Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
886/23.0YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CRISTINA NEVES
Descritores: PROCEDIMENTO DE INJUNÇÃO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
FALTA DE CAUSA DE PEDIR
SANAÇÃO DA NULIDADE
INEPTIDÃO DO REQUERIMENTO INICIAL
Data do Acordão: 12/13/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 186.º, N.º 3, 552.º, N.º 1, ALÍNEA D), 574.º, N.º 2, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, 10.º, ALÍNEA D), 13.º, N.º 1, ALÍNEA A), E 14.º-A DO REGIME ANEXO AO DLEI N.º 269/98, DE 01/09
Sumário: I – O procedimento de injunção, apesar da sua natureza simplificada, não dispensa o ónus de alegação dos factos essenciais que integram a causa de pedir, ainda que de forma sucinta (cfr. artº 10, d), do D.L. 269/98 de 01/09), sob pena de ineptidão do r.i.
II – O critério para aferir a falta de causa de pedir, assenta num juízo de prognose acerca da delimitação do caso julgado, pressupondo uma sentença favorável ao autor: se for possível determinar concretamente qual a situação jurídica que foi objecto de apreciação jurisdicional, sem correr riscos de repetição da causa, não se verificará a falta de causa de pedir.

III – Interposto procedimento de injunção, indicando como causa a celebração de um “contrato de fornecimento de bens ou serviços”, cabe ao requerente o ónus de indicar o concreto acordo celebrado com a R., os bens ou serviços fornecidos, as quantidades, preço acordado e a entrega do bem ou a prestação do serviço.

IV – Só se deve considerar sanada a nulidade por falta de causa de pedir, ao abrigo do disposto no artº 186, nº 3 do C.P.C., naqueles casos em que, apesar de omissos factos essenciais, ainda assim o R. percebeu o sentido e teor dos alegados e deduziu impugnação motivada destes factos, mostrando-se assim elencados na petição inicial e na contestação todos os factos necessários à definição da relação material controvertida e à decisão do pedido formulado no processo, permitindo a formação de caso julgado material.

V – Deve considerar-se inepto, por falta de causa de pedir, o requerimento inicial no qual se descriminam tão só as facturas emitidas pelas A., respectivo valor e juros, desacompanhado de qualquer outro facto do qual se retire o efectivo acordo celebrado com a R. e os bens ou serviços que foram fornecidos, alegando apenas o R., em sede de oposição que teve transacções comerciais com a A. para fornecimento de rações a animais, cessadas há oito anos.


(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral: Artº SUMÁRIO ELABORADO PELO RELATOR (artº 663 nº7 do C.P.C.)

(…).


***

Proc. Nº 886/23.0YIPRT .C1-Apelação

Tribunal Recorrido: Tribunal Judicial da Comarca de Leiria-J. Central Cível de Leiria - ...

Recorrente: C..., LDA.

Recorrida: AA

Juiz Desembargador Relator: Cristina Neves

Juízes Desembargadores Adjuntos: Pires Robalo

                                         Luís Manuel Carvalho Ricardo


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Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de COIMBRA

RELATÓRIO


C..., LDA. interpôs procedimento de injunção contra AA, peticionando o pagamento da quantia de € 296 712,45, indicando tratar-se de um “contrato de fornecimento de bens ou serviços”, como data do contrato, 08-10-2012, o período a que se refere, 07-11-2012 a 22-12-2022 e no que se reporta à exposição dos factos a que respeita a pretensão, a indicação das facturas em dívida e respectivos juros.

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Notificada, veio a R. invocar a ineptidão da petição inicial por falta de causa de pedir.

*

Distribuídos os autos como acção declarativa sob a forma comum, foi proferido despacho de adequação formal pelo tribunal recorrido, convidando a A. a pronunciar-se quanto à invocada ineptidão.

Em resposta a esta arguição de nulidade, veio a A. alegar essencialmente que não se verifica a apontada nulidade, uma vez que no requerimento injuntivo indica de forma sucinta as facturas em dívida e o tipo de contrato celebrado, não lhe sendo exigível que elencasse outros factos tendo em conta a natureza simplificada e restritiva do procedimento de injunção, tendo em conta que o “Requerimento de Injunção tem um limite de caracteres de escrita, o que inviabiliza a alegação de todos os factos referentes à relação entre as Partes, Autora e Ré.” e que ao “indicar e fazer menção às referidas faturas, a Autora ficou sem mais caracteres no Requerimento de Injunção.”

Por último, alega que ainda que assim não fosse, a Ré interpretou convenientemente o alegado no requerimento de injunção.


*

Após, foi proferida decisão que julgou “verificada a invocada exceção dilatória da nulidade de todo o processo por ineptidão da petição inicial, por falta de causa de pedir, com consequente absolvição da Ré da instância.

***


Não se conformando com essa decisão, veio a A. dela interpor recurso, concluindo da seguinte forma:

“1. O Tribunal a quo entendeu como verificada a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial, por alegada falta de causa de pedir, tendo absolvido a Ré da instância, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 186.º, n.º 1 e 2, alínea a), 278.º, n.º 1, alínea b), 576.º, n.º 1 e 2, 577.º, alínea b), 578.º, e 573.º, todos do Código de Processo Civil.

2. O presente recurso visa discutir a decisão proferida nos autos, visando a reapreciação da mesma, requerendo-se a respetiva revogação da sentença ora recorrida e a sua substituição por decisão que julgue improcedente a exceção dilatória de ineptidão do Requerimento Inicial de Injunção.

3. A Autora, no Requerimento de Injunção apresentado, discriminou as faturas que fundamentam a relação comercial entre a Autora e a Ré.

4. A Ré, na oposição à injunção apresentada, além de ter alegado a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial, veio apresentar, sem conceder, a respetiva defesa por impugnação.

5. A Ré, na defesa por impugnação apresentada veio reconhecer saber do que se tratam as faturas identificadas pela Autora, nomeadamente, no artigo 10.º, 11.º e 12.º da sua oposição à injunção.

6. A Ré veio reconhecer e identificar a própria causa de pedir dos autos- o fornecimento da ração para coelhos- conforme se poderá ler do artigo 11.º da sua oposição à injunção.

7. Foi a própria Ré que solicitou os serviços e o fornecimento de bens à Autora, razão pela qual bem sabe do que se trata.

8. A Ré além de identificar a origem da relação contratual, identifica igualmente o período temporal da mesma, referindo, na sua oposição à injunção, que as transações já cessaram há cerca de 8 (oito) anos.

9. A Ré interpretou convenientemente o Requerimento de Injunção tendo, inclusive, apresentado a respetiva defesa ao mesmo.

10. Não poderá ser procedente a exceção de ineptidão d petição inicial por alegada falta de causa de pedir quando a própria Ré identifica, sem dúvidas ou hesitações, a própria da causa de pedir.

11. Não deverá o processo culminar com nulidade e com a consequente absolvição da Ré da instância.

12. A causa de pedir da presente ação é referente ao contrato de fornecimento de ração para coelhos e tudo o demais associado à atividade da própria Ré àquela data.

13. A Ré, na data da relação contratual com a Autora, possuía contabilidade organizada- cfr

alegado pela própria Autora no requerimento apresentado na data de 31 de maio de 2023, com a referência citius n.º 45724724, e documento n.º 1 junto com aquele.

14. A Ré detinha uma empresa em nome individual.

15. A Ré sabe e tem como saber a proveniência das faturas descritas pela Autora, uma vez que tem aquelas arquivadas na sua contabilidade.

16. A Ré, com a consulta das faturas emitidas e descritas no Requerimento de Injunção, consegue identificar a relação contratual que a subjaz, aliás, conforme o fez.

17. Deveria ter tido aplicação no caso o disposto no artigo 186.º, n.º 3 do Código de processo Civil.

18. Quando o Réu vem alegar ineptidão da petição inicial mas se verifica que interpretou convenientemente a petição inicial, não deverá tal exceção ser procedente.

19. O Tribunal a quo decidiu mal, salvo o devido respeito.

20. O Tribunal a quo tinha nos autos elementos suficientes para a concreta aplicação do artigo 186.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, conforme dita o princípio da economia processual e do aproveitamento dos autos.

21. As partes compreenderam o que estava em causa na presente ação, pelo que deverá o processo prosseguir os seus trâmites.

22. Deverá este Douto Tribunal revogar a sentença proferida pelo Tribunal a quo, substituindo a mesma por decisão que julgue totalmente improcedente a exceção da ineptidão do requerimento de injunção.

23. Mesmo que não se entenda pela aplicação do artigo 186.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, o que não se concede mas se acautela por mero dever de patrocínio, sempre se deverá referir que no presente caso não se verificar qualquer ineptidão da petição inicial.

24. O procedimento de Injunção encontra-se previsto e regulado no Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro.

25. É um processo de natureza célere, cuja tramitação se encontra simplificada que o legislador previu com vista ao descongestionamento dos Tribunais.

26. O artigo 10.º, n.º 2, alínea b) do Decreto-Lei n.º 269/98 vem determinar que o Autor, no requerente da injunção, apenas está obrigado a expor sucintamente os factos que fundamentam a sua pretensão.

27. Não se aplica aos procedimentos de injunção a mesma exigência dos demais processos quanto à exposição dos factos de forma pormenorizada conforme consta do artigo 552.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil.

28. Os requerimentos de injunção estão reduzidos ao mínimo.

29. Não podia a Autora indicar, de forma pormenorizada, todos os factos que fundamentam a causa de pedir e a origem do seu crédito, na medida em que o impresso para o requerimento inicial não tem espaço para mais.

30. Se o legislador colocou à disposição apenas um requerimento simplificado, a Autora estava confinada a descrever os factos da forma mais restritiva que tem para o fazer, o que o fez.

31. O Requerimento de Injunção tem um limite de caracteres de escrita, o que inviabiliza a alegação de todos os factos referentes à relação entre as Partes, Autora e Ré.

32. O conjunto de faturas emitidas, referente aos serviços e bens prestados pela Autora à Ré é bastante extenso- 57 (cinquenta e sete) faturas.

33. A Autora necessitava de indicar todas as faturas, com a identificação do n.º de cada uma, do valor devido a título de capital e do montante devido a título de juros, por forma a conseguir formular o respetivo pedido.

34. Ao indicar e fazer menção às referidas faturas, a Autora ficou sem mais caracteres no Requerimento de Injunção.

35. A Autora cumpriu com o seu ónus de alegação vertido no artigo 10.º, n.º 2, alínea d) do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de setembro, ao ter enumerado e feito referência a todas as faturas que descrevem a relação negocial entre as Partes.

36. São as próprias faturas que materializam a relação jurídicas entre as Partes.

37. O Tribunal a quo, na sentença ora recorrida, fundamentou a sua decisão referindo que se encontravam em falta dois elementos:

i) localização no tempo das relações contratuais;

ii) forma como cada parte cumpriu ou incumpriu as obrigações assumidas.

38. Os referidos elementos encontravam-se nos autos, salvo o devido respeito.

39. No que respeita ao elemento da localização no tempo das relações contratuais: no próprio requerimento de injunção consta a data do vencimento de cada fatura e o período temporal a que cada uma diz respeito, sobretudo na parte referente à contabilização dos juros.

40. No que concerne ao elemento referente à forma como cada uma das partes incumpriu ou cumpriu com as obrigações assumidas, sempre se deverá referir que no Requerimento de Injunção peticionou-se contra a Ré o valor total das faturas apresentadas, razão pela qual é de entender que ocorreu um incumprimento no pagamento das mesmas, aliás, conforme consta dos demais requerimentos nos autos.

41. Deveria o Tribunal a quo ter entendido estar cumprido o ónus de alegação do pedido e da causa de pedir, devendo ter julgado como improcedente a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial.

42. Pelo que se requer a este Douto Tribunal a revogação da sentença proferida e substitua a mesma por outra que julgue improcedente a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial, o que se requer.

43. Se existiam dúvidas quanto e algumas deficiências no requerimento de injunção, deveria a Autora ter sido disso notificada para vir aos autos apresentar um requerimento de aperfeiçoamento, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 590.º, n.º 2, alínea b) e n.º 4 do Código de Processo Civil.

Termos em que, dando-se provimento ao presente recurso se fará a costumada JUSTIÇA!”


*

A R. veio interpor contra-alegações, concluindo da seguinte forma:

(…).


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Foram dispensados os vistos aos Srs. Juízes-Desembargadores adjuntos.

 


***

QUESTÕES A DECIDIR


Nos termos do disposto nos artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial.[1] Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.[2]

Nestes termos, as questões a decidir, consistem em apurar:
a) Se o requerimento injuntivo é inepto, por falta de causa de pedir;


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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A matéria de facto a considerar de relevo para decisão é a seguinte:

1-A A. apresentou requerimento de injunção contra a R., indicando o seguinte:

Contrato de: fornecimento de bens ou serviços

Data do contrato: 08-10-2012

Período a que se refere: 07-11-2012 a 22-12-2022

Capital: € 177 414,53

Juros de mora: € 119 144,92

2-Na exposição dos factos, fez constar o seguinte:

FAC/1100 no valor de 519,46 € + juros entre 07/11/2012 e 22/12/2022

FAC/1263 no valor de 1 639,08 € + juros entre 20/12/2012 e 22/12/2022

FAC/1287 no valor de 6 684,07 € + juros entre 28/12/2012 e 22/12/2022

FAC/1301 no valor de 5 051,22 € + juros entre 30/12/2012 e 22/12/2022

FAC/1308 no valor de 3 330,73 € + juros entre 03/01/2013 e 22/12/2022

FAC/1335 no valor de 5 465,65 € + juros entre 09/01/2013 e 22/12/2022

FAC/1420 no valor de 6 713,74 € + juros entre 30/01/2013 e 22/12/2022

FAC/1422 no valor de 5 059,03 € + juros entre 30/01/2013 e 22/12/2022

FAC/1446 no valor de 3 795,18 € + juros entre 06/02/2013 e 22/12/2022

FAC/1447 no valor de 3 146,08 € + juros entre 06/02/2013 e 22/12/2022

FAC/1503 no valor de 4 964,98 € + juros entre 21/02/2013 e 22/12/2022

FAC/1507 no valor de 5 059,03 € + juros entre 21/02/2013 e 12/12/2022

FAC/1508 no valor de 5 623,75 € + juros entre 21/02/2013 e 12/12/2022

FAC/1534 no valor de 6 633,93 € + juros entre 28/02/2013 e 12/12/2022

FAC/1624 no valor de 5 797,19 € + juros entre 16/03/2013 e 12/12/2022

FAC/1691 no valor de 5 751,88 € + juros entre 28/03/2013 e 12/12/2022

FAC/1692 no valor de 5 204,68 € + juros entre 28/03/2013 e 12/12/2022

FAC/1746 no valor de 3 146,08 € + juros entre 04/04/2013 e 12/12/2022

FAC/1792 no valor de 5 754,53 € + juros entre 13/04/2013 e 12/12/2022

FAC/1820 no valor de 5 877,04 € + juros entre 19/04/2013 e 12/12/2022

FAC/1881 no valor de 2 482,90 € + juros entre 05/05/2013 e 12/12/2022

FAC/1897 no valor de 4 973,02 € + juros entre 10/05/2013 e 12/12/2022

FAC/1989 no valor de 5 552,70 € + juros entre 24/05/2013 e 12/12/2022

FAC/2023 no valor de 1 576,81 € + juros entre 01/06/2013 e 12/12/2022

FAC/2024 no valor de 3 969,65 € + juros entre 01/06/2013 e 12/12/2022

FAC/2105 no valor de 3 007,58 € + juros entre 16/06/2013 e 12/12/2022

FAC/2106 no valor de 2 305,14 € + juros entre 16/06/2013 e 12/12/2022

FAC/2178 no valor de 2 361,72 € + juros entre 28/06/2013 e 12/12/2022

FAC/2283 no valor de 1 415,34 € + juros entre 14/07/2013 e 12/12/2022

FAC/2339 no valor de 4 588,40 € + juros entre 27/07/2013 e 12/12/2022

FAC/2378 no valor de 2 166,63 € + juros entre 03/08/2013 e 12/12/2022

FAC/2623 no valor de 4 094,46 € + juros entre 28/09/2013 e 12/12/2022

FAC/2710 no valor de 3 627,24 € + juros entre 17/10/2013 e 12/12/2022

FAC/2721 no valor de 492,80 € + juros entre 20/10/2013 e 12/12/2022

FAC/2722 no valor de 3 716,91 € + juros entre 20/10/2013 e 12/12/2022

FAC/3053 no valor de 4 650,52 € + juros entre 27/12/2013 e 12/12/2022

FAC/3058 no valor de 669,70 € + juros entre 27/12/2013 e 12/12/2022

FAC/3142 no valor de 1 462,57 € + juros entre 30/01/2014 e 12/12/2022

FAC/3188 no valor de 4 185,27 € + juros entre 30/01/2014 e 12/12/2022

FAC/3197 no valor de 10,40 € + juros entre 30/01/2014 e 12/12/2022

FAC/2 no valor de 547,37 € + juros entre 06/02/2014 e 12/12/2022

FAC/3 no valor de 19,00 € + juros entre 06/02/2014 e 12/12/2022

FAC/27 no valor de 10,40 € + juros entre 08/02/2014 e 12/12/2022

FAC/125 no valor de 820,41 € + juros entre 27/02/2014 e 12/12/2022

FAC/160 no valor de 4 189,59 € + juros entre 05/03/2014 e 12/12/2022

FAC/197 no valor de 5 266,19 € + juros entre 12/03/2014 e 12/12/2022

FAC/221 no valor de 336,36 € + juros entre 17/03/2014 e 12/12/2022

FAC/257 no valor de 2 540,46 € + juros entre 22/03/2014 e 12/12/2022

FAC/423 no valor de 3 074,82 € + juros entre 16/04/2014 e 12/12/2022

FAC/489 no valor de 1 168,40 € + juros entre 25/04/2014 e 12/12/2022

FAC/519 no valor de 1 142,00 € + juros entre 03/05/2014 e 12/12/2022

FAC/613 no valor de 706,00 € + juros entre 21/05/2014 e 12/12/2022

FAC/681 no valor de 664,73 € + juros entre 01/06/2014 e 12/12/2022

FAC/774 no valor de 719,02 € + juros entre 18/06/2014 e 12/12/2022

FAC/888 no valor de 2 295,28 € + juros entre 09/07/2014 e 12/12/2022

FAC/1006 no valor de 425,88 € + juros entre 08/08/2014 e 12/12/2022

FAC/3710 no valor de 124,80 € + juros entre 12/09/2014 e 12/12/2022

Capital Inicial: 177 414,53€

Total de Juro: 119 144,92 €

Capital Acumulado: 296 559,45€.”

3-Deduzida oposição, alegou a R. no seu articulado:

 “10. Sempre alega a requerida que sendo verdade que entre requerente e requerida ocorreram transações comerciais,

11. Que se traduziram no fornecimento de ração para coelhos,

12. Tais transações terminaram há cerca de 8 anos.

13. E a requerida pagou todos os valores correspondentes aos fornecimentos de bens e serviços.

14. Nada devendo a requerida à requerida, seja a que titulo for.

15. E como tal deve ser absolvida do pedido.”


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FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO


Insurge-se a recorrente contra a decisão que absolveu a R. da instância por ineptidão da p.i. com fundamento em falta de causa de pedir, com base essencialmente em dois argumentos:

-a inaplicabilidade aos procedimentos de injunção - atenta a sua natureza simplificada e a restrição de caracteres imposta pelo legislador - da mesma exigência quanto à exposição dos factos de forma pormenorizada conforme consta do artigo 552.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil;

-a aplicação do disposto no artº 186, nº3 do Código de Processo Civil, por a R. ter interpretado convenientemente o procedimento de injunção.

Cumpre decidir, começando pelo primeiro argumento invocado pelo autor:

O cumprimento do ónus de alegação de factos no procedimento de injunção;

Em termos gerais, uma injunção traduz-se numa ordem, dirigida a um determinado sujeito, seja ele pessoa singular ou colectiva, para que adopte um determinado comportamento, em cumprimento de uma obrigação que se afigura incontrovertida.

No nosso ordenamento jurídico civilista, esta injunção – para pagamento de quantia certa - obtém-se no âmbito de um procedimento simplificado, com vista à constituição de um título executivo para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a €15.000 (cfr. art. 1.º do D.L. nº 269/98 de 1 de Setembro, na redacção introduzida pelo D.L. nº 303/2007 de 24 de Agosto) ou emergentes de transacções comerciais, independentemente do seu valor (cfr. art. 2º e 10º, nº1, do D.L nº 62/2013 de 10 de Maio, que revogou o D.L. n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro).

A criação de uma injunção de pagamento, como título executivo nasce essencialmente da necessidade de assegurar tutela jurisdicional efectiva àqueles direitos de crédito que, não sendo controvertidos, não beneficiavam de título executivo e assim, careciam de prévia acção declarativa, com evidentes reflexos não só na pendência judicial, mas também na morosidade e, variadas vezes, na impossibilidade de satisfação do crédito, o que constituía uma violação do direito à tutela jurisdicional efectiva dos cidadãos (artº 20 da Constituição), direito que compreende não só o direito de acção, mas o direito de obter uma decisão judicial num prazo razoável e sem dilacções indevidas, no âmbito de um processo justo e equitativo.[3]

É neste quadro – direitos de crédito, não controvertidos e morosidade/impossibilidade de satisfação em prazo útil e razoável - que se verificou a necessidade de criação de um novo modelo simplificado que permitisse ao credor de obrigações pecuniárias de pequeno montante, não abrangidas por título executivo particular e sem que existisse verdadeiro litígio quanto à existência e montante da obrigação, a obtenção, sem recurso à prévia acção declarativa, de um título executivo.[4]

A solução do legislador nacional, vertida no D.L. 404/93 de 10 de Dezembro e posteriormente no D.L. 269/98 de 1 de Setembro, incidiu sobre um modelo de injunção não probatório, vigente noutros países como a Áustria ou a Alemanha, mas com a diferença, na opção nacional, de não estar sujeito ao crivo decisório de um magistrado, privilegiando-se a celeridade e simplificação dos actos tendentes à formação do título executivo[5] e fazendo-se depender a intervenção do magistrado e o destino do processo, da reacção do próprio requerido, mediante a dedução de oposição.[6]

Nesta medida, afastou-se de outros modelos europeus de origem latina,[7] nomeadamente, o “procédiment de injonction de payer” francês, do “processo monitorio” espanhol (que até à alteração introduzida pela Ley nº 13/2009 era da competência de um magistrado judicial) e do “procedimento speciali di ingiunzione» italiano,[8] modelos em que o requerente estava obrigado à apresentação de prova documental a acompanhar o pedido de injunção, sem a qual este era liminarmente indeferido, sendo este requerimento e a respectiva prova documental analisados por um magistrado, a quem cabia a competência para analisar o respectivo mérito e determinar a sua executoriedade.

O modelo de injunção nacional aproximou-se do modelo de “gerichtliches mahnverfaren” alemão, já que naquele modelo era ao funcionário judicial que competia emitir o mandato judicial de injunção, o “mahnbescheide”, mas com importantes diferenças. No modelo alemão, por via da equivalência da notificação à citação nas acções declarativas (cfr. §693 ZPO) e da possibilidade conferida ao requerido, mesmo após a constituição do mandato de injunção, de se opor à aposição de fórmula executória, podendo deduzir reclamação a ser apreciada por um magistrado judicial, a protecção conferida ao requerido era superior ao do modelo nacional, uma vez que o requerido dispunha de duas oportunidades para contestar o crédito peticionado, só se tornando esta fórmula executória definitiva, decorrido que fosse este segundo prazo.[9]

No modelo nacional adoptou-se não só um modelo de injunção não probatório que, como refere Mariana França Gouveia[10]coloca a tónica na responsabilidade do próprio requerido” caracterizando-se “pela total ausência de uma apreciação judicial relativamente ao mérito do requerido[11] como um modelo de injunção sem magistrado.

Em consequência desta concepção da injunção como um modelo de formação de título executivo sem intervenção do magistrado judicial, a competência para todos os actos a praticar na formação do título estava e está, cometida ao secretário judicial, pelo que este processo de injunção, embora se inicie pela apresentação de requerimento na secretaria do tribunal territorialmente competente (actualmente no Balcão Nacional de Injunções) não foi equacionado como sendo um verdadeiro processo judicial, nem a aposição de fórmula executória foi equiparada à sentença judicial.

O que não significa que neste modelo de injunção simplificada, o legislador nacional tenha prescindido do ónus imposto ao requerente de expor, embora de forma sucinta, os factos que fundamentam a sua pretensão.

Com efeito, o procedimento de injunção inicia-se pela apresentação do requerimento injuntivo junto da secretaria judicial, em formulário próprio (constante da Portaria nº 902/98, de 15 de Outubro), contendo os elementos referidos no art. 10º deste diploma: a identificação da secretaria do tribunal onde o requerimento irá ser entregue; a identificação das partes; o lugar onde deve ser efetuada a notificação; a exposição sucinta dos factos que fundamentam a pretensão (causa de pedir); a formulação do pedido, com discriminação do capital, juros vencidos e outras quantias devidas e a indicação da taxa de justiça paga.

Nestes termos, admitido este procedimento o requerido é notificado dos factos sucintamente alegados no requerimento (cfr. artº 10, nº1, alínea d), do Regime Anexo ao D.L. 269/98), decorrendo desta notificação efectuada por alguma das formas previstas nos nºs 2 a 5 do artº 225 do C.P.C., a preclusão dos meios de defesa caso o requerido não deduza oposição, nos termos previstos no artº 14-A, nº1, do Regime em Anexo ao D.L. 269/98 de 1 de Setembro, introduzido pela Lei nº 117/2019 de 13 de Setembro), sem prejuízo dos contidos no nº2 deste preceito legal.

Nesta medida, a alegação, ainda que sucinta, dos factos essenciais, associada à dispensa de prova, nomeadamente de junção de acervo documental que suporte o alegado crédito, afigura-se essencial ao cumprimento do princípio constitucional da proibição da indefesa, possibilitando ao requerido o conhecimento integral dos factos, para a organização da sua defesa[12], para que possa, em cumprimento do disposto no artº 574, nº2, do C.P.C., “tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor.”.

O que significa que o requerente não está dispensado do ónus de indicar os factos essenciais que justificam o seu pedido de injunção,[13] sob pena de nulidade do processado por ineptidão do procedimento injuntivo[14], mas apenas que o deverá fazer de forma sucinta tendo em conta a natureza simplificada deste procedimento, sendo essa a única diferença relevante em relação ao disposto no artº 552, nº1, d), do C.P.C. aplicável às petições iniciais apresentadas no âmbito do processo comum.

Acresce que a efectiva restrição de caracteres existente nos formulários com que se inicia este procedimento, não dispensa o requerente de indicar todos os factos essenciais que constituem a causa de pedir. Justifica-se esta restrição e a própria utilização de formulário electrónico pela natureza específica deste procedimento, a utilizar pelos titulares de créditos que, pese embora não satisfeitos, se não mostram controvertidos, devendo a causa de pedir que suporta o pedido formulado, adequar-se a este procedimento e ao espaço previsto para a sua descrição.

O procedimento de injunção é uma faculdade expedita concedida pelo legislador para formação de título executivo, mas não se trata de procedimento obrigatório e não será seguramente adequado a todos os créditos de natureza comercial, mais complexos e de natureza mais litigiosa, servindo afinal as restrições de espaço para delimitar a simplicidade exigida para este procedimento.

Nestes termos, a noção de causa de pedir num caso e noutro não assume qualquer diferença (diferença que existe apenas na exigência de explanação sucinta). Consiste no acto ou facto jurídico de que precede a pretensão deduzida em juízo, isto é, o facto jurídico em que o autor se baseia para formular o seu pedido (arts. 10, al. d) e 552, nº1, d) e 581, nº4, do C.P.C.). A exigência contida na lei, não se refere a factos jurídicos abstractos, mas sim a factos jurídicos concretos, que então se enquadrarão na respectiva norma jurídica, permitindo ao tribunal que se pronuncie sobre o mérito da causa, quer em sentido positivo, quer em sentido negativo.

Como pertinentemente assinala Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora[15], a “causa de pedir é o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido”, correspondendo assim, nos dizeres de Lebre de Freitas, “ao núcleo fáctico essencial tipicamente previsto por uma ou mais normas como causa do efeito de direito material pretendido[16].

O critério para aferir a falta de causa de pedir, conforme refere Abrantes Geraldes[17], assenta num juízo de prognose acerca da delimitação do caso julgado, pressupondo uma sentença favorável ao autor. Assim, como aí se refere: “ … projectando no futuro a decisão, se for então possível determinar concretamente qual a situação jurídica que foi objecto de apreciação jurisdicional, sem correr riscos de repetição da causa, não se verificará a falta de causa de pedir. Já quando, por falta de invocação de qualquer matéria de facto, por grave deficiência na sua descrição ou por falta de localização no espaço e no tempo, for previsível o risco de repetição da causa ou se tornar impossível a averiguação da relação jurídica anteriormente litigada deverá concluir-se pela ineptidão da petição inicial”.

Nesta medida só se poderá concluir que uma p.i. é inepta “quando existir ausência absoluta de alegação dos factos que integram o núcleo essencial da causa de pedir, o processo careça, em bom rigor, de um objecto inteligível.[18] 

Expostos estes considerandos, é bom de ver que o A. não alegou factos essenciais que integram o núcleo da causa de pedir, não sendo inteligível do elenco de facturas que descreveu quais as relações jurídicas estabelecidas entre as partes, se fornecimento de bens ou serviços, sendo indicado de forma genérica ambas as hipóteses, que bens (ou serviços) foram fornecidos, a quem e a que preço, se se destinaram ao exercício do comércio da requerida, qual o prazo de pagamento, se convencionado, se não convencionado se existiu interpelação da R., se foram pagos ainda que parcialmente os serviços prestados ou os bens fornecidos, enfim, todos aqueles factos que permitam ao requerido a compreensão do peticionado, exigida quer por via do disposto no artº 13, nº1, al. a), do Regime Anexo ao D.L. 269/98, quer para aplicação do efeito cominatório da falta de dedução de oposição, previsto no artº 14-A do mesmo diploma legal. A ausência de indicação destes factos essenciais obsta a que o requerido possa deduzir impugnação especificada dos factos constitutivos da causa de pedir indicada (cfr. o exige o artº 474 nº1 do C.P.C.) e impede o efeito cominatório que o legislador pretendeu como consequência da não dedução de oposição.

Acresce que, remetidos os autos à distribuição como acção comum, deles devem constar todos os factos que permitam ao tribunal conhecer e apreciar a relação jurídica controvertida com vista à formação de caso julgado material. Ora estes factos não constam do r.i.

Não tendo sido alegados factos essenciais, o requerimento de injunção é inepto.

Do alegado suprimento da ineptidão, pelos termos da oposição deduzida pela R.

Resulta do disposto no artº 186, nº3, do C.P.C., duas excepções ao princípio da insanabilidade da ineptidão da p.i.

A primeira resulta do disposto no nº3 deste preceito legal, ou seja, sendo oferecida contestação, a arguição de falta ou ininteligibilidade do pedido ou da causa de pedir, deverá improceder, se o juiz verificar, ouvido o A., que o R. interpretou correctamente a petição inicial. Na realidade como assinala França Gouveia[19], a função essencial desempenhada pela p.i. consiste na informação da contraparte “sobre o que o autor pretende com aquela acção. Retira-se claramente do artigo 193.º, n.º 3, ou seja, da importância da percepção do réu. A petição inicial é, antes de mais, uma garantia de defesa do réu.” (negrito nosso).

A segunda decorre do Assento nº 12/94 (publicado no Diário da República n.º 167/1994, Série I-A de 1994-07-21), segundo o qual em caso de “nulidade resultante de simples ininteligibilidade da causa de pedir, se não tiver provocado indeferimento liminar, é sanável através de ampliação fáctica em réplica, se o processo admitir este articulado e respeitado que seja o princípio do contraditório através da possibilidade de tréplica.”, desde que respeitados os limites impostos pelos actuais artºs 264 e 265 do C.P.C.

 Quanto ao primeiro fundamento impeditivo da declaração de nulidade por ineptidão, verifica-se naqueles casos em que, apesar de omissos factos essenciais, ainda assim o R. percebeu o sentido e teor dos alegados e deduziu impugnação motivada desses factos, mostrando-se, assim, elencados na petição inicial e na contestação, todos os factos necessários à definição da relação material controvertida e à decisão do pedido formulado no processo, permitindo a formação de caso julgado material.

Não é, no entanto, o caso. A mera alegação de que que entre requerente e requerida ocorreram transações comerciais (…) Que se traduziram no fornecimento de ração para coelhos”, não permite aferir da relação material controvertida.

Não se sabe o que foi fornecido, quando, em que quantidades, a que preços, a data de vencimento. Não estão alegados nenhum dos factos que permitam o preenchimento do tipo legal de compra e venda, ou a eventual qualificação do contrato, como de venda mercantil. A mera indicação de números de facturas e respectivo valor, não constitui causa de pedir do crédito. Essa causa de pedir há-de assentar em factos dos quais resulte a prestação de um serviço concreto ou a venda de um bem concreto.

Assim sendo, improcede o recurso interposto, mantendo-se a decisão proferida nos seus precisos termos.


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DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta relação em negar provimento à apelação, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas da acção e da apelação pela A. (artº 527 do C.P.C.)
                       
                                               Coimbra 13/12/23


[1] Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pp. 84-85.
[2] Abrantes Geraldes, Op. Cit., p. 87.
Conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, «Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação». No mesmo sentido, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4.10.2007, Simas Santos, 07P2433, de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13.
[3] Sobre o direito a um processo equitativo vide Le Droit à un Procés Equitable, Comission Européenne pour la democratie par le droit, 2000, Conseil de l`Europe e ainda TEIXEIRA DE SOUSA, Miguel, “A jurisprudência constitucional portuguesa e o direito processual civil”, XXV Anos de Jurisprudência Constitucional Portuguesa, Coimbra Editora, 2008, p. 72. Ainda a este respeito vide QUILLHERÉ- MAJZOUB, La defense du droit à un procès equitable, 1999, pág. 226 apud PINTO, Rui, A Ação Executiva, AAFDL, 2020, pág. 13. Ainda sobre a tutela jurisdicional efectiva e o direito a um processo equitativo e leal, vd. MIRANDA, Jorge e MEDEIROS, Rui, Constituição Portuguesa Anotada, Vol. I, Universidade Católica Portuguesa, Fev. 2017, págs. 323 a 330.  

[4]Uma vez que, conforme referido por TEIXEIRA, Paulo Duarte, “Os pressupostos objectivos e subjectivos do procedimento de injunção” Revista Themis, nº 13, 2006, pág. 173 a “solenidade através da qual o estado tradicionalmente exercia a sua função de soberania, não pode ser reproduzida com efectividade, nos múltiplos litígios de uma sociedade plástica aberta e flexível, que necessita pois, de regras e procedimentos reduzidos, rápidos e simples” como meio de conferir tutela efectiva naquelas situações em que a intervenção jurisdicional é meramente residual.
[5] Conforme se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 222/2017 “A consagração do procedimento de injunção, pelo Decreto-Lei n.º 404/93, de 10 de dezembro, fez parte dum movimento de desburocratização e simplificação de atos processuais, com o objetivo de obter maior celeridade e eficácia na resposta da justiça à multiplicação de litígios, que constituía - e ainda constitui - uma das principais causas de congestionamentos no sistema de justiça.”
[6] De acordo com o Livro Verde apresentado pela Comissão das Comunidades Europeias de 20/12.2002 - págs. 19- neste regime não probatório e com acento tónico na responsabilidade do requerido “Se não se procede a qualquer exame, obviamente não é necessária qualquer prova documental do crédito, já que esta é válida apenas enquanto instrumento para permitir esse controlo. Além disso, se o pedido não é apreciado pelo tribunal e, por conseguinte, todo o processo assume um carácter mais administrativo, não parece ser necessário envolver um juiz; consequentemente, em todos os Estados-Membros que integram este grupo, a competência para emitir uma injunção de pagamento é delegada quer nos funcionários judiciais quer, como se verifica na Suécia, nas autoridades responsáveis pela execução, que são organismos administrativos situados fora da esfera judicial.”- Bruxelas/ COM/2002/0746, disponível in https://eur-lex.europa.eu
[7] A este respeito vide MARINHO, Carlos M. G. de Melo, “Os Títulos Executivos Europeus Emergentes de Decisões Judiciais Proferidas em Ações sem Oposição- Regime e Problemas”, Textos de Cooperação Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial, Coimbra Editora, 2008, págs. 149 e 150.  
[8] Em Espanha, este procedimento assume a designação de “proceso monitório”, o qual nos termos dos arts. 812 º a 818º da Ley de Enjuiciamento Civil (Ley 1/2000 de 7 de enero) deve ser presente ao “Juzgado de Primera Instancia”, visando “el pago de deuda dineraria de cualquier importe, líquida, determinada, vencida y exigible”, prevendo o art. 816º deste diploma que, não existindo oposição nem sendo paga a quantia peticionada, o “Letrado de la Administración de Justicia dictará decreto dando por terminado el proceso monitorio y dará traslado al acreedor para que inste el despacho de ejecución.”; após a alteração decorrente da Ley nº 13/2009, entrada em vigor em 4 de maio de 2010, com a criação de uma “oficina general” atribuiu-se a competência ao secretário judicial (em Espanha, licenciado em direito) para admitir o requerimento inicial (competência extensiva a outros processos em geral, como forma de libertar os magistrados de tarefas processuais), e verificar se foram juntos os documentos exigidos pelo art. 812º, nº2, ou se os juntos constituem princípio de prova, caso em que notificará o devedor para pagar ou deduzir oposição; se este não pagar nem deduzir oposição o secretário dará por terminado o procedimento, sendo entregue traslado ao credor se este o solicitar-neste novo modelo a intervenção do juiz ocorre apenas quando o secretário judicial entender não estarem verificados os requisitos para a injunção ou quando for deduzida oposição-sobre as alterações introduzidas pela Ley 13/2009 vd. BADIOLA DÍEZ, Ramón, LEY de enjuiciamiento civil : adaptación práctica de la reforma de la legislación procesal para la implantación de la nueva oficina judicial, Dykinson, 2010; em França, foi aditado em 1988 ao “Code de Procedure Civile” os arts. 1988º e segs. que regulavam um processo simplificado com intervenção do secretário judicial (“déclaration au greffe”), o qual procedia ao registo do pedido no tribunal, observados os requisitos para aplicação deste preceito; no entanto, ao contrário do previsto no D.L. 404/93, as partes são convocadas para uma audiência, pertencendo a competência para a decisão final, ao Juiz; actualmente prevê-se no art. 1406º que este procedimento deve ser presente “devant le juge des contentieux de la protection ou devant le président du tribunal judiciaire ou du tribunal de commerce, dans la limite de la compétence d'attribution de ces juridictions”, incumbindo ao juiz nos termos do art. 1409º deste diploma “au vu des documents produits, la demande lui paraît fondée en tout ou partie, (…) rend une ordonnance portant injonction de payer pour la somme qu'il retient.”; neste procedimento de injunção, o pedido terá de ser apresentado perante um juiz, acompanhado dos documentos que sustentam o crédito, pertencendo ao juiz a decisão sobre a injunção de pagamento se, perante os elementos apresentados, a considerar justificável; em Itália o “Codice di Procedura Civile” prevê a injunção de pagamento nos arts. 633º e segs.; do art. 633º resulta que “Su domanda di chi e' creditore di una somma liquida di danaro o di una determinata quantita' di cose fungibili, o di chi ha diritto alla consegna di una cosa mobile determinata, il giudice competente pronuncia ingiunzione di pagamento”; existindo oposição, segue-se a forma de processo competente mas, se não for deduzida oposição, dispõe o art. 647º que “Se non e' stata fatta opposizione nel termine stabilito, oppure l'opponente non si e' costituito, il giudice che ha pronunciato il decreto, su istanza anche verbale del ricorrente, lo dichiara executivo”. Resulta dos supra apontados ordenamentos que, nestes, a decisão da injunção é da competência do juiz do processo que no regime italiano (na versão introduzida pelo art. 17º da Lei nº 374, de 21 de Novembro de 1991) pertencia ao juiz de paz – a este respeito vidé REDENTI, Enrico e VELLANI, Mário, Diritto Processuale Civile 3ª edição, Giuffrè Editore, 1999, pág. 78.
[9] Neste sentido vide FERREIRA, João Pedro Pinto e GOUVEIA, Mariana França, “A oposição à execução baseada em requerimento de injunção”, Revista Themis, Ano XIII, nºs 24/25, 2013, págs. 332. Conforme referem estes autores, a ordem de pagamento, no regime alemão, é equiparada a uma sentença à revelia declarada provisoriamente executória e assim susceptível de reclamação no próprio tribunal onde se firmou a ordem de pagamento, conforme previsto no art. 700º nº 6 do ZPO - constitui esta reclamação o meio de reacção à condenação à revelia. No caso português, após a oposição de fórmula executória, a lei apenas admite como meio de reacção do requerido, a oposição em sede de execução mediante embargos, com os fundamentos actualmente previstos no art. 857º do C.P.C.  
[10] “A causa de pedir da Injunção”, Revista Themis, Ano VIII, nº13, 2006, págs. 225.

[11] Neste modelo não probatório “o ónus de dar início a um processo contraditório recai sobre o destinatário da injunção de pagamento. Esta inversão de responsabilidade, definida em francês pela expressão particularmente feliz de 'inversio du contentieux', combinada com a protecção dos direitos da defesa, representada pela possibilidade de impedir a efectivação de um título executivo, constitui a característica essencial do procedimento de injunção de pagamento”, cfr. referido no Livro Verde relativo a um Procedimento Europeu de Injunção de Pagamento e a medidas para simplificar e acelerar as acções de pequeno montante, Bruxelas/ COM/2002/0746, disponível in https://eur-lex.europa.eu.
[12] Ainda que se trate de contrato eventualmente nulo, resolvido pelas partes ou de cláusula em si abusiva, a mera indicação de “domicílio convencionado” determina a escolha de um modelo de notificação que se nos afigura incompatível com um nível elevado de protecção e de garantias de defesa, apesar da pronúncia do Tribunal Constitucional em sentido contrário.

[13] A este respeito COSTA, Salvador, A injunção e as Conexas Acção e Execução” cit, a págs. 189, afirma que “a causa de pedir, embora sintética, não pode deixar de envolver o conteúdo das respectivas declarações negociais e os factos negativos ou positivos consubstanciadores do seu incumprimento por parte do requerido.”, acrescentando ainda que “o que verdadeiramente releva como causa de pedir é a descrição da origem do direito de crédito invocado pelo requerente ou a permuta a que se reporta mas, contra a natureza das coisas, porventura sob o desígnio desajustado da máxima simplificação, o impresso só lhe reserva o espaço de sete linhas”.
[14] Razão pela qual ao juiz incumbirá apreciar a nulidade decorrente da falta de causa de pedir ou proferir despacho, convidando a parte a aperfeiçoar este requerimento, cfr. Ac. do TRE de 09/02/17, (Rel. Conceição Ferreira), proc. nº 164562/15.0YIPRT.E1. Ainda na jurisprudência vide o caso descrito no Ac. do TRG de 27/06/19, proferido no proc. nº 30491/18.7YIPRT.G1 – neste, sendo alegado no âmbito de um requerimento de injunção, que tinham existido relações comerciais entre requerente e requerido mediante as quais tinha este encomendado bens ou serviços, indicando o número, data e valor de facturas, considerou-se existir ineptidão por o autor se limitar a indicar vagamente uma transacção comercial ou serviço, como fonte do seu direito, sem que tal deficiência pudesse ser suprida pela junção de documento; ainda no Ac. do TRL de 16/05/19, proferido no proc. nº 89078/18.6YIPRT-A.L1-6, considerou-se, entre outras excepções, a ineptidão do requerimento inicial de injunção, por falta de indicação de causa de pedir, não suprível pela posterior junção de documento, que constitui tão só meio de prova dos factos alegados; no Ac. do TRL de 06/02/20, proferido no proc. nº 28975/19.9YIPRT.L1-2, foi decidido julgar inepto o requerimento de injunção no qual se alegava, como causa de pedir do crédito, o facto de em “ balancete analítico apreendido foi então constatada a existência de um crédito a favor da requerente, Massa Insolvente, de €5.645,27, por considerar tratar-se de alegação genérica, sem indicação dos factos constitutivos do direito.
[15] Temas da Reforma do Processo Civil, I Volume, 2.ª ed., págs. 245.
[16] Ação Declarativa Comum, À Luz do C. P. Civil de 2013, pág. 41.
[17] Temas da Reforma do Processo Civil, I Volume, 2.ª ed., pág. 189.
[18] Ac. do TRC de 4/11/2017, proferido no proc. nº 7034/15.9T8VIS.C1, de que foi relator Fonte Ramos.
[19] Ob. cit, pág. 217 “