Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | ALBERTO RUÇO | ||
Descritores: | CONTRAORDENAÇÕES LABORAIS – ADMISSIBILIDADE DE RECURSO | ||
Data do Acordão: | 09/21/2023 | ||
Votação: | DECISÃO SINGULAR | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO DO TRABALHO DE LEIRIA - JUIZ 1 | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECLAMAÇÃO ARTº 405º CPP | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 49.º, N.º 1 E 2 DA LEI N.º 107/2009 (REGIME PROCESSUAL APLICÁVEL ÀS CONTRAORDENAÇÕES LABORAIS E DE SEGURANÇA SOCIAL). | ||
Sumário: | I - As prestações laborais não se enquadram no conceito de «sanções acessórias» para efeitos da admissibilidade de recurso, nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009 (Regime Processual Aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social).
II - Invocando-se como fundamento para a admissibilidade do recurso o disposto no n.º 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, o tribunal de 1.ª instância deve encaminhar o recurso para o tribunal superior, para este decidir se o recurso é ou não é admissível. III – Mas tal fundamento tem de ser invocado, sob pena de preclusão, no prazo do recurso. | ||
Decisão Texto Integral: | Reclamação – Nos termos do n.º 4 do artigo 50.º do Regime Processual Aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social (Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro), «O recurso segue a tramitação do recurso em processo penal, tendo em conta as especialidades que resultem desta lei.» Por conseguinte, a reclamação foi autuada nesta Relação como reclamação tramitada nos termos previstos no artigo 405.º do Código de Processo Penal porque se insere num recurso que segue a tramitação do recurso em processo penal. * Reclamante ……………………………V..., Lda. Reclamado……………………………...Ministério Público * Sumário I - As prestações laborais não se enquadram no conceito de «sanções acessórias» para efeitos da admissibilidade de recurso, nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009 (Regime Processual Aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social). II - Invocando-se como fundamento para a admissibilidade do recurso o disposto no n.º 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, o tribunal de 1.ª instância deve encaminhar o recurso para o tribunal superior, para este decidir se o recurso é ou não é admissível. III – Mas tal fundamento tem de ser invocado, sob pena de preclusão, no prazo do recurso. * I. Relatório
a) A presente reclamação insere-se num processo de recurso de contraordenação laboral – Regime Processual Aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social (Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro) – e é dirigida ao despacho proferido no pretérito dia 6 de junho, o qual não admitiu o recurso relativo à decisão que incidiu sobre o recurso da contraordenação. Foi, ainda, a arguida condenada ao pagamento de créditos laborais à trabalhadora AA, bem como ao pagamento da quantia de € Com efeito, conforme art 49º da Lei nº 107/2009, são, nomeadamente, e no que à situação sub iudice interessa, suscetíveis de recurso, em caso de condenação da arguida, as decisões em que é aplicada à arguida coima superior a 25UC ou valor equivalente e as decisões onde se procede à aplicação de sanções acessórias – alíneas a) e b) do nº 1 do preceito. A decisão de que a arguida recorre não se enquadra em nenhuma destas alíneas, pelo que é, assim, insuscetível de recurso. b) A Reclamante sustenta que a decisão é recorrível porque lhe foram aplicadas sanções acessórias, ou seja, «…o pagamento dos créditos laborais devidos à trabalhadora AA no montante de € 8.098,56 e ainda o pagamento à Segurança Social da quantia de € 3.148,87 a título de contribuições devidas.», o que permite o recurso nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009. Além disso, ocorre aplicação errada do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009 ao caso, porquanto na decisão considerou-se que se aplicava à relação laboral em questão o C.C.T. celebrado entre a ACILIS – Associação Comercial e Industrial de ..., ... e Porto ... e outras e o CESP –Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal – alteração salarial e outras e texto consolidado publicado no BTE nº 1 de 08.01.2009, por força da PE publicada no BTE nº 30, de 15.08.2009, quando é certo que não se aplicava este «C.C.T.» porquanto facilmente se constata que o CAE de atividade da ora Recorrente, que tem o n.º 47510, não corresponde a qualquer u dos identificados naquele «C.C.T.». Esta errada subsunção jurídica, que pode ser feita em muitos ouros casos similares e que importa acautelar e corrigir, implica que a presente decisão seja recorrível face ao disposto no n.º 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, onde se dispõe que «Para além dos casos enunciados no número anterior, pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.» 1.ª – Se a condenação no pagamento de créditos laborais integra o conceito de «sanções acessórias» previsto no da alínea b) do n.º 1 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009. 2.ª – Se uma eventual e errada qualificação jurídica aplicada aos factos, que implicou a condenação da Reclamante no pagamento de créditos laborais, autoriza o recurso nos termos previstos no n.º 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009. Se a condenação no pagamento de créditos laborais integra o conceito de «sanções acessórias» previsto no da alínea b) do n.º 1 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009. (I) Os créditos laborais são prestações monetárias devidas segundo as normas que regem as relações laborais entre entidade empregadora que remunera e a ação laboral prestada pelo trabalhador. As «sanções acessórias» são, como o nome indica, sanções que acrescem a outras sanções, ambas destinadas a penalizar comportamentos ilícitos contraordenacionais surgidos no âmbito das relações laborais. Por conseguinte, as prestações laborais não podem ser «sanções acessórias» porque não correspondem a penalizações emergentes de contraordenações. (II) O Código do Trabalho – Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro –, no seu artigo 562.º (Sanções acessórias), dá-nos conta das sanções acessórias aplicáveis às contraordenações laborais, ou seja: «1- No caso de contraordenação muito grave ou reincidência em contraordenação grave, praticada com dolo ou negligência grosseira, é aplicada ao agente a sanção acessória de publicidade. 2 - No caso de reincidência em contraordenação prevista no número anterior, tendo em conta os efeitos gravosos para o trabalhador ou o benefício económico retirado pelo empregador com o incumprimento, podem ainda ser aplicadas as seguintes sanções acessórias: 3 - A publicidade da decisão condenatória consiste na inclusão em registo público, disponibilizado na página eletrónica do serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral, de um extrato com a caracterização da contraordenação, a norma violada, a identificação do infrator, o sector de atividade, o lugar da prática da infração e a sanção aplicada. 4 - A publicidade referida no número anterior é promovida pelo tribunal competente, em relação a contraordenação objeto de decisão judicial, ou pelo serviço referido no mesmo número, nos restantes casos.» O Regime Geral das Contraordenações – DL n.º 433/82, de 27 de outubro –, aplicável subsidiariamente às contraordenações laborais – cfr. artigo 60.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro –, também prevê sanções acessórias no seu artigo 21.º, nestes termos: «1. A lei pode, simultaneamente com a coima, determinar as seguintes sanções acessórias, em função da gravidade da infração e da culpa do agente: d) Privação do direito de participar em feiras ou mercados; e) Privação do direito de participar em arrematações ou concursos públicos que tenham por objeto a empreitada ou a concessão de obras públicas, o fornecimento de bens e serviços, a concessão de serviços públicos e a atribuição de licenças ou alvarás; 2 - As sanções referidas nas alíneas b) a g) do número anterior têm a duração máxima de dois anos, contados a partir da decisão condenatória definitiva. 3 - A lei pode ainda determinar os casos em que deva dar-se publicidade à punição por contraordenação.» (III) Verifica-se, por conseguinte, face a estes exemplos de sanções acessórias, que as prestações laborais têm uma génese e finalidade distintas e não se enquadram no conceito de «sanções acessórias» para efeitos da admissibilidade de recurso, nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009. Se uma eventual e errada qualificação jurídica aplicada aos factos que implicou a condenação da Reclamante no pagamento de créditos laborais autoriza o recurso nos termos previstos no n.º 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009. O n.º 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, diz que «Para além dos casos enunciados no número anterior, pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.» Porém, para que isto ocorra há de cumprir-se o que a norma diz: «…pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso…» Existindo tal requerimento, o tribunal de 1.ª instância encaminha de seguida o recurso para o tribunal superior, para este decidir se o recurso é ou não é admissível. E o mesmo vale para o presidente do Tribunal da Relação face a uma reclamação com tal fundamento, pois a norma é clara quando diz que essa apreciação é feita pelo Tribunal da Relação, ou seja, pelos respetivos desembargadores aos quais for distribuído o processo. Ou seja, quando a Reclamante recorreu devia ter dito que recorria ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, isto é, devia ter requerido a apreciação do recurso com esse fundamento, indicando as razões. Então, como já foi dito, o juiz «admitia» o recurso com tal fundamento e encaminhava-o para que o Tribunal da Relação. Isto não foi feito pela recorrente e como não foi feito na devida altura ficou precludida a possibilidade de o fazer mais tarde, designadamente em sede de reclamação, porque decorreu o período próprio. Como referiu Manuel de Andrade, «Há ciclos processuais rígidos, cada um com a sua finalidade própria e formando compartimentos estanques. Por isso os actos (maxime as alegações de factos ou meios de prova) que não tenham lugar no ciclo próprio ficam precludidos (...). O princípio traduz-se portanto, essencialmente, na preclusão das deduções das partes» -– Noções Elementares de Processo Civil. Coimbra Editora/1979, pág. 382. Concluindo, o requerimento devia ter sido apresentado com as alegações de recurso, ou, quando muito, no prazo do recurso, mas não como fundamento de reclamação. Considerando o exposto, julga-se a reclamação improcedente e mantém-se a decisão reclamada. Custas pela Reclamante. * Alberto Augusto Vicente Ruço (Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, por competência delegada - Despacho do Ex.mo Sr. Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18 de março de 2022) |