Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
21/06.0GAMLD-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ORLANDO GONÇALVES
Descritores: PENA DE MULTA
EXECUÇÃO
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 02/29/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: BAIXO VOUGA, ANADIA, JUÍZO DE INSTÂNCIA CRIMINAL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 126º Nº 1 A) CP
Sumário: A instauração de ação executiva para pagamento de pena de multa constitui causa de interrupção da prescrição prevista no art.º 126°, nº 1, al. a), do C.P.
Decisão Texto Integral: Por despacho de 20 de Setembro de 2011, proferido pelo Ex.mo Juiz da Comarca do Baixo Vouga, Anadia, Juízo de Instância Criminal, foi declarada extinta, por prescrição da pena de multa, a responsabilidade da arguida A... decorrente da sua condenação neste processo e, consequentemente, que se arquivem os autos oportunamente.

Inconformado com o douto despacho dele interpôs recurso o Ministério Público, concluindo a sua motivação do modo seguinte:
1.º - Por sentença transitada a 27.2.2007 foi a arguida A... condenada na pena única de 150 dias de multa, a 4€ por dia, no total de 600 €.
2.º- O prazo normal de prescrição dessa pena e de 4 anos, nos termos do art. 122.º-1-d)-2 do CP.
3.º- Tal prazo suspendeu-se enquanto perdurou a dilação do pagamento da pena de multa, por força do requerimento para o seu pagamento fraccionado, ou seja, desde o trânsito da sentença até 21.8.2007, data em que foram declaradas vencidas as prestações ( todas) não pagas, nos termos do art. 125.º-1-d)-2 do CP.
4.º- Sucede que a condenada nada pagou, pelo que, o Ministério Público, por imposição legal ( pois havia notícia de que tinha bens e réditos exequíveis) e nos termos do art. 469.ºdo CPP, instaurou-lhe procedimento executivo tendente á execução patrimonial da pena de multa não paga voluntariamente.
5.º- Entendeu o despacho recorrido que a instauração da execução é apenas um instrumento que visa o pagamento coercivo, como o mandado de captura visa a execução da prisão, não sendo execução tout court da pena, pelo que, nenhum efeito teve no curso do prazo de prescrição, ou seja, não é causa de interrupção da prescrição, nos termos do art. 126.º-1-a)-2 do CP, pelo que a pena estava prescrita, o que ali declarou.
6.º- E deste entendimento, que nos parece afrontar a vontade do legislador, que afoitamente nos demarcamos.
7.º- Desde logo, em colisão com a tese do despacho sob censura, temos o elemento literal da lei, à luz do art. 9.º do CC, pois que uma coisa é o cumprimento voluntário da pena de multa pelo pagamento, outra, bem diversa, é o não pagamento, o qual despoleta por imperativo legal a execução patrimonial do condenado a que se reporta o art. 469.º do CPP, para o qual remete o cit. art. 126.º-1-a) do CP.
8.º- O termo “execução” na mente do legislador equivale a procedimento executivo e não a cumprimento voluntário ou coercivo e é utilizado pela lei de forma indistinta para a pena de multa ou prisão, sendo certo que não pode o intérprete distinguir onde o legislador o não faz, cfr. o cit. art. 9.º do CC, pelo que carece de absoluto fundamento a exclusão da pena de multa do citado art.126º-1-a) do CP.
9.º- Depois, o argumento histórico também aponta no sentido que defendemos, cfr. o art.115.º do projecto do CP de 1982, ou seja, a entender-se tal norma (art. 126.º-1-a) do CP) como fez o Mo Juiz, tratar-se-ia de uma norma penal completamente inútil, estéril, desnecessária e sem objecto e sentido, pois estar-se-ia a atribuir efeito interruptivo a uma causa que, por sua natureza – o cumprimento da pena - já é extintiva da pena, pois que o cumprimento voluntário da pena é a causa normal e natural da sua extinção... !
10.º- A isto acresce um argumento ligado à ratio do instituto da prescrição, que o despacho recorrido atropela, a saber: trata-se de um limite à actuação do Estado, ao seu direito de perseguir e de punir, ligado à paz jurídica e à desnecessidade do procedimento criminal ou da pena, decorrido que foi certo lapso de tempo,
11.º- Pois bem: se a instauração do processo executivo, como poder-dever do MP, representa a afirmação da manutenção da pretensão punitiva/executiva do Estado em agredir o património do condenado que não pagou a multa, não faria sentido que essa iniciativa processual fosse inócua no curso do prazo de prescrição.
12.º - Ou seja, a instauração do processo executivo é precisamente a antítese dos pressupostos em que assenta a prescrição, pelo que e com renovado respeito, não concebemos como se pode defender o contrário sem colidir com a coerência do edifício jurídico.
13.º- Depois, a tese do despacho recorrido ainda daria à comunidade um sinal deveras pernicioso, pois seria conferir um prémio aos condenados relapsos, cada vez em maior número (..!) que se alheiam da tutela criminal e das condenações de que foram alvo, os quais ainda veriam correr sem interrupções o prazo de prescrição não obstante a execução, em detrimento daqueles que cumprem... !
14.º- Em suporte da nossa posição, entre muitos outros, citamos os Acórdãos da Relação de Coimbra de 19.10.2010, no Proc. n.º 262/06.0GBCBR.C1. Relatora Alice Santos e da Relação do Porto de 17.1.2007, no Proc. n.º 0615889, Relator Paulo Valério e de 19.10.2005, no Proc. 411498, Relator Marques Salgueiro, in dgsi;
15.º- Donde, no caso em apreço, conjugada a apontada causa de suspensão da prescrição prevista no art. 125.º-1-d)-2 do CP com a de interrupção prevista no art. 126.º-1-a)-2-3 do CP, temos que a pena em que fora condenada a arguida não se mostra prescrita.
16.º- O despacho recorrido violou, entre outros, os arts. 122.º-1-d) e 126.º-1-a)-2-3, ambos do CP e o art. 469.º do CPP.
Termos em que; na procedência do recurso, se Vas. Exas. revogarem o despacho recorrido, mandando-o substituir por outro que, tal como promovido a fls. 17617 e 182: decline a verificação da prescrição da pena; mande exercer o contraditório na pessoa do defensor e depois declare exequível a pena de prisão subsidiária de 100 dias pela arguida, nos termos do art. 49.º-1 do CP e sem prejuízo do n.º 2 deste preceito, seguindo-se os demais termos, será feita; Justiça.

A arguida não respondeu à interposição do recurso.

O Ex-mo Juiz sustentou o despacho recorrido por remissão para os seus termos.

A Ex.ma Procuradora-geral adjunta neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.

Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º2 do Código de Processo Penal.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação

O despacho recorrido tem o seguinte teor:
« Os presentes autos dizem respeito à condenada A....
Neste processo foi a mesma condenada numa pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, a € 4.00 (quatro euros) diários, num total de € 600,00 (fls.109).
A decisão transitou em julgado a 27/02/2007.
Esteve em curso o pagamento em prestações da pena de multa desde o trânsito em julgado até 21/08/2007 (f1s.143v.), data em foram declaradas vencidas as prestações não pagas; período durante o qual esteve suspensa a prescrição nos termos do art. 125.º, n.ºs 1, al. d), e 2, do C.Penal.
Ao contrário do defendido pelo Ministério Público na promoção de fls.182, a instauração e pendência de acção executiva para cobrança do montante da pena de multa, em nosso entender, não é causa de interrupção ou de suspensão da prescrição [neste sentido: acórdãos do T.R.Coimbra de 15/06/2011 (em www.dgsi.pt - Processo n.º 204/0GBFND.C1); de 11/05/2011 (em www.dgsi.pt - Processo n.º 91/06.0GTCBR.C1); e de 14/10/2009 (em www.dgsi.pt - Processo n.º 50/03.5GAOBR); do T.R.Lisboa de 25-03-2010 (em wvw.dgsi.pt - Processo n.º 347/04.7GEOER.L1-9); e do T.R.Porto de 09-02-2011 ( em www.dgsi.p t- Processo n.º 209/01.0PASTS.Pl)].
O prazo de prescrição da pena é de 4 anos (art.122.º, n.º 1, al. d), do C.Penal).
Assim, desde 21/08/2007 não ocorreu qualquer causa de suspensão ou de interrupção da prescrição da pena de multa, pelo que desde essa data já decorreu o prazo de 4 anos necessário para a prescrição da pena.
Pelo exposto, o Tribunal decide:
Declarar extinta a responsabilidade criminal da condenada A... por em que foi condenada.
Notifique. Após trânsito, comunique ao registo criminal. Oportunamente, arquive os autos. ».

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O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação. ( Cfr. entre outros , os acórdãos do STJ de 19-6-96 Cfr. BMJ n.º 458º , pág. 98. e de 24-3-1999 Cfr. CJ, ASTJ, ano VII, tomo I, pág. 247. e Conselheiros Simas Santos e Leal Henriques , in Recursos em Processo Penal , 6.ª edição, 2007, pág. 103).
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar Cfr. Prof. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, Verbo, 2ª edição, pág. 350. , sem prejuízo das de conhecimento oficioso .
No caso dos autos, face às conclusões da motivação do Ministério Público a questão a decidir é a seguinte:
- se o despacho recorrido violou, entre outros, os artigos 122.º, n.º1, al. d) e 126.º, n.ºs 1, al. a), 2, e 3, ambos do C.P. e o art. 469.º do C.P.P. ao declarar prescrita a pena de multa, pelo que deve ser revogado e mandado substituir por outro que, declinando a verificação da prescrição da pena, determine o prosseguimento dos autos.
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Passemos ao conhecimento da questão.
A prescrição das penas é regulada nos artigos 122.º a 126.º do Código Penal, constituindo um pressuposto negativo de toda a execução. Dela deve conhecer-se oficiosamente, em qualquer estado do processo.
Funda-se o instituto da prescrição das penas na ideia de que “o decurso do tempo tornou a execução da pena sem sentido e, por aí, o facto deixou de carecer de punição.” Prof. Figueiredo Dias, “ Direito Penal Português”, pág. 702 . As razões de prevenção especial e de prevenção geral positiva, com o decurso de prazos-limite ficarão definitivamente frustradas.
O art.122.º, n.º 1, alínea d), do Código Penal, estatui que as penas de multa prescrevem no prazo de 4 anos.
De acordo com o n.º 2, deste preceito, o prazo começa a correr no dia em que transitar em julgado a decisão que tiver aplicado a pena.
O decurso do tempo, que constitui a essência da prescrição, não deve, porém, favorecer o agente quando as exigências de punição são confirmadas através de actos que têm em vista o cumprimento da pena, aqui residindo a razão de ser da interrupção e da suspensão da prescrição da pena.
Radicando nesta ideia, o artigo 125.º, n.º1, do Código Penal, estabelece:
«1. A prescrição da pena (…) suspende-se, para além dos casos especialmente previstos na lei, durante o tempo em que:
(…)
d). Perdurar a dilação do pagamento da multa.
2. A prescrição volta a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão».
Como fundamentos da interrupção, o artigo 126.º, do Código Penal, estatui, designadamente:
«1. A prescrição da pena (…) interrompe-se:
a) Com a sua execução; ou
b) Com a declaração de contumácia.
2. Depois de cada interrupção começa a correr novo prazo de prescrição».
Para obstar a que a interrupção prolongue sem fim à vista o prazo da prescrição da pena, o n.º3 deste art.126.º estabelece que « A prescrição da pena tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade.».
Numa situação como a presente, a prescrição da pena ocorrerá sempre quando tiverem decorrido, desde o dia em que transitar em julgado a decisão condenatória, 4 anos (art.122.º, n.º 1, alínea d), do Código Penal), a que acrescem mais 2 anos ( correspondentes a metade daquele prazo), sem prejuízo do tempo de suspensão.
No caso em apreciação, é pacífico que a arguida A… foi condenada nos presentes autos, por sentença transitada a 27/02/2007, na pena única de 150 dias de multa, à taxa diária de € 4.00 (quatro euros), ou seja , na multa global de € 600,00.
Por força de um requerimento da arguida de 27/02/2007, solicitando o pagamento da pena de multa em 6 prestações, a prescrição da pena ficou suspensa, nos termos do art. 125.º, n.ºs 1, al. d), e 2, do Código Penal, desde aquela data até 21/08/2007, momento em foram declaradas vencidas as prestações não pagas.
Em 6/11/2007, o Ministério Público instaurou execução contra a arguida para pagamento coercivo da multa e custas devidas. Depois de diversas vicissitudes, a execução foi arquivada condicionalmente em 15/6/2011, sem se haver conseguido o pagamento da multa.
Chegados aqui, verificamos que o Ex.mo Juiz do Tribunal a quo, entende que a instauração e pendência de acção executiva para cobrança do montante da pena de multa não é causa de interrupção, conforme decidido nos acórdãos dos Tribunais da Relação de Coimbra e do Porto, que identifica. Considerando que desde 21/08/2007 não ocorreu qualquer causa de suspensão ou de interrupção da prescrição da pena de multa, decidiu que já decorreu o prazo de 4 anos necessário para a prescrição da pena de multa e consequente extinção da mesma.
Em sentido diferente, o Ministério Público defende no recurso em apreciação, sustentado também em jurisprudência dos Tribunais da Relação de Coimbra e do Porto, que identifica, que a instauração da execução é causa de interrupção da prescrição, nos termos do art. 126.º, n.ºs 1, al.a) e 2 do Código Penal, pelo que a pena não prescreveu ainda.
O recorrente discorda da interpretação que subjaz ao despacho recorrido, de que a instauração da execução é apenas um instrumento que visa o pagamento coercivo, como o mandado de captura visa a execução da prisão, não sendo execução tout court da pena, e que o termo execução previsto na al.a), n.º1 do art.126.º do Código Penal tenha o sentido de cumprimento voluntário, de efectivo pagamento da multa.
Socorrendo-se, desde logo do elemento literal da lei, à luz do art. 9.º do CC, o Ministério Público defende que uma coisa é o cumprimento voluntário da pena de multa pelo pagamento e, outra bem diversa, é o não pagamento, o qual despoleta por imperativo legal a execução patrimonial do condenado a que se reporta o art. 469.º do CPP, para o qual remete o citado art. 126.º, n.º1, al.a) do CP.
O termo “execução” na mente do legislador equivale a procedimento executivo e não a cumprimento voluntário ou coercivo e é utilizado pela lei de forma indistinta para a pena de multa ou prisão, sendo certo que não pode o intérprete distinguir onde o legislador o não faz, pelo que carece de absoluto fundamento a exclusão da pena de multa do citado art.126º-1-a) do CP.
Depois, o argumento histórico - o art.115.º do projecto do CP de 1982 - também aponta neste sentido, ou seja, a entender-se o art.126.º, n.º1, al. a) do Código Penal, como fez o Ex.mo Juiz, esta seria uma norma penal completamente inútil, estéril, desnecessária e sem objecto e sentido, pois estar-se-ia a atribuir efeito interruptivo a uma causa que, por sua natureza – o cumprimento da pena - já é extintiva da pena, pois que o cumprimento voluntário da pena é a causa normal e natural da sua extinção.
A isto acresce um argumento ligado à ratio do instituto da prescrição, que o despacho recorrido atropelará, a saber: trata-se de um limite à actuação do Estado, ao seu direito de perseguir e de punir, ligado à paz jurídica e à desnecessidade do procedimento criminal ou da pena, decorrido que foi certo lapso de tempo. Se a instauração do processo executivo, como poder-dever do MP, representa a afirmação da manutenção da pretensão punitiva/executiva do Estado em agredir o património do condenado que não pagou a multa, não faria sentido que essa iniciativa processual fosse inócua no curso do prazo de prescrição.
A tese do despacho recorrido daria à comunidade um sinal deveras pernicioso, pois seria conferir um prémio aos condenados relapsos, cada vez em maior número, que se alheiam da tutela criminal e das condenações de que foram alvo, os quais ainda veriam correr sem interrupções o prazo de prescrição não obstante a execução, em detrimento daqueles que cumprem.
Vejamos.
As divergências que estão na base do despacho recorrido e do recurso interposto pelo Ministério Público, situam-se na interpretação dada à causa de interrupção prevista na al. a), n.º1 do art.126.º do Código Penal, ou seja, à expressão “ com a sua execução”, como causa de interrupção da prescrição da pena.
A adjunta na apreciação deste recurso do Tribunal da Relação, defendeu já no acórdão de 19.10.2010, no Proc. n.º 262/06.0GBCBR.C1, citado pelo Ministério Público, que a prescrição se interrompe com a apresentação do requerimento para execução da pena de multa, começando a correr nessa data, novo prazo de prescrição.
O relator do presente acórdão sufraga esta posição.
Assim, o Tribunal da Relação, no seguimento dessa jurisprudência, entende que os termos “execução” da pena de multa e “cumprimento” da pena de multa, traduzem, na lei, realidades distintas.
Fazendo-se corresponder, sem qualquer apoio na letra da lei, a execução da pena de multa ao seu pagamento, a al. a) do nº 1 do artº 126º do Código Penal seria efectivamente inútil e incompreensível, pois seria atribuir força interruptiva da prescrição da pena - assim diferindo no tempo o momento em que, pela prescrição, se operaria a extinção da pena - , a um evento que, ele próprio, importaria a extinção da pena porque executada/cumprida.
Tratando-se de pena de multa, o respectivo cumprimento é feito ou mediante o seu pagamento voluntário (art. 489º do C.P.P.), ou coercivamente, mediante a competente execução em bens do condenado, dando-se oportunamente pagamento com o que, por essa via se apurar ( art. 491.º do C.P.P.).
Assim, « aquela al. a) só tem sentido e alcance enquanto aí se contemple e entenda a “execução” como o processo dinâmico, previsto na lei, dirigido à obtenção, à custa de bens do condenado, da quantia necessária para o posterior pagamento da multa.
Esse é, de resto, não apenas o sentido que, usualmente, àquela palavra é atribuído (lembremo-nos de expressões como “dar à execução” ou “instaurar a execução”), como é ainda o que claramente se coaduna com as normas processuais relativas às execuções (assim, no que, no caso, mais directamente importa, os artº 467º e segs. do C. P. Penal, maxime, os artº 489º a 491º, e os artº 116º e segs. do C. Custas Judiciais), preceitos dos quais decorre claramente que, ao falar em “execução”, o legislador não teve em mente o acto do pagamento, com o qual se efectiva o cumprimento da pena de multa, mas sim todo o processo dinâmico balizado por lei e que tem por finalidade, precisamente, alcançar esse pagamento Cfr. acórdão do Trib. Relação do Porto , de 19.10.2005, no Proc. 411498, Relator Marques Salgueiro, in dgsi;
.
O argumento histórico, por vezes invocado pela posição contrária à que estamos a seguir, em que vê um argumento a seu favor a eliminação da primitiva redacção da al. b), n.º1 do art. 124 nº 1, do Código Penal/1982, como causa interruptiva da prescrição da pena, , não nos parece consistente.
É certo que na primitiva redacção daquele art.124.º, n.º1, do Código Penal, a prescrição da pena se interrompia não só com a sua execução ( al. a) – como presentemente acontece – mas ainda «com a prática, pela autoridade competente, dos actos destinados a fazê-la executar, se a execução se tornar impossível por o condenado se encontrar em local donde não possa ser extraditado ou onde não possa ser alcançado.».
A perseguição por parte das autoridades do condenada, para efeitos de extradição ou de o fazer comparecer para executar a pena, não nos parece que se compadeçam com a “execução” da pena de multa, com o cumprimento desta, pelo que é na al.a), n.º1 do art.126.º do Código Penal, e não na al. b), que se deve procurar a solução para a questão em apreciação.
Os actos praticados pelo Ministério Público no sentido da execução da pena de multa, com a instauração da execução são reveladores do interesse do Estado na execução da punição e das expectativas comunitárias no cumprimento da pena por parte do condenado, perdurando ainda as exigências de prevenção especial.
A sentença condenatória transitou em 27 de Fevereiro de 2007. O prazo de prescrição da pena de multa esteve suspenso quase 6 meses ( entre 27 de Fevereiro de 2007 até ao dia 21 de Agosto de 2007) e com a instauração da execução pelo Ministério Público contra a arguida A… para pagamento de multa, interrompeu-se o prazo de prescrição da multa.
Ressalvado o tempo da suspensão da execução, de 5 meses e 27 dias, face à interrupção do prazo em 6 de Novembro de 2007, que pode chegar aos 6 anos, temos como certo que ainda não prescreveu a pena de multa aplicada à arguida.
Assim, procede a questão e o recurso interposto pelo Ministério Público.

Decisão

Nestes termos e pelos fundamentos expostos acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e revogar o douto despacho recorrido que havia declarado prescrita a pena, devendo ser substituído por outro que dê prosseguimento ao processo.
Sem custas.
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Orlando Gonçalves (Relator)
Alice Santos