Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
125/21.9T8PCV.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOÃO AREIAS
Descritores: SELEÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DA PROVA
FACTOS ESSENCIAIS
FACTOS INSTRUMENTAIS
JUÍZO PROBATÓRIO
Data do Acordão: 11/22/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE PENACOVA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 5.º, N.º 1, 607.º, N.º 4, E 414.º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL,
Sumário: I – Aquando da prolação da sentença e da seleção dos concretos factos sobre os quais vai incidir a decisão sobre a matéria de facto, caberá ao juiz uma pronúncia sobre os factos essenciais (nucleares) que foram alegados para sustentar a causa de pedir e as exceções, e sobre outros factos também essenciais, ainda que de natureza complementar que, de acordo com o tipo legal, se revelem necessários para que a ação ou a exceção proceda.

II – Em tal tarefa, o juiz não tem de, nem deve, em regra, relativamente a cada tema de prova sobre o qual incidiu a instrução e discussão da causa, pronunciar-se sobre a versão de uma das partes e sobre a contra-versão da outra sobre o mesmo facto.

III – Tratando de factos que integram a causa de pedir, incumbindo a respetiva alegação e prova ao autor, é na versão que lhes é dada pelo autor que hão de ser selecionados, para sobre eles incidir um julgamento de provado ou não provado.

IV – Os factos instrumentais tendo uma função probatória – não constituem uma condicionante direta da decisão, sendo a sua função, antes, a de permitir a prova dos factos principais –, devendo por essa razão, em regra, integrar a motivação da matéria de facto, não deverão ser objeto de um juízo probatório especifico, a discriminar enquanto factualidade julgada provada ou não provada.

Decisão Texto Integral: Processo nº 125/21.9T8PVC.C1 – Apelação

Relator: Maria João Areias

1º Adjunto: Paulo Correia

2º Adjunto: Helena Melo

                                                                                               

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I – RELATÓRIO

AA e marido, BB, intentam a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra CC,

Pedindo a condenação do Réu a:

a) Reconhecer que os autores são donos e legítimos possuidores dos prédios identificados no artigo 1º da PI;

b) Abster-se de qualquer modo perturbar a propriedade dos autores sobre os mesmos prédios.

c) Pagar quantia de € 17.192,00 (Dezassete mil e cento e noventa e dois euros) pelos prejuízos patrimoniais e não patrimoniais causados, acrescida dos juros que se vencerem desde a citação até integral e efetivo pagamento, à taxa legal.

Para o efeito, alegaram, em suma, serem donos e legítimos proprietários dos prédios melhor descritos no artigo 1.º da petição inicial e que no final de 2018, o réu invadiu os referidos prédios e ordenou o corte e procedeu à venda da madeira dos eucaliptos existentes nos mesmos, não procedendo à eliminação dos sobrantes, donde resultaram prejuízos económicos para os Autores. A par disso, referiram, ainda, que a situação lhes causa ansiedade e angústia, devendo ser indemnizados em conformidade.

O Réu deduz Contestação, alegando, em síntese, ser proprietário do prédio inscrito na matriz rústica daquela freguesia sob o artigo 9224.º e que apenas ordenou o corte e a venda da madeira das árvores que faziam parte da sua exclusiva propriedade, sendo que, quanto aos demais prédios, todas as arvores haviam sido cortadas há cerca de 3 anos, encontrando-se numa fase inicial de crescimento, não podendo por isso haver qualquer confusão entre as arvores que pertenciam a um e outros prédios, impugnando no essencial da versão apresentada.


*

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença em que é proferida a seguinte:

VI. DECISÃO:

Nestes termos, e de harmonia com o disposto nos preceitos legais supracitados, este Tribunal julga a ação parcialmente procedente e, em consequência decide:

1. Condenar o Réu CC a reconhecer a propriedade dos Autores AA e marido BB sobre os prédios descritos no artigo 1.º da PI, bem como a abster-se de perturbar tais propriedades.

2. Absolver o Réu CC dos demais pedidos formulados pelos Autores AA e marido BB.

3. Condenar os Autores nas custas do processo.


*

Inconformados com tal decisão, os autores interpõem recurso de Apelação, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:  

1ª. O Meritíssimo Juíza a quo, na nossa humilde opinião, fez uma análise pouco profunda e pouco dos documentos junto aos autos, das declarações de parte da autora AA e dos depoimentos das testemunhas, DD, EE, FF e GG.

2ª. Na verdade, mereciam resposta totalmente negativa os seguintes factos:

“20. O Réu tem conhecimento e consciência da configuração e limites do prédio identificado no facto 18.º.

21. O Réu vendeu, em finais de 2018 inícios de 2019, os eucaliptos que existiam no seu prédio identificado no facto 18.º, ao senhor FF.

22. Todas as árvores vendidas pelo Réu e efetivamente cortadas pelo comprador estavam no prédio do Réu, melhor identificado no facto 18.º da presente sentença, e eram sua propriedade exclusiva.

25. O Senhor FF comprou os eucaliptos ao aqui Réu em finais de 2018 e com o mesmo verificou no local as quantidades existentes dentro dos limites do prédio, quantidades essas que efetivamente transacionaram e cortaram.

26. O Réu não cortou ou deu autorização a alguém para cortar qualquer árvore de qualquer prédio dos autores, em 2018 ou em qualquer outra altura.

27. O Réu não vendeu e recebeu o preço de quaisquer árvores pertencentes aos autores”

3ª. Por outro lado, deveria ter merecido resposta positiva os seguintes factos:

A - Os eucaliptos existentes nos prédios, inscritos na matriz predial rústica da freguesia ..., sob os artigos ...44º. 9075º e ...25º, bem como o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... tinham um diâmetro entre 18 a 20 cm.

B - Os autores tiveram conhecimento no ano de 2017 ou 2018, que o réu ordenou o corte dos eucaliptos nos prédios inscritos na matriz predial rústica da freguesia ..., sob os artigos ...44º. 9075º, bem como o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., sob o artigo ...64º, sendo que já em 2020 ou 2021, o mesmo se passou relativamente ao prédio inscrito sob o artigo ...25º da freguesia ...

C – As árvores cortadas nos prédios dos autores correspondiam esteres um valor mínimo de € 9.000,00 (nove mil euros).

D - O réu além de cortar as árvores existentes nos referidos imóveis, conforme supra referido, vendeu-as e fez seu o produto das vendas das mesmas, sabendo perfeitamente que tais prédios não são sua propriedade, nem as árvores aí existentes, maioritariamente eucaliptos, lhe pertenciam.

E - Quem procedeu aos cortes nos prédios dos autores não procedeu à recolha e eliminação dos sobrantes das árvores abatidas impedindo a regeneração dos eucaliptais, pelo que, para os rentabilizar, estes terão de fazer nova plantação.

F – Os autores terão de contratar uma empresa para proceder à recolha e destruição dos sobrantes, tendo de lavrar, fresar e escarificar o solo dos prédios em causa, bem como adquirir e plantar novos eucaliptos e adubar e proceder ao tratamento fitossanitários das novas plantas, cujo custo de tais serviços ascende a € 4.000,00 (quatro mil euros).

G – Os autores ficaram ansiosos, tristes e nervosos pela atitude e conduta do réu.

4ª. No que diz respeito ao seguinte facto dado como provado:

“20. O Réu tem conhecimento e consciência da configuração e limites do prédio identificado no facto 18.º.

Não se entende como tal facto é dado como provado, pois entre os factos dados como não provados figura sob epigrafe w) que não se provou que “o ré seja legítimo proprietário e possuidor do prédio rústico pinhal e mato, sito no lugar de ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz predial rústica daquela freguesia sob o artigo ...24, com a área de 4,950 m2, a confrontar do Norte com baldio, do Sul com HH e outros, do nascente com II e do poente com JJ”.

5ª. Ora, não se tendo dado como provado as confrontações, área e identificação do prédio não pode ser dado como provado que o mesmo saber da configuração e dos limites constantes do facto 18, quando esta deveria referir-se precisamente ao prédio inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...25º.

6ª. No que diz respeito aos factos provados sob os pontos 21, 22 e 25 da Fundamentação de Facto cumpre, mais um vez referi que, não se provando a localização, área, configuração e composição do prédio pertença do réu e que confina com o prédio inscrito sob o artigo ...25º, rústico da freguesia ... e pertença dos autores, não pode tais factos serem dados como provados.

7ª. O réu, aqui apelado, junta como prova de que é proprietário do referido imóvel uma caderneta predial onde consta que o mesmo corresponde a um prédio rústico revestido de pinhal e mato, sito no lugar de ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz predial rústica daquela freguesia sob o artigo ...24º, com a área de 4,950 m2, a confrontar do Norte com baldio, do Sul com HH e outros, do nascente com II e do poente com JJ.

8ª A testemunha FF, madeireiro de profissão, que alegadamente adquiriu os eucaliptos existentes no prédio refere que após ter-se deslocado ao local com o aqui apelado, CC e com a testemunha EE e depois de nova insistência daquele no sentido de adquirir os mesmos, para prova de que era proprietário, exibiu uma escritura pela qual o depoente concluiu que os eucaliptos que lhe estavam a ser vendidos eram efetivamente do réu.

9ª. A verdade é que a existir tal escritura a mesma não foi carreada para os autos, sendo que o único elemento documental a que o Tribunal teve acesso foi á caderneta predial na qual consta as confrontações supra referida, e onde não existe qualquer limite do prédio com uma estrada.

10ª. Na sua Contestação e no artigo 4º do referido articulado, o apelado refere que o prédio que se arroga proprietário corresponde ao artigo ...24º da freguesia ..., com as confrontações seguintes: Norte- baldio; nascente – II; Sul – HH e outros; poente – JJ

11ª. Não é mencionado no referido articulado, nem depois nos depoimentos prestados que as confrontações na matriz estivesse desatualizadas ou erradas.

12ª. Resulta da sua exposição que o prédio de que se arroga proprietário tem a área de 4.950 metros quadrados, sendo que, também em lado algum se alega ou demonstra que o mesmo tem uma área superior.

13ª. Resulta claramente do depoimento que a testemunha cortou eucaliptos numa área superior a seis mil metros quadrados respeitando os limites indicados pelo réu, aqui apelado.

14ª. Significa isto que os limites indicados pelo réu extravasam claramente a área de que é proprietário, já que a área aproximadamente de cinco mil metros quadrados não se confundo com uma área calculada entre seis mil ou sete mil metros quadrados.

15ª. A testemunha refere que não mediu a área que cortou, mas estamos na presença de um madeireiro experimentado e habituado a calcular mentalmente áreas dos prédios, atendendo ao número de árvores existentes, pois só assim consegue apresentar valores para aquisição das árvores.

16ª. Resulta ainda do testemunho prestado por EE, que a plantação de eucaliptos feita no prédio pertença dos autores, aqui apelantes era realizada em filas cujos pés de eucaliptos tinham, no mínimo, dois metros de distância entre si, sendo que, fora o seu avô, pai da autora mulher, que deixara os eucaliptos, objeto do presente corte, para consolidação do talude.

17ª. Tal depoimento foi prestado com o recurso aos levantamentos topográficos existentes nos autos, e que demonstram que o réu ordenou o corte de eucaliptos, no prédio inscrito sob o artigo ...25º de ... e pertença dos ora apelantes.

18ª. Quanto aos pontos 26 e 27 dos factos dados como provados os mesmos devem ser dados como não provados, desde logo, porque, o réu apelante ao ordenar o corte numa área superior a seis mil metros quadrados, no local onde se situam os prédios inscritos sob os artigos ...24... e ...35º da freguesia ..., ultrapassou claramente os limites do seu prédio que terá menos de cinco mil metros quadrados.

19ª. Mas para além desse prédio, o réu, aqui apelado, vendeu entre 2017 e 2018 os eucaliptos existentes nos prédios identificados no ponto 1 (um) dos factos dados como provados, pertença dos autores aqui apelantes.

20ª. Efetivamente o réu sabia perfeitamente que tais prédios não lhe pertenciam, estando perfeitamente demarcados e distintos dos deles, sendo que as árvores aí existentes, maioritariamente eucaliptos, eram pertença dos ora apelantes.

21ª. A este propósito refere, a testemunha DD que após o réu, aqui apelado, ter herdados os bens que eram de seus pais, houve diversos problemas com as estremas, imputando a este, “vender aquilo que não lhe pertence”.

22ª. No mesmo sentido, a testemunha EE que o Senhor KK conhecido pelo “...” ao ser abordado pelo réu, aqui apelado, lhe terá dito que estava a indicar árvores com sendo suas nos prédios que eram dos autores e que conhecia perfeitamente, ao que este referiu que “não há problema nenhum que eu depois entendo-me com o meu primo”.

23ª. Também nas suas declarações de parte, a autora AA, refere que ao visitar os prédios identificados no ponto um da matéria de facto dada como provada constatou o corte das árvores, a mando do réu, aqui

24ª. Com já referimos e atento a prova carreada para os actos deveria ter sido como provado que:

A - Os eucaliptos existentes nos prédios, inscritos na matriz predial rústica da freguesia ..., sob os artigos ...44º. 9075º e ...25º, bem como o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... tinham um diâmetro entre 18 a 20 cm.

25ª. Tal facto é referido pela testemunha EE no seu depoimento o qual não é posto em causa por nenhum outro, nesta parte, nem foi produzida qualquer prova que inquinasse ou contrariasse o mesmo.

26ª. Deve ser dado como provado o seguinte facto:

B - Os autores tiveram conhecimento no ano de 2017 ou 2018, que o réu ordenou o corte dos eucaliptos nos prédios inscritos na matriz predial rústica da freguesia ..., sob os artigos ...44º. 9075º, bem como o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., sob o artigo ...64º, sendo que já em 2020 ou 2021, o mesmo se passou relativamente ao prédio inscrito sob o artigo ...25º da freguesia ...

27ª Com efeito, é desde logo a autora mulher que o refere nas suas declarações de parte confirmando o corte das árvores nos três primeiros prédios terá ocorrido entre 2017 e 2018.

28ª No mesmo sentido refere a testemunha EE ao referir que as árvores existentes nos três primeiros prédios terão sido cortadas em 2017, 2018 e as existentes no prédio inscrito sob o artigo ...25º terá sido já durante a Pandemia motivada pelo Corona Vírus.

29ª Ora, o réu não avisou os autores do corte das arvores nos prédios destes, como impõe as regras de boa vizinhança, caso tivesse agido de boa-fé, mas antes ocultou tal facto e quando questionado atirou as “culpas” para o madeireiro.

30ª Mas a verdade é que como refere a testemunha EE, que confirma o que o madeireiro em causa era da confiança dos autores e que foi este que o alertou para o corte das árvores nos terrenos destes com o argumento do réu aqui apelado que depois se entendia com estes.

31ª. Tal facto é corroborado pela testemunha GG que no seu depoimento refere ter ouvido do seu falecido irmão e do senhor KK, ao tempo seu patrão, que tendo estes alertado o réu, aqui apelado, para a ultrapassagem dos limites dos seus terrenos, indicando áreas de corte nos prédios pertença dos autores, foram informados que não havia qualquer problema pois que “nunca havia problemas nem dum nem doutros e eles sempre acertavam tudo”.

32ª. Deve ser igualmente dado como provado que:

C – As árvores cortadas nos prédios dos autores correspondiam esteres um valor mínimo de € 9.000,00 (nove mil euros).

33ª. A este propósito refere-se o depoimento da testemunha EE, o qual não foi posto em causa por nenhuma outra prova produzida em audiência de julgamento, nem contrariada por qualquer documento carreado para os autos, o qual refere que o valor da madeira cortada nos prédios dos autores atinge a quantia superior a € 9.000,00(nove mil euros), explicando o método e a forma como chegou a tal montante.

34ª. Deve ser dado como provado que:

D - O réu além de cortar as árvores existentes nos referidos imóveis, conforme supra referido, vendeu-as e fez seu o produto das vendas das mesmas, sabendo perfeitamente que tais prédios não são sua propriedade, nem as árvores aí existentes, maioritariamente eucaliptos, lhe pertenciam.

35ª. Tal resulta da prova já referida e até pelo depoimento de parte do réu que reconhece que os prédios de ambas as partes são destintos, não causam qualquer confusão por estarem demarcados e embora os prédios do apelado e dos apelantes tenham eucaliptos, a verdade é que os cortes anteriores foram realizados em épocas diferentes o que permitia identificá-los claramente.

36ª. Deve ser dado como provado que:

E - Quem procedeu aos cortes nos prédios dos autores não procedeu à recolha e eliminação dos sobrantes das árvores abatidas impedindo a regeneração dos eucaliptais, pelo que, para os rentabilizar, estes terão de fazer nova plantação.

37ª. Tal facto resulta quer do depoimento da testemunha EE, quer do depoimento da testemunha GG, constando que os sobrantes não foram retirados dos prédios objeto do corte e que era necessário arrancar as cepas velhas, lavrar e preparar os terrenos para novas plantações.

38ª. Deve ser dado como provado que:

F – Os autores terão de contratar uma empresa para proceder à recolha e destruição dos sobrantes, tendo de lavrar, fresar e escarificar o solo dos prédios em causa, bem como adquirir e plantar novos eucaliptos e adubar e proceder ao tratamento fitossanitários das novas plantas, cujo custo de tais serviços ascende a € 4.000,00 (quatro mil euros).

39ª. Tal facto resulta depoimento da testemunha EE o qual não foi contrariado por nenhuma prova em sentido contrário.

40ª. Finalmente deve ser dado como provado que:

G – Os autores ficaram ansiosos, tristes e nervosos pela atitude e conduta do réu. 41ª

A este propósito veja-se as declarações de parte da autora AA que refere a profunda tristeza e mágoa que sentiu ela e seu marido ao saberem das condutas do réu aqui apelante.

42ª. Também no depoimento EE descreve a forma com os autores foram atingidos pelas condutas do réu, ficando nervosos e ansiosas com as mesmas, e em face das idades avançadas dos mesmos, fragilizados por se sentirem impotentes para poderem reagir.

43ª. Em face dos factos, que na óptica dos ora apelantes deviam ser dados como não provados e provados, impunha que a decisão fosse no sentido da procedência da ação, no que diz respeito ao montante peticionado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais peticionados ainda que devidamente corrigidos atendendo ao que na nossa modesta opinião ficou demonstrado.

44ª. Com efeito, com a presente ação os autores pretendem, assegurar o exercício pleno do seu direito de propriedade, sobre os imóveis identificados no ponto 1(um) dos factos dados como provados a que acresce o pedido de pagamento de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que as condutas do apelado provocaram.

45ª. Resulta da matéria dada como provada, que os mencionados prédios foram adquiridos por sucessão mortis causa, por óbito dos pais da autora mulher, através das escrituras de habilitação de herdeiros realizadas em 9 de janeiro de 1992 e 25 de julho de 2000 e exaradas nos livros 448-A e 30-C ambos do Cartório Notarial ..., sendo que os mesmos andam na posse dos ora apelantes há mais de vinte cinco anos retirando deles todas as utilidades que tais prédios proporcionam, em seu proveito e interesse exclusivo.

46ª. Por outro lado, ficou demonstrado que a posse dos autores foi e é contínua, pacífica, de boa-fé e pública, exercida com corpus e o animus correspondente ao exercício do direito de propriedade plena sobre os prédios em causa., pelo que, caso não existisse título aquisitivo os autores sempre eram seus proprietários por via da aquisição por usucapião dos mesmos.

47ª. Acontece que, resultante dos pontos que supra se evidenciou, que foram mal julgados, verifica-se que o réu, ora apelante, vendeu eucaliptos existentes nos prédios dos autores, fazendo suas as quantias recebidas por essas vendas, sem que os ora apelantes tenham autorizado ou consentido tal venda.

48ª.  Com efeito, dispõe o artigo 483º do Código Civil “(…)”

49ª. Efetivamente, o réu, ora apelado, ao atuar como atuou, apropriando-se das árvores existentes nos prédios identificados no ponto um dos factos dados como provados lesou os ora apelantes no valor da madeira que as mesmas produziram.

50ª. Tal conduta foi voluntária, procurando assim um ganho com as vendas de árvores que sabia que não lhe pertenciam e fazendo seu o produto da venda destas, causando o empobrecimento dos autores, pelo menos, no valor de tais bens.

51ª. Deste modo, provando tais condutas, os apelantes têm direito a ser indemnizados no valor correspondente ao preço da madeira de que o réu se apoderou.

52ª.Acresce ainda que ficou provado que os autores “ficaram ansiosos, tristes e nervosos pela atitude e conduta do réu”.

53ª. Dispõe o n.º 1 do art.º 496º do Código Civil que “(…)

54ª Os danos não pantominais têm uma dupla natureza, porquanto têm com finalidade primária a reparação dos mesmos, além de terem como finalidade subsequente reprovar a conduta ilícita do lesante.

55ª O quantitativo da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais terá de ser calculado, de acordo com critérios de equidade e grau de culpabilidade, atendendo á situação económica de lesante e lesado.

56ª. Deste modo, tais danos atendendo á sua gravidade e consequência devem ser indemnizados numa quantia não inferior ao valor peticionado na petição inicial.

57ª Resulta assim, que o valor da indemnização a título de danos patrimoniais e não patrimoniais não deve ser inferior a € 16.000,00 (dezasseis mil euros)

58ª. Ao decidir como decidiu o Meritíssimo Juiz a quo violou as normas constantes do artigo, 607º, nº 4 e 5 do CPC, bem como, as constantes nos artigos 483º, 496º, ambos do CC.

Nestes Termos

Dignem-se Venerandos Desembargadores dar provimento ao presente recurso revogando-se a Sentença proferida pelo Tribunal a quo substituindo a mesma por outra que julgue a acção procedente condenado o réu ao pagamento de uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados aos ora apelantes.

*
O Réu apresenta contra-alegações, no sentido da improcedência do recurso.
Cumpridos que foram os vistos legais, nos termos previstos no artigo 657º, nº2, in fine, do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Novo Código de Processo Civil –, as questões a decidir são as seguintes:
1. Impugnação da matéria de facto.
2. Se é de alterar o decidido.
III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

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1. Impugnação da matéria de facto

Os tribunais da Relação, sendo tribunais de segunda instância, têm atualmente competência para conhecer tanto de questões de direito, como de questões de facto.

Segundo o nº1 do artigo 662º do NCPC, a decisão proferida sobre a matéria de pode ser alterada pela Relação, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.


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 Os Apelantes insurgem-se contra o julgamento efetuado em sede de matéria de facto, impugnando a decisão contida nos pontos 20., 21., 22., 25., 26. e 27. da matéria de facto dada como provada:

20. O Réu tem conhecimento e consciência da configuração e limites do prédio identificado no facto 18.º.

21. O Réu vendeu, em finais de 2018 inícios de 2019, os eucaliptos que existiam no seu prédio identificado no facto 18.º, ao senhor FF.

22. Todas as árvores vendidas pelo Réu e efetivamente cortadas pelo comprador estavam no prédio do Réu, melhor identificado no facto 18.º da presente sentença, e eram sua propriedade exclusiva.

25. O Senhor FF comprou os eucaliptos ao aqui Réu em finais de 2018 e com o mesmo verificou no local as quantidades existentes dentro dos limites do prédio, quantidades essas que efetivamente transacionaram e cortaram.

26. O Réu não cortou ou deu autorização a alguém para cortar qualquer árvore de qualquer prédio dos autores, em 2018 ou em qualquer outra altura.

27. O Réu não vendeu e recebeu o preço de quaisquer árvores pertencentes aos autores.

Antes de mais há que contextualizar a matéria sob impugnação, tendo em consideração o objeto da presente ação:

reconhecendo os Autores que o réu tem prédios confinantes com os prédios rústicos dos AA. (id. nos art. 1º a 4º da p.), intentam a presente ação alegando que, no final de 2018, o réu invadiu os prédios dos autores e ordenou o corte dos eucaliptos existentes nos mesmos;

o réu contesta, alegando que, sendo proprietário do prédio nº ...24 (que confronta com o prédio com o artigo ...25, id. no art.3º da p.i.) em finais de 2018 princípios de 2019, vendeu os eucaliptos existentes no seu prédio, mas que, encontrando-se o prédio do autor devidamente demarcado, tendo nos prédios confinantes a madeira havia sido cortada há cerca de 3 anos, não poderia haver qualquer confusão quanto às arvores que pertenciam a um prédio e a outro.

Face à posição assumida pelas partes nos respetivos articulados e inexistindo qualquer pedido reconvencional por parte do réu, era aos autores que incumbia o ónus de de alegação (e de prova) de que, com o corte de árvores ordenado pelo Réu em finais de 2018/princípios de 2019, tenham sido cortados eucaliptos existentes nos prédios dos autores.

Quanto à defesa assumida pelo réu na sua contestação, em sede de mera impugnação, alegando que conhecia as estremas e que, com o corte por si ordenado se limitou a cortar os pinheiros do seu prédio, contendo-se dentro do mesmo tema de prova, o réu verdadeiramente nada tem de provar.

Com a reforma do processo civil, eliminadas a especificação e o questionário e a “base instrutória”, com a opção pelos “temas de prova” o juiz dever-se-á limitar a formular genericamente as questões de facto essenciais sobre as quais deve incidir a instrução e discussão da causa – reportando-se à matéria ou matérias consubstanciadas nos factos principais (essenciais), não só os integradores da causa de pedir, como também aqueles que em que se fundem as exceções deduzidas, em cumprimento do ónus de afirmação, alegação  ou dedução (artigo 5º, nº1), nesta fase, sem qualquer preocupação quanto à distribuição do ónus de prova[1].

Após instrução e discussão, aquando da prolação da sentença e da seleção dos concretos factos sobre os quais vai incidir a decisão sobre a matéria de facto, caberá ao juiz uma pronuncia sobre os factos essenciais (nucleares) que foram alegados para sustentar a causa de pedir e as exceções, e sobre outros factos também essenciais, ainda que de natureza complementar que, de acordo com o tipo legal, se revelem necessários para que a ação ou a exceção proceda[2].

Em tal tarefa, o juiz não tem de, nem deve, em regra[3], relativamente a cada tema de prova sobre o qual incidiu a instrução e discussão da causa, pronunciar-se sobre a versão de uma das partes a contra versão da outra sobre o mesmo facto.

Em se tratando de factos que integram a causa de pedir, incumbindo a respetiva alegação e prova ao autor, são os factos na versão que lhes é dada pelo autor que hão de ser selecionados, para sobre eles incidir um julgamento de provado ou não provado. O que se mostra incorreto é proferir decisão sobre o facto tal como é alegado pelo autor e proferir igualmente decisão sobre aquele mesmo facto (na sua versão negativa) tal como se mostra alegado pelo réu, como é feito na decisão recorrida ao dar como “não provado” que o réu mandou cortar eucaliptos nos prédios do autor e dar, ainda, como “provado” que o réu não o fez. Esta segunda pronúncia é perfeitamente inútil, por irrelevante – a consequência de dar como provado tal facto na sua forma negativa, seria exatamente igual a dar como “não provado” o facto alegado pelo autor de que o réu procedeu ao corte dos eucaliptos existentes nos seus quatro prédios (único facto a dar como provado ou não provado, por constitutivo do direito do autor), ou seja, a da improcedência da ação

A partir do momento em que não se prova que o réu tenha mandado cortar eucaliptos existentes nos prédios do autor, a ação sempre será de improceder.

Como tal, a matéria dada como provada sob aos pontos 20. (sobre o conhecimento que o réu tinha sobre os limites do prédio), bem como a matéria constante dos pontos 21., 22., 25, 26 e 27 (em que se afirma que o réu “não” mandou cortar nem vendeu quaisquer árvores existentes nos prédios dos autores), são de eliminar, por irrelevantes, com exceção do facto relativamente ao qual existe acordo entre as partes:

21. Em finais de 2018, princípios de 2019, o Réu vendeu eucaliptos ao sr. FF e em momento anterior, não concretamente apurado, tinha vendido eucaliptos ao LL.


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Os Apelantes impugnam igualmente a decisão proferida quanto aos factos constantes da als. A), B), C), D) E), E) F), dos factos dados como não provados:

A - Os eucaliptos existentes nos prédios, inscritos na matriz predial rústica da freguesia ..., sob os artigos ...44º. 9075º e ...25º, bem como o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... tinham um diâmetro entre 18 a 20 cm.

B - Os autores tiveram conhecimento no ano de 2017 ou 2018, que o réu ordenou o corte dos eucaliptos nos prédios inscritos na matriz predial rústica da freguesia ..., sob os artigos ...44º. 9075º, bem como o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., sob o artigo ...64º, sendo que já em 2020 ou 2021, o mesmo se passou relativamente ao prédio inscrito sob o artigo ...25º da freguesia ....

C – As árvores cortadas nos prédios dos autores correspondiam esteres um valor mínimo de € 9.000,00 (nove mil euros).

D - O réu além de cortar as árvores existentes nos referidos imóveis, conforme supra referido, vendeu-as e fez seu o produto das vendas das mesmas, sabendo perfeitamente que tais prédios não são sua propriedade, nem as árvores aí existentes, maioritariamente eucaliptos, lhe pertenciam.

E - Quem procedeu aos cortes nos prédios dos autores não procedeu à recolha e eliminação dos sobrantes das árvores abatidas impedindo a regeneração dos eucaliptais, pelo que, para os rentabilizar, estes terão de fazer nova plantação.

F – Os autores terão de contratar uma empresa para proceder à recolha e destruição dos sobrantes, tendo de lavrar, fresar e escarificar o solo dos prédios em causa, bem como adquirir e plantar novos eucaliptos e adubar e proceder ao tratamento fitossanitários das novas plantas, cujo custo de tais serviços ascende a € 4.000,00 (quatro mil euros).

G – Os autores ficaram ansiosos, tristes e nervosos pela atitude e conduta do réu.


*

Quanto ao facto constante da al. A), que o tribunal deu como não provado, respeitante ao diâmetro dos eucaliptos existentes nos prédios dos autores, é um facto meramente instrumental – tendo por função coadjuvar o juiz a retirar induções ou valorações sobre a realidade dos factos principais[4] –, ajudando a modelar o convencimento do juiz, relativamente aos factos que verdadeiramente importa indagar e provar: se o réu ordenou o corte de eucaliptos que se situavam, não no seu prédio, mas nos (ou nalgum) dos prédios dos autores, e que é irrelevante enquanto tal.

Só assim não o será, quando eles sirvam para apoiar o estabelecimento de presunções judiciais ou para preencher determinados conceitos jurídicos ou juízos de valor relevantes para a procedência da ação ou da defesa[5].

Os factos instrumentais têm uma função probatória, na medida em que não constituem uma condicionante direta da decisão, sendo a sua função, antes, a de permitir a prova dos factos principais[6].

Tendo uma função probatória, devem por essa razão, em regra, integrar a motivação da matéria de facto, em lugar da sua discriminação enquanto factualidade julgada provada, enquadrando o nº4 do artigo 607º do CPC a sua relevância no momento da análise critica dos meios de prova, indicando o juiz o processo logico dedutivo em que baseia as ilações tiradas de factos concludentes, com base nas regras e nas máximas da experiência da vida, sendo pois, essas ilações dados de facto que carecem de motivação (processo de convencimento)[7].

Atenta a função secundária que desempenham no processo, tendente a justificar simplesmente a prova dos factos essenciais, e podendo em regra ser livremente discutidos e apreciados na audiência final, não deverão ser objeto de um juízo probatório especifico[8].

Revertendo aos factos em apreço, a espessura dos eucaliptos situados nos prédios dos autores, constituiria um mero elemento, conjugado com todos os demais disponíveis, a entender no processo de formação da convicção do tribunal, na hora de decidir sobre o verdadeiro facto essencial consistente em determinar se, com os cortes de eucaliptos determinados pelo Réu, foram igualmente cortados eucaliptos situados nos identificados prédios dos autores.

Como tal, não é de apreciar a impugnação deduzida pelos Apelantes quanto a tal facto.


*

Passemos a analisar a decisão proferida quanto ao facto que o tribunal veio a dar como “não provado” sob a al. B):

 B) Os autores tiveram conhecimento no ano de 2017 ou 2018, que o réu ordenou o corte dos eucaliptos nos prédios inscritos na matriz predial rústica da freguesia ..., sob os artigos ...44º. 9075º, bem como o prédio rústico inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., sob o artigo ...64º, sendo que já em 2020 ou 2021, o mesmo se passou relativamente ao prédio inscrito sob o artigo ...25º da freguesia ....

O juiz a quo justificou, pelo seguinte modo, a convicção com que o deixou a instrução e discussão da causa e que o levou, não só, a dar como “não” provado que o réu tenha ordenado o corte de eucaliptos existentes em qualquer um dos prédios dos autores, como, a dar, inclusivamente, como “provado”, que o réu nunca o fez:

“Prosseguindo, a questão que suscitou particular controvérsia nos autos era a questão de se saber se o Réu excedeu os limites dos seus prédios e procedeu ao corte e venda de madeira de terrenos que pertenciam aos terrenos dos Autores.

Mas antes disso importa contextualizar a contenda em apreço, tendo como fontes mais conhecedoras a Autora AA, que prestou declarações de parte, o Réu CC, que prestou depoimento e declarações de parte e a testemunha EE, filho dos Autores e instituído como “procurador” da Autora para cuidar dos terrenos sendo as pessoas ouvidas que revelaram ter maior conhecimento sobre as questões em apreço, a par com a testemunha MM, pessoa que trabalhou e trabalha para o Réu. E nesta parte foram todos concordantes no sentido de, por razões familiares, terem diversos prédios que confrontam entre si, originários de heranças respectivamente da Autora e do Réu, sendo que o Pai da Autora era irmão do Avô do Réu sendo que tais prédios que confrontam uns com os outros têm sensivelmente a mesma área porque, dizemos nós, em data anterior pertenceram ao mesmo proprietário só depois tendo sido divididos e partilhados.

Não obstante também é assumido que, pese embora a propriedade díspar durante décadas, nunca existiram quaisquer problemas entre estremas, relevantes até pelo corte periódico de eucaliptos nos terremos em causa, até ao momento do falecimento do pai do Réu,

E a questão em discussão prende-se, segundo a matéria descrita na petição inicial, em cortes de madeira que o Réu terá feito em finais de 2018 – cfr. artigo 18.º da petição inicial.

E sobre essa matéria foi ouvida a Autora AA, em apertada síntese afirmando achar que os factos aqui em causa foram todos mais ou menos em 2018, mas acabando por ter conhecimento limitado visto que encarregou o seu filho de gerir toda a matéria relacionada com a exploração dos terrenos e das madeiras, mas avançando de todo o modo que os cortes em causa foram em diferentes circunstâncias de tempo, os três primeiros relacionadas com uma venda a um madeireiro de nome KK de alcunha “...”.

De todo o modo com conhecimento mais pormenorizado, foi ouvida a testemunha EE, filho dos AA, que descreveu na sua visão, como o Réu se terá apropriado da madeira que existia nos seus terrenos tendo conhecimento directo visto que os vem gerindo há vários anos. Descreveu também que existiram 2 cortes distintos, o ultimo já durante a pandemia, portanto após Março de 2020, no caso o do prédio com o n.º ...25 (facto 1.º c), ao passo que o corte nos três outros terá sido entre 2017 e 2018.

Diga-se desde já que não se pode deixar de considerar que esta testemunha acaba por contrariar desde logo o descrito na petição inicial, quanto ao período de corte sendo manifestamente diferente situar os cortes em finais de 2018 como na petição inicial, ou em 2017/2018 ou já no período de pandemia sempre após Março de 2020.

De qualquer maneira, o corte dos 3 prédios terá sido em 2017/2018 feitos pelo Sr. KK que “terá cortado” a mando do Réu e o ultimo cortado pelo Sr. FF – o com o n.º matricial ...5 de ....

Depois descreveu os factos conforme dados como provados em 10.º 2.ª parte, 11 e 12, não havendo quanto a essa matéria qualquer motivo para colocar em causa quanto a essa matéria.

No obstante afirmou quanto aos cortes que os observou, neste ultimo caso chegando a chamar a GNR e nos outros 3 que chamou a atenção às pessoas que andavam a cortar tendo-os chamado a atenção, ao que por essas pessoas lhe foi dito que tinham comprado ao Sr. CC e que como tal ele se entenderia com os AA.

(…)

Igualmente afirmou ao levantamento topográfico que a testemunha fez quanto ao prédio inscrito sob o artigo ...25.º (documentos junto com o requerimento n.º 699 18 77 de 19.1.2022), sendo de denotar a discrepância entre a escala de área do terreno dos Autores e do Réu, apresentando-se o terreno do Autor como bem maior do que o do Réu, sendo certo que na matriz da certidão das finanças (documento n.º 5 da PI e documento n.º 1 da Contestação) tem áreas iguais.

Também com relevo, e com o condão de ajudar a perceber a forma temporal em que os factos se situaram, foi ouvido o Réu, que para além dos factos dados como provados em sede de assentada, descreveu que após ter herdado diversos terrenos em 2013, passou a explorá-los tendo vendido a madeira mas não sem antes verificar onde estavam as estremas dos seus terrenos e indicando as mesmas aos compradores. Concretamente sobre o terreno em ... – o ...5 descreveu como chegou a reunir com o filho dos Autores visto que o mesmo teria marcações feitas por este, a afirmou tê-las feito de acordo com uma escritura passada, feito pelos anteriores proprietários, mas que nunca apareceu. Referiu que a certa altura no passado e entre os antecessores de todos terão havido conversações para atualização de estremas mas que não tiveram desfecho positivo mantendo-se como sempre foram.

Com interesse manifestou porém que os cortes que fez ou mandou fazer da madeira nos seus terrenos foram ao Sr. KK em 2015 e a ultima ao Sr. FF em 2018.

Sobre estas matérias depuseram ainda com interesse GG, que chegou a trabalhar para o Sr. KK tendo conhecimento por força de ter feito o transporte de madeira de terrenos do Réu, a na altura apenas andando como o camião de transporte, afirmando não obstante ter conhecimento difuso e com base no que o seu patrão lhe dizia, tendo porém como certo que tais cortes foram antes de 2017 (visto que foi nessa altura que mudou de ocupação laboral, embora na mesma área).

Igualmente se atendeu ao depoimento de MM, zelador dos prédios do Réu há vários anos e com particular afirmou que quanto ao corte do Sr NN do prédio situado junto ao cemitério, afirmou que a certa altura foi avisá-lo que da parte do Sr, CC era “só metade” tendo o madeireiro dado ordem de corte de tudo.

Foram ainda ouvidas as OO, num primeiro momento afirmando ter conhecimento sobre os terrenos em crise nos autos, mas sem contudo saber por onde se davam as estremas das mesmas, bem como não presenciou o corte da madeira nem entrou posteriormente na propriedade dos Autores (artigo ...25.º) para poder, com certeza, afiançar que o réu excedeu o limite da sua propriedade aquando do corte de madeira que mandou fazer, ao passo que a testemunha DD, arrolada pelos Autores, começou por referir que o Réu vendeu aquilo que não era seu para, num momento posterior, afirmar que não sabe por onde se dão as estremas, que não sabe quem mandou cortar as árvores e concluir que o Réu deve ter terrenos juntos com os dos Autores pois são família, mas não sabe de quem são os terrenos, pelo que o relevo do depoimento destas testemunhas acaba por ser muito limitado.

Aqui chegados podemos dividir a matéria de facto em apreciação a dois grupos de prédios: i) um primeiro grupo referente aos prédios inscritos na matriz sob os artigos ...44.º (...), ...5.º (...) e ...64.º (...) e; ii) um segundo grupo referente ao prédio inscrito sob o artigo ...25.º.

No que tange ao primeiro grupo, afigura-se-nos razoável concluir que de facto existiu um corte de madeira não autorizado nem ordenado pelos Autores.

Com efeito desde logo a testemunha MM, zelador dos terrenos do Réu, mencionou que ocorreu tal corte em área que o Réu não tinha vendido. Afirmou porém, tal como indicado pelo Réu, que este indicou claramente ao madeireiro os limites do seu terreno, nada mais o tendo autorizado a cortar. Mas tão importante quanto isso é que resultou da prova produzido e de forma manifesta, que o corte feito nos referidos 3 terrenos de modo nenhum ocorreu em “finais de 2018”. Com efeito o próprio Réu afirmou que os mesmos foram feitos em 2015, sendo tal versão reforçada pelo depoimento da testemunha GG, que, sem o mínimo interesse na causa referiu que tais cortes ocorreram sempre em data anterior a 2017 (…).

De qualquer das formas, não existiu como se descreveu a mínima prova que o Réu tenha cortado ou dado ordem para cortar de forma ilícita, qualquer madeira situada nesses terrenos, motivo pelo qual ficam não provados os factos c) a m) quantos os prédios aí em causa.

No que tange ao segundo grupo, isto é, ao prédio inscrito sob o artigo ...25.º, não ficou provado que o Réu tenha procedido ao corte e à venda dessa madeira.

Ora, para além do já descrito, quer o Réu CC, quer a testemunha EE, filho dos Autores, mencionaram que há uma prática de os vizinhos nunca cortarem as árvores dos prédios confinantes nos mesmos anos (facto 23.º) e que os compradores são pessoas locais que compram a madeira dos vários prédios há décadas e conhecem os prédios e os seus limites como ninguém, melhor até que muitos proprietários (facto 24.º).

Ademais, essas mesmas pessoas referiram que o avô do Réu tinha o hábito de deixar nas estremas dos seus terrenos uma “fiada/corrimão de eucaliptos em linha”.

A este propósito, a testemunha EE, filhos dos Autores, mencionou que quando mostrou o seu terreno (artigo ...25.º) à testemunha FF, madeireiro, este último reparou nos marcos e na direção dos mesmos afirmando que se se olhasse por aí acima via-se o alinhamento de eucaliptos do avô do Réu.

É certo que a testemunha EE, filho dos Autores, apresentou uma versão segundo a qual teria havido um acordo verbal entre o pai do Autor e o avô do Réu para mudar as estremas do terreno sob o artigo ...25.º e o do Réu que com ele confina, mas que tal acordo ficou sem efeito e que o Réu lavrava em erro quanto a essas estremas porque pensava que o acordo tinha efeito. Mais referiu que nesse acordo esteve presente um Sr. PP.

No entanto, o Réu, nas suas declarações, foi claro quanto a este ponto, tendo referido que tendo ouvido falar desse acordo, foi, a sugestão da testemunha EE, ter com o Sr. PP que lhe confirmou que o acordo estava sem efeito e que então mandou cortar pelos marcos conforme eles estavam.

A par disso, o Réu mencionou que a testemunha FF, a quem vendeu a mata, foi pedir a devolução do dinheiro à testemunha EE em face do engano com as estremas, o que foi corroborado pela testemunha FF (que descreveu tal matéria e de forma muito credivel), bem como pela Autora AA, nas suas declarações de parte, sendo que esta última referiu que teve de devolver dinheiro ao madeireiro e testemunha FF – donde resulta que, no que tange ao prédio sob o artigo ...25.º não haver qualquer prova de que o Réu tenha mandado cortar o que não lhe pertence, sendo ainda de apontar o inusitado da área do prédio sob o artigo ...25.º ilustrado pelo levantamento topográfico junto sob o doc 2 do requerimento n.º 699 18 77 de 19.1.2022, ter uma área bem maior do que o terreno descrito como sendo do Réu, sendo certo que na matriz da certidão das finanças (documento n.º 5 da PI e documento n.º 1 da Contestação) tem áreas iguais (0,4950 ha).

A ser assim, resulta que o Réu sabia os limites e configurações da sua propriedade confinante com o prédio dos Autores inscrito no artigo ...25.º, tendo o mesmo apenas procedido ao corte da madeira que se encontrava no seu terreno, donde resulta a prova dos factos 18.º a 22.º e 26.º a 27.º, este dois também relativos aos demais prédios, e não provados os factos c) a m) quanto a este prédio e s) a v) intimamente ligados a eventual conduta do Réu que não se provou.”

 Os Apelantes vêm defender que tais factos – que nos anos de 2017/2018, o Réu ordenou o corte dos eucaliptos nos prédios inscritos sob os artigos ...44, ...75..., ...64, e já em 2020, 2021, o mesmo se passou com o prédio inscrito no artigo 9.225 – devem ser dados como “provados”, invocando a seu favor o depoimento da autora – que afirmou que “aconteceu que ao cortar os eucaliptos deles também mandou cortar os nossos” e o depoimento da testemunha EE – que afirmou que o KK foi uma das pessoas que cortou três prédios e que aquele lhe afirmou que terá avisado o aqui réu de que aquela madeira não era dele, situando tais cortes em 2018 – e no depoimento de GG – que afirmou que ouviu falar ao seu primo que andavam a cortar dois ou 3 prédios da AA.

Tendo o tribunal recorrido sido tão minucioso na análise da prova – confrontando o que é afirmado por cada uma das testemunhas relativamente a cada facto ou circunstâncias que rodearam o corte dos eucaliptos ordenado pelo réu, explicando as ilações que retira dos pontos comuns e dos pontos em que divergem, e distinguindo dois momentos factuais, nos cortes de eucaliptos ordenados pelo réu (um em momento situado em finais de 2018 e um outro em momento anterior) –, da impugnação deduzida pelos Apelantes, não ressalta qualquer erro ou má compreensão da prova por parte da decisão recorrida. Limitando-se a selecionar cirurgicamente algumas afirmações da autora, AA, ouvida em declarações de parte – que se constatou nada saber pessoalmente pois é o seu filho quem vem tomando conta dos prédios –, da testemunha EE, filho dos autores, e da testemunha GG, afirmações que o tribunal a que teve em consideração e que conjugou criticamente com a restante prova, e ficando claro que os alegados cortes se reportam a dois momentos temporais distintos, os Apelantes limitam-se a reproduzir pequenos excertos de tais declarações sem os contextualizar.

E, pela nossa parte, a audição de tais depoimentos, bem como do depoimento de parte do Réu dos depoimentos das demais testemunhas, não nos deixou convicção diversa da exposta pelo tribunal a quo, sendo que, as afirmações de que se socorre, quer por parte da autora, quer por parte da testemunha GG são de “ouvir dizer”.

Com efeito, a testemunha GG que trabalhou para o Sr. KK até que, em finais de 2017, começou a trabalhar por conta própria, à pergunta que lhe foi colocada pelo ilustre mandatário dos autores, ela própria indiciadora da resposta que se pretendia, “Nessa altura foram cortados os prédios do Sr. CC e outros da D. AA, é isso?”, respondeu “Foram cortados uns dois ou três. Eu ouvia eles a falar, andavam a cortar prédios do CC, e que havia ali dois ou três prédios da AA, e ele antigamente comprava, eles sempre se deram bem e nunca havia problema nem de um nem de outro, depois acertavam tudo (…) eu só carregava a madeira para a fábrica”.

E referir, que para além das declarações do filho dos autores, ninguém confirma por conhecimento pessoal que o réu tenha ordenado o corte para além daquilo que era seu.

Aliás, quer das declarações do EE, filho dos autores, quer do Réu, quer da testemunha FF (madeireiro que procedeu ao corte levado a cabo em 2018), fica a ideia de que as discrepâncias sobre se, com o corte ordenado pelo réu terão sido cortados eucaliptos situados no prédio dos autores, resulta precisamente num conflito de estremas entre os artigos 2925 dos autores e o artigo 2924, na posição divergente entre ambos quanto a uma alegada correção das estremas – o EE afirma ter existido um acordo de alteração de estremas, enquanto o Réu afirma que tal acordo em embora discutido nunca entrou em vigor. Aliás, é curioso o relatado por esta testemunha FF, afirmando que, depois de o EE lhe ter vendido 3 ou 4 matas, e depois de a testemunha ter sido contactada  pelo Réu CC que lhe queria que uma parte que já lhe tinha sido vendida pelo EE, e depois de conversações entre ambos (entre o CC e o primo QQ), o EE acabou por lhe devolver o dinheiro respeitante a esta parte (o que foi confirmado pela autora AA nas suas declarações de parte). É certo que tal testemunha afirma que, algum tempo depois, acabou por fazer negócio com o CC e que cortou eucaliptos numa área de 6.000/7.000 m2, quando o prédio nº ...24 (do réu) surge na matriz como tendo 4.950 m2, o que poderia apontar no sentido de que poderiam ter sido eucaliptos não pertencentes a tal prédio. Contudo, tal discrepância poderá resultar de o cálculo da testemunha ter sido feito sem qualquer medição do local, sendo que, se tal corte abrangia a parte que a autora lhe tinha primeiramente vendido, e se esta parte pertencia ao seu artigo 2925, nos podemos questionar por que motivo os autores aceitaram desfazer tal negócio e devolver o valor que por ele tinham recebido?

Como tal, ainda que ficassem dúvidas sobre se, com os cortes que o Réu mandou efetuar, poderiam ter sido cortados alguns eucaliptos situados nalgum daqueles prédios dos autores (sendo que, quer na sua alegação, quer na prova que trouxe ao tribunal, a referência que é feita ao corte de eucaliptos em cada um dos prédios é perfeitamente genérica, não indicando o número de arvores cortadas – e se árvores foram cortadas e lá ficaram os cepos, os autores poderiam ter-se dado ao trabalho de as contar – ou áreas concretamente abrangidas pelo corte[9]), tais dúvidas virar-se-iam contra os autores, nos termos do artigo 414º do CPC -  A dúvida sobre a realidade dum facto e sobre a repartição do ónus da prova resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita –, por ser sobre eles que impendia o ónus de alegação e prova de tais factos.

 Concluindo, nenhuma censura nos merece a resposta dada pelo tribunal a tal ponto da matéria de facto, improcedendo, nesta parte a impugnação dos Apelantes.


*

Mantendo-se a decisão de dar como não provada a matéria constante da al. B) dos factos dados como não provados – e importando a ausência de prova de tal facto, por si só, a improcedência total da ação, prejudicado fica o conhecimento da impugnação deduzida aos demais pontos C), D), E), F) e G), por inútil.

*

A. Matéria de Facto

São os seguintes os factos dados como provados na decisão recorrida, apos as alterações aqui introduzidas em sede de impugnação à matéria de facto:

- FACTOS PROVADOS:

Da petição inicial:

1. Os autores são donos e legítimos possuidores dos seguintes prédios rústicos:

a) Prédio rústico constituído por pinhal e mato, sito no lugar de ..., com a área inscrita de 880 (oitocentos e oitenta) metros quadrados, inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...44º, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ..., que na matriz apresenta as seguintes confrontações: Norte – Herdeiros de RR; Nascente – Herdeiros de SS; Sul – Estrada Pública e; Poente – TT e UU.

b) Prédio rústico constituído por pinhal e mato com oito tanchas, sito no lugar de ..., com a área inscrita de 4.067 (quatro mil, sessenta e sete) metros quadrados, inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...75º, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ..., que na matriz apresenta as seguintes confrontações: Norte – Herdeiros de SS; Nascente – Herdeiros de VV;Sul – OO e Herdeiros de VV; Poente – Estrada.

c) Prédio rústico constituído por pinhal e mato, sito no lugar de ..., com a área inscrita de 4.950 (quatro mil, novecentos e cinquenta) metros quadrados, inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., concelho ..., sob o artigo ...25º, omisso na Conservatória do Registo Predial ..., que na matriz apresenta as seguintes confrontações: Norte – Baldio; Nascente – ... e outros; Sul – HH e outros; Poente – SS.

d) Prédio rústico constituído por eucaliptal, pinhal e mato, sito no lugar de ..., com a área inscrita de 3870,50 (três mil, oitocentos e setenta virgula cinquenta) metros quadrados, inscrito na matriz predial rústica da freguesia ..., sob o artigo ...64º, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ..., que na matriz apresenta as seguintes confrontações: Norte –Herdeiros de SS; ...; Sul – Estrada pública; Poente –Herdeiros de WW.

2. Tais prédios vieram à titularidade dos autores por herança por óbito dos pais da autora mulher, através das escrituras de habilitação de herdeiros realizadas em 9 de janeiro de 1992 e 25 de julho de 2000 e exaradas nos livros 448-A e 30-C ambos do Cartório Notarial ....

3. Os autores por si e seus antecessores há mais de 10, 15, 20, 25 e mais anos, vêm detendo, desfrutando, fruindo e usufruindo de tais imóveis, neles plantando nomeadamente pinheiros e eucaliptos, arroteando, cortando, surribando, escarificando, roçando mato, e tudo que lhes aprouver, retirando assim todas as utilidades que tais prédios proporcionam, em seu proveito e interesse exclusivo.

4. Tudo isto, à vista de toda a gente, e do próprio réu, isto é, publicamente.

5. De forma contínua e ininterrupta.

6. Sem oposição ou violência de ninguém, antes de modo pacífico.

7. Pagando as contribuições e impostos respeitantes.

8. Na intenção e convicção de que ao exercerem tal posse não lesavam como não lesam o direito de quem quer que seja, atuando assim de boa-fé convencidos de que gozavam coisa própria e de que lhes pertencem como proprietários exclusivos desses imóveis.

9. Agindo plenamente convictos de que estavam e estão a atuar no exercício de um direito de propriedade plena sobre os mencionados imóveis.

10. Os prédios dos autores estão devidamente demarcados com a colocação de marcos nos seus limites e embora consta da matriz que os prédios em questão eram pinhais, a verdade é que os mesmos estavam revestidos maioritariamente por eucaliptos plantados pelos pais da autora mulher há mais de 50 anos.

11. Os eucaliptos dos terrenos dos Autores tinham a seguinte idade:

a) Prédio rústico inscrito sob artigo ...44º, freguesia ... – 15 (quinze anos);

b) Prédio rústico inscrito sob artigo ...75º, freguesia ... – 20 (vinte anos);

c) Prédio rústico inscrito sob artigo ...25º, freguesia ... – 35 (trinta e cinco anos);

d) Prédio rústico inscrito sob artigo ...56º freguesia ... – 35 (trinta e cinco anos).

12. Os eucaliptos existentes nos referidos prédios tinham sido cortados, pelo menos uma vez, sendo que os mesmos aguardavam o seguinte corte:

a) Prédio rústico inscrito sob artigo ...44º, freguesia ... – segundo corte;

b) Prédio rústico inscrito sob artigo ...75º, freguesia ... – terceiro corte;

c) Prédio rústico inscrito sob artigo ...25º, freguesia ... – segundo corte;

d) Prédio rústico inscrito sob artigo ...56º freguesia ... - segundo corte.

13. Com efeito, o réu, possui prédios que confinam com os dos autores.

14. Os prédios do Réu não se confundem com os dos Autores, desde logo, porque os prédios dos Autores estão devidamente demarcados.

15. Embora, quer uns prédios, quer outros tenham eucaliptos, a verdade é que os cortes nos prédios dos autores não tinham sido contemporâneos dos cortes realizados nos prédios do réu.

16. O Réu adquiriu propriedades em ..., por via do falecimento de seu pai.

17. Enquanto pai do R. era vivo era este que administrava os prédios que possuía em ....

Contestação

18. O Réu é dono e legítimo proprietário de um prédio que confronta com o prédio dos Autores inscrito na matriz sob o artigo ...25.º, melhor identificado na alínea c) do facto 1.º da presente sentença.

19. O Réu, quando o seu pai faleceu, tratou de identificar no local, acompanhado pelos confinantes que assim o desejaram e com o Senhor MM, todas as propriedades que passaram a pertencer-lhe, incluindo a identificada no facto 18.º da presente sentença.

20. (eliminado)

21. Em finais de 2018, princípios de 2019, o Réu vendeu eucaliptos ao sr. FF e em momento anterior, não concretamente apurado, tinha vendido eucaliptos ao S. KK.

22. (eliminado)

23. Existe uma prática habitual e um costume instituído entre os produtores de eucaliptos, nos termos da qual, nunca se cortam as árvores dos prédios confinantes nos mesmos anos, para existir e permanecer essa diferenciação no crescimento que ajuda a perceber os limites de cada prédio.

24. Os compradores são pessoas locais que compram a madeira dos vários prédios há décadas e conhecem os prédios e os seus limites como ninguém, melhor até que muitos proprietários.

25. (eliminado).

26. (eliminado).

27. (eliminado).


*

B. Subsunção dos factos ao direito

2. Se é de alterar o decidido

Fazendo assentar todas as suas discordâncias com o decidido, na impugnação que deduzem à decisão proferida em sede de matéria de facto – pela qual pretendiam ver dado como provado que aquando dos cortes referidos no ponto 21, o Réu dera igualmente ordem de corte de eucaliptos situados nos prédios dos autores – e que aqui viram soçobrar, nada mais há aqui que apreciar.

A apelação é de improceder.


*

IV – DECISÃO

 Pelo exposto, acordam os juízes deste tribunal da Relação em julgar improcedente a Apelação, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas a suportar pela Autora/Apelante

                                               Coimbra, 22 de novembro de 2022       


 V – (…).



[1] Entre outros, Francisco Manuel Lucas de Almeida, 2ª ed., Vol. II, 2ª ed., Almedina p. 233.
[2] António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração, Artigos 1º a 702º, Almedina, p. 719, nota 10 ao art. 107º.
[3] E dizemos, em regra, porquanto, em determinadas situações, a correta e completa integração jurídica pode exigir a análise de uma e de outra das versões da realidade, como acontece frequentemente com as ações de indemnização por acidente de viação, as ações de divórcio litigioso ou de certas ações reais relacionadas com a posse prescricional – cfr., neste sentido, António Abrantes Geraldes, “Temas da Reforma do Processo Civil”, II Vol., 4ª ed., Almedina, pp.145-146.
[4] José Henrique Delgado de Carvalho, “Os Temas de Prova”, QUID JURIS, p. 61. No sentido de que, em regra os factos instrumentais poderão ser livremente discutidos e apreciados na audiência final, mas não tendo de ser alvo de um juízo probatório especifico, se pronunciam, ainda, Francisco Manuel Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, Vol. II, Almedina, p. 410, e António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, p. 719.
[5]
[6] José Lebre de Freitas, “Introdução ao Processo Civil”, 3ª ed., Coimbra Editora, p. 172.
[7] José Henrique Delgado de Carvalho, obra citada, p. 66.
[8] Neste sentido, Francisco Manuel Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, Vol. II, Almedina, p. 410, e António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, p. 719.

[9] Apenas o filho dos autores, EE, embora referindo ter a listagem desses valores, refere que no ... e no ... foi o prédio todo, mas que o arvoredo era muito separado, e no ... foi só uma parte, o que pouco adianta relativamente ao número de árvores cortadas.