Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1908/10.0TBCTB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: PRESCRIÇÃO
CRÉDITO HOSPITALAR
SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE
CONTAGEM DOS PRAZOS
Data do Acordão: 09/16/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE CASTELO BRANCO – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 3º DO DECRETO-LEI Nº 218/99, DE 15 DE JUNHO.
Sumário: I – Os créditos resultantes da prestação de cuidados de saúde prestados por instituições e serviços integrados no Serviço Nacional de Saúde prescrevem no prazo de 3 anos, contados da data da cessação da prestação dos serviços que lhes deu origem (artº 3 do Decreto-Lei nº 218/99, de 15 de Junho).

II - Aquele prazo era, no direito imediatamente anterior, de 5 anos e contava-se da data em que cessou o tratamento (artº 9 do Decreto-Lei nº 194/92, de 8 de Setembro).

III - A conclusão de que o prazo da prescrição considerado se conta do termo do tratamento do lesado - e não separadamente de cada acto de cuidado de saúde singular – não é apenas um significado possível da lei, mas o que melhor corresponde à sua letra.

IV - Para que o lesante se constitua num dever de indemnizar, fundado numa culpa negligente, é necessária, além constatação da violação objectiva de um dever de cuidado, a imputação objectiva do dano à violação desse dever.

V - Se produção do dano é o resultado de uma concorrência efectiva de causas ou riscos ou perigos, imputáveis a sujeitos diferenciados, e essa concorrência foi essencial para a verificação do dano, este deve ser objetivamente imputado a ambos, com a consequente constituição de uma obrigação de indemnizar subjectivamente complexa.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

1. Relatório.

Companhia de Seguros A…, SA, impugna, por recurso ordinário de apelação, a sentença da Sra. Juíza de Círculo de Castelo Branco que, depois de concluir pela improcedência da excepção peremptória da prescrição, julgou parcialmente procedente a acção que contra si e contra a Companhia de Seguros B… foi proposta pelos Hospitais de …, E.P.E., que condenou a segunda e a primeira a pagar ao último a quantia total de € 20.618,38, acrescida de juros de mora, á taxa legal prevista para os juros civis, vencidos desde a citação no que diz respeito à quantia de € 20.076,24 e desde a notificação da ampliação do pedido, no que concerne à quantia de €542,00 e vincendos até integral pagamento, e a quantia total de € 11.102,21, acrescida de juros de mora, à taxa legal prevista para os juros civis, vencidos desde a citação no que diz respeito à quantia de € 10.810,29 e desde a notificação da ampliação do pedido no que concerne à quantia de € 291,92 e vincendos até integral pagamento, respectivamente.

A recorrente pede, no recurso, que lhe seja concedido inteiro provimento, em conformidade com as conclusões da sua alegação, que são as seguintes:

Na resposta, o apelado concluiu pela improcedência do recurso.

2. Factos provados.

O Tribunal de que provém o recurso julgou provados os factos seguintes:

3. Fundamentos.

3.1. Delimitação objectiva do âmbito do recurso.

O âmbito do recurso é, antes de mais, delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e, dentro do objecto do processo, com observância dos casos julgados formados na acção, pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (artº 635 nº 3 do CPC). Finalmente, o âmbito do recurso poder limitado pelo próprio recorrente (artº 635 nº 2 do CPC). Esta restrição pode ser realizada, expressa ou tacitamente, tanto no requerimento de interposição do recurso como nas conclusões (artº 635 nº 4 do CPC).

A acção tem por objecto o direito de indemnização, fundado numa responsabilidade delitual ou aquiliana, que a lei – com o intuito de facilitar o tratamento do lesado e excepcionando a regra de que só este tem o direito de exigir a indemnização[1] – reconhece aos estabelecimentos hospitalares que contribuíram para o tratamento ou assistência da vítima (artº 495 nº 2 do Código Civil e 1 nº 1 do Decreto-Lei nº 218/99, de 15 de Junho).

O direito de crédito alegado pela apelada emerge, realmente, da prestação de cuidados de saúde a M…, lesado corporalmente em acidente de viação em que intervierem, designadamente, as viaturas …-OC - conduzido por O… e cuja responsabilidade civil por danos causados a terceiros foi contratualmente transferida para a apelante – e o veículo automóvel …-QU – conduzido por J… e cuja responsabilidade civil por danos causados a terceiros foi transferida para co-demandada, B…, Companhia de Seguros SA.

A sentença apelada, depois de julgar improcedente a excepção peremptória da prescrição daquele direito, invocada por ambas as demandadas - com fundamento em que o respectivo prazo inicia o seu curso com a cessação da prestação dos cuidados de saúde – considerou adequado fixar a repartição de culpa em 65% para o condutor do veículo …-Qu e 35% para a condutora do veículo …-OC.

A recorrente discorda da decisão de improcedência da excepção peremptória da prescrição e – apesar de não dissentir da repartição da culpa operada pela decisão impugnada – acha que, em todo o caso, não se encontra constituída no dever de indemnizar por estar “em falta” a necessária causalidade, por não se saber que “intervenção” teve o assistido no acidente, no momento em que os veículos OC e QU colidiram.

Maneira que as questões concretas controversas que importa resolver são as de saber se:

a) O direito de crédito alegado pelo apelado foi ou não atingido pela prescrição, no tocante aos serviços prestados, no contexto do internamento hospitalar, a M…, no período compreendido entre 10 de Outubro e 6 de Dezembro de 2004;

b) Se o facto ilícito negligente que lesou a integridade física de M…, tratado pelo apelado, é objectivamente imputável à violação do dever de cuidado, designadamente do condutor do veículo automóvel …-OC.

A resolução deste problema vincula à determinação do terminus a quo do prazo de prescrição aplicável ao crédito alegado pelo apelado e ao exame do critério de imputação objectiva do resultado danoso à conduta violadora do dever objectivo de cuidado.

3.2. Determinação do seu terminus a quo do prazo de prescrição aplicável.

A prescrição – de que o Código Civil não dá uma noção – assenta num facto jurídico involuntário: o decurso do tempo. A ideia comum que lhe preside é a de uma situação de facto que se traduz na falta de exercício dum poder, numa inércia de alguém que, podendo ou porventura devendo actuar para a realização do direito, se abstém de o fazer[2].

Verificada a prescrição, o seu beneficiário tem a faculdade de, licitamente recusar a prestação a que estava adstrito (artº 304 nº 1 do Código Civil).

Ao contrário do que por vezes se supõe, a prescrição não tem, portanto, uma eficácia extintiva, antes se limita a paralisar o direito do credor, dado que apenas confere o direito potestativo de a invocar: se este direito não for exercido, a obrigação mantém-se civil, não se produzindo quaisquer efeitos; se a prescrição for invocada, a obrigação converter-se-á em obrigação natural – como tal inexigível, mas com solutio retendi[3].

Como é sabido, no tocante á repartição do ónus da prova, o nosso direito orienta-se pela denominada doutrina da construção da proposição jurídica ou teoria das normas, de harmonia com a qual, a repartição desse ónus decorre das relações das normas entre si (artº 342 do Código Civil). Deste critério podem retirar-se, no tocante à prescrição, a regra seguinte: é sobre o demandado que recai o encargo de provar a prescrição da obrigação, ou melhor, os seus elementos estruturais: a não exigência do crédito pelo exequente; o início e o decurso do lapso prescricional (artº 342 nº 2 do Código Civil).

Se o devedor conseguir provar estes dois elementos estruturais da prescrição – prescrição que sendo para este efeito um facto extintivo do direito de crédito de crédito alegado pelo credor, é ao mesmo tempo fonte do direito potestativo invocado pelo devedor de extinguir a relação obrigacional – passa a ser sobre o credor que recai o ónus de provar o facto extintivo – v.g., renúncia do devedor à prescrição – ou impeditivo – v.g. a suspensão ou a interrupção da prescrição - do direito potestativo invocado pelo devedor[4].

O início do prazo de prescrição é, evidentemente, um factor estruturante do próprio instituto.

De harmonia com a norma jurídica indiscutivelmente adequada para enquadrar o caso concreto, os créditos resultantes da prestação de cuidados de saúde prestados por instituições e serviços integrados no Serviço Nacional de Saúde prescrevem no prazo de 3 anos, contados da data da cessação da prestação dos serviços que lhes deu origem (artº 3 do Decreto-Lei nº 218/99, de 15 de Junho). Aquele prazo era, no direito imediatamente anterior, de 5 anos e contava-se da data em que cessou o tratamento (artº 9 do Decreto-Lei nº 194/92, de 8 de Setembro). Em face desta última norma era seguro que o prazo prescricional dos créditos considerados iniciava o seu curso a partir do último acto de assistência prestado ao lesado[5].

A comparação entre uma e outra norma mostra uma semelhança – a adopção, de harmonia com a regra geral, de um sistema objectivo – e duas diferenças: uma relativa ao prazo – que foi encurtado[6] - e outra referente ao enunciado textual referente ao seu terminus a quo: ao passo que antes se dizia que o prazo se contava da cessação do tratamento, declara-se agora que esse prazo se conta da cessação da prestação dos serviços.

O que se pergunta é, em face desta diferença de redacção, se há, realmente, razões para crer na modificação do regime quanto ao referido terminus a quo, que, em vez de situar na cessação do tratamento do lesado, passou a contar-se, isolada e separadamente, de cado acto singular de prestação de cuidados de saúde.

A jurisprudência orienta-se, maioritariamente, no sentido de quem com aquela modificação de redacção o legislador não operou, no tocante ao factor estruturante do início do prazo prescricional, uma alteração de regime[7].

Realmente- como se salienta no Acordão desta Relação de 3 de Março de 2009[8] - não há qualquer indício, tanto no texto da lei, como no preambulo do diploma, que inculque que o legislador tenha, no tocante à contagem do prazo dos créditos considerados, qualquer mudança de regime relativamente ao direito imediatamente anterior e, por isso, a solução que se tem por exacta é a de que se mantém a solução do direito anterior e, portanto, que o prazo prescricional se conta da data em que cessou o tratamento hospitalar.

Não há a mínima razão para sufragar doutrina diferente.

Na verdade, como é da experiência comum, a prestação de cuidados de saúde a vítimas de acidentes de viação – pela multiplicidade e gravidade das lesões com que são atingidas - não se esgota, muitas vezes, na prestação de um único ou singular cuidado de saúde, antes se desdobra na prestação de múltiplos cuidados de saúde durante arcos temporais mais ou menos longos. Ainda que cada um dos concretos cuidados tenha um custo unitário, o certo é que se inserem num processo ordenado por um único fundamento final: a recuperação clinicamente possível do lesado, no corpo ou na saúde. Maneira que tudo aponta para uma aglutinação dos diversos actos de prestação de cuidados de saúde – e do respectivo custo - que vincula a situar o terminus a quo do prazo prescricional do crédito correspondente, não no momento da prestação de cada acto terapêutico – mas no momento em que cessou, definitivamente, a terapia. Entendimento diverso, importaria a multiplicação das acções judiciais de exigência de satisfação dos créditos – no limite tantas quantas os actos singulares de tratamento - com custos acrescidos tanto para os demandantes como para os demandados e, bem assim, para a prestação do serviço de justiça.

E como muitas vezes o custo unitário de cada acto de tratamento é relativamente diminuto, por comparação com os custos decorrentes da reclamação contenciosa do seu pagamento, os prestadores dos cuidados de saúde integrados no SNS, seriam levados, por força a ponderação da relação entre o custo/benefício a renunciar à sua reclamação judicial – prejudicando uma fonte relevante de financiamento do sistema, já, por si – como é do conhecimento comum – altamente deficitário (Base XXXXIII, 2, b) da Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei nº 48/90, de 24 de Agosto).

É exacto – como a apelante salienta na sua alegação – que toda a interpretação da lei deve começar pela sua letra e pela tentativa de compreensão do seu significado: a letra da lei não deve ser entendida apenas como um elemento de interpretação a par de outros – mas antes como a base textual da interpretação.

O elemento literal da interpretação comporta, desde logo, uma dimensão semântica, i.e., referida ao significado das palavras da lei no contexto da sua estrutura. Nesta dimensão, a determinação do significado literal da lei depende das palavras que nela são utilizadas, pelo que não deve deixar-se de atribuir um significado a todas as expressões da lei.

A letra da lei tem um valor próprio que não pode ser ignorado e que impõe dois limites: um deles decorre das presunções de que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados; o outro decorre da proibição de consideração de um significado que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso (artº 9 nºs 2 e 3 do Código Civil). Assim, o significado que não encontre na letra da lei uma correspondência mínima está para além do seu significado possível, pelo que uma conclusão do intérprete ou do aplicador que não for compatível com a letra da lei, não pode ser qualificada como interpretação.

Considerados estes parâmetros, a conclusão de que o prazo da prescrição considerado se conta do termo do tratamento do lesado - e não separadamente de cada acto de cuidado de saúde singular – não é apenas um significado possível da lei – mas o que melhor corresponde à sua letra. Abstraindo do facto de lei usar o plural – créditos e serviços – o que por si inculca uma pluralidade de actos de cuidado de saúde, ainda que de custo unitário diferenciado, é sintomática a utilização - como sucedia na lei revogada - do substantivo cessação – que sugere indelevelmente uma actividade continuada ou repetida. O que não encontra uma tradução, ainda que imperfeita, no texto da lei é o significado que a recorrente lhe atribui de contagem do prazo de cada acto individualizado ou singular, já que para tal correspondência seria necessário que a lei utilizasse a expressão da prestação de cada serviço ou expressão equivalente. Um tal entendimento só pode confortar-se – e só se conforta – na simples variação do enunciado textual da nova lei relativamente à lei antiga, variação a que, pelas razoes, não é suficiente para convencer que corresponda a uma mudança – material – de regime.

E a interpretação que se sustenta é que melhor se harmoniza com a finalidade da lei, i.e., com o elemento teleológico. Tendo em consideração a origem do crédito e a sua finalidade – financiamento do sistema de saúde – e o contexto económico e político – a contagem do prazo prescricional a partir da cessação do tratamento do lesado, é a que melhor prossegue o fim visado pela lei: sem prejuízo, evidentemente da tutela da posição do devedor que a prescrição disponibiliza, assegurar, na maior extensão possível, a percepção de receitas, objectivo que seria séria e gravemente prejudicado por uma contagem do prazo pelo modo sustentado pela impugnante.

Em absoluto remate: o apontado prazo conta-se da cessação do tratamento do lesado.

A recorrente obtempera, porém, que o processo assistencial, médico e medicamentoso da vítima terminou em 6 de Dezembro de 2004, data em que alcançou a alta médica, o que, no seu ver, decorre do documento nº 2, incluso a fls. 11 – factura emitida em 17 de Dezembro de 2009, em nome da co-demandada, B… Portugal, SA.

Mas não. Aquela factura – como literalmente patenteia – documenta não a cessação da prestação de cuidados de saúde ou a alta clínica do lesado, mas a cessação do internamento, que decorreu entre 10 de Outubro e 6 de Dezembro de 2004. Como é bem de ver, cessação do internamento do lesado e cessação da prestação de cuidados de saúde são coisas bem diversas, dado que a prestação destes cuidados – como, aliás, decorre iniludivelmente da matéria de facto julgada provada – pode ter lugar em regime de consulta externa ou de ambulatório.

O instituto da prescrição visa, no essencial, tutelar o devedor, relevando-o da prova. À medida que o tempo passa o devedor terá maior dificuldade em fazer a prova do cumprimento. Na falta da prescrição, qualquer pessoa poderia ser demandada novamente a todo o tempo por débitos que foi pagando ao longo da vida. A não ser a prescrição, o devedor ficaria numa posição permanentemente fragilizada, dado que nunca estaria seguro de ter deixado de o ser. Complementarmente, a prescrição serve ainda objectivos de ordem geral, atinentes à certeza e segurança jurídicas[9].

Expirado o prazo da prescrição, o devedor, para que ela produza efeitos, tem o direito – potestativo – de a invocar, judicial ou extrajudicialmente, expressa ou tacitamente (artº 304 nº 2 do Código Civil). Invocada, pelo devedor, a prescrição produz este efeito fundamental: paralisação do direito do credor, visto que torna lícito ao devedor recusar o cumprimento, bem como opor-se, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito (artº 303 do Código Civil).

O prazo da prescrição está, porém, sujeito a interrupção.

A interrupção da prescrição resolve-se no acto ou no efeito de por termo ao processo prescricional. Verificada a interrupção, fica inutilizado todo o prazo entretanto já decorrido, podendo, quando muito, ocorrer o reinício do processo de prescrição (artº 326 nºs 1 e 2 do Código Civil).

Assim, a prescrição interrompe-se, por iniciativa do titular, pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima a intenção, expressa directa ou indirectamente, de exercer o direito, seja qual for o processo a que esse acto pertença, ainda que o tribunal seja incompetente (artº 323 nº 1 do Código Civil).

Quando a interrupção resulte de um acto desta natureza, o novo prazo não começa a correr antes do trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao processo (artº 327 nº 1 do Código Civil).

Objectivamente, o efeito interruptivo da prescrição restringe-se ao direito a que o acto interruptivo respeita. Relativamente aos limites subjectivos da interrupção, a regra é, igualmente, que a interrupção só produz efeitos em relação às pessoas entre as quais se dá[10].

A interrupção da prescrição promovida pelo titular do direito verifica-se, portanto, pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima a intenção de exercer o direito, intenção que tanto pode ser expressa como tácita, sendo indiferente a espécie do processo a que esse acto pertence e a competência do tribunal (artº 323 nº 1 do Código Civil).

O processo civil português padece de um mal comum a outros processos jurisdicionais em muitas ordens jurídicas: é lento e moroso.

A realização da citação ou a notificação pode, todavia, levar dias, semanas, meses ou mesmo anos.

Para essa lentidão processual podem encontrar-se causas endógenas e exógenas. Como causas endógenas pode apontar-se, justamente, o crónico atraso na citação dos réus ou executados e as dificuldades em racionalização do processo e de maximização da sua eficiência. Entre as causas de morosidade processual exteriores ao processo, contam-se, por exemplo, falta de resposta dos tribunais ao crescimento exponencial da litigiosidade – que, por seu turno, tem variadas causas sociais e económicas - a exiguidade dos meios disponíveis e a irracionalidade da distribuição territorial dos equipamentos judiciários.

Neste contexto, depois da instauração do processo, a citação ou a notificação do devedor escapa, por inteiro, ao controlo do credor. Em última extremidade este veria o prazo da prescrição completar-se por demoras e dilações que lhe são, por inteiro, estranhas.

Para resolver este problema, a lei declara terminantemente que se a citação ou notificação se não fizer dentro do prazo de cinco dias depois de ser requerida por causa não imputável ao credor, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias (artº 323 nº 2 do Código Civil).

Para que esta causa de interrupção da prescrição opere é, portanto, necessária a verificação de três requisitos: que o prazo prescricional ainda esteja em curso nos cinco dias posteriores à proposição da acção; que a citação se não tenha realizado nesse prazo de cinco dias; que o retardamento da citação não seja imputável ao autor.

Uma jurisprudência estável – tanto do Supremo como das Relações – salienta, de um aspecto, que a imputabilidade da dilação na citação exige a demonstração de um nexo objectivo de causalidade entre a conduta do requerente e o retardamento da realização daquele acto de citação, i.e., a violação objectiva pelo requerente da lei do processo até à verificação da citação, e de outro, que aquela dilação não é imputável ao requerente, quando a demora na execução do acto de citação fique a dever-se a razões de índole processual, de organização judiciária, à violação, pelo tribunal ou pelos funcionários, de um dever de diligência, à anormal acumulação de serviço ou a dolo do citando[11].

Assim, no caso de demora na realização do acto de citação resultar de desconcerto entre lei substantiva e a lei de processo, a desarmonia deve desfazer-se dando prevalência às normas substantivas[12] - conclusão que, aliás, corresponde ao elemento que opera a relacionação funcional e teleológica, destes dois ramos do direito: o processo tem por fim a afirmação – realização – do direito substantivo que corresponde ao objecto do processo, e não o inverso.

Este pecúlio de considerações é suficiente para resolver o fundamento da impugnação, relativo à excepção peremptória da prescrição – e para o julgar improcedente.

Desde que, pelas razões apontadas, o terminus a quo do prazo prescricional se deve localizar na cessação do tratamento da vítima – tem-se por inteiramente exacta a conclusão tirada, relativamente a este objecto, pela sentença impugnada: a de aquele prazo ainda nem sequer iniciou o seu curso – no caso de ainda não se mostrar concluído o tratamento do lesado – ou, na hipótese mais benigna, começou esse curso em 21 de Janeiro de 2014 – dada da última prestação de serviços de saúde pelo apelante ao lesado – e, portanto, está ainda muito longe de se ter completado.

Resta, por isso, o fundamento da impugnação restante, representado pela ausência de nexo ou relação de causalidade entre o facto ilícito e a lesão corporal de M… e entre esta ofensa e os cuidados de saúde que lhe foram prestados pelo apelado.

3.3. Critério de imputação objectiva.

Como se notou já, a sentença impugnada – utilizando como critérios individualizadores do cuidado objectivamente devido as normas de comportamento contidas no Código da Estrada - foi peremptória em assacar o facto lesivo determinante da prestação dos cuidados de saúde a uma culpa negligente concorrente, tanto da condutora do veículo automóvel 69-95-OC como do condutor da viatura 97-68-QU, que repartiu na proporção de 35% para a primeira de 65% para o segundo.

Todavia, uma coisa é a constatação da violação objectiva de um dever de cuidado, outra, bem diferente, é a imputação objectiva do dano à violação desse dever[13]. Para que o lesante se constitua no dever de reparar o dano, não é suficiente comprovação do elemento caracterizador do ilícito negligente, que o especializa e que lhe confere autonomia - a violação do cuidado objectivamente devido no caso concreto: é ainda necessário que aquele resultado possa imputar-se objectivamente à conduta.

De harmonia com o princípio que a responsabilidade civil só intervém relativamente a comportamentos humanos e se exige, para a constituição do dever de indemnizar, um resultado, há sempre que verificar não apenas se esse resultado se produziu, como também se ele pode ser atribuído – imputado - à conduta.

É a exigência de um relacionamento ou de uma conexão dessa conduta com o evento a que se procura dar resposta com a causalidade.

Uma orientação que tem merecido um apoio generalizado é a da causalidade adequada ou da causalidade jurídica sob a forma de adequação, que, simplificadamente, pode formular-se assim: um facto é causa de um resultado, sempre que, em termos de normalidade social, seja adequado a produzir esse resultado (artº 563 do Código Civil)[14].

A finalidade evidente da teoria da causalidade adequada é a limitar a imputação do resultado às condutas das quais deriva um perigo idóneo de produção do resultado. Há, porém, domínios em que as soluções que resultam da aplicação da teoria da causa adequada não são inteiramente satisfatórias, o que sucede, sobretudo, em actividades que, comportando, em si mesmas, riscos consideráveis são, todavia, legalmente permitidas. Está nessas condições, por exemplo, a circulação rodoviária em que, na generalidade dos casos, a conduta se revela adequada à produção do resultado, sem que, sob pena de paralisação ou de retrocesso da vida económica e social, seja possível proibi-la.

A teoria da adequação depara-se, pois, com várias dificuldades. Uma delas resulta do facto de o critério de adequação dever ser geral e abstracto, enquanto, depois de o resultado verificado, dificilmente se poder negar a sua previsibilidade e normalidade. O que conduz à conclusão de que o nexo de adequação se tem de aferir segundo um juízo ex ante e não ex post, portanto, segundo um juízo de prognose póstuma: com este oximoro quer-se significar que o juiz deve deslocar-se mentalmente para o passado, para o momento em que a conduta foi praticada e ponderar, enquanto observador objectivo, se, dadas as regras gerais de experiência e o normal acontecer dos factos – o id quod plerumque accidit – a acção praticada teria como consequência a produção do evento[15]. Caso conclua que a produção do evento era imprevisível ou que, sendo previsível, era improvável ou de verificação rara, a imputação objectiva não deverá ter lugar.

A adequação deve, naturalmente, referir-se a todo o processo causal e não só ao resultado, sob pena de um alargamento excessivo da imputação. É neste contexto que se situam os problemas da intervenção de terceiros ou da interrupção do nexo de causalidade, que têm em vista aqueles casos em que o resultado se verifica em consequência de uma co-actuação do lesado ou de terceiro ou da intervenção de qualquer outro evento.

O critério da causalidade resolve o problema por recurso ao concurso real de causas adequadas, simultâneas ou subsequentes, considerando qualquer dos lesantes responsável pela reparação de todo o dano[16].   Esta conclusão impõe-se ao menos nos casos em que a causa operante interrompeu a série causal hipotética e em que a causa operante só provocou o dano porque os termos da causalidade hipotética já decorridos favorecem a sua eficácia causal, de tal modo que o dano, tal como concretamente se verificou, não se teria verificado se não fossem esses termos. Quando isso suceda, estamos perante um caso de concorrência efectiva de causas – e não de um caso de causalidade hipotética e, portanto, não se coloca o problema da relevância negativa da causa hipotética.

Todavia, estes casos não podem, em rigor, assumir relevo de um ponto de vista de pura causalidade, devendo valer para eles a solução disponibilizada pelo critério da criação ou, em caso de concurso de riscos, da potenciação do risco permitido.

Na verdade, em face das dificuldades do critério da adequação não são de estranhar as propostas da sua correcção, por recurso aos conceitos de risco ou perigo permitido e do fim de protecção da norma.

De harmonia com a teoria do risco permitido, a imputação do resultado à conduta do agente só ocorre quando o comportamento tenha criado, ou aumentado ou incrementado um risco proibido, desde que esse risco se tenha materializado no resultado danoso[17]. Sempre que o agente tenha criado um risco não permitido ou aumentado o risco já existente e esse risco – e não outro - conduza à produção do resultado concreto, este deve ser-lhe objectivamente imputado.

A produção do dano pode, realmente, ser o resultado de uma concorrência efectiva de causas ou riscos, o que sucederá sempre que o prejuízo tenha resultado de uma variedade de eventualidades, tenha sido causado por dois ou mais factos[18]: se dois ou mais eventos concorreram para a produção do dano, e essa concorrência foi essencial para a sua verificação, o caso é de concorrência necessária[19] ou de causalidade concorrente ou conjunta, conforme a terminologia que se tiver por preferível.

      Se um e outro dos factos concorrentes forem imputáveis, por exemplo, a dois sujeitos, não oferece dúvida o surgimento de uma obrigação de indemnizar subjectivamente complexa, a cargo dos dois agentes (artºs 490 e 497 do Código Civil). Sendo o dano assacável, em parte, ao agente e, em parte, por exemplo, a caso fortuito ou de força maior, sendo irrecusável a vinculação do agente ao dever de indemnizar, é também inegável que a obrigação de indemnização que deve ser posta a cargo desse agente, se deve limitar ao dano que seja objectivamente imputável à sua conduta.

A obrigação de indemnização tem por escopo fundamental a remoção do dano imputado e, portanto, a medida da indemnização é, por regra, simplesmente, a do dano efectivamente imputado ao lesante (artº 562 do Código Civil). Questões como o nexo de causalidade transcendem, por isso, a problemática da determinação da indemnização.

Todavia, o Código Civil actual rompeu com o princípio da não influência da culpa sobre o quantum respondeatur, permitindo ao juiz, nos casos em que a imputação delitual opere por ilícito negligente, fixar a indemnização, equitativamente, em montante inferior ao dano, desde que o justifiquem não só o grau de culpa do lesante, como também a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (artº 494 do Código Civil).

E o concurso de riscos ou perigos - ou, se se preferir, a contribuição causal de facto não imputável ao agente para a verificação do dano - é certamente, uma das demais circunstâncias do caso a ponderar pelo tribunal.

Todavia, a fixação da indemnização em valor inferior ao do dano justifica-se sempre que os danos sejam provocados por terceiro ou por qualquer outro facto diverso daquele que é objectivamente imputável ao lesante – e na medida em que o sejam. Verdadeiramente, não há aqui uma limitação da indemnização – mas apenas uma delimitação dos danos que ao lesante devem ser imputados, pelo que a redução prescinde da comprovação, mesmo no caso de facto imputável a um terceiro, dos pressupostos da imputação delitual, relativamente a este.

Na jurisprudência nota-se, nos casos de conculpabilidade, o recurso tendencial à doutrina da causa adequada, numa metódica que parte frequentemente do tratamento coincidente das questões da culpa e do nexo causal. Verifica-se, na verdade, uma preocupação maior pelos problemas ilicitude e da culpa, secundarizando o aspecto central e decisivo da adequação entre as condutas e o dano, o que tem, decerto, a ver com a constatação de que uma resposta positiva à questão da culpa facilitará a formulação do juízo causal[20]. Nem outra foi a atitude argumentativa da sentença impugnada.

Seja como for, a recorrente diz, na sua alegação, que ignora se as lesões constatadas na pessoa do assistido M…, que terão motivado a alegada prestação de assistência cujo custo ora vem peticionado, foram causadas pelo embate dos dois referidos veículos, o OC e QU. Mas a ignorância declarada pela apelante não é fundada.

A recorrente abriu a sua alegação com a declaração, a que se mostrou fiel, de que não impugna a matéria de facto. Ora, a leitura dos factos materiais apurados na instância recorrida, mostra, sem sombra de dúvida, que a lesão corporal suportada pelo beneficiário dos cuidados de saúde prestados pelo apelado são objectivamente imputáveis – também – à violação, pelo condutor do veículo …-OC, do dever objectivo de cuidado.

 Realmente, a matéria de facto apurada diz-nos terminantemente que em consequência do embate entre o veículo …-QU e o veículo …-OC resultaram lesões para o assistido M… que lhe determinaram a urgência de 10 de Outubro de 2004, a que se seguiu internamento de 10 de Outubro de 2004 a 6 de Dezembro de 2004, que importou na quantia de € 30.063,93.

Identicamente decorre dos factos materiais definitivamente adquiridos para o processo, que todos os cuidados de saúde prestados pelo apelante ocorreram em consequência do acidente de viação em causa nos autos e, em consequência, do embate ocorrido no dia 9 de Outubro de 2004.

Do estrito ponto de vista da causalidade, já sabemos que s imputação objectiva se não basta com a comprovação de que o lesante, com a sua conduta, produziu ou potenciou um risco não permitido de verificação do facto danoso: é preciso ainda determinar se foi esse risco que se materializou ou concretizou naquele resultado[21].

No caso, porém, é patente que um dos riscos que se concretizou no dano – lesão corporal do utente dos cuidados de saúde – é também o que foi criado pelo condutor do veículo …-OC com o embate na traseira do lado direito do veículo que o precedia – o veículo …-VN – radicado na inadequação da velocidade a que seguia, do qual resultou a sua imobilização da faixa de rodagem e a obstrução, com as luzes desligadas, desta faixa, criando o perigo exponencial – que se concretizou – de ser embatido por outros veículos automóveis que circulavam na mesma via. E foi também esse risco que se materializou na lesão corporal do assistido. Tanto a conduta da condutora do veículo automóvel …-OC como o comportamento do condutor da viatura …-QU serviram para aumentar ou incrementar o perigo de verificação do resultado danoso, e ambos os perigos – criado pela primeira e potenciado ou aumentado pelo segundo – acabaram por determinar efectivamente aquele resultado.

E à mesma conclusão se chega por referência à regra geral da teoria da adequação, dado que, de harmonia com ela, a actuação do lesado ou de terceiro que se integre no processo causal desencadeado pelo lesante só exclui a imputação, se essa actuação aparecer como imprevisível ou improvável. Ora, segundo as máximas de experiência e a normalidade do acontecer – e, portanto, segundo o que é em geral previsível – é provável ou previsível que um veículo que fica imobilizado na faixa de rodagem de uma autoestrada seja embatido por outros veículos utilizadores dessa via. Assim, em face da observação da conduta da condutora do veículo …-OC, no momento em que foi praticada, a ocorrência do segundo embate – que vitimizou M… - não era imprevisível ou, ao menos não improvável, e, portanto, a imputação deverá ter lugar.

Portanto, seja qual for, em definitivo, o modelo explicativo que, relativamente à imputação objectiva se deva ter por exacto, a verdade é que, na espécie do recurso, quer o dano corporal suportado por M… quer as despesas suportadas pelo apelado com a prestação a este de cuidados de saúde são objectivamente imputáveis também – à conduta da condutora do veículo automóvel …-OC.

A recorrente não tem, pois, motivo sério para duvidar da conexão – da causalidade – ou da relação de risco, designadamente, entre a violação do cuidado objectivamente devido pela condutora da viatura …-OC - mais exactamente, entre a violação das exigências de comportamento tipicamente específicas cujo cumprimento o direito requeria, na situação concreta, para evitar a produção de um resultado danoso – e este mesmo resultado.

E ponderadas, complexivamente, todas as circunstâncias relevantes para a produção efectiva do resultado danoso, não se vê motivo para mensurar a contribuição – causal ou de criação ou potenciação do risco ou perigo – em proporção diversa daquela que foi achada pela sentença apelada, para a culpa.

Maneira que a conclusão a tirar é só esta: a da falta de bondade do recurso.

Síntese conclusiva:

a) Os créditos resultantes da prestação de cuidados de saúde prestados por instituições e serviços integrados no Serviço Nacional de Saúde prescrevem no prazo de 3 anos, contado da data em que cessou o tratamento do lesado;

b) Para que o lesante se constitua num dever de indemnizar, fundado numa culpa negligente é necessária, além constatação da violação objectiva de um dever de cuidado, a imputação objectiva do dano à violação desse dever;

c) Se produção do dano é o resultado de uma concorrência efectiva de causas ou riscos ou perigos, imputáveis a sujeitos diferenciados, e essa concorrência foi essencial para a verificação do dano, este deve ser objetivamente imputado a ambos, com a consequente constituição de uma obrigação de indemnizar subjectivamente complexa.

A recorrente sucumbe no recurso. Deverá, por essa razão, satisfazer as custas dele (artº 527 nºs 1 e 2 do CPC).

4. Decisão.

      Pelos fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso.

      Custas pela recorrente

                                                   

                                               Henrique Antunes (Relator)

                                               Artur Dias

                                               Jaime Ferreira

***


[1] Antunes Varela, RLJ, Ano 103, págs. 250 e 251.
[2] José Dias Marques, Prescrição Extintiva, Coimbra, 1953, pág. 4.
[3] António Menezes Cordeiro, Da prescrição do pagamento dos denominados serviços públicos essenciais, O Direito, Ano 133º, Tomo IV (Outubro -Dezembro), 2001, págs. 803 a 805 e Tratado de Direito Civil Português, I, Tomo IV, Almedina, Coimbra, 2007 (reimpressão), pág. 172. Contra, sustentando que a prescrição não converte a obrigação civil numa obrigação natural, Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2007, pág. 381.
[4] Antunes Varela/J. Miguel Bezerra/ Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 126, Ana Filipa Morais Antunes, Prescrição e Caducidade, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, pág. 126, e Acs. da RP de 10.10.95, CJ, XX, IV, pág. 211 e do STJ de 01.10.98, www.dgsi.pt.
[5] Ac. da RP de 09.03.95, www.dgsi.pt.
[6] Encurtamento que parece ter tido por finalidade obviar às dúvidas sobre a ilegitimidade constitucional, por violação do princípio da igualdade, que, todavia, a jurisprudencial constitucional desatendeu: Ac. do TC nº 241/97, de 12 de Março, DR, II, de 15 de Maio de 1997.
[7] Acs. do STJ de 13.04.10, da RC de 03.03.09 e de 06.10.09, da RL de 05.02.09, 14.09.10 e 16.05.12, www.dgsi.pt; em sentido contrário, Ac. da RE de 24.07.07, CJ, III, pág. 246, de harmonia com o qual, o artigo 3,º do Decreto-Lei nº 218/99, de 15 de Junho, que revogou o Decreto-Lei nº 194/92, de 8 de Setembro, alterou o regime que vigorava em matéria de prescrição de dívidas hospitalares, remetendo o início da contagem do prazo prescricional para o momento de cada prestação de serviço individualmente considerada, em que se consubstancia o acto médico e não - como acontecia antes – desde a data que terminava o tratamento ou assistência, no âmbito do processo continuado que lhes dava origem.
[8] Relatado pelo Sr. Juiz Desembargador Artur Dias que, neste recurso, exerce as funções de 2º Juiz Adjunto.
[9] António Menezes Cordeiro, Da Prescrição do Pagamento dos Denominados Serviços Públicos Essenciais, O Direito, Ano 133º, 2001, IV (Outubro -Dezembro), págs. 788 e 789. Não parece, assim, que a prescrição tenha por fundamento o interesse do credor, incitando-o a exigir o cumprimento das obrigações, e sancionando-o pela negligência na actuação do seu crédito como sustenta, por exemplo, Manuel de Andrade – Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, Reimpressão, Coimbra, 1992, págs. 445 e 446. Como nota Menezes Cordeiro – loc. cit. - o interesse do credor é, sempre, o dispor do máximo de pretensões, podendo ordenar no tempo, de harmonia, com as suas conveniências, o exercício dos seus direitos.
[10] Ac. do STJ de 17.11.95, www.dgsi.pt.
[11] Acs. do STJ de 29.04.03, www.dgsi.pt., de 10.04.96, BMJ nº 456, pág. 376, 24.03.99, AD,, Ano 38, nº 456, pág. 1126, 08.07.80, BMJ nº 299, pág. 294, 27.07.82, BMJ nº 319, pág. 265, 05.05.87, BMJ nº 367, pág. 507 e 04.12.92, BMJ nº 421,, pág. 422, da RP 15.03.00, 16.11.00, 13.11.00, 17.05.01, www.dgsi.pt, da RE de 14.10.99, BMJ nº 487, pág. 257 e da RC de 13.06.06, www.dgsi.pt.
[12] Acs. da RP de 11.05.01 e da RL de 14.09.10 e de 13.01.09 e da RC de 13.06.06, www.dgsi.pt.
[13] A fixação da conexão entre a conduta ou condutas e o evento danoso é uma questão de facto subtraída, portanto, à competência decisória do Supremo Tribunal de Justiça, embora este, muitas vezes, não resista a considerar a aplicação do artº 563 do Código Civil como questão jurídica, com o argumento, pouco consistente, de que é necessário indagar a causa jurídica de certo evento. Cfr. Antunes Varela RLJ, Ano 122, pág. 120.
[14] Cfr., v.g., Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, I, 5ª ed. Almedina, Coimbra, 1986, pág. 743 e ss., Pereira Coelho, o Nexo de Causalidade na Responsabilidade Civil, BGD, Suplemento nº IX, Coimbra, 1976, pág. 201 e ss. e Miguel Teixeira de Sousa, Da Responsabilidade Civil por Factos Lícito, Lisboa, 1977, pág. 124 e ss. Menezes Cordeiro - Direito das Obrigações, cit., págs. 338 e 338 – sugere a integração da causalidade na própria conduta e, consequentemente a sua sujeição ao juízo de ilicitude: nesta perspectiva, a averiguação da causalidade adequada limitar-se-ia à indagação da licitude de certo comportamento face a um concreto dano e à identificação da adequação com a verificação do fim visado pelo agente.
[15] Ac. do STJ de 13.01.09, www.dgsi.pt.
[16] Pereira Coelho, O Problema da Relevância da Causa Virtual na Responsabilidade Civil, Almedina, Coimbra, págs. 31 a 34 e Ac. do STJ de 13.01.09, www.dgsi.pt.
[17] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Questões Fundamentais, A Doutrina Geral do Crime, Coimbra Editora, 2004, págs. 313 a 321.
[18] Francisco Manuel Pereira Coelho, O Problema a Causa Virtual na Responsabilidade Civil, Almedina, Coimbra, 1998, pág. 24.
[19] António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, II, Direito das Obrigações, Tomo III, Almedina, Coimbra, 2010, pág. 739.
[20] José Carlos Brandão Proença, A Conduta do Lesado e Critério de Imputação do Dano Extracontratual, Almedina, Coimbra, 1997, págs. 457 a 459
[21] Assim, v.g. Ac. do STJ de 25.11.10, www.dgsi.pt.