Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1607/11.6T2AVR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: DELIBERAÇÃO SOCIAL
REDUÇÃO
CAPITAL SOCIAL
NULIDADE
ANULABILIDADE
Data do Acordão: 07/10/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA - AVEIRO - JUÍZO DO COMÉRCIO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 56, 58, 95, 288, 374 CSC
Sumário: 1. No quadro normativo vigente, estando em causa a redução do capital social para cobertura de prejuízos, não opera a limitação imposta pelo art.º 95º, n.º 1, do CSC (na redacção conferida pelo DL n.º 8/2007, de 17.01).

2. A anulabilidade constitui o regime regra em matéria de invalidade de deliberações sociais, abrangendo, entre outras, as deliberações cujo procedimento ou cujo conteúdo se opõem a cláusulas estatutárias.

3. Os casos de nulidade traduzem as situações mais gravosas expressamente previstas pelo legislador, envolvendo, em regra, o desrespeito do interesse público (stricto sensu) ou do interesse de terceiros (mormente, de futuros accionistas).

Decisão Texto Integral:             Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:


I. Em 01.9.2011, AJ (…), AC (…), EC (…), FN (…), MF (…),  MA (…), MAA (…), MF (…), MG (…), MJ (…) e ML (…) intentaram a presente acção ordinária contra N (…) & G (…), S. A., pedindo que fosse:
 a) Julgada nula e de nenhum efeito a deliberação tomada na assembleia geral dos accionistas da Ré realizada no dia 22.11.2010, relativa à redução do capital social de € 1 400 000 para € 14 000;
b) Julgada nula e de nenhum efeito a deliberação tomada na assembleia geral dos accionistas da Ré realizada no dia 22.11.2010, relativa ao aumento de capital social para € 1 500 000;
c) Julgada nula e de nenhum efeito a deliberação tomada na assembleia geral dos accionistas da Ré realizada no dia 22.11.2010, relativa à alteração da redacção do art.º 6º sob a epígrafe (Capital Social) dos Estatutos da sociedade Ré;
d) Julgada nula e de nenhum efeito a deliberação tomada na assembleia geral dos accionistas da Ré realizada no dia 03.01.2011, relativa à eleição dos membros da Mesa da Assembleia-Geral, do Conselho de Administração e do Fiscal Único;
e) Ordenado o cancelamento da inscrição n.º 9 da matrícula comercial da sociedade Ré referente à redução e aumento do capital através dos serviços do I. R. N. Instituto de Registos e Notariado, I. P. ou pelas Conservatórias do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia e Anadia;
f) Ordenado o cancelamento da inscrição n.º 10 da matrícula comercial da sociedade Ré referente à designação dos membros do Conselho de Administração através dos serviços do I. R. N. Instituto de Registos e Notariado, I. P. ou das Conservatórias do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia e Anadia.
Ou, quando assim não se entenda, que fossem anuladas as deliberações das alíneas a), b), c), d), e) e f), supra.
            Para o efeito, alegaram, em síntese, que as deliberações em causa violam o disposto no art.º 56º, n.º 1, alíneas a), c) e d), do Código das Sociedades Comerciais (CSC) [1], pelas razões melhor explanadas no articulado inicial, o que implica a sua nulidade, ou, caso tal assim não seja entendido, a respectiva anulabilidade, também pelos motivos expostos na petição inicial (p. i.).
A Ré contestou, impugnando parcialmente a factualidade alegada pelos AA. e sustentando que não se verificam as nulidades a que os mesmos se referem, sendo que, a existirem quaisquer invalidades, revestiriam a forma de anulabilidade, encontrando-se extinto, por caducidade, o direito de intentar a pertinente acção anulatória.
Os AA. replicaram pronunciando-se sobre a matéria de excepção, mantendo o alegado na p. i.; ampliaram o pedido e pediram a condenação da Ré como litigante de má fé.
Na tréplica, a Ré opôs-se e concluiu, além do mais, pelo indeferimento da “cumulação de pedidos”.
Apresentado, pelos AA., o articulado superveniente de fls. 822, com nova ampliação  do pedido, e depois de exercitado o contraditório, o Tribunal a quo não admitiu a pretendida ampliação.
Foi elaborado o despacho saneador (tabelar) e seleccionada a matéria de facto (assente e controvertida), indeferindo-se as reclamações das partes.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, por sentença de 08.11.2013 o Tribunal a quo julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré do pedido.
Inconformados, os AA. interpuseram a presente apelação formulando as conclusões que assim vão sintetizadas:
(…)
            Rematam depois dizendo que deve ser anulada a decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância, nos termos e para os efeitos da alínea c) do n.º 2 do art.º 662º, do Código de Processo Civil de 2013 (CPC), por se reputar deficiente, obscura e contraditória e dela não constarem todos os elementos probatórios que permitam a respectiva alteração, ordenando-se a repetição da audiência de discussão e julgamento [a]; no caso de assim se não decidir, deve ser ordenada a produção de nova prova (pessoal), nos termos da alínea b) do n.º 1 art.º 662º, do CPC [b]; ou, em alternativa, deve a sentença ser corrigida e suprida a nulidade de que enferma por virtude de não conter a análise crítica dos meios de prova carreados para os presentes autos, por manifesta falta de especificação da fundamentação considerada decisiva para a formação da convicção decisória do Tribunal a quo, violando o disposto no n.º 3 do art.º 659º, do CPC [c] ou, por último, deve a sentença ser revogada, julgando-se a acção totalmente procedente e provada [d].
A Ré respondeu à alegação dos recorrentes, pugnando pela sua improcedência.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e decidir, sobretudo: a) nulidades da sentença; b) modificação da decisão de facto (erro na sua apreciação, contradição na decisão e sua eventual renovação); c) decisão de mérito, atenta a factualidade assente e o reafirmar das posições iniciais das partes.
*
II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:
a) A sociedade Ré tem por objecto a representação, importação e comércio de equipamentos e materiais de construção civil. (A)
b) Os AA. são accionistas da Ré, sendo titulares de um conjunto de acções ao portador representativas do capital social da mesma. (B)
c) As sociedades denominadas “ T... Luxemburgo” e “ M... Luxemburgo”, com sede no Luxemburgo, também são accionistas da Ré, sendo que detinham 112 000 títulos (acções) ao portador, no valor global de € 560 000 (quinhentos e sessenta mil euros) cada. (C)
d) Na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia Geral da Ré, a A. MG (…) promoveu a convocação de uma reunião extraordinária da assembleia geral da Ré para o dia 22.11.2010, com a seguinte ordem de trabalhos:
1 - Redução do capital social da sociedade Ré para o montante de € 140 000 (cento e quarenta mil euros) - ou outro que a assembleia geral viesse a deliberar - a fim de compensar perdas sociais, mediante diminuição geral e proporcional do número de participações sociais detidas por todos os accionistas.
2 - Subsequente aumento do aumento do capital social para o montante de € 1 500 000 (um milhão e quinhentos mil euros) - ou outro que a assembleia geral viesse a decidir - por subscrição de novas acções, com preferência assegurada aos actuais accionistas em conformidade com o disposto no artigo oitavo do pacto social.
3 - Alteração do artigo sexto dos Estatutos no sentido de que o novo capital social passará a ser de € 1 500 000 (um milhão e quinhentos mil euros) - ou outro que viesse a ser deliberado - representado e dividido pelo correspondente número de acções, ficando o texto dessa cláusula à disposição dos accionistas na sede social a partir da data de publicação (documento de fls. 123). (D)
e) A convocatória referente à assembleia geral aludida em II. 1. d) foi efectuada através de anúncio publicado no Portal da Justiça, em 25.10.2010 (documento de fls. 124/125). (E)
f) No dia e hora designados na convocatória, reuniu a assembleia geral da sociedade Ré, presidida pela A. MG (…), tendo sido deliberado reduzir o capital social da Ré, que era de € 1 400 000 (um milhão e quatrocentos mil euros), para € 14 000 (catorze mil euros), com votação distribuída da seguinte forma:
- Votos a favor: 2 242 votos, distribuídos do seguinte modo:
a) T... Luxemburgo: 1120 votos;
b) M... Luxemburgo: 1120 votos;
c) F (…): 1 voto;
d) R (…): 1 voto;
- Abstenção: MG (…): 81 votos;
- Votos contra: 0 accionistas. (F)
g) Os fundamentos dos votos então expressos ficaram consignados nas respectivas declarações, conforme consta do documento (“acta n.º 89”) de fls. 126 a 130. (G)
h) Relativamente ao 2º ponto da ordem de trabalhos, a vogal do Conselho de Administração, Dr.ª (…), informou os accionistas de uma proposta da sociedade O (…), S. A., para aumento do capital social de € 14 000 (catorze mil euros), para € 1 500 000 (um milhão e quinhentos mil euros), através de entradas em dinheiro no montante de € 1 486 000 (um milhão quatrocentos e oitenta e seis mil euros), sendo que o proposto aumento seria subscrito pela sociedade O (…), S. A., através de depósito de idêntica soma em dinheiro nos termos do preceituado no art.º 89º do CSC, caso no período legal ninguém tivesse subscrito aumento de capital (documento de fls. 126 a 130). (H)
i) Submetida à votação, foi a proposta de aumento do capital social para € 1 500 000 (um milhão e quinhentos mil euros) aprovada por unanimidade (documento de fls. 126 a 130). (I)
 j) Relativamente ao terceiro ponto da ordem de trabalhos, foi deliberado, também por unanimidade, alterar o artigo sexto dos estatutos da sociedade, ficando o mesmo a ter a seguinte redacção: “Artigo 6º (capital social) – O capital social é de 1 500 000,00 € (um milhão e quinhentos mil euros) dividido e representado por trezentas mil acções ordinárias e ao portador, com o valor nominal de 5,00 € (cinco euros) cada uma” (documento de fls. 126 a 130). (J)
k) A deliberação referida em II. 1. f) teve como efeito directo e imediato não só a eliminação de 277 200 acções ao portador, no valor nominal de € 5 (cinco euros) cada, como também a eliminação das acções pertencentes aos AA., bem como aos accionistas (…), o que representa directamente para os AA. a perda de 43 641 acções, no valor nominal de € 5 (cinco euros) cada. (L)
l) Na sequência da deliberada redução do capital social, pretendeu-se que os títulos detidos pelos AA. tivessem a seguinte distribuição de acções/valor nominal (antes e após a redução do capital social):
AG (…), AC (…), EF(…), FG (…), MF (…), MA (…); MA (…); MF (…), MG(…), MJ (…) e ML (…),[5 612/€ 28 060 – 56,12/€ 280,60; 100/€ 500 – 1/€ 5; 200/€ 1 000 – 2/€ 10; 5 812/€ 29 060 – 58,12/€ 290,60; 6 644/€ 33 220 – 64,44/€ 322,20; 500/€ 2 500 – 5/€ 25; 100/€ 500 – 1/€ 5; 8 100/€ 40 500 – 81/€ 405; 8 100/€ 40 500 – 81/€ 405; 5 812/€ 29 060 – 58,12/€ 290,60; 3 000/€ 15 000 – 30/€ 150, respectivamente]. (M)
m) A A. MG (…) determinou, na qualidade de Presidente da Mesa da Assembleia Geral, que a lista de presenças dos accionistas e os documentos intitulados “Estimativa de Balanço” e “Lista de Accionistas” constassem como anexos à “acta n.º 89” de 22.11.2010, da qual passaram a fazer parte integrante devidamente rubricadas pelos actuais membros da mesa (documentos de fls. 131/132). (N)
n) O aviso para o exercício do direito de preferência na subscrição de novas acções por parte dos accionistas não foi objecto de publicação no Portal da Justiça nem no jornal da localidade da sede da Ré ou num dos jornais aí mais lidos. (O)
o) No dia 03.01.2011, realizou-se uma nova reunião extraordinária da assembleia geral de accionistas alusiva à eleição dos novos órgãos sociais para o triénio de 2011-2013. (P)
p) A essa reunião não compareceram nem se fizeram representar os AA.. (Q)
q) A A. MG (…) foi substituída, na reunião de 03.01.2011, pela administradora AC..., que presidiu, sendo que a mesma não é accionista da Ré. (R)
r) Foi também publicada no Diário de Aveiro a convocatória referente à assembleia designada para 22.11.2010, não tendo ocorrido a publicação no Jornal da Bairrada ou no Jornal Região Bairradina como era prática habitual na sociedade. (S)
s) Os relatórios e contas relativos aos exercícios de 2008 e 2009 foram aprovados por unanimidade em assembleias gerais presididas pela A. MG (…) (T)
t) Dá-se aqui por reproduzido o documento de fls. 155 a 170 que consubstancia o estatuto (pacto social) da Ré. (U)
u) Não foram prestadas informações de cariz contabilístico pelo fiscal único presente na assembleia geral de 22.11.2010 tendentes a justificar a proposta da operação de redução e aumento de capital. (resposta ao art.º 5º)
v) Não foi solicitado por nenhum dos participantes na assembleia geral de 22.11.2010 qualquer informação de natureza contabilística ao fiscal único presente na mesma.
w) Nessa reunião, do ponto de vista documental, apenas foram disponibilizados os elementos referidos em II. 1. m). (resposta ao art.º 4º)
x) Não tendo sido apresentados/disponibilizados aos accionistas, nem na assembleia, nem em momento anterior, os seguintes documentos:
    1) Relatório do conselho de administração fundamentado da operação de redução e aumento de capital social deliberada na assembleia geral de 22.11.2010;
    2) Relatório do Fiscal Único fundamentado referente à operação de redução e aumento de capital social deliberada na assembleia geral de 22.11.2010;
    3) Balancete analítico relativo a 31.12.2010;
    4) Cópia de documento comprovativo da comunicação da impossibilidade da empresa de liquidação da prestação de Julho de 2010 do Programa de Papel Comercial contraído no Millenium BCP;
    5) Cópia da proposta do Millenium BCP de transformação do Programa de Papel Comercial em empréstimo a médio e longo prazo, sob a forma de leasing imobiliário com taxa de juro de 7,78 %;
    6) Cópia de documento comprovativo de comunicação aos accionistas (maioritários e minoritários) da situação falência técnica da empresa e da falta de alternativas para o financiamento da “N(…) & G (…), S. A.”;
    7) Cópia de documento comprovativo da manifestação de interesse da sociedade “ O..., S. A.” na subscrição de capital social da “N (…) & G (…), S. A.”;
    8) Cópia da acta do conselho de administração contendo a deliberação de dispensa do relatório do Revisor Oficial de Contas e Fiscal Único da “N (…) & G (…) S. A.”, para a operação de redução e aumento de capital da sociedade;
    9) Cópia da publicação oficial do anúncio de aviso aos accionistas do prazo e condições de exercício do direito de subscrição do aumento de capital proposto.  (resposta ao art.º 5º)
y) Na assembleia geral de 22.11.2010, foram solicitados esclarecimentos pela A. MG (…), esclarecimentos prestados pela vogal do conselho de administração (…), tudo nos termos que resultam da respectiva acta (documento de fls. 126 a 130).
z) A A. MG (…) ficou a aguardar, desde 22.11.2010, pelo envio (via correio electrónico) da versão da “acta n.º 89”, referida em II. 1. g), cuja redacção a identificada administradora se prontificou a assegurar. (10º)
aa) A qual só chegou ao seu conhecimento em 26.01.2011. (11º)
bb) A Presidente da Mesa da Assembleia Geral durante o mandato de 2007-2010, que dirigiu as assembleias que aprovaram por unanimidade as contas referentes aos exercícios de 2008 e 2009, tinha conhecimento que:
 - O relatório e contas do exercício de 2008 evidenciava:
1 - Um resultado líquido de exercício negativo de 659 458,62.
2 - Resultados transitados negativos de 1 653 654.
3 - No relatório e parecer do Fiscal Único, advertia-se: “Chamamos a atenção para o facto de o capital próprio da empresa à data de 31 de Dezembro de 2008 ter passado a ser inferior a metade do capital social da empresa pelo que se torna necessário tomar as medidas previstas no art.º 35º do Código das Sociedades Comerciais. A continuidade da empresa está, consequentemente, dependente da melhoria da sua rendibilidade e/ou entrada de novos capitais”,
 - O relatório e contas do exercício de 2009 demonstrava:
1 - Um resultado líquido negativo de € 34 885,78;
2 - Resultados transitados negativos de € 2 139 439,99;
3 - No relatório e parecer do Fiscal Único, repetia-se ipsis verbis a advertência aos sócios supra transcrita. (13º)
cc) A situação económico-financeira da Ré, que se vinha agravando desde há vários anos, era conhecida de todos os accionistas. (14º)
dd) Conhecendo os mesmos os dados contabilísticos dos documentos referidos em II. 1. bb), designadamente relatório e contas dos exercícios de 2008/2009. (resposta ao art.º 15º)
ee) Em 31.12.2009, o capital próprio da firma havia descido ao montante de € 469 560,89. (16º)
ff) A sociedade (…), S. A., em 21.12.2010, depositou na conta n.º 00001895963 (Millenium BCP) de que a Ré é titular, um cheque sacado sobre o Banco Bilbao Viscaya Argentaria (agência de Aveiro), no valor de € 1 486 000, quantia essa creditada na conta da Ré. (17º)
gg) Os AA. manifestaram desinteresse na subscrição do aumento de capital. (18º)
hh) A publicação a que se alude em II. 1. r) foi efectuada em 25.10.2010. (19º)
ii) A convocatória da assembleia de 03.01.2011 não foi objecto de publicação num dos jornais da localidade da sede da Ré ou num dos jornais aí mais lidos.
jj) Em assembleia geral realizada no dia 10.4.2012, foi deliberada a dissolução da sociedade Ré (documento de fls. 1009 a 1043).
            2. E deu como não provada a demais factualidade em discussão, designadamente que:
            a) A autora MG (…), no dia e hora designados para a assembleia geral, ignorava os pressupostos contabilísticos e financeiros da operação de redução e aumento de capital proposta. (1º)
b) Por se encontrar desprovida de documentação justificativa da operação de redução e aumento de capital, a qual nunca foi facultada pela vogal da administração da ré ((…)) nem sequer por qualquer membro do Conselho Fiscal. (2º)
c) Sendo que nem sequer o próprio Presidente do Conselho de Administração, (…), bem como o accionista (…), eram conhecedores, ao tempo, dos aludidos elementos. (3º)
d) Os autores sempre foram desconhecedores, por nunca terem sido informados directa ou pessoalmente por qualquer membro do Conselho de Administração ou do Conselho de Fiscalização, dos contornos referentes à operação de redução e aumento de capital. (6º)
e) A operação em causa (aumento de capital) apenas foi concretizada a fim de alguns accionistas da empresa O..., S. A., se libertarem de garantias de índole pessoal prestadas por virtude de financiamentos obtidos junto de instituições bancárias. (9º)
3. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.
Dizem os recorrentes que a sentença recorrida padece de vício por violação do dever de fundamentar previsto no art.º 607º, n.º 4, do CPC, no segmento em que decidiu pelo desvalor probatório das testemunhas arroladas pelos recorrentes, o que constitui nulidade da sentença (art.º 615º, n.º 1, b), do CPC), e que, tendo os recorrentes requerido, oportunamente, ao tribunal recorrido a produção de prova documental tendente à demonstração da factualidade do quesito 9º da b. i., a omissão da mencionada diligência de prova pelo Tribunal a quo acarreta, nos termos dos art.ºs 195º, n.º 1 e 615º, n.ºs 1, alínea e) e 4, do CPC, a nulidade do processo e, correspectivamente, da sentença.
Vista a fundamentação da alegação de recurso e compulsados os autos, parece-nos evidente que os recorrentes invocam a existência das causas de nulidade da sentença consistentes na falta de fundamentação de facto e na omissão de pronúncia (art.º 615º, n.º 1, alíneas b) e d), 1ª parte, do CPC).[2]
Porém, também aqui vemos invocadas pretensas “nulidades” da sentença, sem qualquer consistência ou em que é patente a desconformidade ou inadequação do procedimento adoptado.[3]
Na verdade, quanto ao primeiro segmento da referida invocação, dir-se-á, por um lado, que o Mm.º Juiz a quo indicou claramente os fundamentos de facto que justificaram a decisão sob censura e, por outro lado, que tudo o mais ora questionado tem a ver com o efectivo cumprimento do n.º 4 do art.º 607º, do CPC, e, sobretudo, com a pretensão de ver modificada a decisão de facto no âmbito da aplicação do disposto nos art.ºs 640º e 662º, do mesmo Código, matéria a apreciar no ponto seguinte.
Não se podendo/devendo confundir quaisquer eventuais nulidades dos actos processuais (art.º 195º, do CPC) com as “causas de nulidade da sentença” (art.º 615º, do CPC), importa dizer, quanto ao demais invocado, que, perante a dita omissão de pronúncia do Tribunal a quo na sequência das diversas diligências de prova requeridas a fls. 1306 e seguintes (e, particularmente, a enumerada sob o ponto IV/fls. 1312) ao abrigo do disposto nos art.ºs 512º e 528º, do CPC de 1961 (e dos art.ºs 42º e 43º, do Código Comercial), e  tendo presente as datas das duas sessões da audiência de discussão e julgamento (02.10.2013 e 25.10.2013/fls. 1362 e 1366), os recorrentes, se inconformados com a actuação/omissão do Tribunal, há muito deveriam ter manifestado a sua posição através do meio de reacção ou de impugnação tido por adequado, e, assim, reclamando da correspondente “nulidade processual” ou, porventura, mediante a interposição de recurso, caso se considerasse ter havido indeferimento (tácito) da junção dos requeridos meios de prova , o que não fizeram, pelo que, o ora aduzido é, pelo menos, intempestivo [cf., no domínio de aplicação do CPC de 2013, os art.ºs 5º, n.º 1, da Lei n.º 41/2013, de 26.6 e 644º, n.º 2, alínea d) e 638º, n.º 1, do CPC e, ainda, quanto às nulidades do processo, o disposto nos art.ºs 196º, 197º e 199º, do mesmo Código].
Ou seja, os recorrentes não arguiram tempestivamente qualquer nulidade processual, nem adoptaram outro meio de reacção, e é evidente que a descrita actuação não consubstancia vício da decisão recorrida enquadrável na previsão do art.º 615º, do CPC.
Não se poderá pois concluir pela existência das mencionadas “nulidades” da sentença.
4. a) Os AA./recorrentes insurgem-se contra a decisão sobre a matéria de facto, invocando, sobretudo, a prova testemunhal, por eles indicada, produzida em audiência de julgamento.
(…)
            Estas as principais razões pelas quais soçobra a pretensão dos apelantes visando a modificação da decisão de facto (art.º 662º, do CPC).
5. Vejamos agora o direito aplicável e a resposta a dar às demais questões, começando por indicar o principal quadro normativo.
Preceitua o art.º 56º, do CSC:
1 - São nulas as deliberações dos sócios:
a) Tomadas em assembleia geral não convocada, salvo se todos os sócios tiverem estado presentes ou representados;
b) Tomadas mediante voto escrito sem que todos os sócios com direito de voto tenham sido convidados a exercer esse direito, a não ser que todos eles tenham dado por escrito o seu voto;
c) Cujo conteúdo não esteja, por natureza, sujeito a deliberação dos sócios;
d) Cujo conteúdo, directamente ou por actos de outros órgãos que determine ou permita, seja ofensivo dos bons costumes ou de preceitos legais que não possam ser derrogados, nem sequer por vontade unânime dos sócios.
2 - Não se consideram convocadas as assembleias cujo aviso convocatório seja assinado por quem não tenha essa competência, aquelas de cujo aviso convocatório não constem o dia, hora e local da reunião e as que reúnam em dia, hora ou local diversos dos constantes do aviso.
3 - A nulidade de uma deliberação nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 não pode ser invocada quando os sócios ausentes e não representados ou não participantes na deliberação por escrito tiverem posteriormente dado por escrito o seu assentimento à deliberação.
E o art.º 58º estabelece o seguinte:
1 - São anuláveis as deliberações que:
a) Violem disposições quer da lei, quando ao caso não caiba a nulidade, nos termos do artigo 56º, quer do contrato de sociedade;
b) Sejam apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente de prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido tomadas mesmo sem os votos abusivos;
c) Não tenham sido precedidas do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação.
2 - Quando as estipulações contratuais se limitarem a reproduzir preceitos legais, são estes considerados directamente violados, para os efeitos deste artigo e do artigo 56.º
3 - Os sócios que tenham formado maioria em deliberação abrangida pela alínea b) do n.º 1 respondem solidariamente para com a sociedade ou para com os outros sócios pelos prejuízos causados.
4 - Consideram-se, para efeitos deste artigo, elementos mínimos de informação:
a) As menções exigidas pelo artigo 377º, n.º 8;
b) A colocação de documentos para exame dos sócios no local e durante o tempo prescritos pela lei ou pelo contrato.
6. Os recorrentes mantêm, no essencial, a posição expressa nos articulados da acção mas, salvo o devido respeito, não deram a devida atenção à factualidade provada e, inclusive, ao próprio desenvolvimento da acção (ponto I., supra).
Persistem em fazer valer a sua perspectiva atendo-se a um quadro teórico que, necessariamente, não se poderá desligar de uma determinada realidade, sendo esta que ditará a adequação ou inadequação daquele – esta, cremos, a principal tarefa a prosseguir no recurso, adiantando-se, desde já, que se afigura correcto o explanado e decidido pelo Tribunal recorrido.
Na verdade, importava saber se as deliberação sociais impugnadas são/eram inválidas e, sendo-o, se apenas havia lugar à sua anulabilidade, com os efeitos legais daí decorrentes.
7. Dizem os AA. que o capital social[4], na sequência da votação que incidiu sobre o primeiro ponto da ordem de trabalhos da assembleia geral de 22.11.2010, foi reduzido de € 1 400 000 para € 14 000, verificando-se que, antes e depois do aumento de capital subsequentemente deliberado, o resultado líquido do período em causa ascendia ao montante de 48 671,91 € (segundo a mencionada “estimativa de balanço”).
Referem depois, designadamente, que o montante para o qual o capital foi reduzido nem sequer corresponde ao montante mínimo exigido para as sociedades anónimas (€ 50 000/art.ºs 95º, n.º 2 e 276º, n.º 5, este, na redacção do DL 49/2010, de 19.5); não existir um balanço e parecer subscritos pelo fiscal único que espelhassem a realidade financeira da Ré, em conformidade com as regras do SNC/Sistema de Normalização Contabilística; a validade da redução do capital não se basta com a deliberação simultânea de um aumento de capital, verificando-se ainda a violação do direito de preferência dos recorrentes na subscrição do capital social da apelada.
Afirmam ainda que se deverá rejeitar a interpretação restritiva ou correctiva do art.º 95º, n.º 1, efectuada pelo Tribunal a quo, no sentido de que não inclui “a redução de capital para cobertura de perdas” e não faz operar a limitação nele imposta; a deliberação social de redução do capital social da recorrida para cobertura de perdas é ilícita, devendo ser sancionada com a nulidade, nos termos do art.º 56º, n.º 1, alínea d), por incumprimento do limite previsto naquele art.º.
8. Partindo dos normativos indicados em II. 5., supra, importa verificar o regime jurídico aplicável à situação dos autos, em particular, às deliberações tomadas nas mencionadas assembleias gerais.
Uma das principais questões suscitadas pelos AA. prende-se com a alegada violação do art.º 95º, n.º 1 (na redacção introduzida pelo DL n.º 8/2007, de 17.01), que estabelece: “a redução do capital não pode ser deliberada se a situação líquida da sociedade não ficar a exceder o novo capital em, pelo menos, 20 %.”
Esta norma - como muitas outras do Código das Sociedades Comerciais (aprovado pelo DL n.º 262/86, de 02.9) - não podia deixar de constituir uma “fonte de dúvidas e litígios[5], sendo que, como bem se refere na decisão sob censura, as sucessivas intervenções legislativas ao Código das Sociedades Comerciais, em vez de clarificarem o quadro normativo aplicável às sociedades comerciais, criaram nítidos obstáculos a todos os destinatários da norma e a quem tem de efectuar a respectiva exegese.
Assim, na redacção originária do referido art.º, era imposto, nos casos de redução de capital social, que a sociedade obtivesse uma autorização judicial (n.º 1 do art.º 95º), a qual não seria concedida se a situação líquida da sociedade não excedesse o novo capital em pelo menos 20 % (n.º 2), dispensando-se, no entanto, tal autorização se a redução fosse apenas destinada à cobertura de perdas (n.º 3).
Com alterações subsequentes (DL n.º 280/87, de 08.7, e DL n.º 76-A/2006, de 29.3), a norma manteve, no essencial, o regime inicial, só vindo a sofrer uma alteração significativa com o  DL n.º 8/2007, de 17.01, o qual introduziu a redacção actualmente vigente e aplicável ao caso em análise.
 No domínio daquela redacção primitiva, como também se refere na decisão recorrida, parecia claro que a dita limitação fixada em 20 % não operava quando estava em causa a redução do capital social para cobertura de perdas.
Contudo, em face daquela nova redacção, coloca-se a questão de saber se o legislador pretendeu incluir nas situações abrangidas pelo art.º 95º, n.º 1, a redução de capital para cobertura de perdas, assim alterando o regime que resultava da redacção anterior; ou se, pelo contrário, tal redacção resulta de um lapso manifesto, uma vez que o que se pretendia era apenas a mera simplificação dos procedimentos estabelecidos a propósito da redução do capital social.
 Como o Tribunal a quo, e salvo sempre o devido respeito por perspectiva diversa, propendemos para esta segunda solução - no quadro normativo vigente, estando em causa a redução do capital social para cobertura de prejuízos, não opera a limitação imposta pelo art.º 95º, n.º 1.
Na verdade, decorre claramente do preâmbulo do DL n.º 8/2007, de 17.01[6], que o propósito do legislador foi simplificar procedimentos no sector do registo comercial e actos comerciais conexos, aludindo-se expressamente, também, à possibilidade de redução do capital social para cobertura de perdas. Então, já era dispensada a intervenção judicial mas veio a ser também eliminada, com o DL n.º 8/2007, a necessidade de autorização judicial para as demais situações em que se verifique a redução do capital social - tratando-se ou não de cobertura de perdas, o procedimento passou a decorrer, exclusivamente, no âmbito dos órgãos societários competentes, sem prejuízo de recurso à via judicial sempre que exista um litígio sobre a matéria (redução de capital).[7]
Não foi, pois, intenção do legislador alterar, no domínio da redução de capital para cobertura de perdas, o que resultava do quadro normativo anterior, ainda que a redacção adoptada não tenha sido a mais feliz - ao ser unificado o regime (dispensa de autorização judicial para todos os casos de redução do capital social), não se deu o devido relevo a que uma das modalidades mais importantes (cobertura de prejuízos), implicava, para além da referida dispensa, também a inaplicabilidade da limitação (20 %) estabelecida a propósito da situação líquida da sociedade.
Ademais, e revela-se decisivo para a situação em apreço, a sufragar-se um entendimento que apenas atendesse à letra do art.º 95º, n.º 1, a redução de capital para cobertura de perdas estaria, à partida, totalmente impossibilitada, uma vez que a situação líquida da sociedade, após a realização da operação, nunca poderia ser superior em 20 % ao novo capital (“a aceitar-se literalmente, inviabilizaria a maior parte das reduções por perdas, que se tornariam, por definição, impossíveis quando a situação líquida da sociedade fosse negativa”), sendo que, interpretando de forma sistemática o CSC, é legalmente (e obviamente) admissível a redução do capital social para as finalidades apontadas – cobertura de prejuízos.[8]
E uma vez que à operação de redução se seguiu, de imediato, uma operação de aumento de capital (para € 1 500 000) que respeita o que o legislador estabeleceu a este propósito [estamos perante a denominada “operação harmónio”/“operação acordeão”][9] não vemos como se possa afirmar que a redução do capital social da Ré é nula por não ter sido observado o limite mínimo imposto para as sociedades anónimas (€ 50 000/art.º 276º, n.º 5) – cf., ainda, o disposto no n.º 2 do art.º 95 (na redacção conferida pelo DL n.º 8/2007, de 17.01), quanto a essa possibilidade, que tem de se concretizar no prazo de 60 dias seguintes à deliberação[10], pelo que é inteiramente insubsistente o aduzido pelos AA. em sentido contrário.
9. E quanto à pretensa necessidade de um balanço e parecer subscritos pelo fiscal único que espelhassem a realidade financeira da Ré, sem prejuízo do que se dirá adiante, verifica-se, por um lado, que a lei (CSC) não exige, de forma expressa, qualquer documento contabilístico para se proceder à operação de redução de capital[11]; por outro lado, no caso vertente, em sede de assembleia geral, foi apresentada uma “estimativa de balanço” que não deixaria de dar uma perspectiva aproximada da realidade da empresa naquela fase do “exercício de 2010” (de resto, além de os AA. não questionaram a veracidade do que aí consta, verificou-se, depois, elaboradas as contas do exercício de 2010, que a situação económico-financeira da Ré não seria menos grave/difícil do que aquela que era possível entrever da dita “estimativa”/cf. documentos de fls. 362 e seguintes); acresce que, e principalmente, no decurso da assembleia geral de 22.11.2010, ninguém colocou em causa o documento apresentado, sendo certo que se encontrava presente o fiscal único e nenhum dos presentes pediu esclarecimentos sobre os contornos da operação, ou os elementos de natureza contabilística inseridos na dita “estimativa”, sendo certo que, existindo dúvidas, as mesmas poderiam/deveriam ter sido de imediato colocadas a quem estava habilitado a esclarecê-las.[12]
De resto, os accionistas conheciam a situação económico-financeira da Ré.
Improcede, assim, a argumentação dos AA. no sentido de que ocorre a nulidade da deliberação de redução de capital por ausência de documentos legalmente exigidos ou desconhecimento dos pressupostos que motivaram a operação.
10. Consideram depois os recorrentes que na assembleia geral de aprovação da operação de redução e aumento de capital da recorrida foi deliberado aquilo a que certo sector da doutrina apelida de “redução conveniente”, subordinada ao regime do art.º 35º - este o sentido interpretativo que deve ser dado à convocação e aos trabalhos decorridos na referida assembleia que aprovou, sem o aviso convocatório previsto no art.º 35º, n.º 3, uma deliberação de redução do capital da Ré que é nula por padecer de um vício de conteúdo decorrente da falta de convocação e da violação de preceito legal que não pode ser derrogado.
O art.º 35º, como outros preceitos do CSC, também tem sofrido diversas intervenções legislativas que têm dado origem a inúmeras dúvidas e perplexidades a quem tem a tarefa de o interpretar e aplicar.[13]
A norma em apreço (com a epígrafe “perda de metade do capital”) tem, actualmente, a seguinte redacção (introduzida pelo DL n.º 76-A/2006, de 29.3, aplicável in casu):
1 - Resultando das contas de exercício ou de contas intercalares, tal como elaboradas pelo órgão de administração, que metade do capital social se encontra perdido, ou havendo em qualquer momento fundadas razões para admitir que essa perda se verifica, devem os gerentes convocar de imediato a assembleia geral ou os administradores requerer prontamente a convocação da mesma, a fim de nela se informar os sócios da situação e de estes tomarem as medidas julgadas convenientes.
2 - Considera-se estar perdida metade do capital social quando o capital próprio da sociedade for igual ou inferior a metade do capital social.
3 - Do aviso convocatório da assembleia geral constarão, pelo menos, os seguintes assuntos para deliberação pelos sócios:
a) A dissolução da sociedade;
b) A redução do capital social para montante não inferior ao capital próprio da sociedade, com respeito, se for o caso, do disposto no n.º 1 do artigo 96º;
c) A realização pelos sócios de entradas para reforço da cobertura do capital.”
Ao longo de quase duas décadas, o legislador apresentou soluções díspares, para esta problemática, oscilando entre a dissolução por deliberação dos sócios (sob proposta da administração) ou dissolução judicial (a requerimento dos sócios) - versão originária do Código -, a dissolução automática da sociedade (versão de 2002/ DL n.º 162/2002, de 11.7), quando se mantivesse a perda de metade do capital no final do exercício seguinte àquele em que os administradores fizessem constar tal facto no relatório de gestão, e, novamente, a dissolução (a par de outras medidas possíveis) decorrente de deliberação dos sócios (sob iniciativa da administração), quer na redacção de 2005 (DL n.º 19/2005, de 18.01), quer na que actualmente vigora (2006). [14]
Também neste ponto temos por inteiramente correcto o explanado pelo Tribunal recorrido: aquando da convocação da assembleia geral de 22.11.2010 não estava em causa qualquer das medidas alternativas previstas no art.º 35º, n.º 3 - a assembleia não foi convocada especificamente para ser dado cumprimento ao disposto no art.º 35º do CSC, mas sim para um objectivo muito específico, ou seja, para ser deliberado, unicamente, um aumento e redução de capital; tratou-se, pois, de uma medida de saneamento económico-finaceiro da sociedade, enquadrável na denominada “operação harmónio” (redução e aumento simultâneo do capital social).
Daí que não se justifique a extrapolação que os AA. fazem ao defenderem que estava em causa uma assembleia convocada ao abrigo do art.º 35º, pois não era essa a finalidade.
11. Na subscrição de novas acções representativas de aumentos de capital, terão preferência os accionistas que o forem à data da subscrição, na proporção das que já possuam, salvo se de outro modo for deliberado pela Assembleia Geral, observando o disposto no artigo 460º do Código das Sociedades Comerciais (art.º 8º, n.º 1, do “pacto social”/fls. 159).
Em cada aumento de capital por entradas em dinheiro, as pessoas que, à data da deliberação de aumento de capital, forem accionistas podem subscrever as novas acções, com preferência relativamente a quem não for accionista (art.º 458º, n.º 1).
Os AA., como accionistas, gozavam do direito de preferência na subscrição de novas acções; o prazo para o seu exercício, de acordo com os “estatutos”, encontrava-se fixado em 30 dias, contados a partir da publicação de avisos que deveria ocorrer no Diário da República e num jornal da localidade da sede da sociedade ou, na falta deste, num dos jornais aí mais lidos (art.º 8º, n.ºs 3 e 4, do “pacto social”/fls. 160).[15]
 A referência ao Diário da República, na actualidade e à data em que foi realizada a assembleia, deve considerar-se como sendo feita ao sítio na Internet de acesso público, atento o teor do art.º 167º, n.º 1 (a partir da redacção introduzida pelo DL n.º 111/2005, de 08.7[16]).
Decorre dos factos provados que na convocatória da assembleia geral de 22.11.2010 aludiu-se ao exercício do direito de preferência [cf. II. 1. alínea d) - 2, supra] mas não foram publicados os avisos previstos estatutariamente, nem no Portal da Justiça, nem nos jornais a que o “pacto social” faz referência.
Porém, este facto não determina a nulidade da deliberação do aumento de capital.
Verifica-se, desde logo, que os AA. manifestaram desinteresse na subscrição do aumento de capital [cf. II. 1. alínea gg), supra].
Não obstante, a ausência das mencionadas publicações não implica a nulidade da deliberação que incidiu sobre o aumento de capital, porquanto se trata de um mero vício de procedimento – anúncio referente ao exercício do direito de preferência. Estamos, assim, fora do âmbito do art.º 56º, n.º 1, verificando-se, apenas, uma causa de anulação (anulabilidade) prevista no art.º 58º, n.º 1, alínea a), por violação de uma disposição da lei e do contrato de sociedade (art.ºs 459º, n.ºs 1 e 2, do CSC e art.º 8º, n.º 3, do “pacto social”).
Tratando-se de anulabilidade, que constitui o regime regra em matéria de invalidade de deliberações sociais [os casos de nulidade são taxativos - situações mais gravosas expressamente previstas pelo legislador - e, fora do seu âmbito restrito, aplica-se o regime da mera anulabilidade] [17], os AA. dispunham do prazo de 30 dias para intentar a correspondente acção de anulação [art.º 59º, n.º 2, alínea a)].
Inobservado o referido prazo, o respectivo direito sempre se encontraria extinto por caducidade (art.º 298º, n.º 2, do Código Civil), tendo, por isso, ficado sanado o aludido vício procedimental.
12. O art.º 374º (sob a epígrafe “mesa da assembleia geral”), estabelece o seguinte:
1 - A mesa da assembleia geral é constituída, pelo menos, por um presidente e um secretário.
2 - O contrato de sociedade pode determinar que o presidente, o vice-presidente e os secretários da mesa da assembleia geral sejam eleitos por esta, por período não superior a quatro anos, de entre accionistas ou outras pessoas.
3 - No silêncio do contrato, na falta de pessoas eleitas nos termos do número anterior ou no caso de não comparência destas, serve de presidente da mesa da assembleia geral o presidente do conselho fiscal, da comissão de auditoria ou do conselho geral e de supervisão e de secretário um accionista presente, escolhido por aquele.
4 - Na falta ou não comparência do presidente do conselho fiscal, da comissão de auditoria ou do conselho geral e de supervisão, preside à assembleia geral um accionista, por ordem do número de acções de que sejam titulares caso se verifique igualdade de número de acções, deve atender-se, sucessivamente, à maior antiguidade como accionista e à idade.
No art.º 20º, n.º 2, dos “estatutos” da Ré estabelece-se que na falta do presidente da mesa (“impossibilidade deste”) o mesmo é substituído pelo secretário, cabendo a este último designar um accionista que secretarie a mesa da assembleia geral.
Reportando-se à eleição dos órgãos sociais (administração) que ocorreu na assembleia geral realizada em 03.01.2011, os AA./recorrentes continuam a sustentar que a correspondente deliberação é nula, em virtude da assembleia ter sido presidida pela administradora (…), a qual, nos termos legais e estatutários (arts. 374º, n.ºs 3 e 4, do CSC, e 20º, n.º 2, do “pacto social”) não podia presidir a essa reunião.
Ficou provado que a assembleia em questão foi presidida por uma pessoa não prevista no “pacto social” e no CSC.
Todavia, essa circunstância não implica a nulidade da deliberação que incidiu sobre a eleição dos órgãos, mas tão-só a anulabilidade da mesma (não se trata, nomeadamente, de uma deliberação que seja ofensiva dos bons costumes ou de preceitos legais que não possam ser derrogados), estando em causa a violação do disposto no art.º 58º, n.º 1, alínea a), e não do art.º 56º, n.º 1, pelo que ocorreu igualmente a caducidade do direito de arguir tal invalidade (cf. II. 11. in fine, supra).
13.  Todo o sócio tem direito a obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato [art.º 21º, n.º 1, alínea c)].
Relativamente às sociedades anónimas, preceitua o art.º 288º (sob a epígrafe “direito mínimo à informação”), no seu n.º 1 (redacção conferida pelo DL n.º 76-A/2006, de 29.3):
“Qualquer accionista que possua acções correspondentes a, pelo menos, 1 % do capital social pode consultar, desde que alegue motivo justificado, na sede da sociedade:
a) Os relatórios de gestão e os documentos de prestação de contas previstos na lei, relativos aos três últimos exercícios, incluindo os pareceres do conselho fiscal, da comissão de auditoria, do conselho geral e de supervisão ou da comissão para as matérias financeiras, bem como os relatórios do revisor oficial de contas sujeitos a publicidade, nos termos da lei;
b) As convocatórias, as actas e as listas de presença das reuniões das assembleias gerais e especiais de accionistas e das assembleias de obrigacionistas realizadas nos últimos três anos;
c) Os montantes globais das remunerações pagas, relativamente a cada um dos últimos três anos, aos membros dos órgãos sociais;
d) Os montantes globais das quantias pagas, relativamente a cada um dos últimos três anos, aos 10 ou aos 5 empregados da sociedade que recebam as remunerações mais elevadas, consoante os efectivos do pessoal excedam ou não o número de 200;
e) O documento de registo de acções.”
E no que respeita às “informações preparatórias da assembleia geral”, estatui o art.º 289º, n.º 1 (na redacção do mesmo DL n.º 76-A/2006):
 “Durante os 15 dias anteriores à data da assembleia geral, devem ser facultados à consulta dos accionistas, na sede da sociedade:
a) Os nomes completos dos membros dos órgãos de administração e de fiscalização, bem como da mesa da assembleia geral;
b) A indicação de outras sociedades em que os membros dos órgãos sociais exerçam cargos sociais, com excepção das sociedades de profissionais;
c) As propostas de deliberação a apresentar à assembleia pelo órgão de administração, bem como os relatórios ou justificação que as devam acompanhar;
d) Quando estiver incluída na ordem do dia a eleição de membros dos órgãos sociais, os nomes das pessoas a propor, as suas qualificações profissionais, a indicação das actividades profissionais exercidas nos últimos cinco anos, designadamente no que respeita a funções exercidas noutras empresas ou na própria sociedade, e do número de acções da sociedade de que são titulares;
e) Quando se trate da assembleia geral anual prevista no n.º 1 do artigo 376.º, o relatório de gestão, as contas do exercício, demais documentos de prestação de contas, incluindo a certificação legal das contas e o parecer do conselho fiscal, da comissão de auditoria, do conselho geral e de supervisão ou da comissão para as matérias financeiras, conforme o caso, e ainda o relatório anual do conselho fiscal, da comissão de auditoria, do conselho geral e de supervisão e da comissão para as matérias financeiras.”
Os AA. invocaram a falta de publicação das convocatórias de ambas as mencionadas assembleias gerais num jornal da localidade da sede da sociedade ou num dos jornais aí mais lidos, e, consequentemente, a anulabilidade das deliberações tomadas, por violação do disposto no art.º 18º do ”pacto social”, que estabelece tal exigência.
Nos termos do n.º 1 deste art.º 18º, para além da referência à publicação no Diário da República (substituída, como vimos, pela publicação no Portal da Justiça), constata-se que devia ocorrer a publicação num dos jornais em apreço, publicação essa que, como ficou provado, não se verificou.
 Está, por isso, também em causa um vício que determina a anulabilidade das deliberações, nos termos do art.º 58º, n.º 1, alínea a), anulabilidade que, pelas mesmas razões supra indicadas, se encontra sanada, em virtude da acção não ter sido intentada no prazo a que alude o art.º 59º, n.º 2, alínea a).
14. Outro motivo de invalidade, segundo os AA., decorre da violação do direito à informação previsto, em termos gerais, no Código Civil, e, de forma específica, no CSC.
Ora, como também se refere na decisão sob censura, no presente litígio não está em causa a violação do direito mínimo à informação a que alude o art.º 288º, o qual pressupõe uma actuação do próprio interessado – accionista – tendo em vista a obtenção dos elementos considerados relevantes pelo legislador.
Não resulta dos autos que qualquer dos accionistas minoritários se tenha dirigido à sede da Ré com esse propósito, sendo certo que a ter sido adoptada essa conduta, com consequente recusa de prestação das informações pretendidas, o meio de reacção colocado ao dispor dos sócios seria o previsto no art.º 292º - inquérito judicial, a ser tramitado no local próprio.
Embora não se trate da situação apontada – recusa de informação, a quem a solicitou – é líquido que, previamente à assembleia, não foram facultados (não estiveram disponíveis) suportes documentais referentes à proposta de deliberação que veio a ser aprovada (redução e aumento de capital).
E no domínio das causas de anulabilidade das deliberações sociais [art.º 58º, n.º 1, alínea c)], o legislador prevê a hipótese de as mesmas se encontrarem viciadas por não terem sido precedidas do fornecimento aos sócio de elementos mínimos de informação, considerando-se elementos mínimos de informação as menções previstas no art.º 377º, n.º 8 [art.º 58º, n.º 4, alínea a)], e a colocação de documentos para exame dos sócios no local e durante o tempo prescritos pela lei ou pelo contrato [art.º 58º, n.º 4, alínea b)].
Desta forma, e sem embargo de existir desinteresse dos AA. na subscrição do aumento de capital, constata-se que ocorre a causa de anulabilidade prevista no art.º 58º, n.ºs 1, alínea c), e 4, alínea b) – deliberação que não foi precedida de fornecimento aos sócios de elementos mínimos de informação, concretamente a ausência dos suportes documentais previstos no art.º 289º, n.º 1, alínea c) (proposta de deliberação e relatório ou outro documento que a justificasse), suportes esses que deveriam estar disponíveis na sede da sociedade durante os 15 dias que antecederam a assembleia.
Tratando-se, no entanto, de vícios de procedimento, constituíam apenas causa de anulabilidade, pelo que os AA. dispunham do prazo previsto no art.º 59º, n.º 2, alínea a), para intentar a presente acção, estando, consequentemente extinto, por caducidade, o direito que os mesmos pretendem fazer valer.[18]
15. Postergando de algum modo o que decorre da materialidade dada como provada pelo Tribunal recorrido e a (eventual) insubsistência da impugnação da decisão de facto, os AA./recorrentes afirmam também que se verifica situação de  fraude à lei (por violação dos art.ºs 87º e 460º, “normas imperativas”), porquanto a aprovação do aumento de capital que, na sua aparência, cumpre o art.º 87º, na prática, levou à supressão do direito de preferência dos AA.; no dizer dos AA./recorrentes, a assembleia geral de 22.11.2010 permitiu chegar, por via oblíqua (não publicação do aviso do artigo 459º) à violação de um “direito extrassocial” que salvaguarda cada sócio contra a surpresa e e o arbítrio numa matéria tão relevante como a da subsistência da sua própria participação social.
E, a concluir, consideram os AA. que em face do contexto em que se operou a mencionada “operação harmónio” - não descurando que esta operação possa corresponder a um mecanismo muito utilizado no saneamento financeiro de sociedades, especialmente, como meio de estimular sócios maioritários credores sociais ou terceiros em geral a participar num esforço de saneamento, contribuindo com novas entradas para o reforço das finanças sociais[19] -, e sem perder de vista o seu “resultado final”, ou seja, a dissolução e encerramento da sociedade recorrida, as deliberações de redução e aumento de capital são abusivas, por excederem manifestamente os limites resultantes da boa fé e do fim social e económico do direito a uma razoável conciliação do interesse social, pelo que a tomada das deliberações de 22.11.2010 relativas à “operação acordeão” e, por consequência, a eleição dos seus novos órgãos sociais em 03.01.2011, configuram uma situação de abuso do direito sendo, por isso, nulas (art.º 334º, do CC, ex vi do art.º 56º, n.º 1, alínea d), do CSC).
Sabemos que a apelação tem como limite objectivo a reapreciação das questões julgadas em 1ª instância, e não a introdução de questões novas subtraídas ao conhecimento do Tribunal “a quo”.
Por outro lado, os recorrentes invocam os referidos institutos alheando-se da factualidade apurada e que ditou a resposta dada nos pontos antecedentes da presente decisão.
No fundo, e muito simplesmente, a matéria apurada é manifestamente insuficiente para corporizar tais derradeiras invocações e pretensões dos AA./recorrentes, que, em geral, pressupõem o desrespeito do interesse público (stricto sensu) ou do interesse de terceiros (mormente, de futuros accionistas)[20], apontando, sim, para que outro, e diametralmente oposto, possa ter sido o desiderato - ainda que possivelmente votado ao insucesso - prosseguido no âmbito das impugnadas deliberações.
16. Resta, assim, dizer que não se mostram violadas disposições legais que determinem a nulidade das deliberações impugnadas, sendo que as invalidades cometidas – anuláveis – encontram-se sanadas pelo decurso do tempo, por caducidade do direito que assistia aos AA..
Soçobram, desta forma, as demais “conclusões”  da alegação de recurso.
*
III. Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelos AA./apelantes.
*
10.7.2014
Fonte Ramos ( Relator )
Maria Inês Moura
Fernando Monteiro


[1] Diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem.

[2] A lapso manifesto se deverá, pois, a invocação da “alínea e)” do n.º 1 do citado art.º.
[3] A propósito da incorrecta ou inadequada invocação de “nulidades” da sentença, vide, entre outros, A. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, págs. 132 e seguinte.
[4] O capital social é uma massa patrimonial que integra o capital próprio [este, também designado por capitais próprios ou situação líquida, é uma realidade que sempre confundiu leigos e não leigos, questionando-se sobretudo sobre a sua natureza, finalidade e em que circunstâncias pode ser movimentado; o capital próprio corresponde ao património líquido da empresa e é composto pelas seguintes rubricas com tradução contabilística: capital social, reservas, prestações suplementares e resultados transitados; o capital próprio de uma empresa é sempre igual ao seu activo deduzido do passivo] e a sua importância prende-se, fundamentalmente, com a autonomia financeira de uma empresa – vide João Antunes, consultor da OTOC, in Revista TOC 99/Junho/2008.

[5] Recorrendo-se a uma expressão do Prof. Vasco da Gama Lobo Xavier, incluída no estudo Invalidade e ineficácia das deliberações sociais no Projecto do Código das Sociedades, in RLJ, 118º, pág. 202.
[6] Diploma que alterou a redacção dos artigos 70º, 95º, 96º, 100º, 101º, 101º-A, 106º, 116º, 117º, 132º, 242º-B, 242º-F, 508º-E e 528º, do CSC, sendo ainda instituída a figura da Informação Empresarial Simplificada (IES), definida, por força do art.º 1º, n.º 2, do citado diploma, nos seguintes termos: “A IES consiste na prestação da informação de natureza fiscal, contabilística e estatística respeitante ao cumprimento das obrigações legais referidas no n.º 1 do artigo 2º através de uma declaração única transmitida por via electrónica.”
[7] Consta do preâmbulo do referido diploma, designadamente: “O presente decreto-lei concretiza novas medidas de eliminação e simplificação de actos no sector do registo comercial e dos actos notariais conexos. Assim, em primeiro lugar, permite-se a eliminação da intervenção judicial obrigatória para a redução do capital social das sociedades comerciais. Com efeito, e apesar da redução do capital social já ter sido simplificada através da eliminação da celebração de escritura pública no cartório notarial, permanece a obrigatoriedade de intervenção do tribunal para que tal pretensão se possa consumar quando essa redução não se destine à cobertura de perdas, o que torna o processo desnecessariamente moroso e complexo, sem justificação, pois em princípio não existe litígio subjacente a tal acto. Naturalmente que se salvaguarda a possibilidade de oposição judicial sempre que tal litígio exista.”
[8] É o que resulta expressamente do art.º 94º, n.º 1, alínea a), a propósito da convocatória da assembleia [a cobertura de prejuízos, aliás, surge na alínea a) do n.º 1 do art.º 94º como a primeira finalidade da redução, só depois surgindo a libertação de excesso de capital e, em terceiro plano, as restantes finalidades a que se pode destinar a operação em apreço], não fazendo, por isso, sentido, salvo melhor opinião, a observância de uma regra que não tem condições de exequibilidade.
   Neste sentido, vide, entre outros, Paulo Olavo Cunha, Direito das Sociedades Comerciais, 5ª edição, 2012, pág. 893, e Paulo de Tarso Domingues, Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Vol. II, 2011, págs. 142 e seguintes.
   Em sentido contrário, vide F. Mendes Correia, Código das Sociedades Comerciais Anotado, 2009, pág. 314.
[9] Cf. Miguel A. Pupo Correia, Direito Comercial, 6ª edição, 1999, pág. 491.
[10] Dispõe o mencionado normativo: “É permitido deliberar a redução do capital a um montante inferior ao mínimo estabelecido nesta lei para o respectivo tipo de sociedade se tal redução ficar expressamente condicionada à efectivação de aumento do capital para montante igual ou superior àquele mínimo, a realizar nos 60 dias seguintes àquela deliberação.”
[11] Alguma doutrina tem entendido que, pelo menos, é necessário um balanço actualizado para que os accionistas se possam pronunciar devidamente sobre a redução proposta - neste sentido, Paulo Olavo Cunha, ob. cit., pág. 864.
[12] Vide, a propósito, Vasco da Gama Lobo Xavier, estudo citado, RLJ, 118º, pág. 202, “nota (3)”.
[13] Cf., a propósito, entre outros, Menezes Cordeiro, A perda de metade do capital social e a reforma de 2005: um repto ao legislador, in ROA, ano 65, Vol. I/Junho 2005.
[14] O art.º teve a seguinte versão originária (DL n.º 262/86, de 02.9):
   “1 - Os membros da administração que, pelas contas de exercício, verifiquem estar perdida metade do capital social devem propor aos sócios que a sociedade seja dissolvida ou o capital aí seja reduzido, a não ser que os sócios se comprometam a efectuar e efectuem, nos 60 dias seguintes à deliberação que da proposta resultar, entradas que mantenham pelo menos em dois terços a cobertura do capital.
   2 - A proposta deve ser apresentada na própria assembleia que apreciar as contas ou em assembleia convocada para os 60 dias seguintes aquela ou à aprovação judicial, nos casos previstos pelo artigo 67º.
    3 - Não tendo os membros da administração cumprido o disposto nos números anteriores ou não tendo sido tomadas as deliberações ali previstas, pode qualquer sócio ou credor requerer ao tribunal, enquanto aquela situação se mantiver, a dissolução da sociedade, sem prejuízo de os sócios poderem efectuar as entradas das referidas no n.º 1 até ao trânsito em julgado da sentença.
   O DL n.º 162/2002, de 11.7, deu-lhe depois a seguinte redacção:
   “1 - Os membros da administração que, pelas contas do exercício, verifiquem estar perdida metade do capital social devem mencionar expressamente tal facto no relatório de gestão e propor aos sócios uma ou mais das seguintes medidas: a) A dissolução da sociedade; b) A redução do capital social; c) A realização de entradas em dinheiro que mantenham pelo menos em dois terços a cobertura do capital social; d) A adopção de medidas concretas tendentes a manter pelo menos em dois terços a cobertura do capital social.
   2 - Considera-se estar perdida metade do capital social quando o capital próprio constante do balanço do exercício for inferior a metade do capital social.
   3 - Os membros da administração devem apresentar a proposta prevista no n.º 1 na assembleia geral que apreciar as contas do exercício, ou em assembleia convocada para os 90 dias seguintes à data do início da assembleia, ou à aprovação judicial, nos casos previstos no artigo 67º.
   4 - Mantendo-se a situação de perda de metade do capital social no final do exercício seguinte àquele a que se refere o n.º 1, considera-se a sociedade imediatamente dissolvida, desde a aprovação das contas daquele exercício, assumindo os administradores, a partir desse momento, as competências de liquidatários, nos termos do artigo 151.º
   Seguindo-se, antes da actual, a redacção do DL n.º 19/2005, de 18.01:
   “1 - Resultando das contas de exercício ou de contas intercalares, tal como elaboradas pelo órgão de administração, que metade do capital social se encontra perdido, ou havendo em qualquer momento fundadas razões para admitir que essa perda se verifica, devem os gerentes convocar de imediato a assembleia geral ou os administradores ou directores requerer prontamente a convocação da mesma, a fim de nela se informar os sócios da situação e de estes tomarem as medidas julgadas convenientes.
   2 - Considera-se estar perdida metade do capital social quando o capital próprio da sociedade for igual ou inferior a metade do capital social.
   3 - Do aviso convocatório da assembleia geral constarão, pelo menos, os seguintes assuntos para deliberação pelos sócios: a) A dissolução da sociedade; b) A redução do capital social para montante não inferior ao capital próprio da sociedade, com respeito, se for o caso, do disposto no n.º 1 do artigo 96.º; c) A realização pelos sócios de entradas para reforço da cobertura do capital.”.



[15] O art.º 459º, n.º 1, estabelece que os accionistas devem ser avisados, por anúncio, do prazo e demais condições de exercício do direito de subscrição, dispondo-se no n.º 2 do mesmo artigo que o contrato pode prever comunicações adicionais aos accionistas.
[16] Diploma regulamentado pela Portaria n.º 590-A/2005, de 14.7, que estabeleceu o endereço electrónico do sítio onde ocorrem as publicações – Portal da Justiça, a que actualmente se pode aceder a partir do seguinte endereço: http://publicacoes.mj.pt/Index.aspx.
[17] Vide, de entre vários, Vasco da Gama Lobo Xavier, Anulação de Deliberação Social e Deliberações Conexas, Atlântida Editora, págs. 260 e seguinte; L. P. Moitinho de Almeida, Anulação e Suspensão de Deliberações Sociais, 3ª edição, 1996, pág. 49; Jorge Henrique Pinto Furtado, Deliberações de Sociedades Comerciais, Almedina, 2005, págs. 590 e seguintes e 631 e seguintes e Paulo Olavo Cunha, ob. cit., págs. 641 e seguintes.
[18] Vide, de entre vários, Vasco da Gama Lobo Xavier, ob. cit., pág. 260 e RLJ, 118º, estudo cit., págs. 136 e 201e seguinte.
[19] Sublinhado nosso.
[20] Vide, de entre vários, Vasco da Gama Lobo Xavier, ob. cit., págs. 260 e seguinte, e estudo cit., RLJ, 118º, págs. 75 e 202 e seguinte.