Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
211/09-3PBCVL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: GOMES DE SOUSA
Descritores: JOVEM DELINQUENTE
LEI ESPECIAL
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
Data do Acordão: 01/20/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DA COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 4º DO DEC-LEI Nº 401/82, DE 23-09,40º 71ºA 73º DO CP;
Sumário: A circunstância modificativa atenuante prevista no artigo 4º do Dec-Lei nº 401/82, de 23-09, que institui o regime aplicável em matéria penal aos jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, não implica - se for aplicável pena de prisão - um raciocínio automático que faça corresponder uma atenuação especial a um determinado nível etário, nem de conceder sempre a atenuação especial, impondo–se em cada caso apurar se há “sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”.
Decisão Texto Integral: A - Relatório:
Nos autos de processo sumário com o número supra indicado do Tribunal da Comarca da Covilhã, em que são arguidos R. P. S. e A foi lavrada sentença em … de ….de 2009, que julgou a acusação procedente, por provada, e em consequência, condenou o arguidos R. P. S. e A. pela prática, em co-autoria material, do crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203º, nº1 e 204º, nº2, al. e), com referência ao 202º, al. f), todos do Código Penal, e ainda o arguido R. pela prática, em concurso real, do crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º, nºs 1 e 2 do DL 2/98, de 3 de Janeiro, nas seguintes penas:

a) Os arguidos P. e A, numa pena de prisão, que se fixou em 2 (dois) anos e 2 (dois) meses, a qual, ao abrigo do disposto no artigo 50º, nº 1, do Código Penal, se suspendeu por igual período;

b) O arguido S. numa pena de prisão, que se fixou em 2 (dois) anos e 3 (três) meses, a qual, ao abrigo do disposto no artigo 50º, nº 1, do Código Penal, se suspendeu por igual período;

c) O arguido R., numa pena única de prisão, que se fixou em 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de prisão, operado o respectivo cúmulo jurídico.

d) A suspensão da execução das penas de prisão fixadas em a) e b) ficou sujeita a regime de prova, com regras de conduta a determinar pelo organismo competente, mas sempre e obrigatoriamente, relativamente aos três arguidos referenciados:

1. A sujeição a tratamento de desintoxicação dos produtos estupefacientes que consomem;

2. O exercício de qualquer tipo de actividade profissional; e ainda

3. A proibição de se ausentarem das respectivas residências após as 21:00 horas, durante o Verão, e após as 18:00 horas, nas restantes estações do ano, tudo nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 52º e 53º do Código Penal).


*

Inconformados, recorreram os arguidos R. e A. da sentença proferida, com as seguintes conclusões (transcritas):

1. O Recorrente R. está familiarmente inserido e procura trabalho.

2. Tem problemas na sua vida pessoal, ligados ao consumo de haxixe e de convívio com amigos que o levam a tomar as decisões erradas e que fundamentam o seu registo criminal.

3. Mas a aplicação duma pena de prisão efectiva não constitui um meio para a reinserção desde arguido - antes fundamentará o aprofundar das suas tendências delinquentes.

4. A aplicação duma pena de prisão suspensa por igual período, sujeita a condições como as que foram aplicadas aos restantes arguidos do presente processo potenciaria a ressociabilização do arguido.

5. A sentença de que ora se recorre é nula pois a não fundamentação da denegação da suspensão da pena de prisão é causa dessa mesma nulidade.

6. A pena de prisão aplicada à recorrente A. é excessiva pois a ela deveria ter sido aplicada o regime penal especial para jovens.

7. Em qualquer dos casos, deveriam ter sido previstas excepções para a condição de não se poder a aqui recorrente ausentar de casa, fora das vinte e uma horas no Verão e dezoito horas nas outras estações do ano, atento o facto de aquela ser mãe duma criança de cinco meses.

Assim, deverá a pena de prisão efectiva aplicada ao arguido R. ser suspensa, com sujeição a condições ou em alternativa ser declarada nula, por falta de fundamentação da denegação da suspensão da pena de prisão e a pena aplicada à recorrente A. ser especialmente reduzida, devendo a condição de permanência na residência fora de horas estipuladas ser objecto de certas excepções, nos termos acima indicados.


*

O Exmº Procurador-geral Adjunto neste Tribunal da Relação emitiu douto parecer no sentido da improcedência dos recursos.

Cumprido o disposto no artigo 417 n.º 2 do Código de Processo Penal.


*

B - Fundamentação:

B.1. Pelo Tribunal recorrido foram dados como provados os seguintes factos:

1. No dia 18… de …de 2009, cerca das 06:00 horas, os arguidos dirigiram-se ao edifício sede da Associação ….. Covilhã, utilizando a viatura ligeira de passageiros de marca …., modelo …. de cor vermelha e matrícula XO…. conduzida pelo arguido R., com o propósito de se apoderarem de dinheiro ou outros objectos que ali encontrassem, fazendo-os seus, como antes por todos projectado e acordado.

2. Quem entrou na dita Associação foram os arguidos S. enquanto os arguidos R. e A. estavam no interior do referido veículo, à espera dos seus companheiros.

3. Os arguidos entraram na sede da A… utilizando um muro que circunda a dita Associação, para dali saltarem para o telhado, o qual possui uma clarabóia que se encontrava aberta e de novo saíram pelo mesmo.

4. Consigo trouxeram um cofre com a quantia de 1.200 Euros, cofre esse que deitaram do telhado para a via pública, e que os dois outros arguidos recolheram para o veículo automóvel.

5. Os arguidos utilizaram dois pares de luvas de felpo de cor preta e cinzenta e um par de luvas de trabalho de cor cinzenta.

6. O arguido R. não é detentor de carta de condução.

7. Os arguidos agiram de modo livre, voluntário e conscientemente, em obediência ao plano por eles traçado de se deslocarem àquele local – sede da A… - e de se apropriarem dos bens e dinheiro que lá se encontrassem, como de facto se apropriaram, sabendo que não eram seus, e que ao agir deste modo, actuavam contra a vontade dos respectivos proprietários.

8. O arguido R. quis exercer a condução automóvel bem sabendo que não era detentor de documento que para tal o habilitasse.

9. Sabiam os arguidos que o comportamento que tomavam lhes era proibido e punido por lei penal.

10. Os arguidos confessaram os factos.

11. Os arguidos R. registam passado criminal:

O arguido R. já foi condenado pela prática, em …-2007, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203º do Código Penal, no 1º Juízo do Tribunal Judicial da Covilhã, numa pena de multa, no montante de € 350,00; foi também condenado pela prática, em ….-2007, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º do DL 2/98, de 3 de Janeiro, no … Tribunal Judicial da Covilhã, numa pena de multa, no montante de € 900,00; foi ainda condenado pela prática, em ….-2007, dos crimes de furto e uso de veículo, p. e p. pelo artigo 208º do Código Penal, de condução sem habilitação legal, na forma continuada, p. e p. pelo artigo 3º, nº 1 do DL 2/98, de 3 de Janeiro, também por referência ao artigo 30º, nº 2 do Código Penal, e de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º, nºs 1 e 2 do DL 2/98, de 3 de Janeiro, no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Santa Comba Dão, numa pena de 1 ano e 2 meses de prisão, suspensa por igual período, condicionada ao dever de pagamento da indemnização devida à sociedade ofendida, no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado, e numa pena de multa, no montante de € 1.560,00.

O arguido S. já foi condenado pela prática, em ---2004, de um crime de passagem de moeda falsa, p. e p. pelo artigo 262º do Código Penal, no .. Tribunal Judicial da Covilhã, numa pena de 10 meses de prisão, substituída por multa, no montante de € 1.080,00.

12. Contra os arguidos P. e S. foi deduzida acusação e realizado julgamento em Processo Sumário, no Tribunal Judicial da Covilhã, por em …./2009 praticarem novo furto na área daquela comarca, encontrando-se designado o dia …./2009, pelas 10:00 horas, para a leitura da sentença.

13. Os arguidos R. e A. são companheiros e vivem com o pai do primeiro e uma filha de ambos, com cinco meses de idade.

Actualmente encontram-se desempregados e a casa onde vivem está desprovida de água e electricidade, por falta de pagamento, uma vez que apenas sobrevivem com a pensão do pai do R. e com o subsídio da filha menor, contando com alguma ajuda por parte da família da A.. O arguido R. por vezes faz trabalhos de carácter sazonal, sem rendimento fixo, e está à espera de ser chamado para trabalhar na apanha do pimento.

O arguido P. é estudante, frequentando um curso de Operador de Informática e mora com os pais, que o sustentam financeiramente.

O arguido S. é trabalhador fabril, auferindo mensalmente entre € 400,00 a € 450,00, vive sozinho, em casa arrendada, pagando mensalmente a quantia de € 150,00, a título de renda e além das despesas domésticas habituais está a pagar mensalmente ao banco uma prestação de € 100,00, para amortização do empréstimo que contraiu para aquisição do veículo automóvel identificado nos autos.

14. Todos os arguidos são consumidores de haxixe.

15. A ofendida teve um prejuízo de cerca de 1.200 Euros.


*

Não existem factos não provados.

*

E fundamentou a sua apreciação da prova nos seguintes considerandos:

“A convicção do tribunal resultou de uma apreciação global da prova, em conjugação com as regras da experiência comum.

De referir, desde logo, a confissão integral e sem reservas dos arguidos.

Ainda a deslocação do tribunal ao local dos factos, onde os arguidos explicaram como entraram e como saíram do edifício sede da A..

Também o depoimento da testemunha Rui, que referiu a quantia que se encontrava no cofre.

Outrossim, e por fim, todos os documentos juntos aos autos”.


*

Cumpre decidir.

B.2 – O âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso, designadamente, a verificação da existência, ou não, dos vícios indicados no art. 410°, n.° 2, do Código de Processo Penal de acordo com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das secções do STJ de 19/10/95 in D.R., I-A de 28/12/95.

São, assim, questões suscitadas pelo recorrente, abarcando todos os pontos referidos nas conclusões apresentadas:

1) – Da nulidade da sentença e dos fundamentos para a não suspensão da pena;
2) - Da aplicação do regime especial para jovens adultos;
3) – Da medida concreta da pena da arguida e seu regime de execução.

Não está o tribunal de recurso impedido, no entanto, de conhecer dos vícios referidos no art. 410º, nº 2 do Código de Processo Penal, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, designadamente a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório na apreciação da prova.

O recurso pode ainda ter como fundamento, mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada – nº 3 do referido preceito.


*

B.2 – Alegam os recorrentes nulidade da sentença por inexistência de fundamentação da denegação da suspensão da pena aplicada ao arguido R.

Esta a conclusão do recorrente, não obstante se poder considerar que o recorrente alega insuficiência da fundamentação, como aliás se deduz claramente das suas motivações.

E, de facto, não ocorre inexistência de fundamentação já que o tribunal, de forma explícita, invoca anterior suspensão da pena para afastar nova aplicação por a supor improdutiva.

Não se trata, pois, de uma questão de nulidade, que não ocorre, sim de apurar se as razões adiantadas pelo tribunal recorrido fundamentam de forma suficiente a sua decisão.

O que reconduz a análise da questão para momento lógico posterior.


*

B.3 – Do arguido R.

Relativamente à pretendida suspensão da execução da pena haverá que concluir ser desfavorável a prognose a fazer quanto ao comportamento do arguido.

Analisando os dados constantes dos autos constatamos, no entanto, que quanto ao arguido R. nenhum dos critérios se mostra preenchido.

O arguido não exerce profissão regular, vive em família desestruturada, não se tendo apurado – na actualidade - qualquer modo lícito de auferir rendimentos. Tem vários antecedentes criminais inscritos no CRC.

Neste campo resta acrescentar que, contrariamente ao alegado nas suas conclusões de recurso, o arguido não “procura” trabalho. Deu o tribunal recorrido que ele “espera” trabalho que, “por vezes”, faz. E, aqui e como sempre, os verbos fazem a diferença.

Aqui uma situação passiva face ao mercado de trabalho e a uma previsível maior dificuldade de reinserção. Ali uma ideal situação que se exigia pró-activa e reintegrativa.

A uma actuação passiva face ao mercado de trabalho tem correspondido uma situação activa na prática de ilícitos criminais.

Daí que o arguido tenha sido já condenado por crimes da mesma natureza, onde beneficiou já de suspensão da pena, as quais se revelaram ineficazes para evitar que o arguido voltasse a delinquir.

No caso, o tratamento mais favorável, porque mais tolerante, ao invés de favorecer a inserção do arguido numa sociedade que ele normativamente entenda, irá ser um balão de oxigénio para o sentimento de impunidade favorecendo nele a ideia de uma concreta impunidade.

Todos os factos e juízos de prognose evidenciados revelam que inexistem perspectivas imediatas de reinserção social e, logo, a ausência de vantagens para a dita reinserção numa suspensão da pena.

Assim como as apontadas razões e as necessidades de prevenção desaconselham a suspensão da sua pena.

Não há, portanto, insuficiência na motivação do tribunal recorrido.


*

B.4 – Do regime especial para jovens adultos – arguida A.

Na determinação da pena concreta, o Tribunal deve levar em conta o disposto no n° 1, do artigo 71°, do Código Penal.

Deste resulta, como é doutrina maioritária e proveniente de Coimbra, que incumbe ao tribunal operar as duas (ou três) operações referidas pelo Prof. Figueiredo Dias e aceites pela jurisprudência:

1 - Determinar a moldura penal abstracta correspondente aos factos provados;

2 - Determinar o quantum concreto da pena em que o arguido deve ser condenado. - Prof. Figueiredo Dias, in “As consequências jurídicas do crime”, pag. 193, Editorial Notícias, 1993.

Naquela primeira operação haverá que fazer a análise que permita concluir pela existência ou operatividade, no caso concreto, de alguma circunstância modificativa comum, seja agravante, seja atenuante.

No caso, impõe-se apurar se a circunstância modificativa comum atenuante prevista no artigo 4º do Dec-Lei nº 401/82, de 23-09, que institui o regime aplicável em matéria penal aos jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, é aplicável

Dispõe o dito preceito que “se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73.º e 74.º do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”.

Como se afirma no preâmbulo do diploma, “(4) o princípio geral imanente em todo o texto legal é o da maior flexibilidade na aplicação das medidas de correcção que vem permitir que a um jovem imputável até aos 21 anos possa ser aplicada tão-só uma medida correctiva.

Trata-se, em suma, de instituir um direito mais reeducador do que sancionador, sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção.

(7) As medidas propostas não afastam a aplicação - como ultima ratio - da pena de prisão aos imputáveis maiores de 16 anos, quando isso se torne necessário, para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade, e esse será o caso de a pena aplicada ser a de prisão superior a 2 anos”.

Temos, pois, que o critério para apreciar da aplicação do referido regime legal se limita à análise das eventuais vantagens para a reinserção social do jovem condenado e resultantes da atenuação.

Não se trata, portanto, de um raciocínio automático que faça corresponder uma atenuação especial a um determinado nível etário nem, por apelo a uma “psico-sociologia do coitadinho”, de conceder sempre a atenuação especial por graça ou mercê, sim de apurar se há “sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”.

Esta, a atenuação, haverá, por seu turno, que atender à sua situação pessoal, familiar e socioprofissional, mas também à relação que é necessário estabelecer entre a personalidade dos arguidos e à prognose quanto ao seu comportamento futuro.

Não estamos, portanto, face a uma análise genérica que abarque indistintamente todos os arguidos, mas perante um juízo individual, em função dos sobreditos critérios.

Para este desiderato verificamos que a arguida recorrente pode, em termos de pressupostos legais, beneficiar da atenuação especial contida no artigo 4º do Dec-Lei nº 401/82, pois que menor de vinte e um anos de idade à data da prática dos factos.

Estamos em sede de processo sumário, com as inerentes dificuldades de obter mais profundas informações sobre a situação socioprofissional da arguida e suas perspectivas de reinserção, integradas num estudo de acompanhamento da sua vivência.

Mas o tribunal recorrido – no facto provado 13, 1º parágrafo – deu um razoável (na medida do possível) enquadramento da vida da arguida.

Se o enquadramento geral – a conduta do conjunto dos arguidos - é muito mau, de negativo na conduta da arguida apenas se surpreende a co-autoria a que os autos se reportam.

A arguida não tem antecedentes criminais e não tem outros processos pendentes.

E, não obstante, revela um conjunto de circunstâncias – pequeno, embora - de pendor positivo, designadamente o apoio familiar e a circunstância de ter uma filha de poucos meses de idade, causa habitualmente motivadora para a positividade.

De tudo redunda um juízo positivo (conquanto na fronteira da admissibilidade) que permite concluir existirem vantagens na atenuação especial da pena no âmbito do regime jurídico para jovens adultos.

Sendo um juízo de maior dificuldade a emitir relativamente ao conjunto de arguidos, é de considerar que a ausência de antecedentes criminais e de processos pendentes permite a álea na sua admissão e se entende adequado correr tal risco, em benefício da arguida.

Temos, portanto, uma moldura penal abstracta diferenciada para a arguida com um mínimo de 1 (um) mês a um máximo de 5 (cinco) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de prisão.


*

B.5 - Analisemos, então, a medida concreta da pena.

Definida a moldura penal abstracta, haverá que encontrar o quantum concreto da pena a aplicar à arguida, aqui na segunda e última operação supra referida, pois que o tipo de ilícito apenas a pena de prisão prevê.

Na determinação desse quantum concreto haverá que fazer apelo às necessidades de prevenção e à culpa da arguida, na sequência do comando contido no artigo 71º, nº 2 do Código Penal.

É afirmação habitual da doutrina, com seguimento jurisprudencial, - V. g., dos mais recentes, os Acs. do STJ de 24-01-2007 (06P4345), de 25-10-2006 (06P2938) e de 21-03-2007 (07P790). que a prevenção geral positiva ou de integração, com o intuito de tutela dos bens jurídicos é a finalidade primeira da aplicação de uma pena, não fazendo esquecer a prevenção especial ou de socialização, a reintegração do agente na sociedade - art. 40.º, n.º 1, do CP.

Funcionando em “ambivalência” com as necessidades de prevenção, a culpa, a vertente pessoal do crime, o cunho da personalidade do agente tal como vertida no facto, funciona como um limite às exigências de prevenção geral.

Assim, o limite máximo da pena fixar-se-á, em função da dignidade humana do condenado, pela medida da culpa revelada, que assim a delimitará, por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que social e normativamente se imponham, enquanto o seu limite mínimo é delimitado pelo quantum da pena que em concreto ainda realize eficazmente aquela protecção dos bens jurídicos.

Apuremos, então, quais os elementos de facto determinantes para a determinação da pena concreta, nos termos do artigo 71.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal.

Desde logo se deve levar em conta a elevada ilicitude dos factos e a necessidade de tutela efectiva dos bens jurídicos protegidos que, aqui, se limitam aos patrimónios.

Haverá que relembrar que a arguida agiu com dolo directo e que a sua culpa é intensa.

O diminuto valor subtraído/causado será circunstância que denota pouca necessidade de prevenção.

O mesmo não ocorre com a necessidade de prevenção de futuros crimes, já que as circunstâncias da prática dos mesmos exigem maior rigor e severidade, dada a actuação em grupo. É prática que, por imposição de defesa da sociedade, se impõe reprovar seriamente.

São, pois, circunstâncias atinentes ao facto, sua forma de execução e à personalidade do agente, que determinarão que a pena proposta cumpra a “função contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violada”, na terminologia de Jakobs.

Entende-se, pois, que se enquadra na culpa da arguida a pena de 9 (nove) meses de prisão, suspensa por um ano e sujeita ao regime de prova fixado pelo tribunal recorrido porque os factos o justificam face ao critério legal permissivo da suspensão, designadamente a “prognose social favorável” pelas razões já apontadas.

E, por essas mesmas razões – apoio familiar e filha de poucos meses de idade e considerando que o arguido – seu companheiro - terá que cumprir pena efectiva, é excluída do regime de suspensão e prova a proibição de se ausentar do seu domicílio que havia sido imposta pelo tribunal recorrido.


***

C - Dispositivo

Assim, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal deste tribunal em declarar parcialmente procedente o recurso interposto e, em consequência, altera-se a decisão do tribunal recorrido no que à arguida A diz respeito, nos seguintes termos.

Reduz-se a pena da arguida para 9 (nove) meses de prisão, suspensa por um ano;

É excluída do regime de suspensão e prova a proibição de se ausentar do seu domicílio que havia sido imposta pelo tribunal recorrido.

No mais mantém-se a douta sentença recorrida.

Sem custas.

Coimbra, 20 de Janeiro de 2010 (elaborado e revisto pelo relator antes de assinado).

João Gomes de Sousa

Calvário Antunes