Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
373/11.0PBVIS-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: PRISÃO PREVENTIVA
FUNDAMENTOS
Data do Acordão: 02/01/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: 1º JUÍZO CRIMINAL DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 191, 193, 196, 202, N.º 1, ALÍNEA A) E B) E 204, AL. A) A C) CPP
Sumário: Indiciando-se fortemente a prática em coautoria e em concurso real pelo arguido, para além de um crime de burla informática , um crime de sequestro e um crime de roubo, justifica-se a aplicação da prisão preventiva, atendendo não só à natureza e circunstância destes dois últimos crimes, os quais são geradores de forte e grave alarme social e perturbadores da ordem e tranquilidade públicas, em face do receio generalizado da população por crimes desta natureza, que têm vindo a ocorrer com cada vez maior frequência, assim criando um sentimento de insegurança que se sente atualmente, estando tal criminalidade associada a agentes jovens, com fraca inserção social e que fazem da prática deste tipo de crimes modo de vida, impondo-se terminar com a continuação da atividade criminosa nestes casos, repondo assim a paz social.
Decisão Texto Integral: No processo supra identificado foi proferido despacho que determinou a aplicação da medida de coação -prisão preventiva- ao arguido A....
Inconformado, vem interpor recurso de tal despacho, formulando as seguintes conclusões:
1. A medida de prisão preventiva aplicada ao arguido é excessiva, desnecessária, desproporcional e desadequada.
2. Ao aplicar tal medida de coação, o Tribunal não ponderou convenientemente todos os factos de que dispunha.
3. Assim, esqueceu-se de ponderar que os factos foram praticados em março de 2011 e que a medida de coação apenas foi aplicada 8 meses depois, quando as necessidades cautelares já não eram tão elevadas.
4. Nem o alarme social, volvidos 8 meses, era/é tão elevado.
5. Esqueceu-se o douto despacho de ponderar e valorar o comportamento do arguido desde a prática dos factos, não estando o mesmo indiciado e/ou referenciado pelas autoridades pela prática de outros factos.
6. Não teve o douto despacho ainda em consideração o facto do arguido ser primário.
7.Não ponderou a sua idade à data da prática dos factos, 21 anos, quando este beneficia ainda do regime especial dos Jovens Adultos.
8.O arguido tem apenas o 9º ano de escolaridade.
9.O Tribunal não ponderou as condições em que foram praticados os factos.
10. O arguido residia com o B... (outro suspeito), individuo com grande ascendente, de quem tem receio e medo.
11.O arguido foi ameaçado pelo B... a entrar no carro da vítima, temendo pela sua integridade física e ser, deixado em Viseu, cidade que desconhecia.
12.A sua atuação foi consequência de um ato de pânico sobre uma possível agressão por parte do B....
13. Indivíduo que se encontra atualmente preso, à ordem de outro processo, com quem o arguido não tem, desde a prática dos factos, qualquer tipo de relação.
14. Já relativamente ao outro suspeito, C..., o arguido apenas o conheceu por intermédio do B... e não teve mais contacto com o mesmo.
15.Quanto à vítima, desconhece por completo a sua identidade.
16. Não teve também o Tribunal em consideração que atualmente o arguido vivia com os seus pais, pessoas humildes, já de alguma idade.
17. O arguido sempre esteve integrado na sociedade, sendo-lhe conhecidos vários trabalhos, quer na construção civil, quer na apanha das pinhas.
18. E mesmo atualmente, apesar de desempregado ajudava os seus pais na agricultura, de onde o seu agregado familiar tirava o seu sustento.
Do DIREITO:
19.Ora, a esta factualidade acresce ainda a natureza dos crimes praticados e a sanção que previsivelmente venha a ser aplicada.
20. Não sendo de prever que a este arguido venha a ser aplicada uma pena de prisão efetiva.
21. A medida de coação aplicada ao arguido é excessiva, é violadora dos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade impostos no art. 193, n.º 1, e também o seu n.º 2 e 3.
22. A medida de prisão preventiva deve-se aplicar quando todas as outras se revelem inadequadas e insuficientes para prevenir o perigo de fuga ou do cometimento de novos crimes.
23. Violou ainda o disposto nos arts. 193, n.º 2 e 3, ao aplicar de imediato a pena de prisão subsidiária sem dar preferência à obrigação de permanência na habitação.
24.Ou seja, a prisão preventiva só é aplicável em último ratio.
25.Pelo que as medidas de coação para serem aplicadas deverão respeitar, também, os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade.
26.A medida aplicada foi-o sem que, em concreto, estivessem verificados os pressupostos do art. 204 do C.P.P.
27.Pois não se verifica qualquer perigo de fuga por parte do arguido (artigo 204, al. a) do C.P.P.), que se encontra integrado no seu seio familiar.
28.Não se verifica o perigo de perturbação do decurso do inquérito: o arguido tem sempre colaborado, desconhece a identidade da vítima e a sua localização; bem como nunca mais teve contacto com os outros suspeitos.
29.Quanto à continuação da atividade criminosa, deveria o tribunal a quo ter ponderado o comportamento do arguido desde março de 2011, o que não fez.
Deve o presente recurso ser procedente, revogando-se a medida de coação aplicada por violadora dos princ1p1os subjacentes à sua aplicabilidade, aplicando-se em concreto outra medida que seja necessária e adequada às exigências cautelares do caso concreto e proporcional à gravidade dos factos e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas, designadamente a obrigação de apresentação periódica, nos termos do art. 198 do C.P.P., ou por outra medida que entenderem por mais adequada e menos gravosa.
Respondeu o Magistrado do Mº Pº, concluindo:
1-A medida de coação aplicada não é excessiva, desnecessária, desproporcional e desadequada;
2-A gravidade dos factos e os crimes imputados ao arguido fazem prever que lhe venha a ser aplicada uma pena privativa da liberdade;
3- o facto de o arguido ter 21 anos à data da pratica dos factos e de não ter antecedentes criminais por si só não permitem, nesta fase processual, fazer qualquer juízo de prognose favorável ao arguido uma vez que o mesmo não demonstrou qualquer arrependimento, nem reconhecimento da elevada gravidade e desvalor da sua atuação, tendo revelado uma personalidade desajustada e desconforme ao direito, uma conduta antissocial e falta de valor ético-juridico, não se encontrando ainda nesta data nem social nem profissionalmente inserido;
4- o facto de terem decorridos 8 meses desde a data dos factos não afasta por si só as necessidades cautelares que o caso requer;
5- o alarme social provocado por este tipo de ilícitos, tendo em conta as circunstâncias como foram praticados e a natureza dos crimes cometidos, foi e permanece muito elevado;
6- a conduta do arguido após os factos não abona em seu favor, uma vez que o mesmo em sede de primeiro interrogatório judicial não revelou qualquer arrependimento, nem reconhecimento da elevada gravidade dos factos que praticou e do desvalor da sua atuação, não tendo colaborado com a justiça, mentindo em Tribunal;
7- o tribunal ponderou não só a idade do arguido como o facto de o mesmo não ter antecedentes criminais, tendo concluído, face à personalidade demonstrado no cometimento dos factos e na postura assumida no primeiro interrogatório judicial, ao facto de se encontrar desempregado e não estar social nem profissionalmente inserido, nesta fase, não se poderá fazer qualquer juízo de prognose favorável ao arguido;
8- o Tribunal ponderou e bem as circunstâncias em que ocorreram os factos, não sendo minimamente credível que o arguido tenha atuado pressionado pelo arguido B... e com receio do mesmo, uma vez que o recorrente foi viver para a casa deste bem sabendo, como confessou, que o mesmo já tinha cumprido pena de prisão e o comportamento do recorrente durante a pratica dos factos, assumindo um papel determinante na execução dos factos, entra em flagrante contradição com as suas declarações e os alegados receios;
9-o arguido sabe, porque tais elementos estão acessíveis no processo, os elementos de identificação da vitima e, atenta a sua personalidade revelada na atuação que teve no cometimento dos crimes e durante o primeiro interrogatório judicial, não se coibirá de praticar atos de violência física e/ou psicológica contra a vitima, bem como de engendrar uma defesa com os restantes arguidos no sentido de obstruir a ação da justiça;
10- a medida de coação aplicada não viola os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade impostos no art. 191, n.ºs 1, 2 e 3 do CPP, revelando-se necessária e adequada a obviar ás exigências cautelares que o caso requer e proporcionais à gravidade dos crimes cometidos e ás sanções que previsivelmente lhe venham a ser aplicadas;
11- uma vez que se verifica um concreto perigo de fuga do arguido, atento o facto de o mesmo não estar social, familiar e profissionalmente integrado, podendo facilmente se deslocar e fixar em qualquer ponto do país e do estrangeiro, como aconteceu na altura dos factos em que residia com o arguido B..., sendo certo que pesa sobre o mesmo a ameaça do cumprimento de uma pena de prisão;
12- verifica-se em concreto perigo de perturbação do decurso do inquérito uma vez que o arguido revelou uma personalidade de indiferença em relação aos factos e as suas consequências e violenta, que revela que o mesmo não se coibirá de utilizar a violência contra a vitima e outras testemunhas, bem como de consertar uma estratégia de defesa com os restantes arguidos que obste à descoberta da verdade e da realização da justiça;
13- existe um perigo concreto de continuação da atividade criminosa, tendo em conta a personalidade revelada pelo arguido na execução dos factos e na sua postura em sede de primeiro interrogatório judicial, reveladores da facilidade com que o mesmo pratica atos de violência contra as pessoas, bem como o facto de o arguido não se encontrar social e profissionalmente integrado;
14- a medida de permanência na habitação sob vigilância eletrónica não se mostra adequada para obstar ao perigo de fuga e ao perigo de perturbação do inquérito, atenta a personalidade do arguido acima descrita e demonstrada nos elementos já juntos aos autos.
15- a prisão preventiva foi aplicada de forma legal e mostra-se necessária, adequada e proporcional ás exigências cautelares acima descritas, sendo a única suscetível de obviar aos aludidos perigos de fuga, continuação da atividade criminosa, de perturbação do inquérito e de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas;
Deverá o recurso ser declarado totalmente improcedente, confirmando o despacho recorrido.
Nesta instância, o Ex.mo P.G.A. emite parecer no sentido do não provimento do recurso.
Foi cumprido o art. 417 nº 2 do CPP.
Não foi apresentada resposta.
Foram colhidos os vistos legais.
Realizada a conferência, cumpre decidir.
***
É do seguinte teor o despacho recorrido:
A detenção do arguido, uma vez que efetuada ao abrigo do disposto nos artigos 254, n.º 1, alínea a), 257, n.ºs 1 e 2 e 258, todos do Código de Processo Penal é legal, tendo sido dado cumprimento ao disposto no artigo 259 do citado diploma legal, pelo que se considera a mesma validada, tendo o arguido sido apresentado no prazo legal, conforme o disposto nos artigos 141, n. ° 1 e 254°, n.º 1, alínea a), ambos do Código de Processo Penal.
Em face das declarações do arguido, designadamente as prestadas em sede de inquérito perante a Polícia Judiciária, em conjugação com os demais elementos constantes dos autos, designadamente prova pericial de fls. 13, prova por Reconhecimento de fls. 252 a 254, prova documental fls. 6, 25 a 38, 38, 43 a 220, 232, 234, 238 a 242, 246 a 248, 262 a 265 e prova testemunhal de fls. 21 e 236 (depoimento do ofendido D...), fls. 17, 225, de fls. 227, de fls. 230, 251-A, resulta fortemente indiciado que na madrugada do dia 05.03.2011, entre as 00H30 e a 01H00, no Parque de Estacionamento da Feira Semanal de Viseu, sito nesta cidade, o arguido A... . juntamente com os suspeitos B... e C..., introduziram-se no interior do veículo ligeiro de passageiros, da marca Peugeot, matrícula …, propriedade de D..., aproveitando a abertura das portas por parte do mesmo, tendo-se o arguido sentado no banco ao lado do condutor, no vulgarmente designado "banco do pendura", enquanto o C... e o B... se sentaram no banco de trás.
Uma vez no interior do veículo, um dos indivíduos que se encontrava no banco de trás do condutor, apertou o pescoço do ofendido contra o encosto de cabeça do banco e, de seguida, juntamente com os outros dois, agrediam o ofendido a murro, provocando-lhe as lesões descritas e examinadas a fl. 13 e 14, nomeadamente equimoses nas pálpebras inferiores, as quais foram causa direta e necessária de 15 dias para a cura, sem afetação da capacidade de trabalho geral e profissional.
Foi-lhe, então exigida ao ofendido a entrega de dinheiro e da sua carteira, que este de imediato lhes entregou, contendo no seu interior algumas moedas, no total de cerca de € 4,00.
De seguida exigiram-lhe, ao ofendido, a entrega do cartão multibanco que por estar numa bolsa da carteira ainda não tinham detetado, tendo-lhes indicado onde o mesmo se encontrava, o que não os impediu de continuarem todos a agredir o ofendido enquanto lhe exigiam o pin do mesmo, que de imediato lhes forneceu.
Entretanto o arguido e os dois identificados indivíduos ordenaram ao ofendido que saísse do veículo e entrasse para o banco de trás onde este ficou sentado, tendo um dos indivíduos assumido o volante do veículo e o arguido A... permanecido no "lugar do pendura".
De seguida circularam por diversas artérias da cidade de Viseu, parando em pelo menos três multibancos, sendo sempre o arguido A... quem saía do veículo e tentava o levantamento de quantias monetárias nos multibancos.
O ofendido informou-os que apenas possuía na sua conta € 11,00, no entanto, os três indivíduos não acreditavam, exigindo-lhe a quantia de € 400,00.
No multibanco existente no Edifício do Instituto da Juventude de Viseu, sito nesta cidade, o arguido A... conseguiu proceder ao levantamento da quantia de € 10,00, que os três indivíduos fizeram sua.
O ofendido entregou-lhes, ainda, um relógio e o seu telemóvel da marca Samsung E1120, com o n.º … .
Entretanto o arguido e os suspeitos haviam revistado todo o porta-luvas do veículo e dali retirado uma navalha e uma tesoura propriedade do ofendido, tendo um dos indivíduos que se encontravam no banco de trás dito "passa-me a navalha que o vamos espetar, porque ele tem mais dinheiro, recebeu há pouco tempo."
Mais resulta fortemente indiciado que, sempre com o carro em andamento, o arguido A... e os identificados suspeitos tiraram-lhe os sapatos e as meias e disseram-lhe em tom intimidativo que o levavam para o pinhal até confessar onde tinha mais dinheiro.
Ao entrarem na A25 em direção a Mangualde, encostaram o veículo na berma e ordenaram ao ofendido que passasse para o volante e saísse dali, o que aquele acedeu, abandonando o local.
O ofendido, entregou-lhes todo o dinheiro que trazia consigo, no valor total de cerca de € 4,00, bem como o seu relógio, o seu telemóvel, o seu multibanco e respetivo pin porque, atento o comportamento muito violento acima descrito receou pela sua integridade física e pela própria vida e só por tal recear.
Atuou o arguido sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo as suas condutas criminalmente punidas.
Indicia-se assim fortemente nos autos a prática, pelo arguido A..., em coautoria com os demais identificados suspeitos, e em concurso real, de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210, n.º 1 do Código Penal, de um crime de sequestro, previsto e punido pelo artigo 158 do Código Penal e um crime de burla informática, previsto e punido pelo artigo 221, n.º 1 do Código Penal.
O crime de roubo imputado ao arguido é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos, sendo o crime de sequestro punido com pena de prisão até 3 anos ou multa e o crime de burla informática, punido com a moldura penal abstrata de prisão até 3 anos ou pena de multa.
O arguido não confessou os factos, não tendo nesta diligência colaborado na descoberta da verdade e na realização da justiça, optando por negar todos os factos imputados, mesmo confrontado com as demais declarações prestadas nos autos e com as declarações por si prestadas no inquérito, admitindo apenas que esteve no interior do veículo automóvel do ofendido.
Pese embora a versão apresentada pelo arguido na presente diligência, em face de todos os elementos constantes dos autos, em conjugação com as declarações do ofendido, dos depoimentos testemunhais que referem ter sido o arguido quem vendeu o telemóvel roubado à vítima e a versão dos factos apresentada pelo arguido perante a Polícia Judiciária no dia de ontem, versão essa em grande parte coincidente com a versão apresenta pelo ofendido D…, considera-se fortemente indiciada a factualidade imputada ao arguido nos termos supra descritos.
Importa referir que na presente diligência, não demonstrou o arguido qualquer tipo de arrependimento nem reconhecimento da elevada gravidade e desvalor da sua atuação, tendo o arguido se procurado desresponsabilizar e desvalorizar toda a sua atuação, tendo assim revelado uma personalidade desajustada e desconforme ao direito, revelando não possuir qualquer valor ético-jurídico e possuir uma conduta antissocial, pese embora a sua jovem idade.
Com efeito, o arguido é jovem, e, de acordo com as suas declarações, vive atualmente com os seus pais no concelho de Oliveira do Hospital, encontrando-se desempregado, pelo que não se pode considerar estar o arguido inserido nem permite, nesta fase, fazer qualquer juízo de prognose favorável ao arguido.
O arguido não possui antecedentes criminais, no entanto, tal circunstância, nesta fase, não valora em seu benefício, pois, apesar da sua juventude, o arguido não se encontra social nem profissionalmente inserido, tendo residido cerca de dois meses com o suspeito B..., sabendo que aquele possuía antecedentes criminais e já tinha inc1usivamente cumprido pena de prisão. De referir ainda o fenómeno a que se tem vindo a assistir nos últimos tempos, estando os jovens associados à prática de crimes violentos, violência essa que vem aumentando, circunstância essa reveladora de uma grande franja da população jovem desintegrada da sociedade e sem referências que os levem a pautar a sua atuação de acordo com as mais básicas normas sociais e normas jurídicas, antes optando tais jovens pela prática de crimes, caminho da delinquência, não procurando a sua integração, ficando a sua atuação, muitas das vezes impune por não se lograr descobrir a identidade dos agentes de tais crimes.
Os crimes indiciados e imputados ao arguido são graves, gravidade essa que resulta desde logo da elevada moldura penal dos crimes em causa, designadamente em relação ao crime de roubo associado ainda ao crime de sequestro e geradores de forte e grave alarme social e perturbadores da ordem e tranquilidade públicas, em face do receio generalizado da população por crimes desta natureza, os quais são muito graves, e que têm vindo a ocorrer com cada vez maior frequência, assim criando o elevado sentimento de insegurança que se sente atualmente, estando tal criminalidade, nos dias de hoje, associada a agentes jovens, com fraca inserção social e que fazem da prática deste tipo de crimes modo de vida, assim obtendo quantias monetárias e fazendo ainda desta atuação forma de entretenimento, o que terá sido inc1usivamente o caso dos autos, impondo-se terminar com a continuação da atividade criminosa nestes casos, repondo assim a paz social.
Em face de tais factos, considera-se existir um concreto perigo de continuação da atividade criminosa, atenta a facilidade com que o arguido se determinou à prática dos factos e ao modo de execução dos mesmos, criando um ambiente de terror relativamente à vítima, sendo que, e estando este tipo de crimes cada vez mais relacionado com os jovens, por serem cada vez mais jovens os seus agentes, se considera existir, atenta as regras da experiência comum e a falta de inserção social e profissional do arguido, perigo de continuação da atividade criminosa, tendo já o arguido há muito ultrapassado a barreira psicológica que o impediria de agredir as vítimas com vista à obtenção de dinheiro.
A personalidade demonstrada nesta diligência pelo arguido vem reforçar o perigo de continuação da atividade criminosa, em face da sua indiferença em relação aos factos e suas consequências.
Existe ainda um concreto perigo de perturbação do inquérito, designadamente quanto à aquisição conservação da prova, porquanto poderia o arguido facilmente tentar coagir a vítima de forma a que esta viesse a alterar o seu depoimento, e alertar os demais suspeitos, no sentido de frustrar a investigação e o apuramento dos factos, designadamente em relação ao suspeito C....
Mais se refira, em relação ao arguido, que a sua atuação assumiu um papel determinante na execução dos factos consubstanciadores da prática dos imputados crimes, tendo o arguido colaborado ativamente na execução desses crimes, em adesão ao plano previamente delineado por todos, que o vieram a executar nos termos acordados, exercendo violência sobre a vítima e mantendo-a nessas condições enquanto executavam os factos num longo período de tempo.
Existe um concreto e elevado perigo de perturbação da ordem e tranquilidade públicas, pelos fatores supra expostos, sendo conhecido o crescente alarme social e insegurança resultantes da prática de crimes desta natureza, sendo ainda inquestionável as graves repercussões psicológicas nas vítimas deste tipo de crimes, em face da violência utilizada, motivado pelo aumento exponencial de crimes de roubo com grande violência.
Considera-se existir igualmente perigo de fuga, em face da ameaça do cumprimento de uma pena de prisão, não tendo o arguido atividade profissional fixa nem família constituída, podendo facilmente deslocar-se e fixar-se em qualquer ponto do país ou mesmo no estrangeiro, o que resulta ainda da circunstância de o arguido facilmente mudar de residência, residindo com pessoas que, de acordo com as suas próprias declarações, pouco conhece, como sucedeu com o suspeito B....
Assim, concorda-se inteiramente com a posição assumida pela Digna Magistrada do Ministério Público, quer quanto à factualidade indiciada, sua qualificação jurídica e exigências cautelares que se fazem sentir.
De acordo com o disposto no artigo 193 do Código de Processo Penal, as medidas de coação a aplicar em concreto devem ser necessárias e adequadas às exigências cautelares que o caso requer e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas, sendo que, a prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação só podem ser aplicadas quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coação.
Nesta fase do processo, atentos os indícios juntos aos autos, impõe-se a aplicação, por todos os fatores expostos, de medida de coação mais gravosa do que o TIR, impondo-se a aplicação de medidas de coação que acautelem os enunciados perigos, sem esquecer que a prisão preventiva é uma medida de coação de aplicação em última ratio, quando nenhuma outra se revele adequada, necessária e suficiente para acautelar os perigos que se fazem sentir, considerando-se, que quer as medidas de coação de obrigação de apresentações periódicas quer as medidas de proibição e imposição de condutas do artigo 200 do C.P.P. se revelariam, nesta fase, incapazes de obviar de forma adequada e suficiente aos aludidos perigos.
Considera-se, com efeito, em face dos fatores expostos que nenhuma outra medida de coação que não uma medida detentiva da liberdade será suficiente para salvaguardar os perigos concretos que se fazem sentir, desde logo em face da gravidade dos factos, da personalidade revelada pelo arguido e dos supra enunciados perigos.
Da mesma forma, a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, mesmo que com vigilância eletrónica, não seria suficiente nem adequada para acautelar os enunciados perigos, sendo que, a experiência vem demonstrando que a aplicação de tal medida não obsta à continuação da atividade criminosa, sendo certo que o arguido poderia colocar-se em fuga, não lhe sendo conhecida estrutura familiar de apoio adequada à execução de tal medida, tanto mais que o arguido apenas recentemente voltou a residir com os pais, sendo estes pessoas humildes e que trabalham na agricultura, pelo que as exigências cautelares em concreto impõem a aplicação ao arguido da medida de coação de prisão preventiva.
Assim, considerando a gravidade dos factos, o alarme social provocado, o perigo de continuação da atividade criminosa e demais perigos e da personalidade demonstrada pelo arguido, que nenhuma outra medida de coação que não uma medida detentiva da liberdade será suficiente para salvaguardar os perigos concretos que se fazem sentir, os quais se revelam num patamar elevado.
Desta forma, e concordando-se na íntegra com a posição assumida pela Digna Magistrada do Ministério Público, a qual se dá por integralmente reproduzida, considera-se que nenhuma outra medida que não a prisão preventiva será adequada e suficiente para a salvaguarda dessas elevadas exigências cautelares, sendo ainda proporcional quer à gravidade dos crimes e às sanções que previsivelmente serão de aplicar.
Com efeito, tendo em conta a gravidade dos factos e os crimes que em concreto são imputados ao arguido, é de prever que ao arguido venha a ser aplicada pena privativa da liberdade.
Por todo o exposto, determina-se que o arguido A... aguarde os ulteriores termos do processo sujeito, para além do TIR já prestado nos autos, nos termos do disposto nos artigos 191, 193, 196,202, n.º 1, alínea a) e b) e 204, al. a) a c), todos do Código de Processo Penal, à medida de coação de prisão preventiva, por ser esta medida a única medida adequada, necessária e suficiente a salvaguardar as exigências cautelares que se fazem sentir, sendo ainda proporcional, quer à gravidade dos crimes quer às sanções que previsivelmente serão de aplicar.
***
Conhecendo:
O despacho recorrido encontra-se devidamente fundamentado, quer no que concerne à qualificação jurídica dos factos indiciados, quer na justificação da necessidade de aplicação de medida de coação gravosa.
Ao arguido recorrente foi aplicada a medida de coação, prisão preventiva.
Considerando-se, como é entendimento unânime da jurisprudência, que é através das conclusões formuladas pelo recorrente no final da motivação do seu recurso, que se delimita o objeto do mesmo, verificamos que:
O recorrente entende como desproporcional, injustificada e excessiva, a medida de coação, prisão preventiva, porque não se ponderou o tempo decorrido (entre a prática dos factos e a detenção), não se atendeu ao facto de ser primário e indivíduo não referenciado pelas autoridades policiais, não se teve em conta a idade do arguido e o disposto no regime aplicável a jovens, não se atendeu às circunstâncias da prática dos factos, sendo o arguido “coagido” a praticá-los, não se teve em conta a não previsão de vir a ser-lhe aplicada pena de prisão efetiva, concluindo pela inexistência de perigo de fuga.
Que não se verificam todos os pressupostos necessários à aplicação desta medida.
*
Que os requisitos da determinação e aplicação da medida de coação prisão preventiva se verificavam, resulta de toda a prova recolhida e que se confirma após o interrogatório e despacho subsequente que valida a detenção.
O recorrente, quer quando ouvido na Judiciária, quer em interrogatório judicial admite a prática dos factos.
Face ao que fica dito e, sobejamente justificado no despacho recorrido, entendemos que todas as outras medidas de coação se mostram inadequadas ou insuficientes.
1-fortes indícios de o arguido ter praticado crimes dolosos puníveis com pena de prisão de máximo superior a cinco anos.
Os factos objetivos foram admitidos pelo arguido (tendo comparticipado na sua prática) e os mesmos são objetivamente graves e reveladores da intenção do arguido e acompanhantes.
E, o arguido teve intervenção ativa, nomeadamente nas idas com a vítima a caixas multibanco, com intenção de ser levantado dinheiro da conta do arguido.
Destes factos objetivos e analisados à luz da experiência e deles é que se pode retirar a intenção, se verifica que o arguido agiu livre e consciente em coautoria com os demais indiciados, sem que fosse coagido por algum daqueles, ou tivesse agido em estado de pânico.
Assim, que se tem como correto o enquadramento jurídico dos factos indiciados, efetuado no despacho recorrido.
Relativamente ao tempo decorrido entre a prática dos factos e a detenção, foi apenas o necessário a que a investigação averiguasse quem foram os autores dos factos indiciados. A alegada “coação”, no momento dos factos, que o recorrente refere, não fez com que este os denunciasse logo que teve oportunidade ou após a detenção do coautor que o arguido refere o intimidava.
Assim que, o tempo decorrido, o facto de ser primário e não referenciado e a idade do arguido (21 anos) têm mais relevância em julgamento, na determinação concretas da pena, do que nesta fase de aplicação de medidas de coação.
As medidas de coação, como já se referiu, são aplicadas desde que, devidamente ponderadas se justifique, sendo que a de prisão preventiva só será aplicada se nenhuma outra se mostrar adequada e suficiente.
2- Requisitos de aplicação da medida de coação prisão preventiva:
Os requisitos, ou condições de aplicação de medidas de coação, nomeadamente prisão preventiva, elencados no art. 204, são alternativos (cfr. anotação do Cons. Maia Gonçalves ao art. 204).
Verificando-se um desses requisitos, fica legitimada a aplicação da medida.
Mas, no despacho recorrido para justificar a aplicação desta medida de coação, são indicados e justificados vários requisitos, como se constata do próprio despacho transcrito.
É certo que a prisão preventiva é a última medida a adotar (a liberdade é a regra, a prisão preventiva a exceção –arts. 27 e 28 da Constituição). Citando Fernando Fabião, in Prisão Preventiva, pág. 5, “o homem tem a liberdade na massa do sangue, de tal sorte que, onde ela não existe, não pode falar-se de homens. Ser livre é da essência da natureza histórica do homem. Milénios de história o documentam, testemunhando a progressiva libertação do homem das forças contrárias às múltiplas manifestações desse impulso básico, fundamental que é a liberdade”.
A verificação dos requisitos de aplicação da medida de coação prisão preventiva hão de resultar de um juízo de prognose baseado nos elementos fácticos indiciados.
Assim que, pressupondo a aplicação de uma pena grave de prisão (atento às molduras penais abstratas, bem como a resultante do cúmulo jurídico) e atendendo a que o arguido tem uma fraca inserção familiar (na altura dos factos não morava com os pais mas como o coautor B..., não se encontra inserido profissionalmente, é plenamente justificado o receio da fuga.
Por outro lado, tendo em conta o meio onde os factos se passaram, a natureza e as circunstâncias do crime haveria perturbação da ordem e tranquilidade públicas.
Ou, como se refere no despacho recorrido, “Os crimes indiciados e imputados ao arguido são graves, gravidade essa que resulta desde logo da elevada moldura penal dos crimes em causa, designadamente em relação ao crime de roubo associado ainda ao crime de sequestro e geradores de forte e grave alarme social e perturbadores da ordem e tranquilidade públicas, em face do receio generalizado da população por crimes desta natureza, os quais são muito graves, e que têm vindo a ocorrer com cada vez maior frequência, assim criando o elevado sentimento de insegurança que se sente atualmente, estando tal criminalidade, nos dias de hoje, associada a agentes jovens, com fraca inserção social e que fazem da prática deste tipo de crimes modo de vida, assim obtendo quantias monetárias e fazendo ainda desta atuação forma de entretenimento, o que terá sido inc1usivamente o caso dos autos, impondo-se terminar com a continuação da atividade criminosa nestes casos, repondo assim a paz social”.
Assim se justificando a aplicação da medida de coação, prisão preventiva, a qual é a única que se mostra adequada e proporcional aos factos que se mostram indiciados neste caso concreto.
O Código de Processo Penal, para além de acentuar a natureza excecional e residual da prisão preventiva, como já se referiu, reafirma a ideia da sua necessidade pela inadequação ou insuficiência de outras medidas de coação menos gravosas, revelando-se como uma medida residual.
Do exposto resulta que deve recorrer-se à prisão preventiva como extrema ratio, isto é, só quando as demais medidas se revelarem inadequadas ou insuficientes e houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos.
Como refere a Prof. Teresa Beleza, "em princípio, qualquer medida de coação e, sobretudo a mais gravosa de todas que é a prisão preventiva, só deve ser aplicada para fins relativos àquele processo e àquela pessoa em concreto e fundamentalmente, devem ter, neste sentido, fins de segurança, isto é, a prisão preventiva não deve, ao contrário do que acontecerá na realidade, funcionar como uma medida punitiva adiantada, mas deve funcionar, como qualquer medida de coação....como uma garantia de segurança no sentido de que o arguido não se eximirá a estar presente no processo e não irá perturbar o decurso das investigações, destruindo a atividade na suspeita da qual ele está a ser sujeito a um processo crime" (cfr. Apontamentos de Direito Processo Penal, AAFDL, n, pp. 125 e 126).
Assim, que só se possa concluir como no despacho recorrido, que a única medida de coação adequada e proporcional ao caso e que obsta a estes perigos é a prisão preventiva, sendo as outras medidas insuficientes face às exigências cautelares do caso.
E, a aplicação desta medida de coação não viola nenhuma das normas legais invocadas pelo recorrente.
Entendemos, pois, ser de manter a medida de coação, prisão preventiva.
Decisão:
Pelo que exposto ficou, acordam os Juízes desta Relação e Secção Criminal em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido A..., antes se confirmando o despacho recorrido.
Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4Ucs.


Jorge Dias (Relator)
Brízida Martins


Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince.