Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | SÍLVIA PIRES | ||
Descritores: | ALIMENTOS EX-CÔNJUGE | ||
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Data do Acordão: | 04/17/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DE TOMAR – 3º JUÍZO | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTºS 2004º, Nº 2, 2016º, Nº 1, E 2016º-A DO C. CIVIL . | ||
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Sumário: | I – Com a reforma do C. Civil levada a efeito pelo DL 61/2008, de 31-10, o legislador afirmou, expressamente, o princípio de que depois do divórcio, cada ex-cônjuge deve prover à sua subsistência – n.º 1 do art.º 2016º do C. Civil –, o que já resultava das normas gerais sobre alimentos – n.º 2 do art. 2004º –, deixando, contudo, expresso que o ex-cônjuge credor não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio – art.º 2016º-A. II - Com esta orientação o legislador visou explicitar, de uma forma clara, que o direito a alimentos na sequência do divórcio só se constitui se o ex-cônjuge não tiver possibilidades de prover à sua subsistência. III - Assim, constatada que esteja a qualidade de ex-cônjuge do demandante de alimentos, tem que se apurar a sua incapacidade de prover à sua subsistência e somente após a constatação desta é que se parte para a verificação dos requisitos daquele preceito, i. e., a ponderação das necessidades de quem os pretende e as possibilidade daquele que os presta, sendo de considerar as várias circunstâncias ali enumeradas, com a finalidade de fixar o montante respectivo. IV - Está fora de qualquer dúvida que a prova da incapacidade de prover à subsistência, que está na génese do direito a alimentos entre divorciados, impende, como facto constitutivo desse direito, àquele que deles pretende beneficiar, sendo assim a Autora que terá que ter demonstrado os factos donde resulte essa incapacidade, seja com os seus bens pessoais, rendimentos do trabalho ou de capital. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra A Autora intentou a presente acção com processo ordinário, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe, a título de prestação de alimentos, a quantia mensal de € 550,00. Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese: … O Réu contestou, alegando, em síntese: … Concluiu pela improcedência da acção. Veio a ser proferida sentença que julgou a acção nos seguintes termos: Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente por provada e, em consequência, condeno J… a pagar, a título de alimentos, a I…, a prestação mensal de € 250,00, prestação que será paga até ao dia 10 do mês a que disser respeito, acrescida da quantia de € 50,00 por mês até amortização das prestações alimentares já vencidas. * Insatisfeito com a decisão o Réu interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: ... A Autora apresentou resposta, defendendo a confirmação da decisão. 1. Do objecto do recurso Encontrando-se o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, cumpre apreciar as seguintes questões: a) A Autora não tem necessidade de alimentos? b) Os rendimentos do Réu não permitem satisfazer a necessidade de alimentos da Autora? 2. Dos factos Os factos provados são os seguintes: … 3. O direito aplicável O presente recurso foi interposto na sequência da decisão que condenou o Réu a pagar à Autora a quantia mensal de € 250,00, a título de alimentos. Como fundamentos do recurso o Réu invoca a falta de necessidade da Autora, por um lado, e a sua incapacidade para lhos prestar, por outro. Autora e Réu foram casados entre si, tendo o casamento sido dissolvido por divórcio por mútuo consentimento decretado por sentença proferida em 28 de Junho de 2007. A Autora dirige o seu pedido de alimentos contra o Réu, na sua qualidade de ex-cônjuge, tendo intentado a presente acção em 15.3.2010. Com a reforma do C. Civil levada a efeito pelo DL 61/2008, de 31-10, o legislador afirmou, expressamente, o princípio de que depois do divórcio cada cônjuge deve prover à sua subsistência – n.º 1 do art.º 2016º do C. Civil –, o que já resultava das normas gerais sobre alimentos – n.º 2 do art. 2004º –, deixando, contudo, expresso que o cônjuge credor não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio – art.º 2016º-A. Com esta orientação o legislador visou explicitar, de uma forma clara, que o direito a alimentos na sequência do divórcio só se constitui se o ex-cônjuge não tiver possibilidades de prover à sua subsistência. E só se a um deles tal não for de todo possível, terá então o direito a receber alimentos do outro cônjuge, em montante que lhe permita garantir um mínimo de vida digna, e sempre de acordo com as reais possibilidades económicas do ex-cônjuge obrigado a prestá-los. Este direito, assentando num dever assistencial que perdura para além do casamento, passou a ter carácter subsidiário e, seguramente, limitado pela obrigação de socorro numa situação de grande exigência resultante de manifesta carência de meios de subsistência num quadro de impossibilidade ou séria dificuldade de obtenção de rendimento suficiente à realização de uma vida minimamente condigna.[1] Assim, constatada que esteja a qualidade de ex-cônjuge do demandante de alimentos, tem que se apurar a sua incapacidade de prover à sua subsistência e somente após a constatação desta é que se parte para a verificação dos requisitos daquele preceito, i. e, a ponderação das necessidades de quem os pretende e as possibilidade daquele que os presta, sendo de considerar as várias circunstâncias ali enumeradas, com a finalidade de fixar o montante respectivo. Está fora de qualquer dúvida que a prova da incapacidade de prover à subsistência, que está na génese do direito a alimentos entre divorciados, impende, como facto constitutivo desse direito, àquele que deles pretende beneficiar, sendo assim a Autora, no caso que nos ocupa, que terá que ter demonstrado os factos donde resulte essa incapacidade, seja com os seus bens pessoais, rendimentos do trabalho ou de capital. Na verdade, a necessidade do alimentando consiste na impossibilidade de prover total ou parcialmente à sua subsistência, seja com os seus bens pessoais seja com o seu trabalho, sendo, pois, a impossibilidade de prover ao seu sustento aferida pelo seu património e pela sua capacidade de trabalho. No caso de poder prover às suas necessidades através do seu trabalho ou de outros meios que lhe proporcionem um rendimento suficiente, o direito a alimentos pelo ex-cônjuge não lhe deve ser reconhecido, dado ser um meio subsidiário, só justificável na ausência de outros meios de subsistência. Quanto ao património deve ter-se em conta os rendimentos que lhe proporcionem os bens do qual é proprietário, mas também a possibilidade de proceder à alienação desses bens para daí obter proventos que possibilitem a sua subsistência. Quanto à capacidade de trabalho do alimentando, caso não se encontre a exercer uma profissão remunerada, deve ter-se em conta a sua formação, competências, idade e o seu estado de saúde, tendo sempre presente que é sobre si que impende o dever de prover à satisfação das suas necessidades fundamentais, de harmonia, de resto, com o princípio da responsabilidade pessoal de cada um dos cônjuges pelo seu futuro económico depois do divórcio. Não basta, no entanto a simples capacidade para o trabalho, sendo ainda necessária a possibilidade real de efectiva ocupação laboral, dada a dificuldade com que se pode deparar em encontrar posto de trabalho em consequência do desemprego e da crise económica. Nada se apurou quanto à impossibilidade da Autora prover ao seu próprio sustento, nomeadamente que esteja impossibilitada de trabalhar ou que não seja possível rentabilizar ou alienar o seu património imobiliário no sentido de obter meios que lhe permitam prover, por si só, ao seu sustento. Com alguma relevância apenas se provou que a Autora tem como único rendimento o montante que lhe é pago a título de RMI, que no divórcio Autora e Réu acordaram em que este lhe pagava, a título de alimentos e até à partilha dos bens, a quantia mensal de € 500,00, e que a Autora sempre foi doméstica. Estes factos se revelam que a Autora não aufere rendimentos suficientes para a sua subsistência condigna, não são suficientes para permitirem a conclusão de que a Autora não tem condições para, através do desempenho de uma profissão ou da rentabilização do seu património, prover ao seu sustento. Face ao exposto, não tendo a Autora demonstrado uma impossibilidade efectiva de prover ao seu sustento não podem à mesma ser atribuídos alimentos a prestar pelo ex-cônjuge, ficando assim prejudicada a apreciação das possibilidades do Réu em os prestar. Decisão Pelo exposto, julga-se procedente o recurso interposto pelo Réu e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, julgando-se a acção improcedente e absolvendo-se o Réu do pedido formulado pela Autora. Custas da acção e do recurso pela Autora.
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