Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
34/19.1T8CBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: DESERÇÃO DA INSTÂNCIA EM ACÇÃO DECLARATIVA
EFEITO CONSTITUTIVO DA SENTENÇA DE DESERÇÃO
Data do Acordão: 06/27/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO LOCAL CÍVEL DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 277.º, C) E 281.º, DO CPC
Sumário: 1. A deserção da instância declarativa opera, necessariamente, mediante decisão judicial e pressupõe a negligência das partes no impulsionamento do processo (carece de ser imputável às partes) (art.º 281º, do CPC) - a deserção não existe enquanto o juiz a não declara no processo respetivo.

2. A sentença de deserção tem, pois, alcance constitutivo, pelo que enquanto não for proferida, é lícito às partes promover utilmente o seguimento do processo.

Decisão Texto Integral:
Relator: Fonte Ramos
1.º Adjunto: Vítor Amaral
2.º Adjunto: Rui Moura

            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:       

           

           

            I. Na ação declarativa comum instaurada[1] por A..., Lda., contra AA, e Outros (num total de vinte e um demandados[2]), em 28.12.2022, os Réus BB e Outros, requereram, ao abrigo do disposto no art.º 281º, n.ºs 1 e 4 do Código de Processo Civil (CPC), a deserção da instância por falta de impulso processual da A. durante mais de seis meses em promover a habilitação dos falecidos Réus.

            Respondeu a A. pugnando pelo indeferimento do requerido, alegando que as partes foram notificadas do despacho proferido em 24.6.2022, no dia 27.6.2022, começando a partir desta data a contar o prazo previsto no art.º 281º do CPC, que terminou no dia 27.12.2022 e transferiu para o primeiro dia útil seguinte (uma vez se encontrava a decorrer o período de férias judiciais), data em que a A. deu impulso processual aos autos, requerendo a habilitação de herdeiros da Ré CC (18ª demandada)[3], sendo que com esse impulso processual, interrompeu-se o prazo de seis meses previsto no citado art.º, pelo que não se verifica a deserção de instância.

            Por sentença de 07.02.2023, a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo, “ao abrigo do disposto nos art.ºs 277º, al. c) e 281º, n.º 1 do CPC”, julgou “extinta a instância por deserção”.
Inconformada, a A. apelou formulando as seguintes conclusões:
1ª - Em 24.6.2022 foi a A./Recorrente notificada do seguinte despacho:

            “Encontram-se a instância suspensa, ante o falecimento da ré CC, sendo que não juntou ainda a autora aos autos certidão de assento de óbito da ré DD, nem promoveu ainda a habilitação dos sucessores dos réus falecidos. Assim, e em conformidade com o despacho já oportunamente proferido, determino que os autos aguardem impulso processual, sem prejuízo do disposto no art.º 281º, n.º 1 do CPC.

            Notifique.”

            2ª - A notificação do despacho presume-se feita no dia 27.6.2022, data a partir da qual começa a contar o prazo de seis meses a que alude o art.º 281º do CPC.

            3ª - Por requerimento apresentado via Citius a 04.01.2023 a Recorrente requereu a habilitação de herdeiros por óbito da falecida Ré CC.

            4ª - In casu, tal prazo terminaria no dia 27.12.2022, prazo esse que se transferiu para o primeiro dia útil seguinte, uma vez que se encontrava a decorrer o período de férias judiciais (art.º 138º do CPC) e, nesses termos, o prazo terminaria a 04.01.2023.

            5ª - Em 04.01.2023 a Recorrente requereu a habilitação de herdeiros da Ré CC, dando cumprimento ao despacho suprarreferido e interrompendo assim o prazo previsto no art.º 281º, pelo fez cessar a deserção em 04.01.2023 quando deu entrada do requerimento de habilitação de herdeiros.

            6ª - Assim, desde logo, o prazo de seis meses, que se conta a partir do despacho que advertiu a recorrente para a necessidade de impulso processual sob pena de deserção da instância, não foi ultrapassado.

            7ª - Acresce que a deserção da instância produz-se ope judicis e, em 04.01.2023 ainda não tinha sido proferido qualquer decisão de deserção de instância, sendo que até esse momento, a parte pode dar impulso ao processo, antes de o juiz ter declarado a deserção.

            8ª - Acresce que sempre se impunha ao tribunal a quo, antes de proferir a decisão de deserção, ouvir a parte sobre as razões do não impulso, a fim de aquilatar da sua negligência ou falta dela, o que não sucedeu, violando, deste jeito, o disposto no art.º 3º do CPC.

            9ª - O Tribunal a quo, ao declarar a deserção da instância nos termos da decisão de que se recorre e, sem prescindir, sem ouvir a parte, violou o disposto nos art.ºs 3º, 281º e 277º, al. c), do CPC.

            Remata dizendo que deve a sentença ser revogada e substituída por outra que admita o requerimento de 04.01.2023, devendo os autos prosseguir os seus trâmites ou, sem prescindir, determine a notificação da requerente para os já mencionados efeitos.

            O Réu EE (e Outros) respondeu concluindo pela improcedência do recurso.

            A única questão a decidir consiste em saber se podia/devia ser declarada a deserção da instância.


*

            II. 1. A factualidade a considerar é a que consta do relatório que antecede e a seguinte:[4]

            a) Os Réus FF, GG[5] e CC faleceram[6], conforme certidões de assento de óbito juntas aos autos.

            b) De igual forma há notícia nos autos que a Ré DD[7], faleceu, como se documenta pelas diligências com vista à sua citação.

            c) Por despacho proferido em 11.02.2020, foi ao abrigo do disposto no art.º 270º, n.º 1 do CPC, declarada suspensa a instância face ao falecimento da Ré FF.

            d) Tal despacho foi notificado às partes por notificação expedida via Citius em 12.02.2020.

            e) Por despacho proferido em 23.11.2020, face à suspensão dos prazos processuais entre 09 de março e 02.6.2020[8], considerou-se assistir razão à A. de que não havia decorrido o prazo de deserção da instância, mais se determinando a realização das diligências que a mesma havia requerido junto da AT e do Réu GG, com vista a apurar da identificação dos sucessores da falecida Ré FF.

            f) Face à notícia do falecimento do Réu GG, foi em .../.../2021 proferido despacho determinado a notificação da A. para juntar aos autos certidão de assento de óbito do mesmo.

            g) Por requerimento de 05.4.2021, requereu a A. a notificação da AT para juntar aos autos declaração de imposto de selo por óbito do Réu GG, e a notificação do Réu BB[9] para indicar nos autos o NIF da falecida Ré FF.

            h) Por requerimento de 20.5.2021, requereu a A. a prorrogação do prazo para junção aos autos da certidão de assento de óbito do Réu GG, o que foi deferido por despacho de 01.6.2021.

            i) Por requerimento de 25.6.2021, juntou a A. aos autos certidão de assento de óbito do Réu GG.

            j) Por despacho proferido em 22.11.2021, foi ao abrigo do disposto nos art.ºs 269º, n.º 1, al. a), 270º, n.º 1, e 276º, n.º 1, al. a), do CPC, declarada suspensa a instância face ao falecimento do Réu GG, até à notificação da decisão que considere habilitados os sucessores do falecido.

            Nesse mesmo despacho, no deferimento do que havia sido requerido pela A. pelo requerimento de 05.4.2021, foi determinada a notificação do Réu EE para indicar nos autos o NIF da falecida Ré FF, e que se notificasse o ... para juntarem aos autos imposto de selo por óbito do falecido Réu GG, e ainda, logo que fornecido o NIF da falecida Ré FF, juntassem aos autos Modelo I do imposto sucessório apresentado por óbito da mesma.

            Pelo mesmo despacho, e resultando das diligências para citação, que as Rés DD, e CC, haviam falecido, determinou-se a notificação da A. para no prazo de 10 dias juntar aos autos as respetivas certidões de assento de óbito.

            k) Tal despacho foi notificado às partes por notificação expedida via Citius em 23.11.2021[10].

            l) Por requerimento junto em 03.12.2021, notificado entre mandatários, indicou o Réu EE o NIF da falecida Ré FF.

            m) Por requerimento de 06.12.2021, veio a A. informar que após junção de todos os elementos necessários, solicitou a certidão de óbito da falecida Ré CC, aguardando o recebimento da mesma, e requerendo o prazo de 05 dias para junção da certidão de óbito da Ré DD, o que foi deferido por despacho de 09.12.2021.

            n) Por ofícios junto aos autos em 14.12.2021, e 21.12.2021 deu a AT cumprimento ao determinado por despacho de 22.11.2021, os quais foram notificados à A..

            o) Por requerimento de 21.12.2021, juntou a A. aos autos certidão de assento de óbito da Ré CC, e informou estar a diligenciar pelos motivos invocados pela junção da certidão de assento de óbito da Ré DD.

            p) Por despacho de 19.01.2022 foi determinada a notificação da A. para juntar a certidão de assento de óbito da Ré DD.

            q) Por requerimento de 02.02.2022, requereu a A. a notificação dos Réus aí identificados para virem aos autos informar da data do nascimento da Ré DD, a fim de lograr juntar aos autos a certidão de assento de óbito da mesma, o que foi deferido por despacho de 16.02.2022.

            r) Por requerimento junto aos autos em 21.02.2022 pelo Réu EE, notificado entre mandatários, informou o mesmo da data do nascimento da Ré DD.

            s) Por despacho de 17.3.2022, foi ao abrigo do disposto nos art.ºs 269º, n.º 1, al. a), 270º, n.º 1, e 276º, n.º 1, al. a) do CPC, declarada suspensa a instância face ao falecimento da Ré CC, até à notificação da decisão que considere habilitados os sucessores da falecida.

            Nesse mesmo despacho, mais se consignou: “Não juntou ainda a autora aos autos certidão de assento de óbito da ré DD, nem promoveu ainda a habilitação dos réus falecidos. / Assim, e não obstante os prazos de suspensão da instância, determino que os autos aguardem impulso processual, sem prejuízo do disposto no art.º 281º, n.º 1 do CPC”.

            t) Tal despacho foi notificado às partes por notificação expedida via Citius em 25.3.2022, considerando-se as partes notificadas do mesmo, em 28.3.2022 (art.ºs 247º, n.º 1 e 248º, n.º 1 do CPC).

            u) Por requerimento junto em 29.4.2022, informou a A. que não obstante as inúmeras diligências encetadas, não logrou ainda obter a certidão de óbito da Ré DD, requerendo a notificação dos Réus aí identificados para indicarem a data correta do nascimento da referida Ré, o que foi deferido por despacho de 04.5.2022.

            v) Por requerimento junto em 11.5.2022, notificado entre mandatários, reiterou o Réu EE, que a data de nascimento da falecida Ré DD é a que anteriormente havia indicado.

            w) Em 15.6.2022 foi proferido despacho do seguinte teor:

            “… Encontra-se[11] a instância suspensa, ante o falecimento da ré CC, sendo que não juntou ainda a autora aos autos certidão de assento de óbito da ré DD, nem promoveu ainda a habilitação dos sucessores dos réus falecidos. / Assim, e em conformidade com o despacho já oportunamente proferido, determino que os autos aguardem impulso processual, sem prejuízo do disposto no art.º 281º, n.º 1 do CPC. / Notifique”.

            x) Tal despacho foi notificado às partes via Citius em 27.6.2022.

            y) Em 04.01.2023, juntou a A. aos autos requerimento deduzindo incidente de habilitação de herdeiros por óbito da falecida Ré CC.[12]

            z) Referiu e concluiu, ainda, a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo que não requereu a A., até ao momento, a habilitação de herdeiros dos falecidos Réus FF e GG, nem juntou a certidão de assento de óbito da Ré DD, não obstante as diligências requeridas pelo mesmo e deferidas pelo Tribunal, não tendo dado qualquer justificação para ainda o não ter feito.

            aa) E bem assim que, antes da dedução, em 04.01.2023, do incidente de habilitação de herdeiros da falecida Ré CC, a última vez que a A. havia impulsionado a instância foi em 29.4.2022, tendo em vista a junção aos autos da certidão de óbito da Ré DD, sendo que não obstante o requerimento de 11.5.2022, junto pelo Réu EE, nada mais a A. requereu ou justificou relativamente à habilitação dos sucessores dos Réus falecidos, e à junção da certidão de assento de óbito em falta, até à dedução do incidente de habilitação de herdeiros da falecida Ré CC, em 04.01.2023.

            2. Cumpre apreciar e decidir.

            Preceitua o art.º 281º (sob a epígrafe “deserção da instância e dos recursos”) do CPC[13]: Sem prejuízo do disposto no n.º 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses (n.º 1); O recurso considera-se deserto quando, por negligência do recorrente, esteja a aguardar impulso processual há mais de seis meses (n.º 2); Tendo surgido algum incidente com efeito suspensivo, a instância ou o recurso consideram-se desertos quando, por negligência das partes, o incidente se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses (n.º 3); A deserção é julgada no tribunal onde se verifique a falta, por simples despacho do juiz ou do relator (n.º 4); No processo de execução, considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses (n.º 5).

            O regime pretérito (CPC de 1961), relativo à interrupção e deserção da instância, era o seguinte: “A instância interrompe-se, quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência das partes em promover os seus termos ou os de algum incidente do qual dependa o seu andamento” (art.º 285º); “Cessa a interrupção, se o autor requerer algum ato do processo ou do incidente de que depende o andamento dele, sem prejuízo do disposto na lei civil quanto à caducidade dos direitos” (art.º 286º); “Considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando esteja interrompida durante dois anos” (art.º 291º, n.º 1).

            Concluiu-se, assim, que a atual lei processual civil, além de ter encurtado para seis meses o prazo, até aí de dois anos, que a parte dispunha para impulsionar os autos sem que fosse extinta a instância por deserção, eliminou também a figura da interrupção da instância, ou seja, a instância fica deserta logo que o processo, por negligência das partes, esteja sem impulso processual durante mais de seis meses sem passar, portanto, pelo patamar intermédio da interrupção da instância; estamos, pois, perante um regime mais severo para sancionar a negligência das partes em promover o andamento do processo, colimando logo com a ´deserção` e consequente `extinção da instância` [art.º 277º, c)] aquela falta de impulso processual.[14]

            3. Nos termos do art.º 281º, para se considerar deserta a instância é necessário, não apenas que o processo esteja parado há mais de seis meses a aguardar impulso processual da parte, mas também que tal se verifique por negligência (da parte) em promover o seu andamento.

            Segundo a mesma previsão legal, a instância declarativa, ou o recurso, não se poderão considerar desertos independentemente de qualquer decisão judicial (despacho do juiz ou do relator).[15]

            4. Dúvidas não restam, pois, que a deserção da instância declarativa opera, necessariamente, mediante decisão judicial e pressupõe a negligência das partes no impulsionamento do processo (carece de ser imputável às partes)[16], pelo que até ser proferida (tal decisão) não pode, pois, a instância ser considerada deserta, designadamente pela secretaria judicial.[17]

            Pretendeu-se que o arquivamento do processo por deserção ficasse dependente do controlo jurisdicional, designadamente no que toca à verificação da negligência da parte em promover os seus termos.[18]

            5. Confrontados com o atual (e descrito) regime jurídico, afigura-se assim inteiramente correto, e igualmente defensável, o expendido pelo Senhor Professor Alberto dos Reis a propósito de idêntica disposição do CPC de 1939:      

            A deserção não se produz automaticamente, ´ope legis`; depende de acto do juiz, produz-se ´ope judicis`, visto que demanda uma sentença de declaração.[19] Suponhamos então que, tendo passado o lapso de tempo marcado no artigo 296º[20], uma das partes dá impulso ao processo antes de o juiz ter declarado a deserção; deverá o tribunal considerar deserta a instância, não obstante o impulso referido, ou ficará, pelo contrário, inutilizado o efeito da inércia durante o período legalmente necessário para se operar a deserção?

            Entendemos que a inércia fica sem efeito e que deve admitir-se o seguimento do processo.

            Atenda-se, por um lado, a que o efeito da inatividade das partes não se produz ´ipso jure`. A nossa lei não declara (…) que a deserção opera ´de direito` os seus efeitos; pelo contrário, segundo o artigo 296º, não basta o facto da inércia, é necessário uma sentença de extinção.

            (…) Enquanto a instância não for declarada extinta, as partes podem dar impulso ao processo, pouco importando que tenha estado parado durante mais de (...).”[21]

            “(…) A deserção não se produz de direito, posto que deva ser declarada oficiosamente; depende de acto do juiz, produz-se ´ope judicis`. A sentença de deserção tem, pois, alcance constitutivo. Enquanto não for proferida, é lícito às partes promover utilmente o seguimento do processo.”.[22]

            “(…) A deserção não existe enquanto o juiz a não declara no processo respectivo.”[23]

            6. Perante o disposto no art.º 281º, o descrito entendimento e a factualidade mencionada em I., supra - pelo que decorre dos autos, o normal prosseguimento da ação estava dependente da dedução de quatro incidentes de habilitação de herdeiros -, será de concluir que, com a apresentação, em 04.01.2023 [ou seja, aparentemente, mais de seis meses após o despacho dito em II. 1. w) e x), supra – cf. art.º 138º, n.º 1[24] e, também, a posição do Tribunal recorrido aludida nas alíneas z) e aa) da factualidade provada][25], do requerimento deduzindo incidente de habilitação de herdeiros por óbito da falecida Ré CC [cf. II. 1. y), supra], antes de declarada a deserção da instância [em 07.02.2023], a A. não deixou de promover utilmente o seguimento do processo (impulsionando os autos), pelo que ficou desde logo sem efeito, nos termos expostos, a sua eventual inércia [não obstante todo o conteúdo do despacho da alínea w) e a omissão verificada], razão pela qual já não seria sequer possível analisar a sua pretérita atuação no que pudesse consubstanciar negligência na promoção do regular andamento dos autos[26] - qualquer situação de negligência para efeitos de deserção da instância (excluindo, obviamente, facto ou circunstância integrando justo impedimento), não relevaria, então, para efeitos de deserção da instância.[27]

            7. A deserção da instância encontra o seu fundamento na necessidade ou conveniência (designadamente para a boa ordem dos serviços) de não permitir a pendência nos tribunais de processos que estão parados por longos períodos de tempo e sem solução alguma. Por essa via, libertar-se-ia o tribunal de um “pêso morto” ao mesmo tempo que, reflexa e indiretamente, se estimulavam as partes a ser diligentes e ativas, perante a ameaça de extinção do processo.[28]

            A deserção da instância não tem, portanto, qualquer carácter sancionatório da parte relativamente à sua conduta omissiva durante um certo e determinado período temporal; o que se pretende é libertar o tribunal de processos em relação aos quais nada pode fazer ou decidir porque a atividade jurisdicional está dependente de ato da parte que esta não pratica e em relação aos quais se pode dizer que a sua pendência no tribunal é uma total inutilidade.[29]

            Assim, nas situações em que a extinção da instância pressupõe ainda a existência de um despacho que a declare, não encontramos razões suficientemente válidas para que tal despacho seja proferido quando a situação que lhe está subjacente – a inércia da parte no que toca ao prosseguimento do processo – foi, entretanto, ultrapassada porque a parte veio impulsionar os autos.

            A situação que se depara ao juiz, no momento em que profere o despacho, já não é uma situação de inatividade processual porque, apesar de essa inatividade ter existido durante mais de seis meses, ela cessou, entretanto, porque a parte veio impulsionar o processo num momento em que a instância ainda subsistia por não terem sido ainda declarados os efeitos processuais da deserção; estando o processo em condições de prosseguir, a sua extinção não aproveitaria a ninguém e não lograria satisfazer qualquer interesse relevante, determinando apenas o desaproveitamento de toda a atividade processual aí desenvolvida, obrigando as partes e o tribunal a novo e idêntico esforço na repetição desses atos no âmbito de nova ação que viria a ser instaurada.

            Concluindo: no âmbito da ação declarativa, apesar de o processo ter estado parado, por negligência das partes, durante mais de seis meses a aguardar o necessário impulso processual, enquanto não for proferida decisão a julgar verificada e a declarar a deserção da instância, as partes podem promover utilmente o prosseguimento do processo e, se o fizerem, esse impulso deve ser atendido, ficando prejudicada a prolação de decisão no sentido de declarar a deserção e consequente extinção da instância.[30]

8. Na situação em análise, aquando da apresentação em 04.01.2023 do requerimento de habilitação de herdeiros, por óbito da falecida Ré CC, já tinha ocorrido o prazo de deserção da instância; porém, nessa data, o processo continuava pendente e a A. deu-lhe atendível, adequado e relevante impulso.          

            Os autos contêm especificidades/particularidades que apontam para alguma dificuldade, desde logo, aquando da citação (ou tentativa de citação[31]) dos seus (iniciais) 21 (vinte e um demandados), e bem assim quanto à identificação e localização dos herdeiros dos quatro demandados cujo falecimento foi comunicado aos autos, como também decorre dalguns dos requerimentos da partes.

            E se, aparentemente, tais dificuldades dificilmente se compatibilizam com todo o tempo deste processo (instaurado em 30.01.2019) e a insuficiência do que se terá feito visando o seu “normal” prosseguimento, contudo, toda essa realidade, por um lado, continua insuficientemente explicitada, e, por outro lado, as apuradas vicissitudes (inclusive, as circunstâncias da prolação da decisão recorrida) têm no prosseguimento dos autos a solução tida por adequada e conforme ao regime jurídico vigente.

            Ademais, ante os elementos disponíveis, e sem quebra do respeito sempre devido por opinião em contrário, não se antolha possível afirmar que nada exista no processo que inculque a ideia de que a inação se deve a causas estranhas à vontade da parte” e/ou que esteja “apoditicamente constituída uma situação de desinteresse, logo de negligência”, mormente, por não ter ocorrido “qualquer esforço no sentido de suscitar o incidente de habitação ou de identificar os herdeiros”.[32]

            9. Impõe-se, pois, a revogação da decisão recorrida e o consequente prosseguimento dos autos, admitindo-se, desde já, a habilitação de herdeiros requerida pela A./Recorrente.[33]

            10. Procedem, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.


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            III. Pelo exposto, na procedência da apelação, revoga-se a decisão recorrida, devendo o processo prosseguir os seus termos.

            Custas pelos apelados EE, e Outros.


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27.6.2023


           



[1] Em 30.01.2019.
[2] Dezanove pessoas singulares, uma herança (ilíquida e indivisa) e uma sociedade comercial
[3] Reporta-se, a A., ao requerimento de 04.01.2023 (fls. 211).

[4] Na generalidade, dada como provada na 1ª instância (sob a epígrafe “Com interesse para a decisão, documenta-se nos autos que:”).
[5] Retificou-se (cf. certidão de assento de óbito de fls. 130).
[6] Demandados, respetivamente, nas “posições” 5ª, 4º e 18ª.
[7] 19ª demandada.
[8] Retificou-se - cf. requerimento da A. de 27.10.2020/fls. 118 e despacho de fls. 120, que deu “sem efeito” o despacho de 13.10.2020 e deferiu o requerido pela A. no sentido de o Tribunal solicitar à AT elementos sobre a falecida FF e da colaboração dos demandados na identificação dos sucessores daquela.
[9] 2º demandado.
[10] Retificou-se o ano (constava, erradamente, 2022).
[11] Retificou-se.
[12] Tal incidente foi deduzido por apenso, mas indevidamente autuado (cf. art.º 352º, n.º 2, do CPC); a A. juntou certidão do assento de óbito, indicou os herdeiros/sucessores da Ré CC, comprovou o pagamento da taxa de justiça devida e requereu a notificação dos Réus e a citação dos requeridos “para contestar, querendo, seguindo-se os demais termos” (cf. fls. 211 a 214).
[13] Diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem.

[14] Cf. o acórdão da RP de 02.02.2015-processo 4178/12.2TBGDM.P1, publicado no “site” da dgsi.

[15] Decisão que já não se antolha necessária no processo de execução, aqui, ao que tudo indica, em virtude da utilização privilegiada e tendencialmente única, nesta forma de processo, dos procedimentos eletrónicos e informáticos. Contudo, daí não se poderá concluir que se tenha pretendido prescindir, quanto ao processo executivo, da efetiva negligência das partes enquanto causa/requisito da situação do processo a aguardar impulso processual, de resto, exigência ou pressuposto claramente expresso na letra e no espírito da lei - cf., neste sentido, os acórdãos desta Relação de 01.12.2015-processo 2061/10.5TBCTB-A.C1 [no qual se defendeu que a negligência das partes a que alude o art.º 281º, do CPC de 2013, não deve/pode ser presumida e, em consequência, sobre tal questão (e para dela apurar) deve ser aberto um contraditório prévio, nos termos do art.º 3º/3 do CPC; o atual art.º 281º/1 do CPC não deve ser interpretado/aplicado com a “rigidez” e “automatismo” do antigo art.º 285º do CPC; e que haverá casos em que o contraditório prévio se mostra, em face de elementos resultantes dos autos, desnecessário e inútil, tanto por a negligência ser já patente, como por ser evidente a falta dela.] e 16.12.2015-processo 651/08.5TBCTB-A.C1 [subscrito pelo relator], publicados no “site” da dgsi.

   Sobre a mesma problemática e relativamente às ações declarativas, cf., entre outros, os acórdãos da RP de 02.02.2015-processo 4178/12.2TBGDM.P1 e da RC de 05.5.2015-processo 131/04.8TBCNT.C1, publicados no “site” da dgsi, defendendo-se, no primeiro, “a desnecessidade de despacho do juiz ou do relator está apenas circunscrita ao processo de execução” (n.º 5 do art.º 281º) e que “o tribunal antes de exarar o despacho a julgar extinta a instância por deserção, deve ouvir as partes de forma a melhor avaliar se a falta de impulso processual é imputável ao comportamento negligente de alguma delas, ou de ambas”, e, no segundo, que “importa apreciar e valorar a existência de omissão negligente da parte em promover os termos do processo, do que depende a possibilidade de se decretar a deserção da instância, constituindo a negligência da parte o seu pressuposto, desiderato, este, que só pode ser alcançado mediante a prolação de decisão judicial precedida da averiguação do motivo/causa da falta de impulso processual”, sendo que, nos termos do n.º 5 do art.º 281º, “o único caso em que se permite a deserção da instância, independentemente de decisão judicial, é no caso de processo de execução, dado que a própria declaração de extinção executiva também ocorre independentemente de decisão judicial, cf. artigo 849º, n.º 3, do NCPC”. 

   Porém, em idêntico enquadramento processual, no acórdão da RP de 28.10.2015-processo 2248/05.2TBSJM.P2 (publicado no “site” da dgsi) concluiu-se que “a deserção da instância decorre diretamente da circunstância de o processo estar parado há mais de seis meses a aguardar o impulso da parte e o único despacho legalmente previsto é aquele que declara essa deserção, nada justificando um anterior despacho de alerta”.

   Como neste último aresto da RP, no sentido de que inexiste fundamento legal, nomeadamente à luz do princípio do contraditório, para a prévia audição das partes no contexto da deserção da instância com vista a aquilatar da negligência da parte a quem cabe o ónus do impulso processual, cf., de entre vários, os acórdãos do STJ de 20.9.2016-processo 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1, 14.12.2016-processo 105/14.0TVLSB.G1.S1, 22.02.2018-processo 473/14.4T8SCR.L1.S2, 12.01.2021-processo 3820/17.3T8SNT.L1.S1, 31.01.2023-processo 18932/16.2T8LSB.L3.S1 e 16.3.2023-processo 543/18.0T8AVR.P1.S1 [concluiu-se, nomeadamente: “(...) III. O tribunal não só não está obrigado a inquirir as partes sobre a razão da sua inércia como o não deve fazer por ser um terceiro imparcial que não deve intrometer-se nas decisões que as partes têm liberdade de adotar como seja, não prosseguir com um processo que instauraram.”], bem como, por exemplo, os acórdãos da RL de 22.01.2019-processo 17312/16.4T8SNT.L1-7 e 21.10.2021-processo 4127/17.1T8LSB.L2-6 e da RC de 08.3.2022-processo 11/19.2T8ALD.C1, publicados no “site” da dgsi.

   Sobre a mesma matéria veja-se, ainda, a jurisprudência e a doutrina citadas na nota seguinte.

[16] Dir-se-á, ainda, que alguma doutrina e jurisprudência defende que, apesar de a falta de impulso poder ser, ela mesma, sinónima de negligência da parte e de, em princípio, não se justificar nenhum dever de prevenção da parte, porém, como a deserção da instância exige que a falta de impulso decorra da negligência das partes (art.º 281º, n.º 1, CPC), haverá que avaliar, caso a caso, se se justifica o cumprimento pelo tribunal do dever de prevenção, porquanto, por exemplo, poderá haver razões para o cumprimento desse dever se a parte à qual cabe o impulso não estiver representada por advogado ou se esta mesma parte tiver demonstrado, pelo seu anterior comportamento processual, que está interessada na continuação do processo e se, por isso, for surpreendente a falta de impulso processual – cf., designadamente, Paulo Ramos de Faria/Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. I, Almedina, 2013, pág. 250.

   Em idêntico sentido, cf. o cit. acórdão da RP de 02.02.2015-processo 4178/12.2TBGDM.P1 e, entre outros, os acórdãos da RC de 16.3.2016-processo 131/04.8TBCNT.C2, da RL de 03.3.2016-processo 1423-07.0TBSCR.L1-6 e da RE de 17.3.2016-processo 178/14.6TBRDD.E1, publicados no “site” da dgsi.

   Com o entendimento de que a existência de despacho prévio de advertência à parte para a necessidade de exercício do seu impulso processual não é um requisito autónomo da deserção da instância, mas podendo acontecer, em determinadas situações, que a existência desse despacho seja necessária para configurar uma efetiva falta de impulso processual que possa ser imputada a negligência das partes, designadamente, quando, na situação concreta, não seja claro e líquido que o prosseguimento dos autos esteja dependente de um ato a praticar pelas partes ou quando o prosseguimento do processo está dependente de ato a praticar por outra pessoa que não as partes (por exemplo, por agente de execução ou perito), cf. ainda, de entre vários, os acórdãos da RC de 14.6.2016-processo 500/12.0TBAGN.C1 e 08.3.2022-processo 11/19.2T8ALD.C1, publicados no “site” da dgsi.

   Defendendo a audição prévia das partes, no processo de declaração, cf. ainda, designadamente, os acórdãos da RG de 07.5.2015-processo 243/14.0TBFAF.G1, da RP de 11.4.2019-processo 10135/05.8TBMAI.P1, 23.11.2021-processo 2087/18.0T8PVZ.P1 e 21.02.2022-processo 879/21.2T8STS.P1 [com o sumário: «I - A deserção da instância, que nunca opera automaticamente em processo declarativo e que sempre demanda o prévio exercício do contraditório (n.º 3, do art.º 3º, do CPC), é uma causa de extinção da instância determinada por o processo estar parado há mais de seis meses - pressuposto objetivo - devido a negligência das partes em promover o seu andamento, em situações que lhes caiba, especialmente, o ónus de impulso processual - pressuposto subjetivo - (cf. n.º 1, do art.º 281º, n.º 1, do art.º 6º e al. c), do art.º 277º, todos do CPC); II - Configurada a obrigatoriedade da apresentação de registo comercial da propositura do procedimento cautelar de suspensão de deliberação social, “ónus de impulso especialmente imposto às partes” pelo art.º 9º, alínea e), e art.º 15º, n.º 5, ambos do Código de Registo Comercial, a omissão da sua junção, objetivada nos autos, é suscetível de conduzir àquele efeito extintivo perante circunstancialismo fáctico revelador de negligência das partes; III - E para se poder qualificar a omissão como negligente, impõe-se ouvir, previamente, a parte, a quem nunca se pode retirar o direito de influenciar a decisão, seja ao nível dos factos seja ao da prova seja, ainda, quanto ao enquadramento jurídico.»] e da RC de 23.01.2018-processo 1703/14.8T8LRA.C1, publicados no “site” da dgsi.

[17] Considerando que nas ações a que alude o n.º 1 do art.º 281º do CPC a decisão que declara a deserção tem natureza constitutiva, ou seja, para que exista deserção é necessário que seja proferida sentença a decretá-la, cf., nomeadamente, os acórdãos da RG de 30.4.2015-processo 230/11.0TBBRG.G1 [tendo-se concluído “(...) a decisão de extinção tem alcance constitutivo e não simplesmente declarativo, e daqui que enquanto não for proferida será lícito à parte onerada com o ónus do impulso processual promover utilmente o seguimento do processo mesmo que já tenham transcorrido os seis meses inerentes à deserção.”], da RP de 28.10.2021-processo 17373/19.4T8PRT.P1 [constando do sumário: «(...) III - A sentença de deserção da instância tem alcance constitutivo, no sentido de que enquanto não for proferida, é lícito às partes promover utilmente o andamento do processo. IV - É esta a interpretação que melhor serve princípios básicos do processo civil, nomeadamente da certeza e segurança jurídicas, e da economia processual.»], da RC de 16.3.2016-processo 131/04.8TBCNT.C2, 17.5.2016-processo 2/14.0TBVIS.C1, 22.6.2021-processo 1170/13.3TBPBL.C1 e 08.3.2022-processo 11/19.2T8ALD.C1 e da RL de 07.5.2020-processo 3820/17.3T8SNT.L1-6, publicados no “site” da dgsi.

      Com entendimento diverso, cf., nomeadamente, os acórdãos da RP de 24.5.2021-processo 4842/09.3TBSTS.P2 [sumariando-se: «O despacho que declara deserta a instância tem mero efeito declarativo e os atos espontaneamente praticados pelas partes, após a deserção, mas antes do seu reconhecimento judicial, não impedem que a deserção seja efetivamente declarada.»] e da RL de 20.12.2016-processo 3422/15.9T8LSB.L1-7 e 10.01.2023-processo 16721/17.6T8LSB.L2-7 [refere-se, contudo, na fundamentação: “(...) Confrontando os enunciados das als. a) e c) do art.º 277º, nota-se que a lei não estabelece que a instância se extingue por força do ´julgamento` da deserção, embora ele seja necessário para que esta tenha repercussões processuais.”], publicados no “site” da dgsi, e Paulo Ramos de Faria, O Julgamento da Deserção da Instância Declarativa, JULGAR on line – 2015, págs. 10 e seguintes.

[18] Vide Paulo Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas..., loc. Citado (“nota 16”, supra).
[19] Sublinhado nosso, como os demais a incluir no texto.
[20] Disposição que tinha a seguinte redação: «Considera-se deserta a instância quando estiver interrompida durante cinco anos, sem prejuízo do que vai disposto no artigo seguinte. Verificado o caso previsto neste artigo, deve a secretaria fazer o processo concluso, a fim de ser declarada extinta a instância

[21] Vide Comentário ao CPC, vol. 3º, Coimbra Editora, 1946, págs. 439 e seguinte.
[22] Ibidem, pág. 444.
[23] Ibidem, pág. 445.

  Em tudo idêntica a perspetiva perfilhada (face ao atual quadro normativo) por J. Lebre de Freitas: «Trata-se de realizar uma função ´compulsória`, de natureza semelhante àquela que, no direito civil, realiza a sanção pecuniária do artigo 829º-A CC: à ordem jurídica interessa que seja praticado determinado ato processual, assegurando o prosseguimento do processo. Por isso não faz sentido declarar deserta a instância depois de praticado, pela parte, ´sponte sua` e ainda que após o prazo de seis meses do art.º 281º CPC, o ato cuja omissão tenha estado na origem da paragem do processo. (...) Conseguida a finalidade compulsória, a subordinação do processo civil à função da realização dos direitos materiais (sempre frustrada quando, em vez dela, o processo desemboca numa decisão meramente processual) impõe que o ato seja aproveitado e o processo prossiga. Algo de semelhante se dirá se, depois de decorrido o prazo de seis meses do art.º 281º-1 CPC, forem praticados no processo atos do tribunal (do juiz ou da secretaria) que importem o prosseguimento do processo (Paulo Ramos de Faria, O julgamento da deserção da instância declarativa/Breve roteiro jurisprudencial, julgar, abril 2015, n.º 4.4, pp. 15 e 16).» - in Da Nulidade da Declaração de Deserção da Instância sem Precedência de Advertência à Parte, Revista da Ordem dos Advogados, I-II 2018, pág. 194, nota (11); também disponível in https://portal.oa.pt/media/130214/jose-lebre-de-freitas_roa_i_ii-2018-revista-da-ordem-dos-advogados.pdf.

[24] Cf., por exemplo, o cit. acórdão da RP 23.11.2021-processo 2087/18.0T8PVZ.P1: “(...) II - A deserção da instância não se suspende nas férias judiciais, face à ressalva expressamente prevista no n.º 1 do artigo 138º do CPC, que determina a suspensão dos prazos processuais no aludido período, «salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses»”.

[25] In casu, a falta de impulso processual por período superior a seis meses foi imputável, a título de negligência, à A. - durante os seis meses subsequentes à notificação daquele despacho o incidente não foi deduzido, sendo que, como decorre do despacho em causa e da lei, o prosseguimento dos autos estava dependente de um ato que tinha que ser praticado por qualquer das partes sobrevivas ou pelos sucessores da parte falecida (art.º 351º, n.º 1).

[26] Cf. o cit. acórdão da RC de 17.5.2016-processo 2/14.0TBVIS.C1.

[27] Afirma-se no cit. acórdão da RC de 22.6.2021-processo 1170/13.3TBPBL.C1, “(...) então o processo pode estar parado por mais de 6 meses, mesmo por negligência da parte, mas se ao sétimo mês, por exemplo, a parte requerer algo que faz andar o processo, então este requerimento coloca fim à inatividade processual e a instância já não pode ser declarada extinta por deserção”.
[28] Vide Alberto dos Reis, Comentário ao CPC, vol. 3º, cit., pág. 439.
[29] O principal fundamento da deserção residirá hoje no seu efeito compulsório com vista à tutela da celeridade processual; (...) “ao sistema de justiça estadual repugna a paragem negligente dos termos do processo, mas também repugna a extinção deste, quando ainda é útil, com o consequente aproveitamento de toda a atividade processual pretérita, obrigando (desnecessariamente) a que nova demanda seja instaurada” - Paulo Ramos de Faria, O Julgamento da Deserção da Instancia Declarativa, Breve Roteiro Jurisprudencial, págs. 2 e 15, Julgar on line – 2015, http://julgar.pt/wp-content/uploads/2015/04/O-JULGAMENTO-DA-DESER%C3%87%C3%83O-DA-INST%C3%82NCIA-DECLARATIVA-JULGAR.pdf.
   O mesmo autor sustenta entendimento oposto quanto à questão aqui colocada, considerando que, após a ocorrência da deserção e antes de ser ela judicialmente reconhecida, os atos espontaneamente praticados pelas partes são potencialmente desprovidos do seu efeito jurídico processual típico, não sendo idóneos a impedir o julgamento de deserção da instância. Aceita, no entanto, que, se após o preenchimento dos pressupostos constitutivos da deserção, o tribunal praticar atos, como que pressupondo a subsistência da relação jurídica processual, poderá ficar impedido de, oficiosamente, declarar extinta a instância com base naquela concreta paragem - vide o mesmo Estudo, págs. 14 e seguinte.

[30] Cf. o cit. acórdão da RC de 08.3.2022-processo 11/19.2T8ALD.C1, no presente ponto seguido de perto [constando do sumário: «(...) II - Ainda que estejam verificados os pressupostos de que depende a deserção da instância pela circunstância de o processo ter estado parado por negligência das partes e durante mais de seis meses, enquanto não for proferida decisão a declarar a deserção da instância, as partes podem promover utilmente o prosseguimento do processo, caso em que fica inviabilizada a declaração da deserção da instância com fundamento na falta de impulso processual registada em momento anterior.»] e o acórdão da RC de 02.5.2023-processo 2239/18.T8CBR-C.C1 [reportando-se àquele anterior aresto, com o sumário: «I - Apresentando o instituto da deserção um custo – a perda da atividade que se exerceu no processo – e um rendimento – libertação de processos parados e estimulação das partes a ser diligentes e ativas, induzindo-as a promover o andamento dos autos –, a ponderação de tais vantagens e desvantagens deverá levar a que se reduza o mais possível o custo, sem prejudicar fundamentalmente o rendimento. II - Realizando a deserção uma função compulsória – à ordem jurídica interessa que seja praticado determinado ato processual –, uma vez este praticado e ainda que nesse momento se encontrassem reunidas as condições para tal declaração nos termos do art.º 281º, n.º 1, CPC, se e enquanto tal declaração não tiver ocorrido, deverá tal ato ser aproveitado, admitindo-se o prosseguimento do processo.»], publicado no “site” da dgsi.
[31] Por exemplo, constatamos (no processo físico) a devolução de mais de vinte cartas para citação (por via postal) dos demandados da ação.
[32] Recorrendo, por exemplo, a palavras do referido acórdão da RL 10.01.2023-processo 16721/17.6T8LSB.L2-7.
[33] Cf. II. 1. y) e “nota 12”, supra.