Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4790/11.7TBLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARTUR DIAS
Descritores: RECONHECIMENTO DE ASSINATURAS
ADVOGADO-ESTAGIÁRIO
Data do Acordão: 06/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE LEIRIA – 3º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 38º DO DEC.LEI Nº 76-A/2006, DE 29/03.
Sumário: De acordo com o artigo 38º do Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29/03, a extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas às entidades e profissionais indicados no respectivo nº 1 – aí se incluindo os advogados-estagiários da segunda fase do estágio que actuem sob orientação do patrono – abrange todos os reconhecimentos de assinaturas, simples ou com menções especiais, sem qualquer exclusão, nomeadamente dos reconhecimentos de assinaturas feitas a rogo.
Decisão Texto Integral: Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

                1. RELATÓRIO

                M… e marido L…, residentes na Rua …;

                D… e marido J…, residentes na Rua …; e

P… e mulher C…, residentes na Rua …,

todos representados pelo Ex.mo Sr. Advogado …, intentaram, em 13/09/2011, acção declarativa, com processo comum e forma sumária, contra

V… e mulher F…, residentes na Rua …,

Formulando o seguinte pedido:

“a) Ser declarado que sobre o prédio dos RR., descrito no artigo 8º desta P.I. se acham constituídas as seguintes servidões de passagem de pé, carro, tractor e alfaias agrícolas, com a largura de 4 metros e com início na rua da Camarneira:

i) A favor do prédio dos AA. M… e marido L… identificado no artigo 1º desta P.I e numa extensão de 57,14 metros.

ii) A favor do prédio dos AA. D… e marido J… identificado no artigo 2º desta P.I. e numa extensão de 76,23 metros.

iii) A favor do prédio dos AA. P… e mulher C… identificado no artigo 3º desta P.I. e numa extensão de 79,04 metros.

b) Condenar-se os RR. a reconhecer esta situação e absterem-se de todos e quaisquer actos impeditivos e/ou perturbadores da passagem e acesso para os prédios dos AA.”.

                Alegaram para tanto, em síntese, que os primeiros AA. são donos e legítimos possuidores de um prédio composto de pinhal, sito em …, o qual se encontra inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo nº … com aquisição a favor deles registada na Conservatória do Registo Predial de Leiria sob o nº … da indicada freguesia; que, por sua vez, os segundos AA. são donos e legítimos possuidores de um prédio igualmente sito no indicado lugar de …, composto de pinhal e mato o qual se encontra inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo nº … com aquisição a favor deles registada na Conservatória do Registo Predial de Leiria sob o nº … da indicada freguesia; que os terceiros AA. são donos e legítimos possuidores de um prédio igualmente sito no indicado lugar de …., composto de pinhal e mato o qual se encontra inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo nº … com aquisição a favor deles registada na Conservatória do Registo Predial de Leiria sob o nº … da indicada freguesia; que tais prédios não têm comunicação com a via pública, sempre deles se tendo acedido à mesma, a pé, de carro, carroça e tractor, pelo caminho em terra batida assinalado no croqui que juntaram; que, assim, se constituiu a seu favor, por usucapião, uma servidão de passagem; que o indicado caminho, que descrevem, atravessa o prédio dos RR. actualmente constituído por um terreno de eucaliptos de plantação recente que se encontra inscrito na matriz predial rústica da freguesia de …; e que os RR., no Verão de 2010, cavaram o leito do aludido caminho, estenderam ao mesmo a plantação de eucaliptos e bloquearam a respectiva entrada com cepos de grandes dimensões, assim impedindo a passagem dos AA. para os seus prédios.

                Os RR. contestaram, aceitando a existência de uma servidão de passagem constituída a favor dos prédios dos AA., não com o trajecto e características por eles alegadas, mas antes com o traçado definido no mapa que juntaram, pela qual os AA. podem continuar a passar, pois se encontra desimpedida.

                Por despacho de 13/06/2012, com fundamento em que as procurações dos AA.  D… e marido J… se mostram assinadas por terceiro, a rogo, e reconhecidas por uma Sr.ª advogada estagiária e não, como deveriam, por notário, a Mª Juíza do processo convidou os referidos AA. a juntarem procurações que reunissem os apontados requisitos legais.

                Os AA. em causa pediram a reforma daquele despacho, sustentando que o reconhecimento das assinaturas feito pela Sr.ª advogada estagiária é válido, o que foi indeferido por despacho de 10/07/2012.

                Os AA. requereram a junção aos autos de nova procuração emitida pelo A. J…, não apresentando a procuração da co-autora mulher com o fundamento de que a mesma se recusa a outorgá-la, pedindo ainda a “prossecução dos autos com as partes legitimadas”.

                Com data de 23/01/2013, foi proferido o despacho seguinte:

                “Atendendo à falta de junção de procuração forense pela A. D…, fica sem efeito a ação instaurada pela mesma.

Risque da petição inicial, da capa do processo e do sistema informático, o nome da mesma como A..

Notifique AA. e RR. para se pronunciarem, querendo, pelo prazo de 10 dias, acerca da legitimidade/ilegitimidade para o A. J… intervir nos presentes autos como A., desacompanhado da sua cônjuge, com quem é casado no regime da comunhão geral de bens – art.º 3º, n.º 3, 2ª parte do C.P.C..”

Não tendo os AA. reagido, foi marcada uma audiência preliminar para cuja acta foi ditado o seguinte despacho:

“Na sequência da falta de junção de procuração pela A. D…, foi dada sem efeito a ação relativamente à mesma.

Consequentemente, o A. J… passa a figurar nos autos como autor desacompanhado da respetiva cônjuge.

Do objeto da ação resulta que este A. pretende, através deste processo, ver reconhecida uma servidão de passagem constituída por usucapião a favor de imóvel de que se arroga proprietários sobre o imóvel dos RR..

Sendo o prédio alegadamente dominante um bem comum do casal, e salvo melhor entendimento, só ambos os cônjuges podem conjuntamente demandar os RR. para tal desiderato.

Consequentemente, e por força do disposto no art.º 28º-A do C.P.C., configura-se aqui a violação de um litisconsórcio necessário ativo, o que acarreta a ilegitimidade do A. J… para intervir nos autos desacompanhado da sua cônjuge.

Por todo o exposto, ao abrigo do previsto no art.º 508º, n.º 1, al. a) do C.P.C., convida-se o A. J… a, no prazo de 10 dias, suprir esta sua ilegitimidade processual ativa, nomeadamente através do incidente de intervenção de terceiros, sob pena de absolvição da instância.”

Como o A. J… manteve total passividade, foi, em 31/10/2013, proferida a seguinte decisão:

“Na sequência da falta de junção de procuração pela A. D…, foi dada sem efeito a ação relativamente à mesma.

Por força desta decisão o A. J… passou a figurar nos autos como autor desacompanhado da respetiva cônjuge.

Do objeto da ação resulta que este A. pretende, através deste processo, ver reconhecida uma servidão de passagem constituída por usucapião a favor de imóvel de que se arroga proprietário sobre o imóvel dos RR..

Prevê o art.º 34º, n.º 1 do C.P.C. (art.º 28º-A do anterior C.P.C.) que devem ser propostas por ambos os cônjuges, ou por um deles com consentimento do outro, as ações de que possa resultar a perda ou a oneração de bens que só por ambos possam ser alienados ou a perda de direitos que só por ambos possam ser exercidos, incluindo as ações que tenham por objeto, direta ou indiretamente, a casa de morada de família.

Sendo o prédio alegadamente dominante um bem comum do casal, e salvo melhor entendimento, só ambos os cônjuges podem conjuntamente demandar os RR. para o mencionado desiderato, pelo que configura-se aqui a violação de um litisconsórcio necessário ativo, o que acarreta a ilegitimidade do A. José Alexandre para intervir nos autos desacompanhado da sua cônjuge.

Oportunamente, e ao abrigo do previsto no art.º 508º, n.º 1, al. a) do anterior C.P.C., foi convidado o A. J… a, no prazo de 10 dias, suprir esta sua ilegitimidade processual ativa, nomeadamente através do incidente de intervenção de terceiros, sob pena de absolvição da instância dos RR..

Expirado, há muito, o prazo concedido, nem o A. J… ou qualquer dos outros AA. supriram esta ilegitimidade.

Acresce que, tal como se mostram alegados, as causas de pedir e os pedidos referentes aos AA. P… e esposa, C…, e M… e marido, L…, são incindíveis relativamente à causa de pedir e ao pedido do A. J…, pelo que a ilegitimidade verificada e que agora vai declarada estende-se a todos os AA. e, como tal, a absolvição da instância dos RR. é relativamente à totalidade da ação.

Por todo o exposto, ao abrigo do previsto nos art.ºs 34º, n.º 1, 576º, n.ºs 1 e 2, 577º, al. e) e 578º do C.P.C., declaro o A. J… parte ilegítima para intervir nos autos desacompanha da sua cônjuge, e, consequentemente, atendendo a que esta ilegitimidade se estende aos demais AA., absolvo da instância os RR. V… e F….

Mais se decide condenar os AA. solidariamente ao pagamento das custas do processo, por força do previsto no art.º 526º do C.P.C..”

                Inconformados, os AA. interpuseram recurso, encerrando a alegação apresentada com as seguintes conclusões:

Os recorridos responderam, defendendo o não provimento do recurso e a manutenção do julgado.

O recurso foi admitido.

Nada a tal obstando, cumpre apreciar e decidir.

                Tendo em consideração que, de acordo com o disposto nos artºs 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. Proc. Civil aplicável[1], é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, constata-se que à ponderação e decisão deste Tribunal foram colocadas as seguintes questões:

                a) (Ir)regularidade do mandato forense formalizado através da procuração de fls. 24, outorgada pela A. D… e subscrita, a rogo, por aquela não saber assinar, por “R…”;

                b) (I)legitimidade do marido, o A. J…, para, desacompanhado da cônjuge, dar prosseguimento à acção;

                c) Extensão dessa ilegitimidade aos restantes AA.

                Salienta-se que não tendo nem podendo ter sido objecto de recurso autónomo (artº 644º), as decisões de fls. 72/73, 77, 83 e 85/86 não constituíram caso julgado formal, nada impedindo a sua impugnação no recurso interposto da decisão de fls. 89/90.

                2. FUNDAMENTAÇÃO

                2.1. De facto

                A factualidade e incidências processuais relevantes para a decisão do recurso são as que decorrem do antecedente relatório, aqui dado por reproduzido para todos os efeitos legais, e ainda as seguintes:

                a) A assinatura “R…”, aposta, a rogo, na procuração de fls. 24, outorgada pela A. D…, mostra-se reconhecida presencialmente por P…, Advogada Estagiária, detentora da cédula profissional nº …;

                b) O reconhecimento foi registado em 2011/03/04, como nº …[2];

c) A procuração referida tem o teor seguinte:

“PROCURAÇÃO

            D…, casada, residente na Rua …, constitui seus bastantes procuradores forenses o Sr. Dr. … e a Srª. Dr.ª …, Advogado e Advogada-Estagiária, com escritório em Rua …, a quem concedem poderes forenses gerais.

            Leiria, 3 de Março de 2011.”

                (Segue-se uma impressão digital e a assinatura manuscrita “R…”).

d) Na Conservatória do Registo Predial de Leiria, sob o nº … da freguesia de …, encontra-se descrito um prédio rústico, composto de terra de pinhal e mato, …;

                e) Na mesma Conservatória encontra-se, através da Ap. 10930 de 2010/12/02, a aquisição do prédio referido na alínea anterior registada a favor de D…, casada com J… no regime de comunhão geral.

                2.2. De direito

                Estabelece o artº 373º, nºs 1, 3 e 4 do Código Civil:

1. Os documentos particulares devem ser assinados pelo seu autor, ou por outrem a seu rogo, se o rogante não souber ou não puder assinar.

2. (…).

3. Se o documento for subscrito por pessoa que não saiba ou não possa ler, a subscrição só obriga quando feita ou confirmada perante notário, depois de lido o documento ao subscritor.

4. O rogo deve igualmente ser dado ou confirmado perante notário, depois de lido o documento ao rogante.

                Embora, de acordo com o nº 1 do artº 2º do Código do Notariado, o órgão próprio da função notarial seja o notário, o artº 3º do mesmo diploma legal estabelece algumas excepções. Com efeito, aí se dispõe:

1 - Excepcionalmente, desempenham funções notariais:

a) Os agentes consulares portugueses;

b) Os notários privativos das câmaras municipais e da Caixa Geral de Depósitos recrutados, de preferência, de entre os notários de carreira;

c) Os comandantes das unidades ou forças militares, dos navios e aeronaves e das unidades de campanha, nos termos das disposições legais aplicáveis;

d) As entidades a quem a lei atribua, em relação a certos actos, a competência dos notários.[3]

2 - Em caso de calamidade pública podem desempenhar todos os actos da competência notarial quaisquer juízes ou sacerdotes e, bem assim, qualquer notário, independentemente da área de jurisdição do respectivo serviço.

3 - Os actos praticados no uso da competência de que gozam os órgãos especiais da função notarial devem obedecer ao preceituado neste Código, na parte que lhes for aplicável.

                Ora, sob a epígrafe «Extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas e autenticação e tradução de documentos», preceitua o artº 38º do Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29/03:

1 – Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei n.º 244/92, de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial.

2 – Os reconhecimentos, as autenticações e as certificações efectuados pelas entidades previstas nos números anteriores conferem ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial.

3 – Os actos referidos no n.º 1 apenas podem ser validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça.

4 – Enquanto o sistema informático não estiver disponível, a obrigação de registo referida no número anterior não se aplica à prática dos actos previstos nos Decretos-Leis n.ºs 237/2001, de 30 de Agosto, e 28/2000, de 13 de Março.

5 – O montante a cobrar, pelas entidades mencionadas no n.º 3, pela prestação dos serviços referidos no n.º 1, não pode exceder o valor resultante da tabela de honorários e encargos aplicável à actividade notarial exercida ao abrigo do Estatuto do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 26/2004, de 4 de Fevereiro.

                Embora o nº 1 da disposição legal transcrita se não refira expressamente aos advogados estagiários, devem os mesmos, desde que estejam já na segunda fase do estágio e actuem sob orientação do patrono, considerar-se incluídos na previsão, pois que, nos termos do artº 189º, nº 1, al. a) do Estatuto da Ordem dos Advogados, estando na indicada fase do estágio e actuando sob a referida orientação, podem praticar todos os actos da competência dos solicitadores e a estes é ali feita explícita menção[4].

                No caso dos autos, a Sr.ª Advogada-Estagiária estava efectivamente na segunda fase do estágio, uma vez que era já titular e detentora da competente cédula profissional (artº 188º, nº 3 do EOA) e não só não foi alegado, como nada inculca que não actuasse sob orientação do patrono, antes sendo aquela orientação sugerida pelo teor da procuração[5].

                Não se levantam também quaisquer dúvidas quanto à realização do registo em sistema informático referido nos nºs 3 e 4.

                A questão que verdadeiramente se levanta é a de saber se a extensão aos advogados e advogados estagiários na situação atrás indicada, da competência para o reconhecimento de assinaturas abrange todo e qualquer reconhecimento, ou se existem excepções, nomeadamente no tocante ao reconhecimento de assinaturas feitas a rogo.

Dispõe o artº 153º do Cód. do Notariado:

1 - Os reconhecimentos notariais podem ser simples ou com menções especiais.

2 - O reconhecimento simples respeita à letra e assinatura, ou só à assinatura, do signatário de documento.

3 - O reconhecimento com menções especiais é o que inclui, por exigência da lei ou a pedido dos interessados, a menção de qualquer circunstância especial que se refira a estes, aos signatários ou aos rogantes e que seja conhecida do notário ou por ele verificada em face de documentos exibidos e referenciados no termo.

4 - Os reconhecimentos simples são sempre presenciais; os reconhecimentos com menções especiais podem ser presenciais ou por semelhança.

5 - Designa-se presencial o reconhecimento da letra e assinatura, ou só da assinatura, em documentos escritos e assinados ou apenas assinados, na presença dos notários, ou o reconhecimento que é realizado estando o signatário presente ao acto.

6 - Designa-se por semelhança o reconhecimento com a menção especial relativa à qualidade de representante do signatário feito por simples confronto da assinatura deste com a assinatura aposta no bilhete de identidade ou documento equivalente emitidos pela autoridade competente de um dos países da União Europeia ou no passaporte ou com a respectiva reprodução constante de pública-forma extraída por fotocópia.

                Preceitua, por sua vez, o artº 154º do Cód. do Notariado:

1 - A assinatura feita a rogo só pode ser reconhecida como tal por via de reconhecimento presencial e desde que o rogante não saiba ou não possa assinar.

2 - O rogo deve ser dado ou confirmado perante o notário, no próprio acto do reconhecimento da assinatura e depois de lido o documento ao rogante.

Das disposições legais transcritas é possível extrair diversas conclusões. A primeira é a de que as espécies de reconhecimentos notariais se reduzem a duas: simples ou com menções especiais[6]. A segunda é a de que os reconhecimentos podem ser presenciais ou por semelhança, sendo que os simples são sempre presenciais e os com menções especiais podem ser presenciais ou por semelhança. A terceira é a de que, embora o reconhecimento de assinatura feita a rogo seja um reconhecimento com menções especiais, deve ser presencial. A quarta é a de que a extensão às entidades e profissionais referidos no artº 38º, nº 1 do Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29/03, nomeadamente aos advogados e advogados estagiários na situação acima mencionada, da competência para o reconhecimento de assinaturas abrange ambas as espécies de reconhecimentos: simples ou com menções especiais, incluindo, pois, o reconhecimento de assinaturas feitas a rogo[7].

Efectivamente, reduzindo-se a duas as espécies de reconhecimentos notariais – simples ou com menções especiais – e afirmando o artº 38º, nº 1 do Decreto-Lei nº 76-A/2006 que as entidades e profissionais ali mencionados podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, não restam dúvidas de que tais entidades estão legalmente habilitadas a fazer todos os reconhecimentos, exactamente como os notários.

Isso mesmo inculca o artº 708º do NCPC (artº 51º do anterior CPC, com a redacção dada pelo Decreto-Lei nº 116/2008, de 04/07), segundo o qual qualquer documento assinado a rogo só goza de força executiva se a assinatura estiver reconhecida por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal.

Ou seja, contra o que foi entendido pela 1ª instância, o reconhecimento de assinaturas feitas a rogo não foi excluído da extensão do regime dos reconhecimentos feita pelo artº 38º do Decreto-Lei nº 76-A/2006 a favor das entidades e profissionais mencionados no respectivo nº 1.

Assim sendo – como nos parece ser – a procuração forense outorgada pela A. D… a favor dos seus ilustres mandatários, junta a fls. 24, não padece da irregularidade ou invalidade que lhe foi apontada pela 1ª instância, não havendo fundamento para a exigência de substituição da mesma por outra com intervenção notarial, nem para ter sido dada sem efeito, com base na omissão dessa substituição, a acção instaurada pela dita D…, em litisconsórcio com o marido. E, consequentemente, não padece o referido marido – J… – de ilegitimidade processual activa, ilegitimidade essa que, a existir, nunca se estenderia aos AA. M… e marido L… e P… e mulher C…

Com efeito, os três casais AA. não estão entre si numa relação de litisconsórcio, seja voluntário, seja necessário, antes estando numa relação de coligação, pois demandaram conjuntamente o casal dos RR. por pedidos diferentes, embora com a mesma e única causa de pedir. Isto é, cada casal dos AA., na qualidade de proprietários de prédios distintos, pediu o reconhecimento de uma servidão de passagem a favor do seu próprio prédio, ainda que tais servidões assentem, ao menos parcialmente, sobre a mesma parcela de terreno do prédio dos RR.

Do que fica exposto decorre claramente, a nosso ver, que assiste razão aos recorrentes, devendo, por isso, a apelação proceder e as decisões recorridas ser revogadas.

Sumário:

De acordo com o artigo 38º do Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29/03, a extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas às entidades e profissionais indicados no respectivo nº 1 – aí se incluindo os advogados estagiários da segunda fase do estágio que actuem sob orientação do patrono – abrange todos os reconhecimentos de assinaturas, simples ou com menções especiais, sem qualquer exclusão, nomeadamente dos reconhecimentos de assinaturas feitas a rogo.

                3. DECISÃO

                Face ao exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação e, consequentemente, em revogar as decisões recorridas.

                As custas são a cargo dos recorridos.

Coimbra, 2014/06/03

Artur Dias (Relator)

Jaime Ferreira

 Jorge Arcanjo

[1] Que é, face à data da decisão recorrida e ao disposto nos artºs 5º, nº 1 e 7º, nº 1 da Lei nº 41/2013, de 26/06, o aprovado por esta Lei. São dele todas as disposições legais adiante citadas sem menção da origem.

[2] É do seguinte teor o termo de reconhecimento:

“Reconhecimento Presencial

Artº 154º

  Reconheço a assinatura aposta na procuração forense de … que, por não saber assinar, conforme me declarou, solicitou o rogo à signatária por virtude de exprimir a sua vontade. Verifiquei a identidade da rogada, por ser do meu conhecimento pessoal e do rogante pela exibição do seu bilhete de identidade número … emitido em 3/02/1977 pelo Serviço de Identificação Civil de Lisboa. Li e expliquei em voz alta o conteúdo do presente e do documento anexo, tendo o rogante e a rogada confirmado o rogo.

  Monte Redondo, 4 de Março de 2011.

  Registo on line nº …”

   Seguem-se, sob a expressão «A Advogada–Estagiária», a assinatura «P…» e, sob a expressão «A Rogo», a assinatura «R…».

[3] Sublinhado nosso.

[4] Edgar Valles, Actos Notariais do Advogado, 5ª edição, págs. 55/56.

[5] Outorgada a favor do Sr. Advogado … e da Sr.ª Advogada Estagiária e indicando um só escritório.

[6] Edgar Valles, Obra citada, pág. 73.

[7] Edgar Valles, Obra citada, págs. 79/80.