Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
998/20.2T8SRE-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: TÍTULO EXECUTIVO
TÍTULO PARA PAGAMENTO DE RENDAS
ENCARGOS OU DESPESAS
INDEMNIZAÇÃO PELO ATRASO NA RESTITUIÇÃO DA COISA
Data do Acordão: 01/18/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE EXECUÇÃO DE SOURE DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 14.º-A DO NOVO REGIME DO ARRENDAMENTO URBANO
ARTIGO 1045.º DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para obter o pagamento coercivo da indemnização pelo atraso na restituição da coisa locada, quando o destinatário foi advertido de que incorria no dever de indemnizar no caso de não cumprir a obrigação de restituir o prédio arrendado e lhe foram indicados todos os dados para o cálculo do quantum indemnizatório.
Decisão Texto Integral:




            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I.  Em 06.5.2020, A. instaurou execução (para pagamento de quantia certa) contra B. e C. , com base no disposto no art.º 14º-A, do Novo Regime do Arrendamento Urbano/NRAU (aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27/02 - na redação conferida pela Lei n.º 13/2019, de 12/02), pedindo, além do mais, o pagamento das rendas vencidas correspondentes aos meses de julho de 2015 e junho a setembro de 2017, no valor global de € 925 (€ 185 x 5) e, ainda, atento o disposto no art.º 1045º, n.º 2, do Código Civil (CC), a indemnização pela não restituição do imóvel desde outubro de 2017 a abril de 2020 (restituído em 10.3.2020), no montante de € 11 470 [31 x € 185 x 2].

Por despacho de 11.6.2020, a Mm.ª Juíza a quo, nos termos do art.º 726, n.º 3, do Código de Processo Civil (CPC) indeferiu o requerimento executivo relativamente ao pagamento (coercivo) de € 11 470, a título de indemnização, “uma vez que, nessa parte, o título não se mostra revestido de força executiva”.
Inconformada, visando a revogação daquele despacho, o exequente apelou formulando as seguintes conclusões:

1ª - Em 25.8.2017 o Exequente decidiu resolver o contrato de arrendamento, nos termos do n.º 3 do art.º 1083º do CC, tendo por fundamento a falta de pagamento das rendas vencidas referentes aos meses de Julho de 2015 e Junho a Setembro de 2017, no valor global de 925 € (novecentos e vinte e cinco euros).

2ª - Enviando, para o efeito, uma carta registada com aviso de receção, nos termos dos art.ºs 9º e 10º do NRAU, para a morada do locado e do fiador indicada no contrato de arrendamento.

3ª - Não tendo os Executados procedido ao pagamento das rendas vencidas, bem como, da penalidade de 50 % pelo atraso no seu pagamento, no período de trinta dias, desde o recebimento da comunicação supra referida, a resolução produziu retroativamente os seus efeitos em 31.8.2017 (data de assinatura do aviso de receção pelo arrendatário), a partir da qual o Executado arrendatário deveria ter entregue o imóvel ao Exequente.

4ª - Face à conduta relapsa do Executado arrendatário, o Exequente foi obrigado a lançar mão do competente procedimento especial de despejo ao qual foi atribuído o n.º 3508/17.5YLPRT.

5ª - Nessa sequência, o Exequente apenas conseguiu obter a posse do imóvel por via do despejo que ocorreu em 10.3.2020.

6ª - O Exequente nas comunicações enviadas aos Executados é contundente ao informar das implicações legais que recairiam sobre os mesmos, caso não procedessem à restituição do locado após a cessação do contrato. Senão vejamos,

            “Caso não procedam aos pagamentos e/ou à entrega do locado ao Fundo nos prazos referidos, o Fundo será forçado a actuar os meios judiciais e a responsabilidade de V. Exas. será agravada pelos custos judiciais e ainda: a) (...); b) Pela indemnização legal por não entrega do locado, correspondente ao dobro do valor da renda mensal, desde a cessação do contrato e até efectiva entrega do locado (art.º 1045º do CC).”

7ª - Da leitura da comunicação, é totalmente percetível para o homem de conhecimento médio que o arrendatário tem como obrigação: (i) desocupar o locado ao fim de um mês após a resolução; (ii) caso assim não proceda deverá manter os pagamentos do valor equivalente à renda, mas a título de indemnização, já que o contrato se encontra resolvido; (iii) caso persista em não restituir o locado nem em pagar a indemnização, esta será elevada em dobro.

8ª - Face ao exposto, além das rendas vencidas deverão os Executados entregar ao Exequente, a título de indemnização, os valores devidos no período mediado entre a resolução do contrato até entrega efetiva do imóvel.

9ª - Nas comunicações rececionadas pelos Executados, é-lhes comunicado os valores em dívida a título de rendas vencidas e em incumprimento, como da obrigação de indemnizar o Exequente em caso de incumprimento futuro da obrigação de restituir o locado, contendo para tal os dados para o cálculo aritmético dos montantes.

10ª - Assim, veio o Exequente apresentar o requerimento executivo para cobrança coerciva do montante global de 12 420,50 €, aritmeticamente calculado, uma vez que a obrigação já se encontra líquida, além de certa e exigível.

11ª - O valor exequendo é composto pela soma dos seguintes montantes: i) € 925 referente às rendas vencidas e não pagas; ii) € 11 470 a título de indemnização por mora na restituição da fração ao Senhorio; iii) € 25,50 referente à liquidação da taxa de justiça devida pela entrada da presente ação judicial.

12ª - O Recorrente encontra-se, assim, munido de um título executivo complexo nos termos da al. d) do n.º 1 do art.º 703º do CPC, conjugado com o art.º 14-A do NRAU, a obrigação é certa, exigível e líquida.

Não houve resposta.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e decidir, apenas, se o título compósito dado à execução compreende o mencionado valor indemnizatório.


*

II. 1. Para a decisão do recurso releva a descrita factualidade (e tramitação) e ainda:

a) O exequente fundou o seu pedido nos seguintes factos:

- É o legítimo proprietário da fração autónoma designada pela letra “G”, correspondente ao 3º Andar Direito, Bloco B, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 1760, inscrito na respetiva matriz sob o art.º 1080.

- Em 01.4.2015, o exequente e o executado/arrendatário celebraram um contrato de arrendamento habitacional, mediante o qual aquele deu de arrendamento ao executado e este tomou de arrendamento o mencionado prédio urbano para habitação.[1]

- O contrato de arrendamento foi celebrado pelo prazo de 5 anos, com início no dia 01.4.2015 e termo em 31.3.2020, renovável por períodos de 1 (um) ano.

- A renda mensal contratada teve o valor inicial de € 185, que se vencia no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que respeita.

- Porém, o executado não efetuou os pagamentos da/s renda referentes aos meses de julho de 2015 e junho, julho, agosto e setembro de 2017.

- Por meio de carta registada com aviso de receção remetida a 29.8.2017 para a morada convencionada pelas partes (recebida a 31.8.2017), o exequente procedeu à resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento das rendas, interpelando ainda o executado/arrendatário para este efetuar o pagamento das quantias que mantinham em dívida, a título de rendas vencidas e não pagas.[2]

- Do mesmo modo, por meio de carta registada com aviso de receção remetida a 29.8.2017, o exequente comunicou ao executado fiador que procedeu à resolução do contrato de arrendamento do qual era fiador por falta de pagamento das rendas, interpelando-o para que efetuasse o pagamento das quantias em dívida, a título de rendas vencidas e não pagas.

- Porém a comunicação não foi regularmente realizada por factos imputáveis ao executado fiador, obrigando o exequente a remeter nova carta registada com aviso de receção a 28.9.2017, nos termos do art.º 10º, n.º 3 do NRAU, recebida a 29.9.2017.[3]

- Os executados não efetuaram qualquer pagamento, nem o seu recebimento foi recusado pelo exequente.

- Somente em 10.3.2020 foi restituída a posse da fração ao exequente, não tendo sido paga nenhuma indemnização pela mora na entrega.

- O executado fiador e o executado arrendatário foram interpelados pelo exequente por comunicação com o aludido conteúdo, para os devidos efeitos, incluindo quanto à indemnização prevista no art.º 1045º, n.º 2 do CC.[4]

b) Com o requerimento executivo foi junta a certidão predial urbana da mencionada fração autónoma e foram ainda juntos o contrato de arrendamento (e respetivos anexos) e cópia de toda a documentação referente às aludidas cartas remetidas aos executados

2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva (art.º 10º, n.º 5 do CPC).

De entre as espécies de títulos executivos taxativamente previstos na lei adjetiva, figuram os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva (art.º 703º, n.º 1, alínea d) do CPC).

O contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário (art.º 14º-A, n.º 1 do NRAU - sob a epígrafe “título para pagamento de rendas, encargos ou despesas” -, na redação conferida pela Lei n.º 13/2019, de 12.02). O contrato de arrendamento, quando acompanhado da comunicação ao senhorio do valor em dívida, prevista no n.º 3 do artigo 22º-C do regime jurídico das obras em prédios arrendados, aprovado pelo DL n.º 157/2006, de 08.8, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente à compensação pela execução de obras pelo arrendatário em substituição do senhorio (n.º 2).     

Constituindo-se o locatário em mora, o locador tem o direito de exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a 20 % do que for devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento (art.º 1041º, n.º 1 do CC).

Se a coisa locada não for restituída, por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obrigado, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, exceto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida (art.º 1045º, n.º 1 do CC, sob a epígrafe “indemnização pelo atraso na restituição da coisa”). Logo, porém, que o locatário se constitua em mora, a indemnização é elevada ao dobro (n.º 2).

É inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora igual ou superior a três meses no pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário ou de oposição por este à realização de obra ordenada por autoridade pública, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 3 a 5 do artigo seguinte (art.º 1083º, n.º 3 do CC).

3. Perante a descrita factualidade e o apontado quadro normativo, afigura-se que a apelante tem razão, pois, atendendo à amplitude da previsão do art.º 14º-A, n.º 1, do NRAU (rendas, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário) e ao conteúdo das comunicações da exequente aos executados (arrendatário e fiador), não vemos como não incluir, no título compósito dado à execução, todos os valores que aquela poderá exigir atento o circunstancialismo ligado ao incumprimento do contrato de arrendamento e à sua resolução, bem como à mora na entrega do prédio arrendado (sequente àquela resolução), com as consequências decorrentes dos factos discriminadas nas ditas comunicações - e dos concretos (e simples) fatores de cálculo e parcelas aí referidos - e do regime jurídico aplicável.

As importâncias em causa estão abrangidas pelo título executivo, sem que seja imprescindível a prévia liquidação (nas comunicações efetuadas ao arrendatário e ao fiador), computação/liquidação (das quantias que se vençam posteriormente, até à restituição do imóvel arrendado) que poderá ter lugar no requerimento de execução, por se estar perante mero cálculo aritmético.

Sem quebra do devido respeito por entendimento contrário, podendo-se afirmar - como melhor se explicitará adiante - que o legislador não recusa, aos montantes devidos pelo uso indevido do locado (art.º 1045º do CC), a equiparação às rendas em sentido estrito, esta a resposta que se poderá/deverá dar à situação em análise, ainda na sua fase liminar.[5]

4. Em sentido idêntico ao assinalado no ponto anterior, veja-se, desde logo, o entendimento expresso em dois arestos desta Relação.

Num deles, salienta-se que a comunicação do senhorio, por um lado, define o pressuposto da liquidação e realiza esta e, por outro lado, visa também enquadrar a reação do arrendatário, por exemplo para cessar a mora e impedir a resolução[6], possibilitando, inclusive, a liquidação aritmética das (iguais) prestações vincendas, quer no momento do requerimento executivo, quer mais à frente na execução, obtida que seja nessa altura a restituição do locado. Consequentemente, o valor admitido na execução não é apenas o valor contado no momento da comunicação, podendo incluir o decurso do tempo como fator do valor a cobrar a final; resolvido o contrato de arrendamento, a solução assenta na consideração da manutenção de uma relação de facto que justifica os pagamentos referidos”, sendo que o preceituado no art.º 1045º, n.º 2, do CC justifica quer a advertência feita pelos exequentes (aquando da comunicação da resolução do contrato) quer a indemnização liquidada (pela própria lei), apresentando certeza e segurança - partindo da comunicação, não há qualquer novidade ou surpresa na execução, operando, apenas, o momento da entrega do bem arrendado (ulterior à comunicação) e fazendo valer os respetivos fatores de cálculo.[7]

Noutro acórdão - esclarecendo a própria decisão recorrida a natureza complexa ou compósita do título constituído pelo contrato de arrendamento escrito e o documento comprovativo da comunicação ao devedor do montante em dívida[8] e que a exigência de comunicação ao arrendatário (na forma prevista no art.º 9º, n.º 7 do NRAU) tem em vista “obrigar o exequente a proceder a uma espécie de liquidação aritmética extrajudicial prévia dos montantes em dívida[9] - salienta-se que, numa «tarefa de interligação e valoração, que excede o domínio literal»[10], e no respeito pelos princípios contidos no art.º 9º do CC, o sentido prevalente a dar àindemnização” ex vi do art.º 1045º, n.º s 1 e 2 do CC corresponde ou integra a categoria das “rendas” a que alude o art.º 14º-A do NRAU, porquanto a expressão “renda” foi empregue no art.º 14º-A do NRAU com sentido que abrange a ´indemnização` prevista no art.º 1045º, n.ºs 1 e 2 do CC, na medida em que o desiderato legal que faculta a cobrança executiva de verdadeiras “rendas” ao abrigo desse normativo é precisamente idêntico ao que justifica a cobrança de ´indemnizações` que são sucedâneo de verdadeiras rendas - uma “renda em dobro”, devida a título de ´indemnização`, mas que nem por isso deixa de corresponder a uma “renda” e a dever ser considerada enquanto tal -, concluindo-se, depois, que o título executivo ajuizado comportava a realização coativa da “indemnização” ´ex vi` do art.º 1045º, n.ºs 1 e 2 do CC (pela mora na restituição do imóvel arrendado/mora no cumprimento da obrigação de restituir[11]), interpretação que encontra no texto da norma aplicável o mínimo de correspondência verbal.[12]

5. Para além da aplicabilidade do art.º 14º-A do NRAU ao fiador do arrendatário - questão não compreendida no objeto deste recurso -, discutiu-se, na jurisprudência, se esta norma abrangia a indemnização a que se refere o art.º 1045º do CC.

 Como se adiantou nos dois pontos anteriores, perfilha-se assim o entendimento de que o texto da lei, conjugado com os demais elementos/critérios de interpretação (em particular, o teleológico, numa juridicamente correta ponderação de interesses socialmente afirmados e socialmente conflituantes[13], no contexto do ordenamento jurídico vigente e da realidade social e económica), não afasta que se inclua a quantia eventualmente devida pela mora na entrega do prédio arrendado (in casu, atraso na restituição da fração arrendada)[14] - em razão duma possível equiparação entre as rendas em sentido estrito e os montantes devidos pelo uso indevido do locado (art.º 1045º do CC)[15], exigida, também, pela ratio legis, no contacto entre a lei e a vida real[16] -, não se justificando que tal indemnização seja, necessariamente, determinada em ação declarativa ou decorra doutro título que não aquele previsto na mencionada norma do NRAU [cf. art.º 703º, n.º 1, alíneas a) e b) do CPC].

6. Conclui-se, pois, que a presente execução deverá prosseguir os seus termos tendo em conta o que resulta do contrato de arrendamento que vinculou as partes e das comunicações aludidas em II. 1. a), supra [devidamente efetuadas, definindo-se os fatores e marcos temporais para o cálculo de todas as importâncias consideradas devidas a título de rendas (vencidas e não pagas) e de indemnização pelo atraso na restituição da coisa (art.º 1045º do CC)], devendo-se considerar, ainda, que o despejo (a entrega do imóvel), segundo o alegado, ocorreu a 10.3.2020.

7. Procedem, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.


*

III. Pelo exposto, revoga-se a decisão recorrida na parte em que indeferiu o requerimento executivo quanto ao pagamento da quantia devida a título de indemnização pelo atraso na restituição da fração arrendada, prosseguindo os autos como se refere em II. 6., supra.

Sem custas.


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18.01.2022



[1] Contrato de arrendamento a que respeita o documento de fls. 23/49.
[2] Missiva reproduzida a fls. 32 a 34/58 a 60, onde se refere, designadamente: «(...) Informamos que se encontram em dívida 925 € (185 € x 5 meses), respeitantes a rendas vencidas e não pagas referentes aos meses de Jul. 15; Jun. 17; Jul. 17; Ago. 17; set. 17. / O atraso no pagamento de rendas é superior a três meses, pelo que vimos pela presente resolver o contrato de arrendamento acima identificado (arts. 1083º/3, 1084º/4 do CC), resolução que produzirá efeitos no último dia do mês em que V. Exas. sejam notificados da presente, devendo o locado ser desocupado e entregue ao Fundo, livre de pessoas e bens, até ao final do mês seguinte, incluindo respectivas chaves, comandos e equipamentos. / Informamos que V. Exas. ainda poderão evitar a resolução do contrato de arrendamento, caso procedam ao pagamento da totalidade das rendas em dívida, acrescidas de metade do seu valor (penalização legal), desde que o pagamento da totalidade das rendas e da penalidade seja efectuado no prazo de 30 dias contados da recepção da presente carta (arts. 1041.º e 1084.º/3 do C.C.) (...).»
[3] Cf. os documentos reproduzidos a fls. 35 a 42/62 a 69.

[4] Fazendo-se constar das referidas cartas: «(...) Caso não procedam aos [“caso não sejam realizados os”] pagamentos e/ou à entrega do locado ao Fundo nos prazos referidos, o Fundo será forçado a actuar os meios judiciais e a responsabilidade de V. Exas. [“enquanto fiadores”] será agravada pelos custos judiciais e ainda: / a) Pelos juros vincendos (futuros) à taxa de juro legal, até efectivo e integral pagamento, calculados sobre cada uma das rendas vencidas e não pagas; / b) Pela indemnização legal por não entrega do locado, correspondente ao dobro do valor da renda mensal, desde a cessação do contrato e até efectiva entrega do locado (art.º 1045º do CC)
[5] Sem que fique arredado, cremos, um eventual acertamento em sede de embargos de executado e/ou em resultado das diligências que o juiz sempre poderá determinar (cf., designadamente, os art.ºs 411º, 551º, n.º 1 e 732º, n.º 2 do CPC).
   A este propósito, mas tratando-se de matéria não compreendida no objeto do recurso, reclamará porventura melhor explicitação ou demonstração o que foi alegado nas “conclusões 4ª e 5ª”, ponto I., supra.
[6] Na situação dos presentes autos, invocando, nomeadamente, o regime dos art.ºs 1041º e 1084º, n.º 3 do CC – cf., por exemplo, “nota 2”, supra.
[7] Cf. o acórdão da RC de 18.02.2014-processo 182/13.1TBCTB-A.C1 [assim sumariado: «1. A comunicação prevista no n.º 2 do artigo 15º da Lei n.º 6/2006, de 27.2, que aprovou o Novo Regime de Arrendamento Urbano, pode ter subjacente a cobrança de rendas em caso de resolução do contrato. 2. Esta extinção contratual pode provocar diferentes situações de cobrança da renda e de indemnizações (liquidadas pela lei) a ela ligadas. 3. Neste caso, a lei exige mais (e diferente) do que aquilo que já resultava do previsto no art.º 46º, n.º 1, c), do Código de Processo Civil, sendo que a maior exigência está na referida comunicação, na qual o interessado fica obrigado, para obter título executivo, a definir o pressuposto da cobrança e a liquidação que confirma o pressuposto. 4. O valor admitido na execução não é apenas o valor contado no momento da comunicação porque o próprio pressuposto, apresentado e comunicado, pode incluir o decurso do tempo como contabilizador do valor a cobrar a final, possível por simples cálculo aritmético.»], publicado no “site” da dgsi.

[8] Vide Rui Pinto, Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, 2013, págs. 1162 e seguintes.

[9] Cf., de entre vários, o acórdão da RL de 18.01.2018-processo 10087-16.9T8LRS-B.L1-6, publicado no “site” da dgsi.
[10] Vide Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, 11ª edição, Almedina, 2001, pág. 392.
[11] Vide Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, Vol. II, 4ª edição, Coimbra Editora, 1997, pág. 383.

[12] Cf. o acórdão da RC de 04.5.2019-processo 7285/18.4T8CBR-B.C1 [com o sumário «I – O título executivo a que se reporta o art.º 14º-A do NRAU tem natureza complexa, sendo integrado pelo contrato de arrendamento e pela comunicação ao devedor (arrendatário ou fiador). II – O título executivo do dito art.º 14º-A do NRAU confere ao exequente suporte para a realização coativa do valor inerente às rendas “em dobro”, rectius, “indemnização” pela mora na restituição do locado, a que se refere o art.º 1045º, n.ºs 1 e 2 do C. Civil, a par das “rendas” singulares igualmente em dívida. III – Não obstante, tem de constar da comunicação feita [ao arrendatário e a eventual fiador] que serão peticionados valores respeitantes a rendas vincendas e a indemnização, em ordem a que tais valores estejam abrangidos pelo título executivo, contendo este todos os dados para o cálculo aritmético dos montantes devidos.»], publicado no “site” da dgsi.
[13] Vide A. Castanheira Neves, Introdução ao Estudo do Direito - Interpretação Jurídica, Coimbra, 1985/1986, págs. 51 e seguinte.

[14] Cf., ainda, de entre vários, os acórdãos da RP de 22.3.2012-processo 5644/11.2TBMAI-A.P1 e da RL de 18.01.2018-processo 10087-16.9T8LRS-B.L1-6 [sumariando-se: «– Não revestindo por si, o contrato de arrendamento, enquanto mero documento particular, a qualidade de título executivo, esta qualidade foi-lhe atribuída expressamente pelo art.º 703º, n.º 1 d) do CPC, sendo este título de natureza complexa, composto pelo contrato de arrendamento e pela notificação ao arrendatário (e fiador) dos montantes em dívida. – Do teor do art.º 14-A do NRAU não se retira que o contrato de arrendamento acompanhado da respectiva comunicação não constitua título executivo contra o fiador, mas antes a intenção de “obrigar o exequente a proceder a uma espécie de liquidação aritmética extrajudicial prévia dos montantes em dívida, de forma a conferir maior grau de certeza quanto ao montante peticionado, tendo em conta a potencial vocação duradoura do contrato”. (...) – O art.º 14º-A do NRAU abrange quer as rendas vencidas quer as rendas vincendas e a indemnização devida pela mora na entrega do locado, contendo a comunicação remetida todos os dados para o cálculo aritmético dos montantes devidos, sem que seja imprescindível uma prévia liquidação, a qual se resume a uma operação aritmética.»] e 21.02.2019-processo 3855/17.6T8OER-A.L1-2 [que nos dá conta da evolução da jurisprudência nesta matéria e onde também se considerou que o senhorio deverá incluir na comunicação a reclamação de todas as quantias que se vençam posteriormente até à entrega do prédio arrendado - ou proceder a comunicações ulteriores, antes de avançar para o procedimento executivo para cobrança dessas quantias -, o que constitui clara exigência da lei, concluindo-se, ainda, a final: «A comunicação prevista no art.º 14.º-A do NRAU não constitui título executivo para o pagamento de quantias que não tenham nela sido comunicadas ao inquilino.»], publicados no “site” da dgsi.

   Em sentido diverso, cf., entre outros, os acórdãos da RP de 12.5.2009-processo n.º 1358/07.6YYPRT-B.P1 [reportando-se à indemnização prevista no art.º 1041º n.º 1 do CC, mas num juízo extensível ao n.º 2 do mesmo art.º, considerou: «I - O contrato de arrendamento acompanhado do comprovativo da comunicação feita ao arrendatário do montante das rendas em dívida, a que alude o n.° 2 do art.º 15º do NRAU - na sua redação primitiva -, constitui título executivo não só em relação aos arrendatários mas também em relação às pessoas que no dito contrato tenham assumido a obrigação de fiadores. II - Porém, a força executória dos referidos documentos apenas abrange o montante das rendas em dívida constante da comunicação feita ao arrendatário, e não a indemnização prevista no n.° 1 do art.º 1041º do Código Civil nem quaisquer outras rendas vencidas posteriormente àquela comunicação.»] e 18.10.2011-processo 8436/09.5TBVNG-A.P1 e da RL de 19.11.2020-processo 5508/20.9T8SNT-A.L1-2 [concluindo-se: «I – A indemnização prevista no art.º 1045/2 do CC, mesmo que incluída em termos determináveis na comunicação em causa no art.º 14-A/1 do NRAU, não é abrangida pela exequibilidade do título aí previsto, por não ser uma obrigação contratual e na data da comunicação ainda não estarem verificados os pressupostos da indemnização. II – Já o mesmo não se pode afirmar da “indemnização” prevista no art.º 1045/1 do CC.»; teve “voto de vencido” em conformidade com a jurisprudência atrás indicada], publicados no “site” da dgsi.

[15] Na doutrina, vide Soares Machado e Regina Santos Pereira, Arrendamento Urbano (NRAU), 3ª edição, Petrony, pág. 281.

   Defendendo a tese ampla de equiparação, quanto à indemnização moratória prevista no n.º 1 do art.º 1041.º do CC, cf., nomeadamente, Luís Menezes Leitão, Arrendamento Urbano, 8ª edição, 2017, Almedina, pág. 221.

   Com uma perspetiva contrária, cf. Joana Pinto Monteiro, A execução para cobrança de rendas, I Congresso de direito do arrendamento, Almedina, 2020, pág. 187.
[16] Vide Manuel de Andrade, Ensaio Sobre a Teoria da Interpretação das Leis, Arménio Amado – Editor Sucessor, Coimbra, 1987, págs. 22 e seguinte.