Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
53/12.9TBTCS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FERNANDO MONTEIRO
Descritores: PROPRIEDADE INDUSTRIAL
MARCA
LOGÓTIPO
INDEMNIZAÇÃO
DANO
Data do Acordão: 01/28/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA 1º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTS. 338 L CPI, 483 CC, 471, 661 CPC
Sumário: 1 - A regra do nº1 do art.338º-L do Código da Propriedade Industrial é uma concretização da regra do nº1 do art. 483º do Código Civil, sede da responsabilidade civil, no que respeita à violação do direito de propriedade industrial de outrem.

2. Nesta sede, o dano é um pressuposto da indemnização.

3. O ónus de alegação do dano permanece apesar da dificuldade de liquidação completa deste.

4. Sem dano, não há que invocar a equidade. O juízo relativo a esta só tem lugar quando não haja possibilidade de provar os elementos de que dependa a liquidação da indemnização.

5. Quando não é ainda conhecida toda a extensão do dano, admite-se a formulação do pedido genérico.

Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

G (…) UNIPESSOAL, LIMITADA, com sede na Rua (...) Lisboa, intentou ação contra O (…), LDA, com sede em (...) Trancoso, pedindo:

1) A R. seja proibida de usar os elementos decorativos exteriores do seu estabelecimento na Praça (...) Guarda, ou noutro, que foram instalados quando era franqueada da “MULTIÓPTICAS”;

2) Seja ordenado à R. que retire e destrua os suportes decorativos exteriores referidos no número anterior;

3) A R. seja proibida de substituir aqueles suportes por outros que sejam confundíveis com o logótipo e as marcas “MULTIÓPTICAS”;

4) A R. seja condenada a pagar à A. uma indemnização em montante igual a 4% (quatro por cento) do montante pecuniário gerado pela exploração do estabelecimento da R. na Praça (...) Guarda, desde o dia 30/09/2010 até ao dia anterior à da retirada dos suportes decorativos exteriores que, nesta data, utiliza nesse estabelecimento;

5) A R. seja condenada a pagar à A. os encargos suportados com a protecção dos seus direitos de propriedade industrial e com a investigação e cessação da conduta lesiva dos seus direitos pela R., em valor a liquidar em execução de sentença;

6) A R. seja condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, a dividir em partes iguais entre a A. e o Estado, no valor diário de 500,00€ (Quinhentos Euros), por cada dia, posterior ao trânsito em julgado da decisão desta acção que a condene nos pedidos 1), 2) e/ou 3) acima formulados;

7) A R. seja condenada a publicitar, a suas expensas, a decisão final desta acção, por extracto, nos jornais “O INTERIOR” (sede: Rua da Corredoura, 80, r/c, direito, C, 6300 Guarda) e “A GUARDA” (sede: Rua Marquês de Pombal, 55-61, 6300-728 Guarda).

Para tanto, a Autora alega em síntese:

É titular do registo de logótipo nº15262, titular da marca nacional nº360017 e ainda titular do registo de marca nacional nº431490, com reivindicação das cores azul e amarela, sendo certo que os sinais distintivos “Multiópticas” distinguem uma cadeia de estabelecimento de ópticas existentes há mais de duas décadas, em várias localidades, tendo-se tornado conhecida do público em geral, devido à existência de enorme investimento publicitário, comunicação e marketing.

A ré é uma sociedade por quotas, constituída em 24/09/2007, que explora um estabelecimento óptico sito na (...), Guarda e que até 29/09/2010 integrou a rede “Multiópticas”, enquanto franqueada, tendo, nessa data, sido revogado o contrato de franquia.

Não obstante, a ré continua a usar os mesmos letreiros em fundo de cor azul e letras com cor amarela, a mesma tabuleta com o desenho de óculos na cor amarela, não tendo, pois, retirado tais elementos decorativos exteriores.

Na tabuleta de entrada do estabelecimento da ré, no lado esquerdo, a palavra óptica, que era em amarelo, foi pintado com cor azul o elemento “Multi” da expressão Multiópticas e a letra “S”; na tabuleta exterior, saliente, com a forma de “óculos”, a palavra “Óptica” continua posicionada à direita e o elemento Multi, foi pintado de azul.

Todavia, a dissimulação a azul dos elementos que estavam a amarelo não é total, podendo ver-se os elementos dissimulados.

A ré não tem qualquer autorização da autora para utilizar o seu logótipo, porque se a tivesse pedido, a autora teria exigido a quantia de 4% do montante pecuniário gerado pela exploração do estabelecimento comercial da ré, desde 30/09/2010 até à cessação da utilização dos respectivos logótipo e marca, estando ainda a suportar, com a defesa dos seus direitos, montante que já ultrapassa os € 5 000.

Os direitos de logótipo e marca são privativos de propriedade industrial, especialmente protegidos por lei, tratando-se de sinais distintivos, que visam distinguir determinada entidade, tendo, ainda, a marca a função de garantia e de angariar clientes, sem que exista qualquer confusão, para estes do produto que estão a adquirir, pelo que não deve confundir-se com outra marca anteriormente adoptada, impedindo-se imitações ou usurpações.

A ré continuou a usar os mesmos suportes identificativos que usava quando o seu estabelecimento fazia parte da rede “Multiópticas”, sendo certo que as alterações a que procedeu, de camuflagem apenas parcial, não são suficientes e idóneos para afastar a possibilidade dos consumidores serem induzidos em erro, até porque antes, enquanto durou o contrato de franquia se tinham habituado a ver aquele estabelecimento como pertencente à rede “Multiópticas”, sendo sua intenção manter tudo como antes, com a intenção de continuar associada à Multiópticas e fazer crer aos consumidores que assim é, tirando benefício ilegítimo do prestígio e reputação da ré, violando os seus direitos de propriedade e exclusivo ao logótipo e marca, criando confusão, o que constitui concorrência desleal.

Contestou a Ré, em síntese:

Alega desconhecer os factos alegados nos artigos 1º a 11º da petição inicial.

É verdade que celebrou com a ré um contrato de franquia.

Na própria semana em que findou tal contrato, retirou os símbolos distintivos da “Multiópticas” e pintou, alguns dias depois, a azul mais escuro do que o da “Multiópticas”, toda a faixa e por cima da pintura colocou apenas a palavra “óptica”.

Deixou ficar o desenho dos óculos, duas circunferências contíguas, dado que esse desenho não está patenteado por ninguém.

O azul e o amarelo são as cores da optometria.

Não escreveu, nem manteve a palavra “multi”, nem a letra “S”, mas tão somente a palavra “óptica”.

Foi o facto da ré ter sido autorizada a utilizar a marca “Maxiópticas” que levou a autora a intentar esta acção, no sentido de a fazer desistir de utilizar tal marca.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente e decidido:

Proibir a ré de usar os elementos decorativos exteriores do seu estabelecimento na Praça (...) Guarda, ou noutro, que foram instalados quando era franqueada da “MULTIÓPTICAS”;

Condenar a R. a retirar e destruir os suportes decorativos exteriores referidos;

Proibir a ré de substituir aqueles suportes acima referidos por outros que sejam confundíveis com o logótipo e as marcas “MULTIÓPTICAS”;

Condenar a R. a publicitar, a suas expensas, a decisão final desta acção, no jornal “O INTERIOR”.

Julgar extinto por inutilidade superveniente da lide o pedido de condenação da ré no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, a dividir em partes iguais entre a A. e o Estado, no valor diário de 500,00 € (Quinhentos Euros), por cada dia, posterior ao trânsito em julgado da decisão desta acção que não cumpra o determinado.

Julgar improcedentes os demais pedidos efectuados pela autora.

*

            Inconformada com as absolvições da Ré dos pedidos 4) e 5), a Autora recorreu e apresenta as seguintes conclusões:

(…)

            A Ré contra-alegou:

(…)

*

            As questões que importa resolver são as seguintes:

            A) A alteração da resposta ao quesito 6º por força de confissão.

            B) O ónus de alegação e prova dos danos. O uso da equidade. (Quanto ao pedido 4) da Autora.)

C) O recurso à liquidação em execução de sentença. (Quanto ao pedido 5) da Autora.)

*

            A) A alteração da resposta ao quesito 6º por força de confissão.

            (…)

*

            São estes os factos provados:

1. A autora foi constituída em 28/12/2006 e o seu objecto social consiste na: a) comercialização de todo o material óptico e optométrico, tanto internamente como internacionalmente, mediante importação e exportação por grosso e a retalho, bem como a prestação de serviços de qualquer espécie relacionados com a óptica, optometria, a gestão de centros ou quaisquer instalações de audiometria, oftalmológicas ou similares e conexas, bem como a sua implementação b) a exploração de estabelecimentos de ópticas; c) a aquisição e alienação de patentes, direitos de autor, processos industriais secretos (know how) e quaisquer outros tipos de direitos de propriedade intelectual: a cedência de licenças sobre tais direitos e a aquisição de licenças relativamente aos mesmos direitos: a prestação de serviços a terceiros: a condução de negócios próprios, bem como por conta de terceiros; d) a participação, financiamento, administração ou qualquer outro interesse noutros negócios e empresas e) a realização de tudo o que possa ser de utilidade ou estar relacionado com o presente objecto.

2. Pela apresentação 109/20080929 foi registada, na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, 4ª Secção, a fusão por incorporação entre a “ P..., LDA” (incorporante) e a sociedade “MULTIÓPTICAS, UNIPESSOAL, LDA” (incorporada), mediante a transferência global do património da sociedade incorporada para a sociedade incorporante.

3. Em 25/05/2011 foi registada, na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, 4ª Secção, a alteração da denominação social da autora, de “ P... LIMITADA” para “ G..., LIMITADA”.

4. A autora é titular do registo do logótipo n.º 15262, “MULTIÓPTICAS”, que foi pedido ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (I.N.P.I.) em 24/08/1989 e concedido em 22/07/1991, conforme certificado de registo, cuja cópia se mostra junta a fls. 54, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor.

5. A autora é titular do registo da marca nacional n.º 360.017, que foi pedido ao I.N.P.I. em 13/11/2001 e concedido em 16/09/2003, para assinalar “aparelhos e instrumentos ópticos; artigos de oculista; armação de óculos; óculos (óptica); lentes de óculos; aparelhos e instrumentos auditivos” (classe 9) e “serviços ópticos” (classe 44), conforme certificado de registo, cuja cópia se mostra junta a fls. 56, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor.

6. A autora é titular do registo da marca nacional n.º 431.490, (com reivindicação de cores: azul e amarelo) que foi pedido ao I.N.P.I. em 16/04/2008 e concedido em 10/07/2008, para assinalar “aparelhos e instrumentos ópticos; lunetas, óculos, armações para óculos, lentes oftalmáticas, lentes de contacto, óculos de sol, artigos ópticos; peças e acessórios” (classe 9) e “serviços de optometria e de oculistas; adaptação de óculos; serviços médicos relacionados com os cuidados dos olhos” (classe 44), conforme consta no certificado de registo, cuja cópia se mostra junta a fls.58, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor.

7. A ré é uma sociedade por quotas constituída em 24/09/2007, pelas sócias (…) (quota: 3.750,00 Euros) e (…) (quota: 1.250,00 Euros), tendo sido realizado um aumento de capital, em 16/02/2009, com a entrada da sócia (…) (quota: 2.600,00 Euros).

8. A ré explora o estabelecimento de óptica sito na Praça (...) Guarda, reproduzido nas fotografias de fls. 185 a 187, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

9. No dia 29-09-2010, a autora e a ré celebraram, por escrito, o acordo cuja cópia consta a fls. 188 a 196, dando-se aqui por integralmente reproduzido, no qual consta, entre o mais, o seguinte: “I. O (…) LDA (…) adiante designada por Primeira Contratante, abreviadamente designada por “Vendedora”; e II. P (…) – UNIPESSOAL, LDA (…) de aqui em diante abreviadamente designada por “Compradora” (…) CONSIDERANDO (…) VII A (...)explora, presentemente, nos termos do Segundo Contrato de Franquia relativo à (...) e do Contrato de Franquia relativo à loja do Centro (...), o Estabelecimento da (...) e o Estabelecimento do Centro (...) (…) X. As Partes acordaram na revogação do Segundo Contrato de Franquia relativo à (...) e do Contrato de Franquia relativo à loja do Centro (...), e demais compromissos contratuais dele decorrentes. As Partes acordaram celebrar este acordo de revogação (o “Acordo”), o qual se regula pelas seguintes CLÁUSULAS 1. OBJECTO Pelo presente Acordo, as Partes acordam em revogar o Segundo Contrato de Franquia relativo à (...) e do Contrato de Franquia relativo à loja do Centro (...) (em conjunto, os “Contratos de Franquia”), salvo no atinente a obrigações que, pela sua natureza ou por acordo das Partes, se devam manter apara além da respectiva cessação, incluindo, mas não limitando, em matéria de cessação de utilização de

sinais distintivos, saber fazer e demais direitos de propriedade intelectual e industrial, comunicação a terceiros, confidencialidade e garantias (…) 4. EXPLORAÇÃO DO ESTABELECIMENTO DA (...) Verificando-se o cumprimento e integral execução, pela Ocer, deste Acordo e do Contrato de Compra e Venda de Activos, designadamente de quaisquer obrigações que se devam manter e/ou cumprir depois da revogação dos Contratos de Franquia, fica a (...)autorizada – e sem que tal consubstancie incumprimento da obrigação de não concorrência prevista na cláusula 12ª (décima segunda) do Segundo Contrato de Franquia da (...) – a manter a exploração do Estabelecimento da (...), nele prosseguindo a actividade de comercialização de produtos de óptica e audiometria, desde que o faça sob marca, insígnia e sinais distintivos de comércio distintos e não confundíveis com os licenciados ao abrigo dos Contratos de Franquia ou outros que integrem a imagem corporativa da Pearle ou da rede MultiOpticas. (…) OBRIGAÇÕES PÓSCONTRATUAIS Sem prejuízo do disposto na cláusula 1.1, e do disposto nos Contratos de Franquia, a (...)obriga-se a entregar à Pearle, até á Data da Produção de Efeitos, todo o material promocional, publicitário, de embalagem, de escritório e facturas que tenha em seu poder e destinado a utilização no interior ou exterior dos estabelecimentos pela mesma explorados, e que se refiram ou contenham, parcial ou totalmente, a marca “MultiOpticas”, e/ou a quaisquer designações e/ou insígnias comerciais, desenhos, lay out, direitos de autor e demais sinais distintivos e/ou elementos constitutivos da imagem corporativa da Pearle ou da rede de franquia “MultiOpticas”. DECLARAÇÕES DA EX.MA SRA D. (…) A Exma. Sra. D. (…), na qualidade de anterior franqueada, declara e garante nada ter a exigir ou reclamar da Pearle, seja a que título for, incluindo, mas não limitando, relativamente ao período em que eventualmente tenha explorado, pessoalmente, estabelecimentos franquiados ao abrigo dos Contratos de Franquia, e/ou em consequência da transmissão da respectiva posição contratual dos Contratos de Franquia a favor da Ocer, ou da revogação ora acordada”.

10. Em 10/05/2011, a ré apresentou ao I.N.P.I. o pedido de registo da marca nacional n.º 483.394, “MAXIOPTICAS”, destinada a assinalar serviços de «Vendas (promoção de -) (para terceiros)» (classe 35) e «ópticos (serviços -)» (classe 44).

11. Este pedido de registo foi publicado no Boletim da Propriedade Industrial n.º 99/2011, de 24/05/2011.

12. A concessão do registo da marca nacional n.º 483.394, “MAXIOPTICAS”, foi publicitada no Boletim da Propriedade Industrial n.º 216/2011, de 11/11/2011.

13. É intenção da ré pintar, nos suportes decorativos referidos em 16 e 17, o elemento “MAXI”.

14. Em 11/01/2012, a autora impugnou judicialmente essa decisão, mediante interposição de recurso de marca, que está em tramitação no 4.º Juízo do Tribunal de Comércio de Lisboa – Processo n.º 64/12.4TYLSB.

15. A ré não é titular de denominação social, marca, nome ou insígnia de estabelecimento, ou, de logótipo com a expressão «MULTIÓPTICAS».

16. Antes do acordo referido em 9, existia, no estabelecimento indicado em 8, uma placa de metal soldada ao edifício, pintada de azul, onde constavam os dizeres “Multiópticas”, pintados a cor amarela.

17. Mais existia uma tabuleta saliente com o desenho de “óculos”, na cor amarela.

18. Após o acordo referido em 9, a ré manteve a placa e a tabuleta descritas em 16 e 17.

19. Após o acordo referido em 9, na placa descrita em 16, no lado esquerdo da palavra “OPTICA” (em amarelo), foi pintado, com cor azul, o elemento “MULTI” da expressão “MULTIOPTICAS” (em amarelo).

20. E a letra “S” foi pintada em cor azul.

21. Também o elemento “MULTI” da expressão “MULTIÓPTICAS” (em amarelo) que existia na tabuleta descrita em 16 foi pintado em cor azul.

22. Actualmente, a placa referida em 16 encontra-se pintada de azul e tem apostos os dizeres “Óptica”, nos termos reproduzidos nas fotografias de fls. 185 a 187.

23. Na tabuleta exterior, saliente, com a forma de “óculos”, a palavra “OPTICA” (em amarelo), continua posicionada à direita.

24. Os sinais “MULTIÓPTICAS” distinguem uma cadeia de estabelecimentos de óptica, existente há mais de duas décadas, com estabelecimentos localizados em várias localidades, sendo constituída presentemente mais de uma centena de lojas, das quais umas pertencem à autora e outras são franqueadas.

25. Os sinais “MULTIÓPTICAS” tornaram-se conhecidos do grande público consumidor em razão de investimentos em publicidade, comunicação e marketing, que em 2011 foram de cerca de 12,5 milhões de euros.

26. A autora promove campanhas publicitárias, a nível nacional, na televisão e noutros meios de comunicação social, que são protagonizadas por figuras públicas famosas a nível nacional: Eusébio (jogador de futebol), Ana Bola (actriz), Diana Chaves (apresentadora de televisão), os irmãos Guedes (modelos) e Sofia Ribeiro (modelo e actriz).

27. No estudo de mercado intitulado « G...– Global Brand Monitor», realizado pela empresa “ (...)”, no período de Janeiro a Junho de 2011, apurou-se que o sinal “MULTIÓPTICAS” é do conhecimento (“Total awareness”) de 97% dos inquiridos.

28. No mesmo estudo de mercado apurou-se que a “MULTIÓPTICAS” lidera todos os indicadores de conhecimento público e notoriedade (“Total awareness”, “Consideration”, “Visit” e “Purchase”) quando comparada com outros concorrentes do ramo de comércio óptico – “Grand Optical”, “Optivisão”, “Instituto Óptico”, “Vision Lab”, “Óptica Jumbo/Auchan”, “Óptica Well’s (Sonae)”, “Açain Afflelou” e “Independent optician”.

29. Pelo menos até 2009, o estabelecimento referido em 8 integrou a rede

“MULTIOPTICAS”, da autora, enquanto franqueada.

30. Antes das alterações descritas em 17 a 20, os consumidores habituaram-se a tomar o estabelecimento referido em 8 como integrante da “Multiópticas”.

31. Os estabelecimentos da rede “Multiópticas” são caracterizados por terem apostas uma placa com as características descritas em 16 e pelo menos alguns deles são também caracterizados por terem uma tabuleta com as características descritas em 17.

32. Para defesa dos seus direitos de logótipo e marca, na presente acção, bem como no procedimento cautelar, designadamente com a investigação ao estabelecimento da ré, consulta jurídica e patrocínio judiciário, a autora suportará encargos em montante não concretamente apurado.

*

B) O ónus de alegação e prova dos danos. O uso da equidade. (Quanto ao pedido 4) da Autora.)

            O pedido 4) da Autora é relativo a dano patrimonial porque assenta na perda de um potencial ganho.

            A Recorrente Autora invoca o disposto no art. 338.º-L do Código da Propriedade Industrial, que determina:

1. Quem, com dolo ou mera culpa, viole ilicitamente o direito de propriedade industrial de outrem, fica obrigado a indemnizar a parte lesada pelos danos resultantes da violação.

2. Na determinação do montante da indemnização por perdas e danos, o tribunal deve atender nomeadamente ao lucro obtido pelo infractor e aos danos emergentes e lucros cessantes sofridos pela parte lesada e deverá ter em consideração os encargos suportados com a protecção, investigação e a cessação da conduta lesiva do seu direito.

3. Para o cálculo da indemnização devida à parte lesada, deve atender-se à importância da receita resultante da conduta ilícita do infractor.

4. O tribunal deve atender ainda aos danos não patrimoniais causados pela conduta do infractor.

5. Na impossibilidade de se fixar, nos termos dos números anteriores, o montante do prejuízo efectivamente sofrido pela parte lesada, e desde que esta não se oponha, pode o tribunal, em alternativa, a estabelecer uma quantia fixa com recurso à equidade, que tenha por base, no mínimo, as remunerações que teriam sido auferidas pela parte lesada caso o infractor tivesse solicitado autorização para utilizar os direitos de propriedade industrial em questão e os encargos suportados com a protecção do direito de propriedade industrial, bem como com a investigação e cessação da conduta lesiva do seu direito.

6. Quando, em relação à parte lesada, a conduta do infractor constitua prática reiterada ou se revele especialmente gravosa, pode o tribunal determinar indemnização que lhe é devida com recurso à cumulação de todos os de alguns aspectos previstos nos nºs 2 a 5.

7. Em qualquer caso, o tribunal deve fixar uma quantia razoável destinada a cobrir os custos, devidamente comprovados, suportados pela parte lesada com a investigação e a cessação da conduta lesiva do seu direito.

Facilmente se repara que a regra do nº1 é uma concretização da regra do nº1 do art. 483º do Código Civil, sede da responsabilidade civil, no que respeita à violação do direito de propriedade industrial de outrem.

                Nesta sede, o dano (resultante da violação) é sempre um pressuposto da indemnização.

            Este e os outros pressupostos são definidos na regra do nº1 referido.

            Já os números 2, 4 e 5 do artigo legal actuam quando preenchidos os pressupostos do nº1, como auxiliares na determinação do montante da indemnização. (Neste particular, considerando a natureza dos hipotéticos danos, admite-se que haja o que a Autora designa como “suavização” do ónus da prova do montante do dano.)

            No caso, a sentença recorrida entendeu existir uma violação do direito da Autora porque as placas identificativas do estabelecimento eram susceptíveis de criar confusão num consumidor médio.

            Esta conclusão não é passível de discussão porque não sofreu recurso.

           

Mas ela é insuficiente porque pode haver violação do direito sem haver dano, falta constatada na sentença recorrida.

            A potencial confusão identificativa não é uma efectiva confusão. Um potencial prejuízo não é um efectivo prejuízo e um potencial ganho não é um efectivo ganho.

            Ora, o que está em causa é que a Autora não alegou qualquer dano seu ou um enriquecimento injustificado da Ré, resultante da comprovada violação.

            Relendo a petição, os factos provados e os não provados, podemos caracterizar o caso como uma situação de solução preventiva do risco de efectiva confusão identificativa, sem dano.

            A Autora não alegou um concreto engano do consumidor, um ganho da Ré resultante desse engano ou uma perda sua. Não há uma referência ao meio concreto onde se insere o estabelecimento, nomeadamente sobre a existência de outra loja “Multiópticas”. Enfim, a Autora ficou-se por uma potencialidade de dano ou potencial perda de lucro (o já referido art.29º da petição e respectivo quesito 6º não provado).

            Para o risco de confusão identificativa, considerou-se o facto da loja da Ré ser antes “Multiópticas” e os consumidores estarem habituados a isso.

            Mas, para a consideração do dano, esse facto conjugado com os factos reveladores das alterações feitas pela Ré (embora tidas como insuficientes), permitem-nos ter também como potencial a percepção da alteração pelo consumidor médio. Como alegado pela Ré, tem-se como possível que os consumidores teriam tido percepção da alteração.

            A Ré procedeu a uma efectiva alteração da identificação, insuficiente é certo para eliminar todo o risco de confusão. (O quesito 2) – proposto pela Autora, alegando que a dissimulação em azul dos elementos a amarelo não era total, podendo ainda percepcionar-se os elementos dissimulados – foi dado como não provado.)

Conforme factos 10 a 13, a Ré obteve a concessão do registo da marca nacional “MAXIOPTICAS”, publicada em 11/11/2011, sendo sua intenção pintar, nos suportes, o elemento “MAXI”.

O quesito 5) – proposto pela Autora (A intenção da ré, ao proceder nos termos descritos, é fazer crer aos consumidores que continua a fazer parte da rede comercial da “Multiópticas”?) – foi dado como não provado.

A documentação contabilística junta (que não tem tradução em facto alegado ou na resposta a um quesito) revela uma quebra de facturação da Ré.

            Tudo isto corrobora aquela ideia de se tratar de um caso de solução preventiva do risco (de efectiva confusão identificativa), sem dano.

            Sem dano, não há que invocar a equidade. O juízo relativo a esta só tem lugar em último recurso, quando não haja possibilidade de provar os elementos de que dependa a liquidação. Assim actua o nº5 do invocado art.338.º-L do Código da Propriedade Industrial – “na impossibilidade de se fixar…o montante do prejuízo efectivamente sofrido”. (A norma não diz: na impossibilidade de se fixar o prejuízo; ela afirma: na impossibilidade de se fixar o montante do prejuízo.)

            Alega a Autora que não impende sobre ela um ónus de alegação e prova dos danos concretos quando a violação é continuada, por não ser possível.

            Admite-se, em certos casos, que a liquidação do total do dano não seja logo possível, mas é errado dizer que não é possível alegar o dano ocorrido ou iniciado. A Autora confunde o ónus de alegação do dano com a dificuldade de liquidação completa do dano.

            Alega ainda a Autora dificuldades em apurar danos na violação de direitos imateriais e exemplifica com um caso julgado.

            Todavia, o caso que apresenta, apesar de ser interpretado como não tendo danos, foi solucionado como o de um efectivo enriquecimento injustificado à custa da criação de outrem (no âmbito do art.473º do Código Civil). A dificuldade específica do caso residia no facto do criador não comercializar a criação.

            No nosso caso, além da falta de alegação de um dano, também não há alegação de um enriquecimento concreto obtido à custa da “imagem” da Autora.

E por tudo isto não deve proceder o pedido 4) da Autora.

*

C) O recurso à liquidação em execução de sentença. (Quanto ao pedido 5) da Autora.)

No pedido 5), a Autora pediu a condenação da Ré a pagar-lhe os encargos suportados com a protecção dos seus direitos de propriedade industrial e com a investigação e cessação da conduta lesiva dos seus direitos por esta, em valor a liquidar em execução de sentença.

Para tanto, a Autora tinha alegado no art.30º da petição:

Para defesa dos seus direitos de logótipo e marca, da violação dos mesmos pela R., a A. está a suportar encargos com a investigação ao estabelecimento da R., consulta jurídica e patrocínio judiciário, em montante que já ultrapassa os 5.000,00 € (Cinco Mil Euros).

Ficou provado:

Para defesa dos seus direitos de logótipo e marca, na presente acção, bem como no procedimento cautelar, designadamente com a investigação ao estabelecimento da ré, consulta jurídica e patrocínio judiciário, a autora suportará encargos em montante não concretamente apurado.

O nº7 do art.338.º-L do Código da Propriedade Industrial dispõe:

Em qualquer caso, o tribunal deve fixar uma quantia razoável destinada a cobrir os custos, devidamente comprovados, suportados pela parte lesada com a investigação e a cessação da conduta lesiva do seu direito.

Neste particular, não há dúvidas que a Autora quis ligar a alegação a este preceito legal, tendo provado custos com a investigação e a cessação da conduta (potencialmente) lesiva do seu direito, embora não os tenha quantificado seguramente.

A sentença recorrida concluiu pela improcedência do pedido porque “não alegou e provou a autora, como lhe competia, os concretos encargos que já suportou e aqueles que ainda teria de suportar (embora, em relação a este pudesse não os quantificar)”.

O art.471º, nº1, b), do Código de Processo Civil anterior (hoje no art.556.º, de forma idêntica), quanto aos pedidos genéricos, dispõe:

1 — É permitido formular pedidos genéricos nos casos seguintes:

a) (…);

b) Quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil.

Este último artigo preceitua:

Quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da acção, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos.

            Por seu lado, o art.661º, nº2, daquele código de processo (hoje no art.609º, nº2, de forma idêntica, embora com tempo verbal diferente), quanto aos limites da condenação, dispõe:

         2 — Se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida.

            Quando não é ainda conhecida toda a extensão do dano, admite-se a formulação do pedido genérico. (L. Freitas, M. Machado, R. Pinto, C.P.C. Anotado, vol.2º, 2ªedição, C.E., páginas 266 e 682.)

Na fundamentação do pedido, a Autora alegou estar a suportar os referidos e identificados custos.

A opção pelo pedido genérico decorre da consideração de que só após o termo da acção poderá a Autora conhecer o valor total das quantias que lhe serão reclamadas a título de honorários, pelo patrocínio judiciário.

Não conhecendo o total, a Autora não concretizou os valores intermédios.

Parece-nos legalmente admissível este procedimento.

Ainda o facto de estar em causa, por força da lei, uma quantia razoável destinada a cobrir os custos, devidamente comprovados, suportados pela parte lesada com a investigação e a cessação da conduta lesiva do seu direito, permite a sua liquidação depois de proferida sentença de condenação genérica (art.358º, nº2, do novo Código de Processo.)

Por fim, o que ficou provado (custos dos processos) permite a sua integração na norma do nº7 do art.338.º-L do Código da Propriedade Industrial.

*

Decisão.

Julga-se o recurso parcialmente procedente, revoga-se parcialmente a decisão recorrida, relativamente ao pedido 5) da Autora e, mantendo o demais decidido, condena-se a Ré a pagar à Autora a quantia que se vier a liquidar, nos termos do nº7 do art.338.º-L do Código da Propriedade Industrial, destinada a cobrir os custos, devidamente comprovados, suportados pela Autora com a investigação e a cessação da conduta lesiva do seu direito.

            Nesta instância, custas pelo Recorrente em 9/10 e pela Recorrida em 1/10.

Coimbra, 2014-1-28

 (Fernando de Jesus Fonseca Monteiro ( Relator )

 (Luís Filipe Dias Cravo)

 (Maria José Monteiro Guerra)