Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
663/16.5T8FIG.1.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA
QUANTIFICAÇÃO DO VALOR DE CRÉDITO
Data do Acordão: 01/31/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA – JUÍZO DO RABALHO DA FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 807º, Nº 3 DO NCPC.
Sumário: Relegado para liquidação em execução de sentença o apuramento do valor a receber pelo credor e uma vez que no incidente de liquidação não existe ónus da prova por parte do credor, no termo desse incidente terá que ser quantificado um qualquer crédito do credor sobre o devedor, recorrendo-se oficiosamente, se necessário, à prova pericial ou à equidade, sob pena de violação do caso julgado formado em torno da decisão em liquidação.
Decisão Texto Integral:








Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I – Relatório

No processo de que os presentes autos são apenso foi proferida sentença que condenou a ré a pagar ao autor a “… quantia a liquidar posteriormente e nunca podendo exceder o montante peticionado a este título pelo A., relativa à retribuição do trabalho prestado pelo A. ao serviço da R. de acordo com o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável, depois de descontados os montantes já pagos pela R. e de se proceder à compensação nessa quantia do valor de €1.379,08 (mil trezentos e setenta e nove euros e oito cêntimos), a título de indemnização pelo incumprimento do prazo de aviso prévio da cessação do contrato de trabalho pelo A., acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 30/12/2015 e até efetivo e integral pagamento”.

O autor deduziu o presente incidente de liquidação, sustentando que deve ser liquidada em €47.517,75 a quantia que a ré deve pagar-lhe.

A ré deduziu oposição, concluindo que deve o “… presente incidente ser julgado totalmente improcedente por não provado e, consequentemente, ser a Ré absolvida do pedido.”, pois que pagou ao autor as quantias que lhe eram devidas segundo o contrato de trabalho e o regime jurídico aplicável.

O incidente prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença de cujo dispositivo consta, designadamente, o seguinte: “Pelos fundamentos expostos, julgo parcialmente procedente o presente incidente de liquidação e, em consequência, liquido a obrigação pecuniária a cargo da R. “T..., Lda.”, constante da sentença proferida nestes autos, na quantia de €10.000 (dez mil euros), já depois de efetuado o desconto e a compensação constantes também dessa mesma sentença, a pagar pela R. “T..., Lda.” ao A. V..., acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 30/12/2015 e até efetivo e integral pagamento.”.

Não se conformando com o assim decidido, apelou a ré, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas:

...

O A. contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação.

Também apelou subordinadamente, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas:

...

A ré contra-alegou relativamente ao recurso subordinado, pugnando pela sua intempestividade ou pela sua improcedência.

Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência das apelações.

Cumpre decidir.

II - Principais questões a decidir

Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso, integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir:

1ª) se as contra-alegações e o recurso subordinado são intempestivos;

2ª) se a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação;

3ª) se os factos dados como provados permitem concluir no sentido de que os montantes pagos pela ré ao autor, acrescidos de um crédito indemnizatório que lhe foi reconhecido sobre o autor na sentença sob liquidação, excediam em €12.551,33 os valores que o autor deveria ter recebido da ré de acordo com o CCT aplicável à relação de trabalho que existiu entre ambos, razão pela qual não deveria ter sido liquidado nenhum crédito a satisfazer pela ré ao autor;

4ª) se o crédito do autor sobre a ré deve ser quantificado em valor nunca inferior a €35.000, nos termos propugnados pelo autor no recurso subordinado.

III – Fundamentação

A) De facto

Os factos provados

...

B) De direito

Primeira questão: se as contra-alegações e o recurso subordinado são intempestivos.

Nos termos do art. 80º do CPT na redacção em vigor à data da apresentação do recurso principal, contra-alegações e recurso subordinado, “O prazo de interposição do recurso de apelação ou de revista é de 20 dias.” (nº 1), sendo que “Nos casos previstos nos n.os 2 e 4 do artigo 79.º-A e nos casos previstos nos n.os 2 e 4 do artigo 721.º do Código de Processo Civil, o prazo para a interposição de recurso reduz-se para 10 dias.” (nº 2)

Nos termos do art. 79.º-A/2/i do CPT em vigor à data da apresentação das alegações, contra-alegações e recurso subordinado, cabe recurso de apelação nos casos previstos nas alíneas c), d), e), h), i), j) e l) do art. 691º/2 do VCPC (1ª parte), e, para além disso, nos demais casos expressamente previstos na lei (2ª parte).

Nos termos do art. 691º/2/j cabia recurso de apelação autónoma do “Despacho que não admita o incidente ou que lhe ponha termo;”.

A matéria regulada neste art. 691º passou a estar regulada no art. 644.º do NCPC.

Cabe, assim, determinar, para que norma deve considerar-se feita a remissão operada pelo referido art. 79.º-A/2/i do CPT.

A este propósito, cabe recordar o que se deixou escrito, a que damos a nossa integral adesão, no acórdão do STJ de 19/11/2015, proferido no processo 271/14.5TTCBR.C1.S1: “Como se sabe, a remissão diz-se estática ou material quando é feita para certa norma, em função do seu conteúdo concreto; e diz-se dinâmica ou formal quando apenas se atende à circunstância de a norma remitida ser aquela que em certo momento regula determinada matéria, aceitando-se, assim, eventuais alterações posteriores ao respetivo conteúdo.

Como refere Menezes Cordeiro, citado no Ac. de 24.02.2015, Proc. n.º 365/13.4TTVNG.P1.S1 (Relator: Gonçalves Rocha), desta Secção Social do STJ: «Segundo Castro Mendes “a remissão na lei é em regra formal (= dinâmica), nos negócios jurídicos em regra material (= estática). Na verdade, quando façam remissões, as partes escolhem uma lei que conhecem: a escolha é material e logo estática. Pelo contrário, o legislador remete para a melhor solução existente: a escolha é formal e logo dinâmica, variando as normas ad quem.”

Por seu turno, escreve Dias Marques “[…] a remissão genérica traduzida pela referência a um dado instituto será quase sempre dinâmica. Quando a lei remete para o regime de certo instituto não visa, em geral, a sua regulamentação originária, mas antes o regime que existir no momento em que haja de proceder-se à aplicação”.

E continua esse mesmo autor: “Quando a remissão é específica, isto é dirigida a um preceito concreto, a um artigo da lei designada pelo seu número, já o problema pode revestir maior dúvida. Em todo o caso, ainda aí, na maior parte das vezes, haverá de considerar-se dinâmica a remissão”».

Ao contrário do entendimento acolhido na decisão recorrida[3], afigura-se-nos que a remissão consagrada no art. 79.º-A/2/i), do CPT, reveste natureza dinâmica ou formal, como é a regra em matéria de normas remissivas (cuja existência radica, essencialmente, na vantagem em evitar a repetição de normas e de garantir a igualdade/harmonia de regimes e soluções legais) e tendo ainda em conta o alcance e a ratio desta disposição legal.

Na verdade, como expressamente se dá conta no respetivo preâmbulo, com o DL n.º 295/2009, que introduziu na nossa ordem jurídica aquele inciso legal, procedeu-se a um conjunto de alterações no direito processual do trabalho justificado, para além do mais, “pela necessidade de (…) conformação de várias normas de processo do trabalho aos princípios orientadores da reforma processual civil, nomeadamente em matéria de recursos (…),sem prejuízo de se manter a remissão geral para a legislação processual comum, como regime aplicável aos casos omissos”.

Deste modo, por força da remissão dinâmica ínsita na disposição legal em análise, não pode deixar de concluir-se no sentido de à interposição do recurso de apelação serem aplicáveis, no domínio do processo laboral, as pertinentes disposições do CPC que estejam em vigor em cada momento, à luz das disposições transitórias que dão resposta aos problemas de sucessão de leis no tempo (cfr., no que releva quanto à situação em apreço, uma vez que a ação foi instaurada em 05.03.2014, o art. 7.º da Lei n.º 41/2013, de 26/6).

Em idêntica perspetiva, refere Abrantes Geraldes[4]:

“O art. 79.º-A, n.º 2, al. i), do CPT, por referência ao art. 691.º, n.º 2, al. i), do anterior CPC, apenas abarcava os despachos de admissão ou de rejeição de meios de prova.

Todavia, o art. 644.º, n.º 2, al. d), do NCPC, veio equiparar a tais decisões aquelas em que se admite ou rejeita algum articulado.

Conquanto se mantenha formalmente inalterado o art. 79.º-A do CPT, creio que também esta situação ocorrida no foro laboral deve obedecer ao mesmo regime, quer por via da adaptação que necessariamente deve ser feita da norma remissiva (art 79.º-A, n.º 2, al. i), do CPT, em conexão com o art. 691.º, n.º 2, al. i), do anterior CPC e, agora com o art. 644.º, n.º 2, al. d), do NCPC), quer por via da aplicação subsidiária do regime processual comum (art. 1.º, n.º 2, al. a), do CPT). Com efeito, nada se prevendo no CPT acerca de tais decisões, impõe-se o recurso subsidiário ao NCPC cujo preceito prevê a admissibilidade [de] apelação do despacho interlocutório de admissão ou de rejeição de algum articulado.”

Acrescentando, em nota de rodapé:

“Nem sequer se mostra necessário invocar para o efeito o elemento de ordem racional que imporia uma tal solução. Os mesmos argumentos que justificam a admissibilidade de recurso imediato das decisões sobre a admissibilidade de meios de prova se aplicam à admissão ou rejeição de articulado. Na verdade, ainda que o diferimento da impugnação de tais decisões não colidisse com a utilidade absoluta do respetivo resultado, resulta manifesto que um melhor aproveitamento da atividade processual se obtém quando uma tal decisão intercalar é submetida de imediato a reapreciação em via de recurso, sob pena de formação de caso julgado formal.”.

Como assim, uma vez que é dinâmica, a remissão ora equacionada deve considerar-se feita para o art. 644º do NCPC, devendo procurar-se neste a norma correspondente a cada uma das alíneas c), d), e), h), i), j) e l) do art. 691º/2 do VCPC para que remete o art. 79º-A/2/i do CPT.

A norma correspondente ao art. 691º/2/j do VCPC encontramo-la do art. 644º/1 do NCPC, na parte em que nele se determina a recorribilidade imediata da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo a incidente processado autonomamente, como é o caso do incidente de liquidação onde foi proferida a decisão recorrida.

Tudo visto, somos a concluir no sentido de que o prazo de interposição de recurso (independente ou subordinado), sem reapreciação de prova gravada, da decisão que ponha fim ao incidente de liquidação é de dez dias – neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/5/2019, proferido no processo 106/09.0TTBRG.2.G1, decisão sumária do Tribunal da Relação de Lisboa de 16/3/2016, proferido no processo 3436/07.2TTLSB-A.L1-4.

Por outro lado, é igualmente de dez dias o prazo para apresentação de contra-alegações (art. 638º/5 do NCPC), a contar da data da notificação das alegações de recurso da parte contrária.

No caso de recurso subordinado, o prazo de interposição conta-se da notificação da interposição do recurso da parte contrária – art. 633º/2 do NCPC.

No caso em apreço, a interposição do recuso principal foi notificada ao autor através de notificação elaborada/certificada pela plataforma Citius em 17/6/2019 (referência 80358185), devendo ter-se por efectuada em 21/6/2019 (art. 248º do NCPC).

O prazo de dez dias para contra-alegar e para interposição do recurso subordinado esgotou-se em 1/7/2019.

O recurso subordinado e contra-alegações foram apresentados em 10/7/2019, ou seja, manifestamente fora do prazo de que o autor tinha para o efeito, mesmo que acrescido dos três dias uteis complementares consentidos pelo art. 139º/5 do NCPC.

Termos em que se decide não tomar conhecimento das contra-alegações e do recurso subordinado.

Segunda questão: se a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação.

É sabido que o vício de nulidade por falta de fundamentação regista-se, apenas, nos casos de falta absoluta de fundamentação.
Com efeito, socorrendo-nos dos ensinamentos expendidos a respeito do vício de nulidade da sentença por falta de fundamentação[1], cabe recordar a lição de Teixeira de Sousa, segundo o qual “Esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (art. 208º, n.º 1, CRP; art. 158º, n.º 1).”.
E acrescenta o mesmo autor: “O dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (...) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (...); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível.” - Estudos sobre o Processo Civil, pág. 221.
Ou, como refere Lebre de Freitas, “Há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação.” - CPC, pág. 297.
No mesmo sentido diz o Conselheiro Rodrigues Bastos, que “A falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º 1 é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença.” - Notas ao Código de Processo Civil", III, pág. 194.
E como advertia o Professor Alberto dos Reis “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade do n.º 2.° do art. 668.°” - Código de Processo Civil Anotado, V, pág. 140.
Deste modo, face à doutrina exposta, conclui-se que a nulidade por falta de fundamentação não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a verificação da nulidade, a ausência de motivação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida.

Δ

No que concerne à arguida nulidade da falta de fundamentação fáctica, é manifesta a improcedência da pretensão da apelante no sentido de que essa nulidade seja declarada.

Para o efeito, basta transcrever o que foi exarado na decisão recorrida relativamente aos factos provados e não provados e à fundamentação aduzida para que tais factos assim tenham sido considerados:

...

Pode ou não concordar-se com o assim explicitado pelo tribunal recorrido; pode igualmente sustentar-se ou não que a fundamentação fáctica aduzida pelo tribunal recorrido poderia ser mais detalhada.

O que não pode seguramente sustentar-se é que ocorre uma falta absoluta de fundamentação.
De resto, segundo o acórdão do STJ de 6/6/2007[2], a decisão proferida sobre a matéria de facto não é susceptível de enfermar das nulidades da sentença previstas no artigo 668º do então Código de Processo Civil (actual art. 615º do NCPC) - no mesmo sentido e já ao abrigo do NCPC, tem decidido reiteradamente esta secção deste Tribunal da Relação, por exemplo nos acórdãos de 23/6/2017, proferido no processo 716/16.0T8CVL.C1, e de 15/09/2017, proferido no processo 4302/16.6T8VIS.C1; ainda no mesmo sentido, a título de exemplo, acórdãos do STJ de 31/1/1991, BMJ nº 403, p. 382 e de 9/4/1991, BMJ nº 416, p. 558, acórdão do STA de 20/12/2007, proferido no processo 0830/07, acórdão da Relação do Porto de 8/9/2014, proferido no processo 55/13.8TTPRT.P1, acórdãos da Relação de Coimbra de 20/1/2015, proferido no processo 2996/12.0TBFIG.C1, de 19/12/2012, proferido no processo 31156/10.3YIPRT.C1, acórdão do TCA do Norte de 15/10/2015, proferido no processo 01593/15.3BEPNF.

Não ocorre, assim, a nulidade arguida pela ré no concreto segmento que está em análise – fundamentação da decisão de facto.

Δ

No que concerne à nulidade da sentença por falta de fundamentação do decidido em matéria de direito, importa considerar o que se fez consignar na sentença recorrida em termos de fundamentação jurídica, sob a epígrafe “O Direito”, e que seguidamente se transcreve: “3.1.1 – O thema decidedum dos presentes autos cifra-se, neste momento processual, “unicamente” na decisão da liquidação da condenação pecuniária a cargo da R., a efetuar nos termos dos Arts. 358º e ss. do Novo Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no Art. 1º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho.

Como se sabe, o Art. 609º, n.º 2 do Novo Código de Processo Civil prescreve que “Se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida”.

Assim, “Sabendo-se que há danos que não foi possível determinar, mas que são determináveis e quantificáveis, entre recorrer à equidade e deixar os mesmos para a liquidação em execução de sentença, é preferível esta última alternativa” (Acórdão da Relação de Coimbra de 10 de dezembro de 2002, CJ V, p. 25), estando, de qualquer forma, o Tribunal sempre limitado, na liquidação destas obrigações pecuniárias e como já se referiu anteriormente na decisão final deste processo, pelo disposto no Art. 609º, n.º 1 do Novo Código de Processo Civil, não podendo condenar, a final, ultra petitum.

3.2.1 – No caso sub judice, o A. foi admitido ao serviço da R., para sob sua autoridade, direção e fiscalização, exercer uma atividade, mediante retribuição, verificando-se todos os elementos que caracterizam o contrato de trabalho, restando liquidar os créditos laborais em cujo pagamento a R. foi condenada e que se reportam apenas à “retribuição do trabalho prestado pelo A. ao serviço da R. de acordo com o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável, depois de descontados os montantes já pagos pela R. e de se proceder à compensação nessa quantia do valor de €1.379,08 (mil trezentos e setenta e nove euros e oito cêntimos), a título de indemnização pelo incumprimento do prazo de aviso prévio da cessação do contrato de trabalho pelo A.”, sendo certo que se mantém o desconhecimento relativamente aos dias concretos em que o A. prestou trabalho e esteve ao serviço da R. no estrangeiro (e sendo certo que as ajudas de custo “internacional” substituíam também, mas não só, “parte da cláusula 74ª”, pelo que se desconhece que parte da mesma estará ainda em dívida), o que, de qualquer forma, não pode implicar a improcedência deste incidente de liquidação, mas antes que o Tribunal decida segundo a equidade.

Como se escreveu no Acórdão da Relação do Porto de 24 de maio de 2004, retirado de www.dgsi.pt, “Se for relegada para execução de sentença o apuramento dos danos, e se o credor não vier a fazer a prova concreta do valor em dívida, a solução não está em julgar improcedente o incidente da liquidação, mas em condenar o devedor num valor certo, com recurso à equidade”, dado que, “como ensinava o Prof. Anselmo de Castro (in “Ação Executiva Singular, Comum e Especial”, 2ª Ed., págs. 62), perante as paralelas disposições constantes dos arts. 808º e 809º do CPC (anterior redação), “... Nesta hipótese não se aplicam, por conseguinte, as regras do ónus da prova, de acordo com as quais a insuficiente prova produzida pelo credor teria como consequência a fixação do crédito apenas no montante provado, com a improcedência da parte restante. A liquidação virá a fazer-se, como é óbvio, segundo a equidade, em dados termos, semelhantemente ao que dispõe agora o CC no art. 566º, nº3, para a obrigação de indemnizar...”.

Ou, de outra forma, “I - Quando se relega para liquidação em execução de sentença o apuramento do valor a receber pelo credor, tal significa, desde logo, que o Tribunal reconheceu a existência de um direito de crédito, que só não foi liquidado em montante certo, por não haver elementos para determinar o respetivo "quantum". II - O artº 807, n.3, do Código de Processo Civil, ao aludir a "litigantes" e à insuficiência da prova, prescinde de qualquer repartição de ónus probatório, impondo ao juiz que, oficiosamente, supra tais insuficiências, recorrendo, designadamente, à prova pericial. III - No incidente de liquidação, para lá de não haver ónus da prova por parte do exequente, a improcedência da liquidação, com fundamento de que o exequente não fez prova, equivale, a um "non liquet" e viola o caso julgado formado com a decisão definitiva [exequenda], que reconheceu ao exequente um crédito que, afinal, vem, contraditoriamente, a ser-lhe negado. IV - Se for de antever que a prova pericial, ou outras diligências que possam ser ordenadas, oficiosamente, não surtam efeito útil, o Tribunal deve decidir com base na equidade e, assente em tal critério, fixar a indemnização devida ao credor/exequente” – Acórdão da Relação do Porto de 31 de Janeiro de 2005, também retirado do sítio www.dgsi.pt.

Ou, ainda, I – A liquidação de uma sentença destina-se tão só à concretização do objeto da sua condenação, com respeito do caso julgado da sentença liquidanda, não sendo permitido às partes tomar uma posição diferente ou mais favorável do que a já assumida na ação declarativa. II – Quando a prova produzida pelos litigantes (em incidente de liquidação) for insuficiente para fixar a quantia devida, incumbe ao juiz completá-la mediante indagação oficiosa, ordenando, designadamente, a produção de prova pericial – artº 380º, nº 4, CPC. III – Da leitura do citado normativo resulta não só que as regras do ónus da prova não funcionam no caso do incidente de liquidação de sentença, mas, e sobretudo, que nunca poderá o incidente de liquidação vir a ser julgado improcedente por falta de prova. IV – Não sendo suficiente a prova produzida pelas partes, para se proceder à liquidação do crédito em causa, deverá o julgador levar a efeito a prossecução de tal objetivo oficiosamente, ultrapassando a situação de non liquet com a produção de prova (suplementar) que julgue adequada para o efeito (v.g. pericial). V – Se mesmo depois disso não for ainda possível atingir tal desiderato, deverá então e a final julgar-se a liquidação de acordo com a equidade, ou seja, fazendo um julgamento ex aequo et bono – artºs 4º, al. a) e 566º, nº 3, do C. Civ..”- Acórdão da Relação de Coimbra de 4 de dezembro de 2007, retirado de www.dgsi.pt.

A decisão segundo a equidade deve assentar nos elementos do caso sub judice (na justiça do caso concreto), uma vez que não há regras legais diretamente aplicáveis, procurando chegar a uma solução que, no entender do julgador, se afigure a mais justa e adequada em face do caso decidendo e dos interesses das partes.

Como referem PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado I, p, 54, em anotação ao Art. 4º do Código Civil, “O que passa a ter força especial são as razões de conveniência, de oportunidade, principalmente de justiça concreta, em que a equidade se funda”, passando-se, assim, para o que KARL ENGISCH, Introdução ao Pensamento Jurídico, 7.ª Edição, trad. portuguesa de J. Baptista Machado, Lisboa, 1996, p. 248, designa de jus aequum, em que o julgador é “chamado a descobrir o Direito do caso concreto, não simplesmente através da interpretação e da subsunção, mas também através de ‘valorações e decisões de vontade’”.

3.2.2 – In casu e como resulta também do que já acabou de se expor, só pode ser considerada, desde logo, a quantia peticionada ab initio a título de retribuição do trabalho prestado pelo A., descontando-se e compensando-se, como decidido na sentença agora liquidada, no montante devido ao A. a indemnização pelo incumprimento do prazo de aviso prévio da cessação do contrato de trabalho pelo A. e as ajudas de custo pagas pela R..

Desta forma, entende-se, atentas as posições das partes e considerando a falta total de outros elementos para fixar esse montante de forma mais equitativa, ser de liquidar a quantia em dívida, considerando, desde logo, muitíssimos exagerados os montantes peticionados pelo A. a este título (mormente no que diz respeito a alimentação, em que considera todos os dias úteis de um mês e sendo certo que sempre haveria muitos meses, ao longo do período em que trabalhou para a R., em que esteve de férias ou não esteve deslocado no estrangeiro, pretendendo também ter trabalhado para a R. perto de 250 dias de descanso e feriados) e atendendo igualmente aos valores muito avultados já pagos pela R. como “ajudas de custo” e aos montantes a compensar e a descontar, no montante de €10.000, a que acrescem, como decidido na sentença em causa (e pelos fundamentos aí constantes), “juros de mora, à taxa legal, desde 30/12/2015 e até efetivo e integral pagamento”.”.

Logo após e concordantemente com o assim exarado em termos de fundamentação, decidiu o tribunal recorrido nos termos constante do dispositivo supra transcrito.

Pode concordar-se, ou não, total ou parcialmente, com quanto acabou de transcrever-se.

Outrossim, pode considerar-se que o assim explicitado poderia, ou não, ser objecto de mais desenvolvida argumentação, designadamente quanto aos critérios ponderados para efeitos de fixação equitativa do crédito do autor.

O que manifestamente se nos afigura insustentável é afirmar-se, como faz a ré, que não se mostra fundamentado o decidido pelo tribunal recorrido.

Improcede, assim, a nulidade arguida pela ré no concreto segmento que está em análise – fundamentação da decisão jurídica.

Em face do antecedentemente exposto, é negativa a resposta à questão em análise.

Terceira questão: se os factos dados como provados permitem concluir no sentido de que os montantes pagos pela ré ao autor, acrescidos de um crédito indemnizatório que lhe foi reconhecido sobre o autor na sentença sob liquidação, excediam em €12.551,33 os valores que o autor deveria ter recebido da ré de acordo com o CCT aplicável à relação de trabalho que existiu entre ambos, razão pela qual não deveria ter sido liquidado nenhum crédito a satisfazer pela ré ao autor.

A ré insurge-se contra o valor de 10.000 euros fixado equitativamente pelo tribunal recorrido como sendo aquele que é devido ao autor com o fundamento de que os montantes por ela pagos ao autor, acrescidos de um crédito indemnizatório que lhe foi reconhecido sobre o autor, excediam em €12.551,33 os valores que o autor deveria ter recebido da ré de acordo com o CCT aplicável.

A conclusão assim sustentada pela ré alicerça-se nos seguintes quatro pressupostos que a mesma dá como assentes: i) é apenas de €11.490,26 a diferença entre o montante que foi pago a título de cláusula 74ª/7 do CCTV aplicável e aquele que deveria ter sido pago a esse título; ii) é apenas de €11.351,88 o valor devido ao autor a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado segundo as cláusulas 18º/1 e 41º/1 do CCTV aplicável; iii) é apenas de €14.575 o valor que deveria ter sido fixado como sendo devido ao autor a título de despesas com refeições e ao abrigo da cláusula 47ª-A do CCTV aplicável; iv) deve ser contabilizado em €48.589,39 o valor global pago pela ré ao autor e que deveria ser considerado para efeitos de liquidação dos valores referidos em i), ii) e iii), acrescendo à diferença assim determinada o valor de €1.379,08 que foi fixado na sentença em liquidação como sendo devido pelo autor à ré a título de indemnização pela inobservância do prazo de aviso prévio.

Consideramos que os factos dados como provados não suportam os pressupostos i), ii) e iii) retro enunciados, razão pela qual queda insustentada a supra referenciada conclusão enunciada pela ré no sentido de os valores a contabilizar a seu favor excederam em €12.551,33 os créditos que deveriam reconhecer-se ao autor.

Consideremos separadamente cada um desses pressupostos.

No que concerne ao primeiro pressuposto, parte a ré do princípio indemonstrado e que não se encarregou de demonstrar no sentido de que seria de €29.934,84 o valor a que o autor tinha direito a título de cláusula 74ª/7 do CCTV aplicável.

Comece por dizer-se que o valor indicado pela apelante não está referido na sentença recorrida, assim como o não foi na sentença objecto de liquidação.

Por outro lado, a apelante não faz o mínimo esforço argumentativo e demonstrativo que permita aquilatar da (in)fundada conclusão quantitativa que sustenta.

Em terceiro lugar, é sabido que a cláusula 74ª/7 consagra um direito dos motoristas em serviço no transporte internacional a receber uma retribuição especial e especifica que integra a retribuição global do trabalhador, destinando-se a mesma a compensar a vinculada disponibilidade do trabalhador para o desempenho de funções em deslocação no estrangeiro.

Como assim, tal retribuição apenas é devida por referência aos dias em que aquela vinculada disponibilidade se mantenha, não sendo devida, por exemplo, nos dias de faltas justificadas ou injustificadas do trabalhador ao serviço.

Ora, os factos dados como provados, seja na decisão recorrida, seja na proferida na acção declarativa comum, são completamente omissos sobre se alguma vez o autor faltou ao trabalho e, na afirmativa, que número de dias terá faltado, sendo que alguns dos recibos juntos aos autos fazem menção a períodos de falta do autor (v.g. fls. 22 vº, 296vº) que, em qualquer caso, não se sabe se ocorreram efectivamente ou não.

A significar, face à omissão referida no antecedente parágrafo e ao enunciado nos antepenúltimo e penúltimo parágrafos, que existe uma real impossibilidade de se determinar com exactidão o valor que a ré deveria ter pago ao autor a título de cláusula 74ª/7, assim como queda indemonstrado e insustentável o valor de €29.934,84 indicado pela apelante.

No que concerne ao segundo pressuposto, parte a ré do princípio indemonstrado e que não se encarregou de demonstrar no sentido de que seria apenas de €11.351,88 o valor devido ao autor a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal e feriado segundo as cláusulas 18º/1 e 41º/1 do CCTV.

Também a este respeito importa recordar que o valor indicado pela apelante não está referido na sentença recorrida, assim como o não foi na sentença objecto de liquidação.

Por outro lado, os factos dados como provados não permitem determinar o número de sábados, domingos e feriados em que o autor esteve ao serviço da ré no estrangeiro, pois segundo o descrito no ponto 2º) daqueles factos “O A. conduziu, nas viagens que lhe foram determinadas pela R. em Portugal e no estrangeiro, num número não concretamente apurado de sábados, domingos e feriados. (Respostas aos Artigos 7º e 8º da Petição Inicial e aos Artigos 13º a 28º da Contestação)”.

Não estando determinado o número de dias referido no antecedente parágrafo[3] é matematicamente impossível determinar com exactidão o crédito do autor sobre a ré e que tem como fonte constitutiva o trabalho prestado no estrangeiro naquele tipo específico de dias, dependendo a grandeza desse crédito, designadamente e em primeira linha, do número efectivo de dias de trabalho a contabilizar.

Por consequência, não pode sufragar-se o valor de €11.351,88 indicado pela ré como sendo o devido ao autor a respeito da temática remuneratória que está em apreciação.

No que concerne ao terceiro pressuposto, parte a ré do princípio indemonstrado e que não se encarregou de demonstrar no sentido de que é apenas de €14.575 o valor que deveria ter sido fixado como sendo devido ao autor a título de despesas com refeições e ao abrigo da cláusula 47ª-A do CCTV aplicável.

Reiteramos a este propósito que o valor indicado pela apelante não está referido na sentença recorrida, assim como o não foi na sentença objecto de liquidação.

Por outro lado, não se sabe o número de dias em que o autor permaneceu no estrangeiro ao serviço da ré, sendo que o crédito do autor neste domínio depende, também, desse número.

As partes não estão de acordo relativamente a esse número, pois que o autor reclama 1320 dias (52.800 euros / 40 euros – arts. 9º e 10º da petição), e a ré oferece em alternativa, nestas alegações e sem qualquer suporte factual que alicerce devidamente o seu raciocínio, 583 dias (14.575 euros / 25 euros – arts. 24º e 25º das alegações), sendo que o tribunal recorrido não quantificou esse número de dias.

Além disso, ao contrário do sustentado pela apelante, não se provou que o autor apenas realizasse transportes em Espanha[4], razão pela qual soçobra a sua pretensão de que apenas fosse atendido o valor da diária fixado no novo CCTV de 2018 para os motoristas do serviço Ibérico – 25 euros.

Ora, o valor das refeições não é igual em todos os países da Europa, razão pela qual a quantificação exacta do crédito do autor ora em apreciação dependeria da determinação do número de dias passados pelo autor nos diferentes países estrangeiros por onde transitasse e do custo das refeições em cada um desses países, variáveis estas que subsistem indeterminadas.

Em face do exposto, não pode sufragar-se o valor de €11.351,88 indicado pela ré como sendo o devido ao autor a respeito da temática remuneratória que está em apreciação.

Soçobram, pois, três dos pressupostos em que a ré faz assentar a conclusão no sentido de que o crédito global do autor era inferior em €12.551,33 relativamente ao resultado da soma dos montantes por ela pagos ao autor com o crédito indemnizatório que lhe foi reconhecido sobre o autor.

Não pode ser com base nessa conclusão, por isso, que pode proceder a pretensão da apelante no sentido de se considerar que nada é devido ao autor e que, por isso, deveria ser revogada a condenação que lhe foi imposta na sentença recorrida no sentido de pagar ao autor 10.000 euros.

Acresce dizer que na sentença a liquidar, a ré foi condenada a pagar ao autor a “… quantia a liquidar posteriormente e nunca podendo exceder o montante peticionado a este título pelo A., relativa à retribuição do trabalho prestado pelo A. ao serviço da R. de acordo com o instrumento de regulamentação coletiva do trabalho aplicável, depois de descontados os montantes já pagos pela R. e de se proceder à compensação nessa quantia do valor de €1.379,08 (mil trezentos e setenta e nove euros e oito cêntimos), a título de indemnização pelo incumprimento do prazo de aviso prévio da cessação do contrato de trabalho pelo A., acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 30/12/2015 e até efetivo e integral pagamento”.

Assim sendo, jamais poderia proceder a pretensão da apelante no sentido de se reconhecer que nada teria de liquidar-se como estando em dívida ao autor.

De facto, como consta do sumário do acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 31/5/2005, proferido no processo 0457249: “I - Quando se relega para liquidação em execução de sentença o apuramento do valor a receber pelo credor, tal significa, desde logo, que o Tribunal reconheceu a existência de um direito de crédito, que só não foi liquidado em montante certo, por não haver elementos para determinar o respectivo "quantum".

II - O artº 807, n.3, do Código de Processo Civil, ao aludir a "litigantes" e à insuficiência da prova, prescinde de qualquer repartição de ónus probatório, impondo ao juiz que, oficiosamente, supra tais insuficiências, recorrendo, designadamente, à prova pericial.

III - No incidente de liquidação, para lá de não haver ónus da prova por parte do exequente, a improcedência da liquidação, com fundamento de que o exequente não fez prova, equivale, a um "non liquet" e viola o caso julgado formado com a decisão definitiva [exequenda], que reconheceu ao exequente um crédito que, afinal, vem, contraditoriamente, a ser-lhe negado.

IV - Se for de antever que a prova pericial, ou outras diligências que possam ser ordenadas, oficiosamente, não surtam efeito útil, o Tribunal deve decidir com base na equidade e, assente em tal critério, fixar a indemnização devida ao credor/exequente.” – no mesmo sentido podem consultar-se, a título de exemplo, os acórdãos do STJ de 14/7/2009, proferido no processo 630-A/1996.S1; de 13/4/2010, proferido no processo 109/2002.C1.S1; os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 6/6/2013, proferido no processo 6730/07.9TMSNT.L2-6; de 30/6/2011, proferido no processo 5491/09.1TVLSB.L1-2; de 4/3/2010, proferido no processo 57/2001.1.L1-2; de 24/6/2008, proferido no processo 10831/2007-1; o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 4/7/2014, proferido no processo 1673/09.4TBVCD.P2.

Assim, no caso dos autos, sempre teria que reconhecer-se ao autor um qualquer crédito que excedesse numa qualquer medida a soma dos montantes pagos pela ré ao autor com o crédito indemnizatório que lhe foi reconhecido sobre o autor, não podendo, também por esta razão, proceder a pretensão da apelante no sentido de “ser a douta sentença de que se recorre substituída por outra, que absolva a Recorrente;”.

Tudo visto, deve ser negativa a resposta à questão que ora está em apreciação.

Por outro lado, tendo de reconhecer-se ao autor um qualquer crédito sobre a ré, improcedendo integralmente a argumentação aduzida pela ré no sentido de tentar demonstrar que nada era devido ao autor e na ausência de qualquer outra argumentação que tenha sido complementarmente aduzida pela ré para contrariar o concreto valor de 10.000 euros equitativamente fixado pelo tribunal recorrido, com indicação de outro valor alternativo ao assim fixado e explicitação dos critérios alternativos de quantificação desse valor alternativo, não vislumbramos razões suficientemente válidas e persuasivas para censurar aquele valor de 10.000 euros que, assim, subsiste intocado.

Quarta questão: se o crédito do autor sobre a ré deve ser quantificado em valor nunca inferior a €35 000, nos termos propugnados pelo autor no recurso subordinado.

O conhecimento desta questão ficou prejudicado pelo sentido em que foi decidida a primeira questão.

IV- DECISÃO

Acordam os juízes que integram esta 6ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de não tomar conhecimento do objecto do recurso subordinado e de julgar improcedente o recurso principal, confirmando-se integralmente a sentença recorrida.

Custas pelos apelantes principal e subordinado.

Coimbra, 31/1/2020


(Jorge Manuel Loureiro)

(Paula Maria Roberto)

(Ramalho Pinto)


Sumário:

Relegado para liquidação em execução de sentença o apuramento do valor a receber pelo credor e uma vez que no incidente de liquidação não existe ónus da prova por parte do credor, no termo desse incidente terá que ser quantificado um qualquer crédito do credor sobre o devedor, recorrendo-se oficiosamente, se necessário, à prova pericial ou à equidade, sob pena de violação do caso julgado formado em torno da decisão em liquidação.


(Jorge Manuel Loureiro)



***


[1] Cfr. arts. 613º/3 e 615º/1/d do NCPC.
[2] Proferido no processo n.º 07S670.
[3] Essa indeterminabilidade é admitida pela própria apelante, pois que ora se reporta ao “…número de dias peticionados nos autos.”, para com base neles admitir um valor devido de €11.351,88 (art. 19º das alegações), ora refere que o “…autor não realizou trabalho suplementar nos referidos dias…”, apesar do que manteve aquele valor sem indicação quantificada dos dias em que o autor teria realmente trabalhado no confronto daqueles que foram indicados pelo autor.
[4] Sabe-se apenas que o autor realizava transportes em território nacional e no estrangeiro, sem concreta delimitação geográfica deste último conceito – ponto 2º dos factos dados como provados.