1, als. a) e b), e 2], do Código Penal, na versão decorrente do D.L. n.º 48/95, de 15/03, por cuja autoria, por acórdão desta Relação de 30/08/2008, fora condenado à pena de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na respectiva execução por idêntico período –, em razão do convocado decurso do correspondente prazo máximo legal, de 10 anos e 6 meses, computado desde 24/03/1999, data (da declaração de falência) judicialmente considerada como relevante à consumação da referida infracção criminal. 2 – Realizado o pertinente exame preliminar, em conformidade com o estatuído no n.º 6, al. c), do art.º 417 do C. P. Penal, foi – pelo competente desembargador-relator – proferida pertinente decisão-sumária por cujo conteúdo – documentado na peça de fls. 3869/3872, e infra essencialmente reproduzido, para melhor compreensão – se reconheceu e declarou a efectiva operância jurídica da invocada excepção de prescrição: 3 – Sustentando a irreunião dos atinente pressupostos (prescritivos), dela – decisão-sumária – reclamou o Ministério Público para a conferência – pela peça junta a fls. 3879/3880 –, fundado no seguinte argumentário (por reprodução, com realces da autoria do relator): 4 – Exercitando o respectivo direito jurídico-processual de contraditório, respondeu o id.º cidadão A..., pela peça ínsita a fls. 3886/3890, opinando pela insubsistência jurídica de tal tese opositiva e pugnando pela consequente manutenção do reclamado acto decisório, aduzindo para tanto as seguintes – sintetizadas/conclusivas – razões:
II – AVALIAÇÃO § 1.º Consabidamente, e como é de fácil entendimento, a legal concessão ao respectivo sujeito passivo do direito de accionamento do mecanismo jurídico-processual de reclamação para a conferência (prevenida sob os arts. 417.º, n.º 8, do CPP – e 652.º, n.º 3, do CPC), e da consequente manifestação de vontade de desencadeamento de colegial revisão do acto reclamado não comporta e/ou pressupõe qualquer legitimação de eventual desautorização do relator, fundada nalgum ideado critério de força/autoridade resultante de virtual somatório de diferentes sensibilidades da maioria [no âmbito do processo penal de três desembargadores: relator, adjunto e presidente da Secção, (cfr. art.º 419.º, ns. 1 e 2, do CPP)], mas antes, evidentemente, tão-só a oportunidade para a respectiva submissão a plural escrutinação da sua (despacho reclamado) racional conformação à adequada legalidade, pela deliberativa avaliação de pertinente, esclarecida e precisa argumentação técnico-jurídica que o reclamante necessária e responsavelmente aduza no respectivo acto reclamativo no sentido demonstrativo da objectiva ilicitude da concernente decisão do relator, posto que, pela própria natureza e definição, a figura jurídica de reclamação – em qualquer ramo do direito cuja disciplina a contemple –, sempre se haverá que constituir numa especial prerrogativa legal-procedimental de controlo, de fundamentada impugnação do acto decisório a que se reporte, posta à disposição do destinatário que por ele se considere prejudicado, tendente à referente revogação, modificação ou substituição, por eventual ilegalidade[1], por si exercitável, se e enquanto se não tiver conformado – expressa ou tacitamente – com o atinente acto[2].
§ 2.º No caso sub judice irreconhece-se-se, porém – com o devido respeito –, qualquer fundamento legal à ajuizanda reacção incidental do Ministério Público ao enunciado despacho do relator (de fls. 3869/3872), assim, de todo, juridicamente inconsequente, pela seguinte ordem-de-razões: 1 – Como esclarecidamente se observa na enunciada resposta, nenhuma específica/objectiva e inteligível crítica jurídica vem dogmaticamente apontada – ou sequer racionalmente ensaiada – na avalianda peça reclamativa à estruturante razão-de-ser do referenciado acto decisório, no inequívoco e ilustrativo sentido da sua hipotética irrazoabilidade/ilegalidade, realidade, em si, manifestamente tradutora de absoluto vazio jurídico-justificativo da respeitante postura opositiva, e, por conseguinte, representativa da corrupção do próprio acto reclamativo pelo vício de ineptidão, por falta da causa-de-pedir (ponderável fundamento jurídico), gerador da respectiva nulidade, excepção dilatória obviamente comprometedora de qualquer significativa intervenção da conferência na reponderação do mérito e acuidade jurídica do referido despacho judicial, [cfr. arts. 186.º, n.º 2, al. a); 278.º, n.º 1, al. e); 576.º, ns. 1 e 2; 577.º, proémio, e 578.º, do C. P. Civil vigente, na versão decorrente da Lei n.º 41/2013, de 26/06, e 4.º do C. P. Penal]. 2 – Ainda que assim se não entendesse, nada legitimaria a – meramente – sugerida amputação do convocado despacho de 01/10/2009 do Ex.mo conselheiro-relator do Tribunal Constitucional (documentado a fls. 3607v.º/3608) da expressa asserção decisória da suspensão da instância concernentemente aos cabíveis procedimentos jurídico-processuais respeitantes ao recurso que o dito cidadão para aí (TC) oportunamente interpusera do referido acórdão condenatório de 30/08/2008 com vista à demandada/pertinente fiscalização (concreta) da atinente constitucionalidade, em função das seguintes – elementares e axiomáticas – razões jurídicas: 2.1 – Da natureza autêntica do respectivo documento e da decorrente prova plena dos específicos factos nele consignados, ou seja, da absoluta/cabal comprovação de que o seu Ex.mo subscritor nele (despacho) exarou efectiva e precisamente, de modo consciente e intencional, a referenciada declaração de suspensão da instância – com o seu exacto alcance e efeito jurídico, e não a conjecturada de extinção da instância –, cuja força, porém, apenas seria hipotética/virtualmente ilidível com base na respectiva falsidade, necessariamente arguível em incidente e prazo – de 10 (dez) dias, contados a partir da correspondente notificação – processual próprio (inverificado), como postulado, máxime, pela dimensão normativa integrada pela conjugada interpretação dos arts. 369.º, n.º 1, 371.º, n.º 1, e 372.º, n.º 1, do Código Civil, e 551.º-A, ns. 2 e 3, do Código de Processo Civil de 1961[3] – com actual correspondência no 451.º, ns. 2 e 3, do Código de Processo Civil de 2013; 2.2 – Da obrigatória respeitabilidade do assim especificamente decidido e não impugnado em tempo oportuno, por inelutável efeito do correspectivo (e consequente) caso-julgado-formal, absolutamente impeditivo de qualquer outra cogitável/discernível alterabilidade do seu (despacho) rigoroso conteúdo, particularmente da sinalizada declaração de suspensão da instância, como incontornavelmente estatuído pelos dispositivos ínsitos sob os arts. 672.º, n.º 1, e 672.º, 1.ª parte, (correlacionados com o 677.º), do Código de Processo Civil de 1961 – com actual correspondência nos arts. 620.º, n.º 1, e 621.º, 1.ª parte, (e 628.º), do Código de Processo Civil de 2013; 2.3 – E, decisiva/terminantemente, do expresso e contraditório reconhecimento pelo próprio reclamante de que posteriormente à data em cuja ocasião defende ter ocorrido o pretenso trânsito-em-julgado do mencionado acórdão condenatório (desta Relação de Coimbra) de 30/08/2008 afinal ainda corriam termos no Tribunal Constitucional legais procedimentos e fases incidentais consequentes/emergentes da reclamação para a conferência do despacho de 27/5/2009 – por cujo conteúdo se houvera irreconhecido pretensa nulidade do de 21/4/2009 –, precisamente objecto de apreciação pelo Ex.mo conselheiro-relator naqueloutro de 01/10/2009, já posterior, pois, ao admitido termo final do prazo prescricional (máximo), de 24/09/2009 (!).
III – DISPOSITIVO Por conseguinte, o órgão colegial judicial reunido para o efeito em conferência neste Tribunal da Relação de Coimbra delibera o indeferimento da avalianda reclamação e a consequente confirmação da questionada decisão-sumária. *** Sem tributação, por dela ser o reclamante (M.º P.º) isento, (cfr. art.º 522.º do CPP). ***
Coimbra, 10/12/2014. (Abílio Ramalho, relator) (Olga Maurício, adjunta)
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