Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1717/13.5PBVIS-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HELENA BOLIEIRO
Descritores: PENA ACESSÓRIA
PROIBIÇÃO DE CONDUZIR VEÍCULOS COM MOTOR
LIQUIDAÇÃO
DESPACHO
FUNDAMENTAÇÃO
IRREGULARIDADE
Data do Acordão: 10/11/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU (JL CRIMINAL – J1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 97.º, 118.º, 123.º, 379.º DO CPP; ART. 69.º DO CP; ART. 121.º DO CE
Sumário: I - À excepção do que sucede com a sentença, em que a lei expressamente comina com nulidade [cf. artigo 379.º, n.º 1, alínea a), do CPP], a verificar-se omissão de fundamentação por violação da exigência contida no artigo 97.º, n.º 5, do CPP, esta consubstanciaria irregularidade nos termos previstos no artigo 118.º, n.os 1 e 2 do mesmo diploma.

II - Uma irregularidade só determina a invalidade do acto a que se refere quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio acto ou, se a este não tiverem assistido, nos 3 dias seguintes a contar daquele em tiverem sido notificados para qualquer termo no processo ou intervindo em algum acto nele praticado.

III - O cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor só se pode considerar iniciado a partir da efectiva entrega ou apreensão do título habilitante da condução.

IV - Sendo emitido o título de condução com a data de emissão de 11-12-2013, que o IMT expediu por correio registado em 10-07-2014 e que foi entregue na morada do recorrente em 11-07-2014, e só vindo a ser apreendido ao recorrente em 25-06-2015, tal lapso de tempo [entre 11-07-2014 e 25-06-2016] não conta para o prazo de 7 meses de proibição de conduzir imposta.

Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na 4.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório 
1. No processo comum singular n.º 1717/13.5PBVIS do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu – Juízo Local Criminal de Viseu – Juiz 1, o arguido A... , com os demais sinais dos autos, foi condenado, por sentença proferida em 16-12-2013, pela prática, como autor material, de um crime de condução em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 1 (um) ano. Mais foi condenado na pena acessória de proibição de conduzir quaisquer veículos motorizados, prevista no artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, pelo período de 7 (sete) meses.
2. Por despacho proferido em 07-07-2016, a Mma. Juíza concordou com a liquidação que a Digna Magistrada do Ministério Público efectuou da pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados aplicada ao arguido e determinou que se procedesse em conformidade com o promovido.

3. Inconformado, o arguido recorreu do referido despacho, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição):

“1- O Facto de o IMT ou a ANSR terem remetido a carta de condução, mesmo que o tenham feito, para uma morada atribuída ao arguido, este não a recebeu.

2- Não existe nos autos qualquer prova em como o original da carta de condução foi entregue ao arguido.

3- A pena acessória já foi por isso integralmente cumprida.

4- Não ocorre causa de suspensão para o cumprimento da pena acessória.

Pretende-se assim que tenha sido violado o previsto nos artigos 613 do CPC, bem como o art º 374 nº 2 do CPP

Termos em que

E sempre com o douto suprimento de Vs. Exa. se pugna pela procedência do presente recurso, devendo a decisão em crise ser substituída por outra que declare extinta pelo cumprimento, a pena acessória

Assim se crê que seja feita Justiça”.

4. Admitido o recurso, a ele respondeu a Digna Magistrada do Ministério Público, pugnando no sentido de que lhe seja negado provimento, para o que alega, em síntese, que tendo em vista o cumprimento da pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pelo período de 7 meses, o arguido procedeu à entrega da guia de substituição do seu título de condução no dia 30-05-2014, sendo que tal cumprimento foi declarado suspenso desde o dia 11-07-2014, porquanto nessa data lhe foi entregue a sua carta de condução que só veio a ser apreendida em 25-06-2016. Ora, uma vez que a pena acessória só se cumpre com a efectiva entrega ou apreensão dos títulos de condução de que o arguido seja portador, apenas a partir do referido dia 25-06-2016 se reinicia o cumprimento da pena acessória em falta e que termina, assim, em 14-12-2016. Mais invoca a magistrada respondente que não se percebe como é que o arguido refere no seu recurso que não recebeu a carta de condução que lhe foi remetida pelo IMT, quando, não obstante sempre afirmasse que não a tinha, a mesma acabou por ser apreendida na sua posse no dia 25-06-2016.

5. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que alude o artigo 416.° do Código de Processo Penal (doravante CPP), emitiu parecer em que acompanha a resposta da Digna Magistrada do Ministério Público na 1.ª instância, sustentando, assim, a improcedência do recurso interposto pelo arguido.

6. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, não foi apresentada qualquer resposta.

7. Após exame preliminar e colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

Cumpre agora decidir.

                                                            *

II – Fundamentação 

1. Dispõe o artigo 412.º, n.º 1 do CPP que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.

Constitui entendimento constante e pacífico que o âmbito dos recursos é definido pelas conclusões formuladas na motivação, as quais delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar[1], sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso[2].

Atentas as conclusões apresentadas, que traduzem de forma condensada as razões de divergência do recorrente com a decisão impugnada, a questão a decidir é a de saber se no cômputo do prazo da proibição de conduzir veículos com motor aplicada nos presentes autos releva a causa de suspensão considerada pelo tribunal a quo e que determinou que o seu termo tivesse lugar no dia 14-12-2016 e não antes.

Como adiante se verá, esta Relação abordará uma outra questão que o recorrente suscitou no corpo da motivação e que, pelo desfecho que sempre se verificaria quanto à mesma, não justificou, por se revelar desnecessário, qualquer convite ao aperfeiçoamento das conclusões formuladas.

                                                      *

2. O despacho recorrido e os elementos relevantes dos autos.

2.1. O despacho recorrido tem o seguinte teor:

Fls. 294

Concordo com a liquidação da pena acessória aplicada ao arguido.

Proceda-se conforme o promovido.

Notifique.

                                                           *

No mais, como se promove”.                                             

                                                           *

2.2. Por sua vez, a promoção sobre a qual versa o despacho recorrido tem o seguinte teor:

“(…)

Fls. 291-293:

Tomei conhecimento.

Nos presentes autos, por sentença transitada em julgado no dia 03.02.2014, foi o arguido condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, para além do mais, na pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pelo período de 7 meses.

Tendo o arguido procedido à entrega da guia de substituição do seu título de condução no dia 30/05/2014 (fls. 131), tendo o cumprimento de tal pena acessória sido declarado suspenso desde o dia 11/07/2014 porquanto nessa data lhe foi entregue a sua carta de condução (fls. 136//137/142/143) e visto que apenas no dia 25/06/2016 lhe foi aprendida a sua carta de condução, sendo que apenas a partir dessa data se reinicia o cumprimento do tempo da pena acessória em falta, promove-se que a mesma lhe seja entregue a partir do dia 14/12/2016.

Mais promovo que se dê conhecimento ao arguido e ao OPC competente da área de residência do arguido (Carregal do sal e Loulé) do período de tempo em que a sua carta de condução se encontra apreendida nestes autos a fim de ser cumprida pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor na via pública para efeitos de fiscalização”.

2.3. Na sentença referida em 2.2., que aplicou ao arguido a pena acessória de proibição de conduzir quaisquer veículos motorizados pelo período de 7 (sete) meses, constam ainda os seguintes elementos:

“Dê-se oportuno cumprimento ao disposto nos artigos 69.º/2/3 do Código Penal e 500.º/1/2/4 do Código de Processo Penal, com a expressa cominação de que não entrega da carta constitui crime de desobediência (artigo 348.º/1, b) do Código Penal).

(…)

Prazo para a entrega da carta: dez (10) dias após o trânsito em julgado da sentença (artigos 69.º/2/3 do Código Penal e 500.º/2 do Código de Processo Penal).

Local para a entrega da carta: secretaria judicial ou em qualquer posto policial, bem como Delegações do I.M.T. (artigos 69.º/3 do Código Penal e 500.º/2 do Código de Processo Penal)” – cf. fls.7-vº e 8 do presente recurso em separado, que correspondem a fls.54-vº e 55 dos autos”.

2.4. Em 11-12-2013, o arguido requereu na Delegação Distrital de Viação de Beja do IMT a revalidação da sua carta de condução, tendo nessa data sido entregue ao mesmo uma guia de substituição da carta de condução, a qual lhe permitia conduzir até 11-03-2014 – cf. fls.11, 12 e 13 do presente recurso em separado, que correspondem a fls.121, 122 e 123 dos autos.

2.5. Em 30-05-2014, o arguido, através do seu Defensor, procedeu à entrega nos autos da guia de substituição referida em 2.4. – cf. fls.18 e 19 do presente recurso em separado, que correspondem a fls.130 e 131 dos autos.

2.6. Na sequência do pedido formulado pelo arguido na Delegação Distrital de Viação de Beja do IMT, referido em 2.4., foi emitido o título de condução n.º P- (...) , com a data de emissão de 11-12-2013, o qual foi expedido pelo correio em 10-07-2014, sob o registo n.º RN681554410PT, e entregue na morada do arguido em 11-07-2014 – cf. fls.20, 21, 22, 23, 24 e 25 do presente recurso em separado, que correspondem a fls.136, 137, 138, 139, 140 e 141 dos autos, sendo fls.21 o documento de pesquisa de objectos CTT, relativo ao registo n.º RN681554410PT, no qual consta que a entrega do referido objecto foi conseguida em 11-07-2014, pelas 10h00m, e fls.22 o documento de pesquisa do IMT, relativo aos registos de envio de cartas de condução via CTT, no qual consta que à carta n.º P- (...) , em nome de A... , corresponde o referido registo n.º RN681554410PT.

2.7. Em 25-06-2016, na Área de Serviço da A22, km 62, sentido Loulé-Albufeira, a GNR (Posto Territorial de Loulé) procedeu à apreensão ao arguido da carta de condução n.º P- (...) – cf. fls.46 e 47 do presente recurso em separado, que correspondem a fls.292 e 293 dos autos, mencionadas na promoção transcrita em 2.2., sendo fls.46 o auto de apreensão de carta de condução lavrado pela GNR (Posto Territorial de Loulé), em 25-06-2016, e fls.47 cópia do documento apreendido, com o n.º P- (...) , onde se pode ler que o mesmo foi emitido em 11-12-2013, pelo IMT – Beja, encontrando-se aposta na folha da referida cópia a anotação de que “A carta de condução fica apensa por linha na contracapa dos autos”.

                                                          *

3. Apreciando.

3.1. Antes do mais, cumpre referir uma questão cuja extemporaneidade na invocação implica necessariamente a sua improcedência, tornando, assim, inútil que no momento próprio se tivesse formulado convite para o recorrente completar as conclusões do recurso, nos termos do disposto no artigo 417.º, n.º 3 do CPP.

Com efeito, no corpo da motivação do recurso diz-se que o despacho recorrido enferma de “irregularidades formais e técnicas”, por nele se ter tomado decisão por simples adesão por concordância com a promoção do Ministério Público que representa muito mais do que uma liquidação de pena acessória, face ao facto controvertido de que o arguido recebeu o original da carta de condução em 11-07-2016.

A questão assim invocada no recurso não foi levada às respectivas conclusões, sendo certo que no final das mesmas o recorrente fez constar, em sede de indicação de normas violadas, o artigo 374.º, n.º 2 do CPP que, como é sabido, respeita ao requisito da sentença relativo à fundamentação de facto e de direito.

Ora, a decisão sindicada não é uma sentença, pelo que, à excepção do que sucede com esta, em que a lei expressamente comina com nulidade [cf. artigo 379.º, n.º 1, alínea a), do CPC], a verificar-se omissão de fundamentação por violação da exigência contida no artigo 97.º, n.º 5 do CPP, esta consubstanciaria irregularidade nos termos previstos no artigo 118.º, n.os 1 e 2 do mesmo diploma[3], a qual só determina a invalidade do acto a que se refere quando tiver sido arguida pelos interessados no próprio acto ou, se a este não tiverem assistido, nos 3 dias seguintes a contar daquele em tiverem sido notificados para qualquer termo no processo ou intervindo em algum acto nele praticado (artigo 123.º do CPP).

O que, in casu, não se verificou.

Na verdade, conforme se alcança da certidão destinada à instrução do presente recurso em separado, o despacho recorrido foi notificado ao arguido por via postal expedida em 19-07-2016 e o requerimento de interposição de recurso e respectiva motivação, onde a irregularidade foi primeiramente invocada, deram entrada em juízo em 03-10-2016 (cf. fls.1).

Assim, face ao supra exposto, sempre a referida irregularidade teria de improceder, ficando prejudicada a apreciação do mérito das razões invocadas no recurso que, como vimos, escaparam ao resumo vertido nas respectivas conclusões.

Termos em que improcede a pretensão a este respeito formulada pelo recorrente.

                                                         *

3.2. No despacho recorrido seguiu-se o entendimento de que o termo do período fixado para a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, imposta ao recorrente na sentença proferida nos presentes autos, ocorreu em 14-12-2016, entendimento que teve por base a entrega que o mesmo efectuou, em 30-05-2014, da guia de substituição do seu título de condução e a suspensão do cumprimento da referida pena acessória desde o dia 11-07-2014, data em que recebeu o original da sua carta de condução, até ao dia 25-06-2016, quando a mesma carta lhe foi apreendida, sendo que apenas a partir daí se reiniciou o cumprimento do tempo da pena acessória em falta.

Segundo se sustenta no recurso, não ocorreu qualquer causa de suspensão do período fixado para a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, imposta ao recorrente na sentença proferida nos presentes autos.

Invocando-se para tanto que o recorrente não recebeu a carta de condução que alegadamente lhe foi remetida pelo IMT ou pela ANSR, sendo que não existe nos autos qualquer prova em como o original daquela lhe foi entregue.

Pois bem.

Em primeiro lugar, há que assinalar que subscrevemos o entendimento de que cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor só se pode considerar iniciado a partir da efectiva entrega ou apreensão do título habilitante da condução, sendo que a referência do artigo 69.º, n.º 2 do Código Penal ao trânsito em julgado tem em vista a exequibilidade da sentença e não a sua execução propriamente dita, tal como vem sendo maioritariamente seguido pela jurisprudência das relações, por se tratar do sentido que melhor se harmoniza com o espírito da lei e a unidade do sistema (assim, cf. Acórdão desta Relação de 13-07-2016, proferido no processo n.º 61/14.5GBLSA.C1[4], e a jurisprudência e doutrina aí indicadas).

É o que resulta do preceituado no artigo 69.º, n.º 3 do Código Penal, ao referir-se ao título de condução que deve ser entregue pelo condenado, no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, título esse que, segundo o disposto no artigo 121.º, n.º 1 do Código da Estrada, corresponde à habilitação legal que permite conduzir um veículo com motor na via pública e que no caso dos ciclomotores, motociclos, triciclos, quadriciclos pesados e automóveis se designa por carta de condução (artigo 121.º, n.º 4).

Por seu turno, no que respeita ao documento substitutivo, o n.º 7 do citado artigo 121.º estabelece que o IMT, I.P., as entidades fiscalizadoras e outras entidades com competência para o efeito podem, provisoriamente e nos termos previstos na lei, substituir as cartas e licenças de condução por guias de substituição, válidas apenas dentro do território nacional e para as categorias constantes do título que substituem, pelo tempo julgado necessário ou, quando for o caso, pelo prazo que a lei directamente estabeleça.

Ora, no caso sub judice, verifica-se que o recorrente requereu, em 11-12-2013, a revalidação da sua carta de condução, sendo que em tal data lhe foi entregue uma guia de substituição daquela, a qual lhe permitia conduzir até 11-03-2014.

Guia de substituição que o recorrente entregou nos autos em 30-05-2014.

Por sua vez, na sequência do referido pedido de revalidação, foi emitido o título de condução n.º P- (...) , com a data de emissão de 11-12-2013, que o IMT expediu por correio registado em 10-07-2014 e foi entregue na morada do recorrente em 11-07-2014.

Esse título de condução veio a ser apreendido ao recorrente em 25-06-2015, encontrando-se, pois, o título na sua posse sem que o mesmo tivesse procedido à sua entrega voluntária nos autos.

Ora, face à apontada sucessão de factos documentados nos autos (cf. os elementos indicados no elenco supra enunciado em 2.4. a 2.7.) e atendendo a que, como vimos, o cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pressupõe a entrega, voluntária ou forçada, do título habilitante para a condução, com a qual se inicia aquele cumprimento, forçoso se torna concluir que relevam para efeitos do cômputo da referida pena:

a) a entrega, em 30-05-2014, da guia de substituição da carta de condução cuja revalidação o recorrente havia requerido em 11-12-2013 e que, embora se apresentasse então com o prazo de validade expirado (11-03-2014), era o único documento habilitante de que o mesmo dispunha até 11-07-2014, data em que recebeu o título definitivo revalidado lhe foi enviado pelo IMT; se assim não se entendesse e se desconsiderasse como cumprimento da pena acessória o mencionado período de 30-05-2017 a 11-07-2013, por invalidade da guia entregue, estaria o condenado a ser penalizado pela demora de um acto que competia àquela entidade pública praticar dentro do prazo fixado no documento substitutivo;

b) a referida data de 11-07-2014, em que o recorrente se tornou portador de título habilitante da condução sem que tivesse observado o dever que sobre ele recaía de proceder à entrega do mesmo na secretaria judicial ou em qualquer posto policial, bem como em delegações do IMT, conforme determinado na sentença proferida nos autos, ao abrigo do disposto nos artigos 69.º, n.º 3 do Código Penal e 500.º, n.º 2 do CPP; e

c) a apreensão do referido título de condução, efectuada pela autoridade policial em 25-06-2016.

Uma vez que no período compreendido entre 11-07-2014 e 25-06-2016 o recorrente era portador do título de condução que o habilitava a conduzir, sem que tivesse procedido à sua entrega, eximindo-se, assim, durante tal lapso de tempo ao cumprimento da pena acessória, o qual só foi retomado pela via coerciva com a aludida apreensão realizada em 25-06-2016, o mesmo não conta para o prazo de 7 meses de proibição de conduzir imposta nos presentes autos, devendo, pois, o respectivo cômputo ser efectuado nos seguintes moldes: de 30-05-2014 a 10-07-2014 (1 mês e 12 dias) e de 25-06-2016 a 13-12-2016 (5 meses e 18 dias).

O que significa que a suspensão considerada no despacho recorrido para efeitos do citado cômputo se encontra devidamente sustentada nos factos apurados nos autos que acima se enunciaram e na natureza do cumprimento da pena acessória em análise, dependente, como vimos, da entrega do título habilitante da condução.

Assim, com a ressalva de que o termo daquele período ocorreu em 13-12-2016 e não em 14-12-2016, como indicado no despacho recorrido, este deve quanto ao mais ser confirmado, não merecendo, pois, provimento a pretensão deduzida no recurso. 

                                                          *

III – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Criminal deste Tribunal da Relação negar provimento ao recurso e, consequentemente, confirmam a decisão recorrida, ressalvando-se, contudo, que o termo da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de sete meses, imposta ao arguido, ocorreu em 13-12-2016 e não em 14-12-2016.

Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3 UC (artigo 513.º, n.os 1 e 3 do CPP e artigo 8.º, n.º 9 do RCP e Tabela III anexa).

Coimbra, 11 de Outubro de 2017

(O presente acórdão foi elaborado e integralmente revisto pela primeira signatária – artigo 94.º, n.º 2 do CPP)

                      

(Helena Bolieiro - relatora)

(Brízida Martins - adjunto)


[1] Na doutrina, cf. Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, Universidade Católica Editora, 2015, pág.335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos Penais, 8.ª ed., Rei dos Livros, 2011, pág.113. Na jurisprudência, cf., entre muitos, os Acórdãos do STJ de 25-06-1998, in BMJ 478, pág.242; de 03-02-1999, in BMJ 484, pág.271; de 28-04-1999, CJ/STJ, Ano VII, Tomo II, pág.193.
[2] Cf. Acórdão do STJ de Fixação de Jurisprudência n.º 7/95, de 19-10-1995, publicado no Diário da República, Série I-A, de 28-12-1995.
  
  
[3] Cf. Acórdão do STJ de 09-02-2012 (processo n.º 131/11.1YFLSB), disponível na Internet em <http://www.dgsi.pt>: “[a] falta de fundamentação das decisões, com excepção da sentença (al. a) do n.º 1 do art. 379.º do CPP), não se mostra cominada com a sanção da nulidade, razão pela qual constitui mera irregularidade”.
  
  
[4] Aresto disponível na Internet em <http://www.dgsi.pt>.
  
  
[5] Cf. o acórdão desta Relação atrás citado: o início do período de execução da pena acessória pressupõe a entrega ou apreensão à ordem dos autos de título válido.
  


Dito isto, e tendo por base o pressuposto de que o cumprimento da referida pena acessória se inicia com a entrega, voluntária ou forçada, do título habilitante ou do documento que legalmente o substitua, necessário se torna, pois, que essa entrega se efective e que o título ou documento substitutivo se revele apto a produzir os efeitos a que se destina, ou seja, que habilite o seu portador a realizar a condução de veículos com motor nas categorias nele indicadas[5].