Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2466/11.4TBFIG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: ERRO
CIRCUNSTÂNCIAS
BASE NEGOCIAL
NEGÓCIO JURÍDICO
ANULAÇÃO
CONTRATO
Data do Acordão: 12/06/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – INST. CENTRAL – SEC. CÍVEL – J2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 252º, 437º A 439º DO C. CIVIL.
Sumário: I) O erro sobre as circunstâncias constitutivas da base negocial poderá determinar a anulação total ou meramente parcial do negócio jurídico, bem assim como a simples modificação do negócio jurídico que reponha de forma equitativa a justiça interna do negócio que foi colocada em causa pelo erro.

II) Para poder relevar, aquele erro tem de incidir sobre a base negocial tal qual ela era constituída no momento da conclusão do negócio.

III) As alterações supervenientes naquela base negocial só podem relevar se forem susceptíveis de fundamentar a convocação e aplicação do regime dos arts. 437º a 439º do CC.

Decisão Texto Integral:




Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra

I – Relatório

Os autores propuseram contra a ré a presente acção declarativa de condenação, deduzindo os pedidos seguidamente transcritos:

Termos em que deve a presente ação ser julgada procedente por provada e por via dela:

a) - Declarar-se anulado o contrato de compra e venda celebrado entre AA e Ré, referido no art.º 10.º deste e consequentemente ser restituído tudo o que tiver sido prestado por força do contrato, condenando-se ainda a Ré a restituir os 63.500,00 Euros por aquela recebido a titulo de preço, a que deverão acrescer as despesas, designadamente emolumentos notarias, registrais, preparos e custos de atos de registo predial, certidões matriciais, registrais, todos os custos inerentes ao contrato de empréstimo bancário, havidas pelos AA e que foram essenciais á instrução e formalização do contrato de cumpra e venda, a que acrescem juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, condenando-se anda a Ré ao pagamento de todas as despesas inerentes á anulação do contrato;

b) - Condenar-se a Ré a indemnizar os AA de todos os prejuízos sofridos e a sofrer em consequência do contrato de compra e venda celebrado e dos vícios que o imóvel vendido apresenta, cuja liquidação se relega para execução de sentença;

c) - Ou, improcedendo o petitório formulado em a) e b), deve a Ré ser condenada a substituir a fração vendida por outra que não enfermando de quaisquer defeitos, nem se situando num bairro social, tenha a mesma caracterização da fração que se substitui, substituição essa que deverá operar-se através de contrato a favor dos AA, condenando-se a Ré no pagamento de todas as despesas decorrentes dessa substituição e ainda em indemnização a favor dos AA por todos os prejuízos por estes sofridos e a sofrer e cuja liquidação se relega para execução de sentença;

d) – Ou, em alternativa, deverá a Ré ser condenada a reparar a expensas suas, sob a sua orientação e fiscalização, no prazo de 60 dias a cantar da data do transito e julgado da sentença que vier a ser proferida moestes autos, todos os defeitos e vícios existentes na fração dos AA, eliminando-os de forma definitiva e permanecem condenando-se ainda neste caso a Ré a indemnizar os AA de todos os prejuízos a estes advindos e resultantes dos defeitos e vícios da fração, em montante a liquidar em execução de sentença:

e) - Ser a Ré condenada em custas e procuradoria devida.”.

Como fundamento das suas pretensões, alegaram, em resumo, que: em 2004 pretendiam comprar uma casa de habitação com boa qualidade de construção, boas condições de habitabilidade e situada numa zona tranquila, tendo-lhes a ré proposto a compra de um apartamento no Empreendimento (...) , em Brenha, que teria as características pretendidas por aqueles, que aceitaram tal proposta, adquirindo o apartamento, uma vez que a ré lhes garantiu que aquele empreendimento estava situado numa zona calma, tranquila e com boa vizinhança e que seriam vendidos todos os apartamentos que então ainda não se encontravam habitados; o apartamento adquirido pelos autores veio a revelar um conjunto de defeitos melhor descritos na petição, todos devidos a construção de má qualidade; frustrando as garantias prestadas aos autores, a ré acabou por arrendar múltiplos apartamentos do empreendimento por quantias irrisórias, a famílias carenciadas de diversas comunidades e etnias, cujos membros praticam crimes, destroem as infra-estruturas e têm comportamentos ruidosos, concorrendo essa má vizinhança e os defeitos do apartamento para uma desvalorização do mesmo; só por erro quanto às qualidades do apartamento e quanto às características da zona em que o mesmo se localiza é que o compraram, sendo reduzida ou nula a probabilidade de os autores o poderem vender; têm vergonha de apresentar o apartamento aos vizinhos e receio dos actos de vandalismo e desacatos que vão ocorrendo no empreendimento; em consequência do anteriormente descrito, sofreram prejuízos ainda não quantificados.

Citada, a ré contestou, pugnando pela improcedência da acção.

Alegou, em resumo, o seguinte: estranha que só volvidos seis anos e meio após a data da sua aquisição do apartamento dos autores e oito anos depois da sua construção, venham os autores invocar vícios e defeitos da construção, tanto mais que em 27/8/2008 declararam por escrito que a sua fracção se encontrava em boas condições, após intervenção por parte da empresa construtora e vistoria do engenheiro responsável da ré; desconhece os defeitos descritos pelos autores, os quais nunca lhe foram denunciados; os autores sabiam estar a comprar um apartamento cuja construção foi efectuada a custos controlados, bem como conheciam os padrões de qualidade do mesmo; caducaram os direitos dos autores emergentes dos defeitos de construção por eles alegados na petição.

Replicaram os autores para, em resumo, sustentar que: em finais do ano de 2008 comunicaram à ré a existência de deficiências várias no apartamento que adquiriram, tendo-se a ré comprometido sucessivamente à sua eliminação, após vistoria que reconheceu a sua existência, mais tendo referido a ré aos autores que os direitos destes jamais caducariam porque independentemente do decurso de quaisquer prazos a mesma sempre honraria a sua palavra e cumpriria com as suas obrigações e responsabilidades legais; não ficou sujeita a qualquer prazo a obrigação assumida pela ré de que seria mantida no empreendimento boa vizinhança e seriam vendidos os apartamentos do empreendimento que ainda não se encontravam habitados à data da aquisição do apartamento dos autores; ao arguir a excepção de caducidade, a ré age com abuso de direito.

Rejeitado o pedido dos autores constante da alínea B) do seu petitório, lavrou-se tabelar despacho saneador, seleccionaram-se os factos assentes e aqueles que deveriam integrar a base instrutória, na sequência do que viria a realizar-se a audiência de julgamento no termo da qual foi proferida sentença de cujo dispositivo consta o seguinte:

Termos em que julgo parcialmente provada e procedente a presente acção ordinária, declarando anulado o contrato de compra e venda celebrado entre os Autores P… e marido J… e a Ré F…, relativo ao apartamento correspondente à fracção autónoma designada pela letra …, Brenha, inscrito na matriz predial urbana da dita freguesia de Brenha sob o artigo …, pelo que condeno a Ré a restituir aos Autores o montante do preço do negócio, de sessenta e três mil e quinhentos euros (€63.500), acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação, contra a devolução à Ré do apartamento pelos Autores, livre e desocupado, no estado em que se encontra actualmente, bem como a respectiva chave.

Absolvo a Ré do pedido reembolso aos Autores do valor das despesas de emolumentos notariais, registrais, preparos e custos de registo predial, certidões matriciais, registrais, custos inerentes ao contrato de empréstimo bancário e todas as despesas inerentes à anulação do contrato.

Custas pelos Autores e pela Ré, na proporção de 1/10 para aqueles e de 9/10 para esta.

Registe e notifique.”.

Não se conformando com o assim decidido, apelou a ré, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas:

Contra alegaram os autores, pugnando pela improcedência da apelação.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II - Principais questões a decidir

Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 - NCPC), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir:
1ª) se a matéria de facto se encontra incorrectamente julgada, devendo ser alterada;

2ª) se a sentença recorrida não deveria ter decretado a anulação do negócio jurídico de compra e venda celebrado entre os autores e a ré com fundamento no erro dos primeiros sobre a base negocial reconhecido naquela sentença.

III – Fundamentação

A) De facto

Os factos provados

B) De direito
Primeira questão: se a matéria de facto se encontra incorrectamente julgada, devendo ser alterada.

Em conclusão: com excepção da alteração decidida no ponto 1.3 que antecede, mantém-se a matéria de facto impugnada pela recorrente.

Segunda questão: se a sentença recorrida não deveria ter decretado a anulação do negócio jurídico de compra e venda celebrado entre os autores e a ré com fundamento no erro dos primeiros sobre a base negocial reconhecido naquela sentença.

Comece por assinalar-se que a sentença recorrida considerou caducados todos os direitos emergentes para os autores do facto de no apartamento adquirido por estes terem surgido os defeitos identificados nos factos descritos como provados.

Nessa parte a decisão não foi impugnada, pelo que transitou em julgado.

Por outro lado, resulta claro da sentença que o tribunal recorrido decretou a anulação do negócio jurídico de compra e venda celebrado entre os autores e a ré com fundamento exclusivo em erro dos autores sobre as circunstâncias que constituíram a base daquele negócio, por aplicação do estatuído nas normas conjugadas dos arts. 252º/2 e 437º/1 do CC.

É o que claramente flui do seguinte trecho da decisão recorrida: “Tudo isto para concluir que deve proceder o pedido principal dos autores de anulação do negócio, tendo em conta o estatuído nos arts. 252º, nº 2 e 437º, nº 1, do Código Civil. Cabe ao Juiz a aplicação do direito, tendo os AA. alegado os factos essenciais da causa de pedir da anulação do negócio (artº 5º, nº 1, 1ª parte e nº 3, do novo C.P.C.).”.

A actividade cognitiva e decisória deste tribunal em sede de fundamentação jurídica está, assim, limitada à tarefa de indagar sobre a verificação ou não dos pressupostos de anulação de um negócio jurídico com fundamento no erro sobre a base negocial.

Importa reter, também, que a anulação decretada pelo tribunal recorrido o foi com o fundamento de que o Empreendimento da (...) foi convertido num bairro social, já depois da conclusão do negócio jurídico anulando, o que frustrou determinadas expectativas que os autores tinham à data da compra e venda sobre as características do bairro em que estava integrado o imóvel adquirido, características essas cuja verificação concreta foi garantida pela ré e sem as quais os autores não tinham adquirido aquele imóvel.

Com efeito, revisitando a sentença recorrida, ali se escreveu que “À data da celebração do contrato de compra e venda os Autores desconheciam esta realidade, tendo a Ré alterado o plano inicial de só arrendar os andares térreos a pessoas carenciadas, passando a arrendar os andares superiores a famílias que se provou serem, além de carenciadas economicamente, problemáticas em termos de relações de vizinhança, de respeito pelas regras de convivência em espaços comuns e de uso dos mesmos.

Este risco de conviver com pessoas desregradas e agressivas não estava previsto inicialmente pelos Autores ao adquirirem o imóvel, nem lhes foi comunicado pela Ré, que posteriormente, de modo unilateral, alterou as condições de ocupação dos blocos habitacionais.” – sublinhados nossos.

A nosso ver, a sentença recorrida fez indevida aplicação ao caso dos autos o instituto da anulação do negócio jurídico com fundamento em erro sobre a base negocial.

Na verdade, o art. 252º/2 do CC rege apenas para as situações em que se regista erro ou desconformidade da representação da realidade existente no momento da celebração do negócio jurídico e integrante da base negocial, constituída pelas circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar, sendo que aí não se enquadram os casos em que se verifica posteriormente à conclusão do negócio uma evolução anormal naquela realidade, casos esses que poderão ter enquadramento nos arts. 437º a 439º do CC, desde que a exigência das obrigações assumidas por um dos contraentes afecte gravemente os princípios da boa-fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato (art. 437º/1 do CC).

Por outras palavras, o estatuído no art. 252º/2 do CC rege para um tipo específico de situação que é diferente daquelas que justificam a previsão normativa dos arts. 437º a 439º do CC, pois que no primeiro caso pretende disciplinar-se o negócio inválido por vício congénito da vontade de algum dos contraentes, ao passo que nos segundos se pretende disciplinar o negócio juridicamente válido, mas cujo equilíbrio patrimonial e funcionalidade própria foram supervenientemente afectados por drástica alteração das circunstâncias envolventes, sendo diversas as consequências jurídicas que devem associar-se a essas distintas situações - Oliveira Ascensão, Direito Civil – Teoria Geral, vol. II, 1999, p. 408, Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, p. 165, acórdão do STJ de 14/6/2011, proferido no processo 3222/05.4TBVCT.S2, acórdão da Relação de Lisboa de 27/10/2015, proferido no processo 25453/12.0 T2SNT.L1-1.

Na verdade, na medida em que o art. 437º se reporta à modificação das circunstâncias contratuais depois da celebração do contrato, reportando-se o art. 252º/2 ao erro que vicia a própria formação da vontade, no primeiro caso o remédio legalmente consagrado é o da resolução ou a modificação contratual segundo juízos de equidade, enquanto no segundo se impõe, em regra, a anulabilidade, por estar em causa a validade do negócio, sem prejuízo de também nos casos de erro poderem operar-se, em alternativa à anulação, modificações no contrato viciado que reponham de forma equitativa a justiça interna do negócio que foi colocada em causa pelo erro – neste sentido, acórdãos do STJ de 13/9/2011, proferido no processo P. 1052/05.2TBLGS.E1.S1, e de 2/10/2014, proferido no processo 1060/11.4T2STC.E1.S1.

Ora, partindo deste enquadramento legal, facilmente se percebe que a matéria de facto não evidencia qualquer erro ou desconformidade na representação que os autores fizeram da realidade existente no momento da celebração do negócio jurídico.

Com efeito, o que os factos provados evidenciam é que à data da conclusão do negócio impugnado os autores pretendiam adquirir uma casa que se situasse numa zona residencial calma e tranquila, em termos de vizinhança, características essas cuja verificação lhes foi garantida pela ré em relação apartamento identificado no ponto 8º) dos factos descritos como provados, razão pela qual os autores aceitaram adquirir tal apartamento à ré (pontos 4 a 8 dos factos descritos como provados).

Nada nos factos provados evidencia, porém, que à data da conclusão do negócio a zona residencial em que estava integrado o imóvel adquirido não fosse calma e tranquila nos exactos termos pretendidos pelos autores.

O que os factos evidenciam é, apenas, que posteriormente à conclusão do negócio impugnado foram alteradas as características dessa mesma zona residencial, a qual foi unilateralmente convertida em bairro social com as características enunciadas no ponto 42º) dos factos descritos como provados, alteração superveniente essa que veio a frustrar as expectativas dos autores de viverem em casa própria integrada em zona calma e tranquila.

De resto, basta ouvir as declarações de parte da própria autora prestadas em audiência de julgamento e que foram gravadas para, com toda a certeza, poder concluir-se que foi apenas em 2011 que ocorreu a alteração no destino dado pela ré ao Empreendimento da (...) e da qual resultou a frustração das expectativas dos autores relativas à inserção do apartamento por eles adquirido em zona residencial calma e tranquila.

Acresce que da leitura da própria decisão recorrida emerge que a situação em causa nos autos se traduziu numa alteração superveniente das condições existentes à data do negócio, que não numa indevida representação pelos autores da realidade existente a essa data, sendo particularmente elucidativo do que se afirma o seguinte trecho da decisão recorrida: “À data da celebração do contrato de compra e venda, os Autores desconheciam esta realidade, tendo a Ré alterado o plano inicial de só arrendar os andares térreos a pessoas carenciadas, passando a arrendar os andares superiores a famílias que se provou serem, além de carenciadas economicamente, problemáticas em termos de relações de vizinhança, de respeito pelas regras de convivência em espaços comuns e de uso dos mesmos.

Este risco de conviver com pessoas desregradas e agressivas não estava previsto inicialmente pelos Autores ao adquirirem o imóvel, nem lhes foi comunicado pela Ré, que posteriormente, de modo unilateral, alterou as condições de ocupação dos blocos habitacionais.

Não houve uma simples mudança; verificou-se uma mutação das relações de vizinhança e das condições de habitabilidade do empreendimento, com relevo para permitir a anulação do negócio (252º, nº 2 e 437º, nº 1, do Código Civil).” – os sublinhados são nossos.

Como assim, contrariamente ao decidido pela sentença recorrida, a situação em apreço não pode reconduzir-se ao instituto do erro sobre a base negocial contemporâneo ao momento da conclusão do negócio jurídico que os factos provados não evidenciam.

A situação fáctica que logrou demonstrar-se poderia revelar, quanto muito, uma situação de alteração das circunstâncias integrantes daquela base negocial ocorrida depois de conclusão do negócio impugnado, alteração superveniente essa que não permite a convocação do referenciado instituto do erro sobre a base negocial que, como visto, pressupõe a contemporaneidade do erro com o momento daquela conclusão.

Por outro lado, não deve este Tribunal da Relação sequer equacionar a possibilidade de convocar e aplicar à situação em apreço o regime dos arts. 437º a 439º do CC, pois que: i) os autores jamais peticionaram a resolução ou modificação do contrato por alteração superveniente e anormal das circunstâncias integrantes da base negocial, com as limitações daí decorrentes do princípio do pedido (art. 609º/1 do NCPC); ii) não foi esse o fundamento com base no qual foi decretada pelo tribunal recorrido a anulação do negócio impugnado, não sendo suscitada nas contra-alegações e respectivas conclusões, por exemplo ao abrigo do art. 636º/1 do NCPC, qualquer questão referente à aplicação, mesmo que subsidiária e para o caso de improcedência do pedido de anulação do negócio impugnado, do regime daqueles normativos, estando essa questão, por isso, fora do objecto do recurso; iii) nas contra-alegações os autores sustentam que o regime jurídico do erro sobre a base negocial é aquele que deve aplicar-se aos factos provados (conclusões 32ª a 34º), sem nunca se invocar a resolução ou modificação contratual com fundamento em alteração superveniente e anormal da base negocial.

Resta dizer que o tribunal recorrido não apreciou os pedidos contantes das alíneas b) a d) da parte conclusiva da petição inicial, estando a este tribunal vedado conhecer dos mesmos, pois que não foi interposto recurso subordinado da sentença recorrida nesse específico segmento denegatório do conhecimento desses pedidos, além de que o conhecimento subsidiário dos mesmos em sede de recurso de apelação não foi suscitado pelos autores ao abrigo do art. 636º/1 do NCPC.

IV- DECISÃO

Acordam os juízes que integram esta 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de julgar a apelação procedente, revogando-se a decisão apelada e absolvendo-se a apelante das condenações que nela lhe foram impostas.

Custas pelos apelados.

Coimbra, 6/12/2016.


(Jorge Manuel Loureiro)

(Maria Domingas Simões)

(Jaime Carlos Ferreira)


Sumário:

I) O erro sobre as circunstâncias constitutivas da base negocial poderá determinar a anulação total ou meramente parcial do negócio jurídico, bem assim como a simples modificação do negócio jurídico que reponha de forma equitativa a justiça interna do negócio que foi colocada em causa pelo erro.

II) Para poder relevar, aquele erro tem de incidir sobre a base negocial tal qual ela era constituída no momento da conclusão do negócio.

III) As alterações supervenientes naquela base negocial só podem relevar se forem susceptíveis de fundamentar a convocação e aplicação do regime dos arts. 437º a 439º do CC.