Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1358/03.5TBFIG-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: EMBARGOS DE TERCEIRO
REGISTO
TERCEIROS
DIREITO DE PROPRIEDADE
PENHORA
Data do Acordão: 01/31/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.838, 848, 849 CPC, 5 CRP, DL Nº 54/75 DE 12/2, DL Nº 124/2004 DE 25/5
Sumário: 1. Os embargos de terceiro devem fundar-se numa posse anterior à diligência judicial respectiva, e o momento para aferir dessa posse é o da realização do acto judicial e não o da sua notificação ao executado ou do seu registo.

2. Não são terceiros entre si, para efeito do disposto no artigo 5º do Código de Registo Predial, o titular do direito de propriedade adquirido em contrato de compra e venda celebrado com o executado e o beneficiário da penhora promovida em execução intentada contra o vendedor e incidente sobre o mesmo bem.

3. Sendo a penhora um direito real de garantia de um crédito que não comporta a transferência de qualquer direito dominial e o direito de propriedade um direito real de gozo, a penhora e o direito de propriedade não são incompatíveis entre si por terem conteúdo distinto.

4. O direito de propriedade adquirido em data anterior à da penhora, ainda que a aquisição não seja registada ou seja registada posteriormente, prevalece sobre a penhora.

Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A Causa:

“J (…), Lda.” deduziu os presentes embargos de terceiro contra o exequente JI (…) e o executado AF (…), alegando, em síntese, que a embarcação “ K...”, penhorada à ordem dos presentes autos, lhe pertence, por tê-la adquirido ao executado em 29.01.2010 e requerido o registo da aquisição na Capitania do Porto de Aveiro cm 01.02.2010. Mais alegou que, no dia 18.02.2010, foi realizada a apreensão da embarcação à ordem dos autos principais, tendo em vista a penhora, que veio a ocorrer em 12.03.2010. Conclui que a penhora, porque posterior à aquisição e respectivo pedido de registo, ofende o seu direito de propriedade, devendo os embargos proceder.

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Os embargos foram recebidos (despacho de 28.04.2010).

Contestou o exequente, invocando a caducidade dos embargos e alegando, em síntese, que o pedido de apreensão data de 2010.2008, e sobre ele não podem prevalecer os actos posteriores de aquisição da embargante.

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Foi proferido despacho saneador, no qual foi julgada improcedente a invocada excepção da caducidade e seleccionada a matéria de facto.

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Proposta e admitida a prova, foi realizada audiência de discussão e julgamento, finda a qual foi proferida decisão da matéria de facto, a qual não foi objecto de reclamação.

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Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que

“a) Declaro a embargante “J (…), Lda.” proprietária da embarcação “ K...”, supra identificada em “2.1.1.” e respectivo motor.

b) Determino o levantamento da penhora que, nos autos principais, incide sobre a embarcação e motor referidos em “a)” e a sua entrega à embargante”.

JI , embargado no processo acima à margem melhor identificado, veio interpor recurso de apelação, para o Tribunal da Relação de Coimbra, alegando e concluindo que:

1- Em sede de Oposição, o Embargado, ora Apelante, pretendia que os embargos fossem julgados totalmente improcedentes mantendo-se a penhora sobre a embarcação dos autos, seus documentos e respectivo motor.

2 - Os presentes autos seguem os termos do processo executivo na redacção anterior às alterações introduzidas pelo Dec.- Lei n° 38/2003. de 8 de Março, isto é das do D.L. n° 13/2002 de 19/02.

3 - A notificação judicial à Capitania de Aveiro de apreensão para penhora não foi indevidamente levada ao registo.

4 - O pedido de averbamento de aquisição é meramente um documento provisório que aguarda decisão de deferimento.

5 - Se assim não fosse não seria necessário o formalismo da necessidade de Despacho de Superior Hierárquico, é esse pedido era imediatamente averbado no processo individual da embarcação.

6 - Ora, de acordo com a matéria dada como provada, Logo após a entrada de tal pedido e antes de se ter averbado registalmente a pretendida aquisição, a embarcação, seus documentos e respectivo motor foram apreendidos.

7 - Tendo sido lavrado o respectivo auto de apreensão e remetido para a Capitania e Tribunal dos autos.

8 - Por esse motivo o Senhor Comandante da Capitania do Porto e Leixões, “Em tempo”, despachou no sentido de suspender o averbamento da aquisição pretendida.

9 - A partir do momento da elaboração do auto de apreensão, estamos já no âmbito dos factos concretos e não de meros pedidos de penhora ou de averbamento de aquisição.

10 - Pelo que a embarcação, seus documentos e motor, antes de ter sido averbada a sua aquisição em nome do embargante, estavam apreendidos, como ainda estão actualmente.

11 - E relembremos aqui o regime adjectivo aplicável e referido, e bem, na Douta Sentença ora recorrida, no seu ponto 4.14, nomeadamente o n°1 do artigo 848° do C. P. Civil, na redacção que lhe era dada pelo D.L. 13/2002 de 19/02.

A penhora de móveis é feita com efectiva apreensão dos bens...

12 - A efectivação da apreensão consubstancia uma efectiva penhora.

13 - Isto é, antes de ser averbada a aquisição da embarcação, está já estava penhorada.

14 - Logo, enquanto a apreensão efectivamente efectuada não fosse dada sem efeito, a Capitania nunca poderia averbar a aquisição.

15 - Por outro lado, a apreensão prevista no artigo 848° atrás referido inclui-se no rol de outras providências que “ afectam a livre disposição dos bens”.

16 - O regime da apreensão prevista no artigo 848°, segue os “termos prescritos na Lei para apreensão de veículos automóveis requerida por credores hipotecários” — n.° 4 daquele preceito.

17 - Ora, a apreensão de veículo automóvel e respectivos documentos ao abrigo do D.L. n° 54/75 de 12/02, é unanimemente entendido como um processo cautelar especificado regulado fora do C.P.Civil.

18 - Também a apreensão prevista naquele artigo 848° do C. P. Civil, tem que ser considerado um processo cautelar e em consequência susceptível de registo.

19 - Em 12 de Fevereiro 1975, foi publicado o D.L. 54/75 com a finalidade de regular o registo automóvel, atendendo precisamente à sua especificidade, e a que o C. R. Predial não respondia cabalmente, parecendo-nos que este diploma deverá ser o aplicado mutatis mutantis ao registo de embarcações.

20 - Desta forma, no artigo 5° deste último diploma legislativo, o seu n.° 1, alínea e), estipula que estão sujeitos a registo, entre outros a apreensão de veículos automóveis

21 - A obrigatoriedade da sujeição a registo da apreensão manteve-se nas suas sucessivas alterações, nomeadamente a imposta pelo D.L. n° 461/82 de 26/11, no qual aquele artigo 5° foi alterado, mas a redacção daquela sua alínea e) manteve-se, passando apenas a ser a sua alínea f), bem como na alteração imposta pelo D.L. n° 85/2006 de 23 Maio, em que mais uma vez a redacção daquele artigo 5° foi alterada, mas a aquela alínea f), manteve-se inalterada.

22 - Tal ordem judicial de apreensão deveria ser registada por aquela Capitania, pois a tal impõem também esta legislação, sendo que tal imposição de registo, decorre do próprio Código do Registo Predial, bastando parta tal a ordem Judicial, pois assim o impõe, aquele código, não sendo necessário para este registo a iniciativa do embargado.

Assim o estipula o artigo 8°-B, n°3 alínea a):

3 - Estão ainda obrigados a promover o registo:

a) Os tribunais no que respeita às acções, decisões e outros procedimentos e providências judiciais.

23 - Por esse facto o Tribunal remeteu a Ordem de Apreensão para Autoridade Marítima e não para qualquer outra entidade policial, pois é ela que tem a competência registal.

24 - Patente fica, pois, que a ordem de apreensão é muito anterior, ao pedido de registo de averbamento da propriedade em nome do embargante.

25 - A resposta ao quesito 8° da base instrutória não espelha o que realmente resultou da inquirição das testemunhas.

26 - Invoca a embargante que cuidou de saber se havia algum ónus ou encargo registado na Capitania.

27 - Dos depoimentos da testemunha (…) resulta que a embargante solicitou verbalmente momentos antes de pedir o averbamento da aquisição, tal informação, que foi no sentido de não constar do registo que obstasse ao negócio.

28 - A resposta ao quesito 8°, deveria reflectir que a colaboradora da embargante questionou verbalmente junto de um funcionário da Capitania de Aveiro algum obstáculo ao registo da embarcação, bem como se tal informação tivesse sido pedida pela forma legal, a resposta obtida seria outra totalmente diferente.

29 - Se essa informação tivesse sido solicitada tal informação por escrito, seria informada da existência do pedido de apreensão para penhora.

30 - Não se vislumbra, pois, qualquer vínculo legal na informação prestada verbalmente pelo funcionário e testemunha (…)

31 - Os documentos continuam apreendidos junto do processo da embarcação.

32 - A apreensão e penhora deve prevalecer sobre a aquisição da embarcação.

33 - A douta Sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 848° do Código de Processo Civil, com a redacção do D.L. 13/2002 de 19/02, aplicável aos autos, bem como o artigo 5°, do D.L. 54/75 de 12/02, nas suas actualizações.

Não foram produzidas contra alegações.

II. Os Fundamentos:

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

Matéria de Facto assente:

2.1.1. Na execução ordinária n.° 1358/03.5TBFIG, a que os presentes autos se encontram apensos, em que é exequente JI e executado AF, foi penhorado, em 12/03/2010, o “barco com o nome de “ K...”, matriculado na Capitania de Aveiro sob o nº ..., da marca “YAMAHA”, série n°. ..., de 115 HP”, conforme documento de fls. 279 a 281 do processo de execução, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“A)” dos factos assentes).

2.1.2. A embargante foi constituída como sociedade por quotas, com o objecto “exploração de oficina de reparação de barcos, motorizados, quadriciclos e equipamentos para a agricultura; comércio de barcos, veículos motorizados, motociclos, equipamento para a agricultura, material e acessórios para barcos e veículos motorizados”, conforme documento de fls. 18 a 20, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“B)” dos factos assentes).

2.1.3. A embarcação referida em “2.1.1.” é uma embarcação de recreio (“C)” dos factos assentes) -

2.1.4. Em 18/02/2010, pelas 15:30 horas, o Comando Local da Policia Marítima de Aveiro procedeu à apreensão da embarcação referida em “2.1.1.”, do seu motor e livrete, nas instalações da embargante, situada na Rua ... Ponte de Vagos, conforme documentos de fls. 272 e 273 do processo de execução, que aqui se dão por integralmente reproduzidos (“D)” dos factos assentes).

2.1.5. Do “Auto de apreensão e nomeação de fiel depositário” elaborado em 18/02/2010, aquando da apreensão referida em “2.1.4.”, fez-se constar a menção ‘ à apreensão da embarcação dc recreio (ER) denominada “ K...’ com o conjunto de identificação ... equipada com motor fora de borda da marca “YAMAHA’; série nº ...de 115 HP, registada em nome de AF /…/ a qual se encontra nas instalações da empresa J (…), LDA /.../ que solicitou a alteração de registo da mesma, em 01 de Fevereiro de 2010, por aquisição ao executado, conforme contrato de compra e venda apresentado para o efeito” conforme documento de fls. 273 do processo de execução, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“E)” dos factos assentes).

2.1.6. Em 01/02/2010 foi entregue na Capitania do Porto de Aveiro um processo de pedido de transferência de registo para J (…), Ld. referente à embarcação referida em “2.1.5.”, em nome de AF conforme documento de fls. 105, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“E)” dos factos assentes).

2.1.7. A embarcação referida em “2.1.5.” foi registada na Capitania do Porto de Aveiro em nome da embargante em 08/04/2010, conforme documento de fls. 184 que aqui se dá por integralmente reproduzido (“G)” dos factos assentes).

2.1.8. Em 30/10/2008 foi determinada a apreensão do barco identificado em “2.1.5.” no processo de execução, conforme documento de fls. 160 do processo de execução, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“H)” dos factos assentes).

2.1.9. Em 30/12/2008 o executado comunicou à G.N.R. de Anadia que vendeu o barco referido em “2.1.5.” a um indivíduo da localidade de Pombal ou Leiria e que não tinha qualquer documento que lhe permitisse identificar o comprador e a sua residência, conforme documento de fls. 217, do processo de execução, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“1)” dos factos assentes).

2.1.10. Em 29/04/2009, a Direcção Geral da Autoridade Marítima foi notificada para proceder à apreensão para penhora da embarcação referida em “2.1.5.”, conforme documento com a referência 2805401, do processo de execução, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“J)” dos factos assentes).

2.1.11. Em 06/05/2009, a ordem de apreensão referida em “2.1.8.” foi comunicada às Capitanias dos Portos e Comandos Locais da Policia Marítima, conforme documento de fls. 224 do processo de execução, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“K)” dos factos assentes).

2.1.12. Em 18/06/2009 o executado comunicou que o barco referido em “2.1.5.” “foi vendido há cerca de um ano” não tendo “qualquer informação sobre o paradeiro do mesmo ou sobre o eventual comprador”, conforme documento de fls. 234 do processo de execução, que aqui se dá por integralmente reproduzido (“L)” dos factos assentes).

2.1.13. Em 15/10/2008, o executado retirou a embarcação referida em “2.1.5.” das instalações da empresa (…)” (“M)” dos factos assentes).

2.1.14. A embarcação referida em “2.1.5.” está nas instalações do embargante desde 15/10/2008 (“N)” dos factos assentes).

2.1.15. Em 29/01/2010, a embargante adquiriu ao 2° embargado a embarcação referida em “2.1.5.” pelo montante de 5.500,00 euros (“1. da base instrutória).

2.1.16. E o motor referido em “2.1.5.” pelo montante de 3.000,00 euros ( da base instrutória).

2.1.17. E acordaram que o pagamento da embarcação e motor referidos em “2.1.5.” fosse efectuado com 5.000,00 euros em dinheiro, entregue ao 2º embargado em 29/01/2010, uma mota de água Yamaha 90 HP com a matrícula X ..., com reboque, no valor de 3.000,00 euros, que a embargante transmitiria ao 2º embargado ou a quem este indicasse à embargante e 500,00 euros, através da entrega de um cheque nesse valor ( da base instrutória).

2.1.18. E acordaram a venda de um motociclo Yamaha, com a matrícula Y ... pertencente a (…), gerente da embargante, ao 2º embargado ou a quem este indicasse, mediante o pagamento imediato dos 5.000,00 euros em dinheiro recebidos pela venda da embarcação referida em “2.1.5.” (“4º” da base instrutória).

2.1.19. Por indicação do 2º embargado à embargante, o motociclo Yamaha, com a matrícula Y ... foi vendido a M (…), residente na Rua ... ., em Anadia (“5º” da base instrutória).

2.1.20. Por indicação do 2 embargado à embargante, a mota de água com matrícula X ... foi facturada ao filho daquele, X (…) residente na Rua ... Anadia, e requerida a favor do mesmo o averbamento da propriedade, junto da Capitania da Póvoa dc Varzim (“6ª”. da base instrutória).

2.1.21. Em 29/01/2010, a embargante preencheu e entregou ao 2 embargado o cheque n.º ..., do “Banco Q..., S.A.”, no valor de 500,00 (quinhentos) euros (da base instrutória).

2.1.22. A embargante, através da colaboradora (…), questionou junto da Capitania do Porto de Aveiro se a embarcação tinha no seu registo algum obstáculo à venda, tendo-lhe sido respondido por um funcionário daqueles serviços nada contar no registo que obstasse ao negócio (“8”. da base instrutória).

2.1.23. No final do mês de Outubro/início de Novembro de 2008, o executado solicitou à embargante que tentasse encontrar comprador para a embarcação e motor referidos em “2.1.5”  ( 11º- da base instrutória).

2.1.24. A embargante acordou com o executado que a embarcação e motor referidos em “2.1.5.” ficariam depositados nas instalações (“stand”) daquela e que esta se comprometia a diligenciar no sentido de encontrar um adquirente, junto dos seus clientes ou de quem se deslocasse às suas instalações (“12”. da base instrutóiia).

2.1.25. Em Novembro de 2008, a embargante passou a publicitar as características da embarcação e do motor no seu sítio na internet (“13. da base instrutória).

2.1.26. Cerca de um ano após o barco estar nas instalações da embargante, o executado propôs-lhe a venda do barco e motor, por ir de viver para França e, na casa para onde iria morar, não dispor de sítio para os guardar (“14.º” da base instrutória).

2.1.27. A embargante só aceitou a compra da embarcação e motor quando o executado disse que aceitava receber parte do preço em dinheiro e outra parte em bens (“15.°” da base instrutória).

2.1.28. O negócio referido em “2.1.15.” e “2.1.16.” foi vertido em documento particular assinado pela embargante e pelo executado, denominado “declaração para registo de propriedade”, datado de 29.01.2010, com o número de série 211 (documento de fls. 279, que aqui se dá por reproduzido).

2.1.29. Foi averbada no registo da embarcação referida em “2.1.5.”, com data de 08.04.20 10, mediante despacho da mesma data, a aquisição referida em “2.1.15.” e “2.1.16.” (documento de fls. 333-334, que aqui se dá por reproduzido).

2.1.30. O registo da penhora foi requerido pelo mandatário do exequente à Capitania do Porto de Aveiro em 09.04.2010 (documento de fls. 365, que aqui se dá por reproduzido).

2.1.31. Foi averbada no registo da embarcação referida em “2.1.6.”, com data de 09.04.2010, mediante despacho da mesma data, a penhora referida em “2.1.30.” (documento de fls. 333-334, que aqui se dá por reproduzido).

2.1.32. O pedido de apreensão referido em “2.1.11.” foi recebido na Capitania do Porto de Aveiro (documento de fls. 346, que aqui se dá por reproduzido).

2.1.33. O pedido referido em “2.1.6.” foi objecto de despacho pelo Capitão do Porto de Aveiro em 02.02.2010, com o seguinte teor: “deferido” e “em tempo: este processo encontra-se a decorrer no âmbito de ordem de apreensão pelo Tribunal Judicial da Figueira da Foz, ficando a aguardar decisão” (documento de fls. 347, que aqui se dá por reproduzido).

2.1.34. O pedido referido em “2.1.6.” foi objecto de despacho pelo Capitão do Porto de Aveiro em 08.04.2010, com o seguinte teor: “proceda-se à alteração de registo conforme solicitado; informe-se o requerente da apreensão em vigor” (documento de fls. 347, que aqui se dá por reproduzido).

2.1.35. O pedido referido em “2.1.30.” foi objecto de despacho pelo Capitão do Porto de Aveiro em 08.04.2010, com o seguinte teor: “deferido; à repartição marítima para cumprir conforme requerido” (documento de fls. 365, que aqui se dá por reproduzido).

Nos termos do art. 684°, n°3, e 690°,n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2, do art. 660°, do mesmo Código.

Das conclusões,

(das quais haverá de dizer-se - em nome do rigor que sempre há que colocar na hipótese de trabalho judiciário sub judice -, que desenvolvem - de forma profusa e tautológica pontos de apreciação, sem levar em devida conta que, justamente, por conclusões se entendem “as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação” (Alberto dos Reis, CPC Anot., 5.°- 359). E, sobretudo, que «as conclusões consistem na enunciação, em forma abreviada, dos fundamentos ou razões jurídicas com que se pretende obter o provimento do recurso. Com mais frequência do que seria para desejar vê-se, na prática, os recorrentes indicarem como conclusões, o efeito jurídico que pretendem obter com o provimento do recurso, e, às vezes, até com a procedência da acção. Mas o erro é tão manifesto que não merece a pena insistir neste assunto. Se as conclusões se destinam a resumir, para o tribunal ad quem, o âmbito do recurso e os seus fundamentos, pela elaboração de um quadro sintético das questões a decidir e das razões porque devem ser decididas em determinado sentido, é claro que tudo o que fique para aquém ou para além deste objectivo é deficiente ou impertinente (Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 30, 299), -

ressaltam as seguintes questões elencadas, na sua formulação originária, de parte, a considerar na sua própria matriz:

I.

25 - A resposta ao quesito 8° da base instrutória não espelha o que realmente resultou da inquirição das testemunhas.

30 - Não se vislumbra, pois, qualquer vínculo legal na informação prestada verbalmente pelo funcionário e testemunha (…).

(…)

Sendo, por isso, na conformação apresentada negativa a resposta às questões em I.

II.

32 - A apreensão e penhora devem prevalecer sobre a aquisição da embarcação.

33 - A sentença recorrida violou, entre outros, os artigos 848° do Código de Processo Civil, com a redacção do D.L. 13/2002 de 19/02, aplicável aos autos, bem como o artigo 5°, do D.L. 54/75 de 12/02, nas suas actualizações.

Neste particular, confirme-se, pressuponentemente, que, tal como no enunciado de suporte à proposição expressa em decisório nos Autos,

“ao registo das embarcações de recreio aplicam-se: (i) os artigos 19.2 e seguintes do RNR (“Regulamento da Náutica de Recreio”, aprovado pelo Decreto-Lei n. 124/2004, de 25 de Maio, que revogou o anterior Regulamento, que havia sido aprovado pelo Decreto-Lei n.° 329/95, de 9 de Dezembro); (ii) subsidiariamente, as normas do Decreto-Lei n. 42614, de 14 de Novembro de 1957, e do Decreto-Lei n. 42645, de 14 de Novembro de 1957, referentes ao registo de navios; e (iii) subsidiariamente, as disposições do registo predial;

no plano adjectivo, atento o disposto no artigo 21º, n. 1 do Decreto-Lei 1138/2003, de 8 de Março, a execução que corre nos autos principais rege-se pelo Código de Processo Civil na redacção anterior à que lhe foi dada por aquele diploma, uma vez que foi intentada em 08.04.2003”.

O problema que se coloca ao tribunal evidencia, efectivamente, como topoi obsidiantes, em termos vinculadores, de sucessão cronológica:

 1º - pedido de apreensão e penhora de uma embarcação de recreio registada em nome do executado;

 2º  - pedido de registo de aquisição por um terceiro estranho à execução;

 3º  - apreensão da embarcação;

 4º  - penhora da embarcação;

 5º  - pedido de registo da penhora (prevalece o direito do exequente ou o direito do adquirente?)

Elemento decorrente, inultrapassável, neste condicionalismo, é que, “tendo-se concluído que o registo da aquisição do terceiro foi — efectivamente — anterior ao registo da penhora pelo exequente, este último nunca poderia prevalecer sobre o anterior”.

Não relevando - por falta de previsão legal nesse sentido - a data do pedido de apreensão.

Continuam, por isso, a valer aqui as considerações formuladas em decisório, validadas, também, nos termos do art. 713º, nº5, do CPC, a saber:

4.35. Procurando, no CPC, um fundamento para a anterioridade do direito do cxequente, a única que se aproxima, sendo aplicável por identidade de razão, é a do artigo 849 n. 4 (“quando a penhora de veículos automóveis for efectuada por autoridade administrativa ou policial, vale como auto de penhora o próprio auto de apreensão.”), mas mesmo esta limita-se a equiparar a realização (e não o pedido) da apreensão à realização da penhora (considerando que a apreensão valeria como penhora mesmo sem aquela previsão, cfr. Amâncio Ferreira, Curso de Processo dc Erccução, Coimbra: Almedina, 1999, pág. 146). E não afasta, claro está, o disposto no artigo 5.°, n.° 1 do Código do Registo Predial nos termos do qual os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo. Tal regra aplica-se também aos efeitos da penhora de coisas móveis sujeitas a registo (cfr., expressarnente, o artigo 838.°, n.° 4 do CPC, bem como Amâncio Ferreira, ob. cit., pág. 147 e Lebre de Freitas, ob. cit., pág. 219).

Bem se compreende que assim seja. Caso contrário, o adquirente que confiou no registo e na segurança da publicidade dos actos ver-se-ia ultrapassado por direitos ocultos, com prejuízo sério - e não pretendido pelo legislador - da segurança do comércio jurídico.

4.36. Por fim, convém notar que, ainda que a aquisição fosse registada após a penhora bastar-lhe-ia ter sido celebrada antes dela (como o foi, no caso concreto) para prevalecer sobre o direito do exequente. Assim é, porque, aplicando-se subsidiariamente as regras do registo predial, entre elas contam-se as que definem o conceito de terceiros para efeitos de registo. Desde o acórdão uniformizador de jurisprudência n.° 3/99 (publicado no DR, Séria 1-A, de 10.07.1999) que resulta pacificado nos tribunais o entendimento ali fixado, ou seja, que terceiros para efeito do disposto o artigo 5.° do Código de Registo Predial são os adquirentes de boa fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos incompatíveis, sobre a mesma coisa, posição que acabou por ser consagrada no artigo 5.°, n.° 4 daquele diploma. Daí decorre a oponibilidade ao exequente que registou a penhora de urna aquisição anterior não registada (como se decidiu naquele acórdão uniformizador). Tratando-se de questão pacífica e lateral face ao problema dos autos, remete-se para o citado acórdão uniformizador, bem como para a inúmera jurisprudência (a título exemplificativo, o acórdão do TRL dc 17.06.2010, proferido no processo n. 4890/06.STCLRS-C.L1-6, na base de dados da DGSI) e abundante doutrina (com detalhe, Miguel Mesquita, Apreensão de bens em processo executivo e oposição de terceiro, 2ª edição, Coimbra: Almedina, 2001, págs. 219 e ss.) sobre tal assunto.

Ainda assim, convém notar que todas estas conclusões valem para o registo predial e, igualmente, para os registos de coisas móveis, aos quais, como se viu, se aplicam subsidiariamente as regras daquele (cfr., neste sentido, em hipóteses de penhoras de automóveis, os já citados acórdãos do TRL de 12.10.2005, proferido no processo nº 5632/2005-4, e de 17.06.2004, proferido no processo 5033/2004-2, do TRC de 07.09.2010, proferido no processo n.° 978/04.STBVNO-A.C1, e do TRP de 09.02.2009, proferido no processo n.° 0846187, todos na base dc dados da DGSI - não se vê com que fundamento se poderá defender uma solução diferente para as hipóteses envolvendo embarcações, face ao regime que se delineou).

4.37. A doutrina do citado acórdão uniformizador de jurisprudência n. 3/99 poderia, até, invocar-se no caso concreto por maioria de razão, com a seguinte formulação linear: se a aquisição anterior à penhora prevalece sobre esta, ainda que registada posteriormente, por maioria de razão prevalecerá a aquisição registada antes da penhora.

4.38. Compreende-se que o exequente tem, no caso concreto, razões para se lamentar, designadamente pela latência do pedido de apreensão, ao longo de muitos meses. Mas esse seu prejuízo não pode ser compensado pelo sacrifício do direito do adquirente, que tem cobertura legal e se baseou na verdade do registo. Se fundamento houver para responsabilidade pelos danos causados pela demora (do que não cumpre cuidar nesta sede), não será a embargante a responsável”.

Elemento de reforço deste entendimento é - em referência meramente exemplificativa - o decorrente de análise jurisprudencial a tal respeito contumaz, de que é exemplo, para o ilustrar o Ac. TRP de 9.02.2009, proferido no processo com o nº0846187 (DGSI), Relatora Fernanda Soares, onde se consigna:

“(…) Nos termos do disposto no art. 5°n°1, al.a) e al.h) do DL 54/75 de 24.12 estão sujeitos a registo o direito de propriedade e a penhora de veículos automóveis (mutatis mutandis, válido, também, para as embarcações como a dos Autos)

Por sua vez o art. 1° n°1 do citado DL (na redacção dada pelo DL 178- A/2005 de 20.10) prescreve que “O registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico”. Finalmente, dispõe o art. 29° do DL 54/75 que “São aplicáveis, com as necessárias adaptações, ao registo de automóveis as disposições relativas ao registo predial, mas apenas na medida indispensável ao suprimento das lacunas da regulamentação própria e compatível com a natureza de veículos automóveis e das disposições contidas neste diploma e no respectivo regulamento”.

(…)

Com efeito, os actos de disposição que o executado pratique após a penhora são ineficazes em relação ao credor/exequente, mas assim já não é se os actos de disposição ocorreram antes da realização da penhora e do seu registo, como é o caso dos autos.

E neste particular considera-se pertinente citar o acórdão unificador de Jurisprudência n°3/99, do STJ., publicado no DR n°159/99 1-A série de 10.7.99, por precisamente a situação nele tratada ser idêntica à dos presentes autos: (...) “Situação diferente é a resultante do confronto do direito real de garantia resultante da penhora registada quando o imóvel penhorado já havia sido alienado, mas sem o subsequente registo. Aqui, o direito real de propriedade, obtido por efeito próprio da celebração da competente escritura pública, confronta-se com um direito de crédito, embora sob a protecção de um direito real (somente de garantia). Nesta situação, mesmo que o credor esteja originariamente de boa fé, isto é, ignorante de que o bem já tinha saído da esfera jurídica do devedor, manter a viabilidade executiva, quando, por via de embargos de terceiro, se denuncia a veracidade da situação, seria colocar o Estado, por via do aparelho judicial, a, deliberadamente, ratificar algo que vai necessariamente desembocar numa situação intrinsecamente ilícita, que se aproxima de subsunção criminal, ao menos se for o próprio executado a indicar os bens à penhora, Assim, poderia servir-se a lex, mas não seguramente o jus.” (...) “São ineficazes, sem prejuízo das regras do registo, e em relação ao exequente, os actos de disposição ou de oneração dos bens penhorados. Dos bens penhorados, mas pertencentes ao devedor.”

E as considerações acabadas de referir assentam no pressuposto de que o registo predial (e também o registo automóvel) não tem natureza constitutiva. E o que decorre do disposto no art.7° do C.R. Predial. Assim, e em conclusão, podemos afirmar que tendo o embargante feito a prova a) da aquisição da viatura à embargada; b) da prática de actos correspondentes ao direito de propriedade; c) e que a aquisição e a prática dos actos ocorreram antes do registo da penhora, procedem os embargos, na medida em que o veículo em causa não era propriedade da executada na data em que o registo da sua penhora se efectivou”.

Consagração similar é aquela que se explicita no AC. TRL de 17.06. 2010, proferido no Processo nº4890.06.5TCLRS.C.L1.6 (DGSI), Relator Aguiar Pereira:

“(…) é sabido que os factos sujeitos a registo (e o facto jurídico de que decorre a aquisição do direito de propriedade é um deles) só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo, (artigo 5° nº 1 do Código de Registo Predial). Daqui decorre, coerentemente com a função publicista do registo, o facto de este ser condição de oponibilidade do direito perante terceiros com pretensões colidentes ou contraditórias sobre o bem sujeito a registo ou, como se escreve no acórdão uniformizador de jurisprudência do STJ n° 3 / 99, de 18 de Maio, a publicidade inerente ao registo predial “constitui condição de eficácia dos actos registáveis, relativamente a terceiros “. O cerne da questão centra-se, assim, na definição do que sejam terceiros para efeito de registo, isto é, para efeito da determinação daqueles a quem, nos termos do artigo 5° nº 1 do Código de Registo Predial, pode ser oposto o direito, já que, se a pessoa contra quem se invoca o direito, ainda que não registado anteriormente, não for de considerar como terceiro não há que considerar a regra da anterioridade do registo.

4. As duas posições divergentes na doutrina e na jurisprudência sobre o conceito de terceiro para este fim encontram-se suficientemente explanadas no acórdão uniformizador de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n° 3/99, pelo que não se afigura necessário reproduzi-las aqui, remetendo-se para a sua leitura.

Em sínteses dir-se-á apenas, transcrevendo as súmulas dos acórdãos uniformizadores de jurisprudência que sobre o assunto se debruçaram (além do atrás indicado publicado no DR 1 Séria A n° 159 de 10JUL99 o acórdão n° 15/97 de 20 de Maio publicado no DR 1 Série A de 4JUL97) que, para uns, adoptando um conceito mais amplo “Terceiro, para efeitos de registo predial, são todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado prédio, veriam esse direito arredado por facto jurídico anterior não registado ou registado posteriormente” enquanto para outros, adoptando um conceito restrito, “terceiros para efeito do disposto o artigo 5° do Código de Registo Predial, são os adquirentes de boa fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos incompatíveis, sobre a mesma coisa “. Visando pôr termo às divergências o Decreto — Lei 533/99, de 11 de Dezembro, introduziu então o n° 4 do artigo 5° do Código de Registo Predial com a seguinte redacção: “Terceiros, para efeitos de registo, são aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si “.

(…)

De acordo com a doutrina do Prof. Antunes Varela e também do Prof. Vaz Serra não haveria que distinguir as duas situações, sendo de considerar que num caso e noutro, o adquirente do direito de propriedade e o penhorante, titular do direito de crédito e da garantia real, são terceiros entre si. Tal entendimento foi rebatido no acórdão uniformizador de jurisprudência do STJ n° 3/99 de 18 de Maio, face às suas consequências práticas no “presente estado legislativo “, que adoptou doutrina mais consentânea com a realidade sobre essa matéria defendida nomeadamente pelo Prof. Orlando de Carvalho e Pires de Lima e Antunes Varela, estes no seu “Código Civil Anotado — Vol. II”.

E assim tem sido entendido pela jurisprudência que, como é exemplo o acórdão do STJ de 7 de Julho de 1999, relatado pelo EXma Conselheiro Ribeiro Coelho (consultável na página da DGSI), continuou a excluir “os casos em que o direito em conflito com o direito não registado deriva de diligência judicial, seja ela arresto, penhora ou hipoteca judicial “. A tutela conferida pelo artigo 5º n° 1 do Código de Registo Predial e a boa fé que lhe subjaz parece, na verdade, apenas ganhar sentido quando o autor comum intervém directamente na transmissão e gera no adquirente a convicção positiva da existência do direito na sua esfera jurídica.

7. Como quer que seja a objecção fundamental à consideração como terceiros entre si do comprador, que não registou a aquisição, e do credor do vendedor, penhorante do bem, é a diferente natureza dos direitos de cada um deles. A penhora em execução, enquanto direito real de garantia de um crédito, e o direito de propriedade não se definem como direitos conflituantes ou incompatíveis, mesmo que pudessem ser havidos como adquiridos do mesmo autor comum, na medida em que no primeiro caso a entidade penhorante, pelo acto da penhora não adquire do executado qualquer direito real de gozo que seja incompatível com o direito de propriedade do comprador que não registou o imóvel.

No acórdão do STJ de 16 de Outubro de 2008, relatado pelo Exm° Juiz Conselheiro Pires da Rosa (igualmente disponível em www.dgs.pt foi claramente estabelecida a diferença entre as situações: para haver nestes casos direitos conflituantes é necessário que haja aquisição no âmbito da venda judicial que se venha a realizar e não quando o que está em causa é apenas um direito de garantia.

No mesmo sentido se pronuncia o recente acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de Fevereiro de 2010 (in www.dataiuris.pt)

8. Aqui chegados podemos responder à questão colocada nas alegações da apelante: a penhora sobre um imóvel, ainda que registada, não é, em si mesma, conflituante nem incompatível com o direito de propriedade sobre o imóvel, não registado ou registado posteriormente, nem os respectivos titulares (do direito de propriedade e de garantia) são terceiros entre si nos termos e para efeito do disposto no artigo 5° do Código de Registo Predial. Não sendo os embargantes e a embargada terceiros entre si não é aplicável ao caso dos autos a regra constante do artigo 5° n° 1 do Código de Registo Predial, podendo os embargantes, titulares do direito de propriedade, ver reconhecido o seu direito pela embargante, independentemente da prioridade dos registos.

9. E, uma vez que o registo não confere direitos mas faz apenas presumir a respectiva titularidade, nos seus precisos termos, comprovado que está nos autos que, à data da penhora, o bem imóvel não pertencia aos executados I... e esposa mas que a respectiva propriedade havia sido transferida para os embargantes, haverá que concluir que bem andou a douta sentença recorrida ao julgar procedentes os embargos e o consequente levantamento da penhora efectuada(…). Improcedem as conclusões das alegações da apelante, devendo ser confirmada a douta decisão recorrida”.

Consequentemente, a sentença recorrida não violou os artigos 848° do Código de Processo Civil, com a redacção do D.L. 13/2002 de 19/02, bem como o artigo 5°, do D.L. 54/75 de 12/02, nas suas actualizações. Tanto assim que são, para o efeito, requisitos essenciais da atendibilidade dos embargos de terceiro que o embargante: 1.º não haja intervido no processo ou no acto jurídico de que emana a diligência judicial, nem represente quem foi condenado no processo ou quem no acto se obrigue; 2.° — tenha a posse sobre a coisa ou seja titular de qualquer direito sobre ela incompatível com a realização ou o âmbito da diligência. Nesta conformidade, os embargos de terceiro devem fundar-se numa posse anterior à diligência judicial respectiva. Consequentemente, o momento para aferir dessa posse é o da realização do acto judicial e não o da sua notificação ao executado ou do seu registo (Ac. RP, de 16.11.2004:JTRP00037378.dgsi.Net).

Vale, ainda, por dizer que as causas de nulidade de sentença ou de acórdão taxativamente enumeradas no art. 668.° do Cód. Proc. Civil não incluem no seu elenco o erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável. A lei só considera nulidade a falta absoluta de motivação ou seja a sua ausência completa. O que não acontece, circunstancialmente.

Nestes termos, e por mera constatação, verificando-se que na sentença recorrida constam os factos e as razões de direito em que o tribunal alicerçou a sua decisão e esta é consequência lógica daquela fundamentação, é evidente que aquela peça processual não está inquinada de qualquer nulidade (art. 668°, n.° 1, alíneas b), c) e e) do Cód. Proc. Civil) (Ac. RE, de 22.5.1997: Col. Jur., 1997, 3.°-265).

O que atribui resposta negativa às questões em II.

Podendo, assim, concluir-se, sumariando, que:

1.

 Para que ocorra nulidade prevista na al. c) do n.° 1 do art. 668.° do Cód. Proc. Civil é necessário que exista uma real contradição entre os fundamentos e a decisão apontando a fundamentação num sentido e a decisão num sentido diferente. O que se não verifica.

2.

 A sentença recorrida não violou os artigos 848° do Código de Processo Civil, com a redacção do D.L. 13/2002 de 19/02, bem como o artigo 5°, do D.L. 54/75 de 12/02, nas suas actualizações. A pretexto, também, que são requisitos essenciais da atendibilidade dos embargos de terceiro que o embargante: 1.º não haja intervido no processo ou no acto jurídico de que emana a diligência judicial, nem represente quem foi condenado no processo ou quem no acto se obrigue; 2.° — tenha a posse sobre a coisa ou seja titular de qualquer direito sobre ela incompatível com a realização ou o âmbito da diligência.

3.

 Nesta conformidade, os embargos de terceiro devem fundar-se numa posse anterior à diligência judicial respectiva. Consequentemente, o momento para aferir dessa posse é o da realização do acto judicial e não o da sua notificação ao executado ou do seu registo.

4.

Não são terceiros entre si, para efeito do disposto no artigo 5º do Código de Registo Predial, o titular do direito de propriedade adquirido em contrato de compra e venda celebrado com o executado e o beneficiário da penhora promovida em execução intentada contra o vendedor e incidente sobre o mesmo bem;

5.

Sendo a penhora um direito real de garantia de um crédito que não comporta a transferência de qualquer direito dominial e o direito de propriedade um direito real de gozo, a penhora e o direito de propriedade não são incompatíveis entre si por terem conteúdo distinto;

6.

O direito de propriedade adquirido em data anterior à da penhora, ainda que a aquisição não seja registada ou seja registada posteriormente, prevalece sobre a penhora.

7.

Por mera constatação, verificando-se que na sentença recorrida constam os factos e as razões de direito em que o tribunal alicerçou a sua decisão e esta é consequência lógica daquela fundamentação, é evidente que aquela peça processual não está inquinada de qualquer nulidade (art. 668°, n.° 1, alíneas b), c) e e) do Cód. Proc. Civil).

III. A Decisão:

Pelas razões expostas, nega-se provimento ao recurso interposto, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.

António Carvalho Martins ( Relator )

Carlos Moreira

João Moreira do Carmo