Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
500/06.9TBTND.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: GONÇALVES FERREIRA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
CULPA
ULTRAPASSAGEM
MUDANÇA DE DIRECÇÃO
Data do Acordão: 10/19/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TONDELA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.483, 487 CC, 24, 35, 39, 41, 44 CE
Sumário: 1. É de imputar a responsabilidade pelo acidente de viação aos dois condutores dos veículos que embateram entre si, no circunstancialismo em que um deles efectua uma ultrapassagem a velocidade muito superior à permitida para o local e o outro muda de direcção para a esquerda já depois de aquele ter iniciado a ultrapassagem.

2. Tendo em conta a similar gravidade das infracções e o facto de ambos os condutores poderem ter evitado o embate, se agissem com as cautelas que a lei impõe, é de fixar a proporção de culpas em 50% para cada qual.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

            I. Relatório:

J (…), casado, residente (…) concelho de Tondela, intentou acção declarativa comum, com forma de processo ordinário, contra Companhia de Seguros (…), SA, com sede (…) Porto, alegando, em resumo, que:

No dia 21 de Fevereiro de 2004, pelas 15H00, quando tripulava o seu motociclo de matrícula ....LU, na EN n.º 228, foi embatido pelo veículo automóvel ....DB, segurado na ré, do que lhe sobrevieram danos vários, patrimoniais e não patrimoniais, que descreve e quantifica.

Coube ao condutor do DB a responsabilidade pela produção do acidente, por ter guinado abruptamente a sua viatura para a esquerda, no preciso instante em que o autor o estava a ultrapassar.

Concluiu pela condenação da ré no pagamento da quantia de € 183.275,00, acrescida de juros legais até integral pagamento.

            Regularmente citada, a ré contestou, imputando, por um lado, ao autor a culpa pela eclosão do sinistro, por se ter abalançado a ultrapassar o DB quando este efectuava uma manobra de mudança de direcção para a esquerda e impugnando, por outro, a existência e o valor dos danos.

            Terminou pela absolvição do pedido.

(…)Companhia de Seguros, SA, com sede (…), em Lisboa, deduziu o incidente de intervenção principal espontânea, alegando ser-lhe devido o montante de € 30.367,57, acrescido de juros vencidos e vincendos, que pagou ao autor, no âmbito de processo emergente de acidente de trabalho, que correu seus trâmites no 2.º Juízo do tribunal do Trabalho de Viseu.

O incidente foi admitido sem oposição, não obstante a ré ter contestado a versão do acidente dada pela interveniente.

No despacho saneador foram declaradas a validade e a regularidade da lide.

A selecção da matéria de facto (factos assentes e base instrutória) foi alvo de reclamação por parte da ré, parcialmente atendida.

Realizada a audiência de julgamento, no decurso da qual a interveniente ampliou o pedido em € 7.091,80, e fixada, sem reparos, a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor as quantias de € 39.190,61 e de 21.520,00, de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescidas de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a citação e da data da sentença, respectivamente, até integral pagamento, e à interveniente a importância de € 14.980,90, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a notificação do articulado de intervenção até efectivo pagamento.

Inconformados com a decisão, dela interpuseram recurso o autor e a ré, que concluíram assim as respectivas alegações:

A. Autor:

1) O veículo DB pretendia entrar numa rua de terra, com 3,50 metros de largura, situada do lado esquerdo da Estrada Nacional 228, atento o sentido de marcha Campo de Besteiros/Vouzela, de forma ascendente e obliquamente para sudoeste e dificilmente visível para quem seguisse aquele sentido;

2) O autor iniciou a manobra de ultrapassagem e passou a circular pela metade esquerda da faixa de rodagem momentos antes de o condutor do DB iniciar a manobra de mudança de direcção para a esquerda;

3) A viatura DB invadiu a meia faixa de rodagem esquerda por onde o autor já circulava, tendo feito um ângulo de cerca de 180º, para contornar o cotovelo que resulta do ponto 8 dos factos provados;

4) O autor não via o DB, que estava tapado pelo veículo que se interpunha entre ambos, não via o caminho térreo, tinha de retomar o mais breve possível a sua direita e não contava com a manobra daquele;

5) O condutor do DB estava obrigado a facultar a ultrapassagem, pelo que foi dele a culpa pela produção do acidente;

6) Ao não entender assim, violou o tribunal o disposto nos artigos 44.º, n.º 1, 38.º, n.º 3 e 39.º, n.º 1, todos do Código da Estrada;

7) Não seguindo o tribunal este caminho, deveria, pelo menos, lançar mão do preceituado no artigo 506.º, n.º 2, do Código Civil, declarando igual a culpa de ambos os condutores;

8) A decisão deve ser revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente procedente ou declare igual a culpa dos condutores dos veículos LU e DB.

B. Ré:

1) O condutor do DB, pretendendo virar à esquerda no entroncamento que se aproximava, fez sinal de pisca – pisca para esse lado, diminuiu a velocidade e, depois de se ter certificado de que não havia trânsito em sentido contrário nem estava a ser ultrapassado, iniciou a manobra;

2) Quando estava prestes a concluir a manobra, ocupando, então, apenas cerca de um metro da metade esquerda da faixa de rodagem, foi embatido pelo LU, que seguia a não menos de 90 quilómetros por hora, apesar de a velocidade máxima permitida para o local ser de 60 quilómetros por hora;

3) O embate ocorreu junto da berma esquerda e a cerca de 6 metros da berma direita, atento o sentido de marcha de ambos os veículos;

4) No local, a estrada tem 6,60 metros de largura, desenha-se em linha recta e as duas meias faixas que a compõem estão separadas por um traço descontínuo;

5) A culpa pela produção do acidente coube ao autor, por conduzir sem atenção ao trânsito (tanto assim que se não apercebeu do DB a concluir a manobra de mudança de direcção para a esquerda), a velocidade superior à permitida (razão por que não conseguiu parar o respectivo veículo no espaço livre e visível à sua frente) e de forma imperita (de tal modo que não logrou passar pelos cerca de 2,30 metros livres da metade esquerda da faixa de rodagem);

6) A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 483.º, 505.º e 570.º do Código Civil e os preceitos estradais.

7) A decisão deve ser revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente.

A interveniente contra-alegou, de molde a sustentar a manutenção do julgado.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Em conformidade com o teor das conclusões das alegações dos recorrentes, que delimitam o âmbito do recurso, são duas as questões a resolver:

a) A responsabilidade pela produção do acidente;

b) O montante indemnizatório.

II. A matéria de facto:

Na sentença apelada foram dados por assentes os seguintes factos:

 

1) No dia 21 de Fevereiro de 2004, pelas 15.00 horas, na Estrada Nacional n.º 228, ao Km 39,350, em Caparrosa, área desta comarca, ocorreu um embate entre o motociclo de matrícula ....LU, conduzido pelo autor J (…), seu proprietário, e o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula ....DB, conduzido por E (…) residente em Caparrosa – A).

2) Nas circunstâncias de tempo e lugar aludidas em A), o motociclo LU e o veículo DB circulavam no sentido Campo de Besteiros – Vouzela – B).

3) O veículo DB circulava à frente do motociclo LU, interpondo-se entre ambos um outro veículo – C) e 1º.

4) Cerca de 50 metros depois do cruzamento que liga Caparrosa e Boaldeia, o autor iniciou a ultrapassagem do veículo que o precedia, bem como do veículo DB – 2º.

5) O condutor do DB pretendia virar à sua esquerda no entroncamento que se aproximava e seguir pela rua Chão de Cima – 17º.

6) Para o efeito, o condutor do DB fez sinal de pisca-pisca para a sua esquerda, diminuindo de velocidade – 18º.

7) A rua para onde o veículo DB pretendia seguir tem aproximadamente 3,50m de largura e, à data do embate, o pavimento era de terra – 7º e 8º.

8) Tal rua não fica perpendicular à Estrada Nacional n.º 228, situa-se do lado esquerdo, atento o sentido Campo de Besteiros – Vouzela, de forma ascendente e obliquamente para sudoeste, sendo dificilmente visível para quem segue em tal sentido – 9º e 10º.

9) Ao chegar ao entroncamento, local para onde pretendia virar, sempre com o sinal de pisca-pisca ligado, o condutor do DB abrandou mais a velocidade – 19º.

10) Depois de se certificar que não havia trânsito em sentido contrário nem estava a ser ultrapassado, o condutor do DB decide que poderia virar para a sua esquerda, iniciando, pouco depois, a respectiva manobra – 20º.

11) O autor, condutor do LU, iniciou a manobra de ultrapassagem e passou a circular pela metade esquerda da estrada, considerando o seu sentido, momentos antes do condutor do veículo DB iniciar a manobra de viragem à esquerda – 23º.

12) O veículo DB invadiu a faixa de rodagem esquerda por onde o motociclo conduzido pelo autor, momentos antes, iniciara a circulação – 4º.

13) Nas circunstâncias de tempo e lugar aludidas em A), o motociclo LU seguia a velocidade não inferior a 90Km/h, sendo certo que, no local do acidente, a velocidade máxima permitida é de 60Km/h – 16º.

14) O condutor do veículo DB, para efectuar a manobra de virar para tal Rua, guinou totalmente para a esquerda, fazendo um ângulo de cerca de 180º – 11º.

15) O autor, para evitar o embate, desviou-se o mais possível para a esquerda, o que não conseguiu – 12º.

16) Quando já concluía a travessia da metade esquerda da via, considerando o seu sentido, o DB foi embatido no seu lado esquerdo traseiro pela frente do LU – 21º.

17) No momento do embate, o veículo DB ocupava cerca de 1 metro da via, encontrando-se já com a respectiva frente no início da Rua Chão de Cima para onde pretendia seguir – 25º.

18) O embate aludido em A) ocorreu na hemi-faixa de rodagem esquerda, junto da berma esquerda e a cerca de 6 metros da berma direita, atento o sentido de marcha de ambos os veículos – D) e 24º.

19) O embate do LU na lateral do veículo DB fez com que este tombasse para o seu lado direito – 26º.

20) Em consequência do embate, o motociclo, o veículo DB e o corpo do autor ficaram junto à berma esquerda, atento o sentido Campo de Besteiros – Vouzela – 15º.

21) No local onde ocorreu o embate, a estrada configura uma recta, estando as hemi-faixas de rodagem separadas por traço descontínuo – 13º e 14º.

22) No local onde ocorreu o embate, a estrada tem a largura de 6,60 metros de largura, sendo o pavimento asfaltado – E).

23) O autor J (…) nasceu em 1 de Junho de 1968 – H).

24) Em consequência do embate, o autor sofreu traumatismo crâneo-encefálico, com coma e internamento nos cuidados intensivos, bem como traumatismo toráxico e traumatismo abdominal, fractura do úmero esquerdo, fractura do 1/3 distal dos ossos do antebraço direito e fractura da bacia, e ainda traumatismo da face (fractura bilateral dos côndilos mandibulares, com maloclusão intermaxilar, fractura da coroa do dente 1.4, avulsão traumática dos quatro incisivos maxilares) – 27º a 30º.

25) Logo após o acidente, foram prestados ao autor os primeiros socorros pelo INEM e de seguida foi transportado para o Hospital de São Teotónio de Viseu, onde ficou internado durante quatro meses, tendo permanecido nos cuidados intensivos durante 21 dias – 31º e 32º.

26) E foi tratado com osteossíntese nos maxilares e bacia e fez sessões diárias de fisioterapia em tal Hospital, durante o internamento – 33º.

27) O autor foi submetido a várias intervenções cirúrgicas no Hospital de São Teotónio de Viseu durante o período em que esteve internado – 34º.

28) Em consequência do acidente, o autor esteve incapacitado de desenvolver a sua actividade profissional durante 212 dias – 35º.

29) À data do acidente, o autor trabalhava como construtor civil, auferindo o ordenado mensal de € 500,00 – 36º.

30) O autor teve alta do Serviço de Ortopedia em 5 de Maio de 2004, com indicação de seguimento em ortopedia e cirurgia maxilo-facial – 38º.

31) O autor solicitou aos clínicos Srs. Dr. ....CR, ortopedista, e Dr. ....PCF, estomatologista, que o observassem e informassem do seu estado clínico, tendo despendido em consultas a quantia de € 275,00 – 39º.

32) Em consequência do acidente, o autor ficou a padecer de cefaleias, alterações menésicas e perturbações do sono e ficou com rigidez do punho direito e do ombro esquerdo, bem como dores torácicas e dores da sinfise púbica e sacroilíaca direita, ficando com dificuldade na marcha e limitação da cinética mandibular – 40º a 44º.

33) A limitação aludida em 44º tem como consequência a limitação da abertura bocal quantificável num afastamento intertasso incisal de 25mm – 45º.

34) O dente 1.4 foi reabilitado com prótese fixa de um elemento cerâmico e os quatro incisivos maxilares foram reabilitados com uma ponte fixa metalocerâmica de quatro elementos sobre três implantes – 46º.

35) Em consequência do acidente, o autor ficou limitado aos trabalhos de pintura e assentamento de azulejos nas paredes – 48º.

36) Em consequência do acidente e das lesões sofridas, o autor ficou com várias cicatrizes no nariz, na anca, abdómen e membro superior esquerdo, estando limitado por não poder levantar o braço esquerdo acima do ombro – 50º e 51º.

37) O autor, aquando do embate e durante a doença, teve muitas dores que ainda perduram, designadamente nas mudanças de temperatura e quando tem de fazer esforço e firmeza, quando está muito tempo de pé ou sentado, ao subir e descer escadas – 52º.

38) O autor ficou com a marcha limitada, ausência de corrida e dificuldade ao comer e na fala – 53º.

39) Durante o período de convalescença, o autor sofreu choque emocional perante a ameaça da necessidade de lhe ser amputado o braço esquerdo e ficar deformado no rosto – 54º.

40) Em face do aludido nos quesitos 50º a 53º, o autor sofre desgostos e inibição e tem complexos perante o sexo oposto – 55º.

41) Em consequência do acidente e das lesões sofridas, o autor ficou a padecer de uma incapacidade permanente parcial de 45%, à qual acresce, a título de dano futuro, mais 5% – 47º.

42) Em consequência do embate, o motociclo LU sofreu danos que tornaram inviável a sua reparação – 63º.

43) O valor do ....LU, à data do acidente, era de cerca de € 5.000,00 – 62º.

44) À data do acidente, o proprietário do veículo ....DB tinha transferido para a ré “Companhia de Seguros (…) SA”, a responsabilidade civil decorrente da circulação de tal veículo, através de contrato de seguro, com o limite de capital de € 750.000,00, titulado pela apólice n.º 4101702014 – I).

45) A interveniente (…) Companhia de Seguros, SA”, no exercício da sua actividade, celebrou com (…) Unipessoal, Ld.ª”, um contrato de seguro obrigatório do ramo acidentes de trabalho por conta de outrem, na modalidade de prémio fixo, titulado pela apólice n.º 202055955, nos termos do qual assumiu a responsabilidade infortunística laboral do autor J (…)– J).

46) O acidente aludido em A) foi também um acidente de trabalho, tendo corrido no 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Viseu um processo de acidente de trabalho com o n.º ...., sendo sinistrado o ora autor J (…) e entidade responsável a ora interveniente “(…)– Companhia de Seguros, SA” – L).

47) No processo aludido em L), foi elaborado auto de conciliação, devidamente homologado e já transitado em julgado, nos termos do qual a interveniente assumiu pagar ao autor a pensão anual e vitalícia de € 1.665,08, com início a 4/9/2005, paga em 14 prestações mensais de igual montante cada, sendo nos meses de Maio e Novembro as referentes aos subsídios de férias e de Natal, actualizáveis nos termos em que o forem as pensões do regime da Segurança Social, desde já se actualizando para o valor de € 1.703,38 anuais a partir de 1/12/2005, bem como € 40,00 pelas quatro deslocações obrigatórias ao IML e ao tribunal, nos termos do documento de fls. 133 a 135, que aqui se dá por reproduzido – M).

48) Até à data da propositura da acção, em 1/9/2006, o autor J (…) recebeu da companhia de seguros interveniente a quantia de € 4.578,18 – 49º.

49) Em consequência do embate, o autor sofreu lesões físicas, tendo a interveniente “(…)– Companhia de Seguros, SA” passado a assumir através dos seus serviços clínicos de Viseu, Porto e Lisboa o tratamento do autor a partir de 27 de Abril de 2004 e pagou todas as despesas de deslocação – N).

50) A interveniente (…) – Companhia de Seguros, SA”, na reparação do acidente, enquanto acidente de trabalho, despendeu as seguintes quantias – 57º a 61º:

− € 3.142,50, em indemnizações salariais;

− € 1.058,36, em pensões;

− € 25.812,66, em assistência clínica;

− € 56,93, em medicamentos; e

− € 290,00, em despesas de transportes.

51) A interveniente (…) – Companhia de Seguros, SA”, desde 29/10/2006 até 27/11/2009, despendeu na reparação do acidente, enquanto acidente de trabalho, as seguintes quantias – ampliação do pedido:

− € 6.632,61, relativa ao pagamento de pensões; e

− € 459,19, relativa a assistência clínica.

III. O direito:

a) A responsabilidade pela produção do acidente

            Na sentença apelada repartiu-se a culpa pelos dois condutores intervenientes, na proporção de 60% para o autor (tripulante do motociclo LU) e de 40% para o condutor do ligeiro DB, na consideração de que ambos contribuíram para a produção do acidente, aquele por efectuar uma ultrapassagem em excesso de velocidade e este por iniciar uma manobra de mudança de direcção para a esquerda quando o autor já se achava em pleno acto de ultrapassar. Segundo, ainda, a decisão, o excesso de velocidade relevaria de forma mais vincada para a eclosão do sinistro, razão bastante para atribuir ao autor uma mais elevada parcela de responsabilidade.

            Discordam os recorrentes da solução encontrada, imputando cada qual a culpa à outra parte (no caso da ré, ao seu segurado, como é óbvio), por apelo, no essencial, ao mesmo argumento: o da regularidade da respectiva manobra e irregularidade da do outro condutor.

            A quem assistirá a razão?

            A culpa, pressuposto básico da obrigação de indemnizar, como emerge do n.º 1 do artigo 483.º do Código Civil (diploma de que serão os restantes preceitos que venham a ser citados sem indicação de origem), é um vínculo de natureza psicológica que liga o facto ao agente.

            A culpa, escreve o Prof. Antunes Varela, exprime um juízo de reprovabilidade pessoal da conduta do agente; o lesante, em face das circunstâncias específicas do caso, devia e podia ter agido de outro modo. É um juízo que assenta no nexo existente entre o facto e a vontade do autor, e pode revestir duas formas distintas: o dolo – a que os autores e as leis dão algumas vezes o nome de má fé – e a negligência ou mera culpa – culpa em sentido estrito (Das Obrigações em Geral, Volume I, 7.ª edição, pág. 559).

            A distinção tem sobejo relevo prático, na medida em que a verificação da mera culpa pode conduzir à redução do montante indemnizatório (artigo 494.º).

            No caso que ora nos ocupa, porém, e como é regra, aliás, em matéria de acidentes de viação, só está em causa a negligência, susceptível de ser definida como a omissão do dever de diligência, que pode revestir duas modalidades: a negligência consciente (sempre que o agente prevê a produção do facto ilícito como possível, mas não usa das cautelas adequadas para o evitar, confiando, precipitada ou levianamente, em que o mesmo se não verificará) e negligência inconsciente (o agente não chega a prever o evento como consequência possível da sua conduta, quando podia e devia tê-lo previsto).

            Na primeira das modalidades, o evento liga-se ao agente pela previsão, na segunda, pela previsibilidade, sendo esse nexo psicológico da previsão ou da previsibilidade que coloca o evento na dependência da vontade do agente (Dario Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, pág. 63/65).

            No que se refere aos critérios de apreciação da culpa (a definição, no fundo, do grau de diligência exigível), duas correntes se formaram na doutrina: uma, no sentido de que o grau de diligência exigível é o do homem normal, medianamente sagaz, avisado e prudente (culpa em abstracto); outra, que entende que é aquele que o próprio agente usa na normalidade do seu dia a dia (culpa em concreto).

            A nossa lei civil acolheu o critério da culpa em abstracto (a culpa, diz o n.º 2 do artigo 487.º, é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso), na consideração, pensa-se, de que o critério da culpa em concreto poderia potenciar comportamentos menos prudentes.

            A ideia fundamental da lei, esclarece o acima mencionado Professor, é a de que o comércio jurídico não pode estar atreito à capacidade pessoal de prestação do devedor, sendo, antes, este que deve preparar as coisas de modo a responder cabalmente pelas obrigações que assumiu ou que por lei lhe foram impostas (obra citada, pág. 569).

            Parece claro que o apelo à figura do bonus pater familias eleva o grau de diligência exigível, já que, como escreve Oliveira Matos, citando Ferrini, a ideia do bom pai de família está mais próxima do homem perfeito que do homem médio (Código da Estrada Anotado, página 370).

            Adverte, por isso, o Prof. Vaz Serra que o critério da culpa em abstracto tem de ser entendido em certos termos, sob pena de conduzir a resultados inadmissíveis, na medida em que o tipo do bom pai de família não é um tipo uniforme, antes adaptável às várias situações, daí decorrendo que não possa deixar de atender-se à cultura e profissão do devedor, à natureza do negócio e a outras circunstâncias (BMJ 68, página 45).

            No que concerne aos acidentes de viação, a negligência tem a ver, sobretudo, com a violação das regras da circulação automóvel e, bem assim, com a perícia e a destreza, essenciais a tal género de actividade. Daí que o dever de diligência apresente um maior grau de exigibilidade (Dario Martins de Almeida, obra citada, pág. 73).

            Aqui chegados, vejamos, em função da matéria de facto provada, a dinâmica do acidente:

Os veículos intervenientes (motociclo LU, do autor e ligeiro DB, do segurado da ré) circulavam na EN n.º 228, no mesmo sentido de marcha, este mais à frente, interpondo-se entre ambos uma outra viatura.

O condutor do DB pretendia virar para uma rua de pavimento térreo, com 3,50 metros de largura, que entronca obliquamente no lado esquerdo da dita EN, atento o sentido de marcha de ambos os veículos, e que é dificilmente visível para quem segue em tal sentido.

Para tanto, ligou o sinal luminoso (vulgo, pisca-pisca) de mudança de direcção para a sua esquerda e diminuiu de velocidade.

Ao chegar ao entroncamento, sempre com o sinal luminoso ligado, abrandou mais, ainda, a velocidade.

Não tendo dado pelo trânsito de veículos em sentido oposto ao seu nem por que estivesse a ser ultrapassado, decidiu que poderia fazer a manobra, que iniciou pouco depois, tendo guinado totalmente para a esquerda, num ângulo de cerca de 180º.

O autor, por sua vez, que pretendia ultrapassar os veículos que o precediam, passou a circular pela metade esquerda da faixa de rodagem, considerando o seu sentido, momentos antes de o condutor do veículo DB iniciar a manobra de mudança de direcção para a esquerda.

Depois do início da ultrapassagem e quando seguia a velocidade não inferior a 90 Km/hora, deparou com o DB na meia faixa na qual, então, circulava.

Na tentativa de evitar a colisão, desviou o seu motociclo para a esquerda, mas sem o conseguir, pois que veio a embater na parte traseira, lado esquerdo, do ligeiro, quando este concluía a travessia da faixa de rodagem, ocupando, então, cerca de um metro da EN.

O embate ocorreu a cerca de seis metros da berma direita, tendo em conta o sentido de ambos os veículos.

No local do acidente, a estrada é em asfalto, tem 6,60 metros de largura, desenha-se em recta, e a faixa está dividida, a meio, por traço descontínuo.

            A velocidade máxima permitida para o local é de 60 quilómetros por hora.

            Presentes estas circunstâncias de facto, julga-se que é, no essencial, correcta a argumentação utilizada na sentença.

A conclusão (no tocante à proporção da culpa) é que não será, porventura, a mais adequada, como melhor adiante se dirá.

Mas vejamos a lei vigente, ao tempo (Código da Estrada, na redacção anterior à do DL n.º 44/05, de 23 de Fevereiro), começando pela questão da velocidade:

 De acordo com o artigo 24.º, n.º 1, os condutores devem regular a velocidade às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, de modo a poderem executar, em condições de segurança, as manobras cuja necessidade seja de prever e, em especial, a fazerem parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente.

            Sem prejuízo dos limites máximos de velocidade fixados (que, na hipótese, era de 60 quilómetros por hora, por via de sinalização vertical), a velocidade deve ser especialmente moderada, além do mais, nos entroncamentos – alínea f) do n.º 1 do artigo 25.º do mesmo diploma.

            Quanto à manobra de ultrapassagem, dispõe o n.º 1 do artigo 41.º que é proibida imediatamente antes e nos cruzamentos e entroncamentos, esclarecendo o n.º 1 do artigo 38.º, para os casos em que é admissível, que não deve ser iniciada sem que o condutor se certifique de que a pode realizar sem perigo de colidir com veículo que transite no mesmo sentido ou em sentido contrário.

            Para a manobra de mudança de direcção para a esquerda, por fim, prevê o n.º 1 do artigo 44.º que o condutor deve aproximar-se, com a necessária antecedência e o mais possível, do limite esquerdo da faixa de rodagem ou do eixo desta, consoante a via esteja afecta a um ou a ambos os sentidos de trânsito, e efectuar a manobra de modo a entrar na via que pretende tomar pelo lado esquerdo destinado ao seu sentido de circulação.

            Em qualquer caso, as manobras de ultrapassagem e de mudança de direcção só podem ser efectuadas em local e de modo a que da sua realização não resulte perigo ou embaraço para o trânsito, sendo certo, por outro lado, que todo o condutor tem a obrigação de facultar a ultrapassagem (artigos 35.º, n.º 1, e 39.º, n.º 1, do Código que se vem referindo).

           

            Visto o circunstancialismo em que o acidente ocorreu e a lei aplicável, pareceria, a um primeiro olhar, que toda a culpa caberia ao autor, por se ter abalançado a uma ultrapassagem em local absolutamente proibido (imediatamente antes de um entroncamento), manobra que o condutor do DB não poderia razoavelmente esperar.

            O problema é que se não sabe (até por não ter sido alegado por qualquer das partes) se o entroncamento estava sinalizado, o que impede se procure a resolução da questão por esta via (apesar de ser pouco crível, diga-se, que o autor ignorasse a existência do entroncamento, já que reside na freguesia da sua localização).

            Com os factos disponíveis (os únicos que interessam), crê-se inquestionável que ambos os condutores andaram mal nos momentos que precederam o acidente.

            O autor, porque, apesar de não poder, por força de sinalização existente, circular a velocidade superior a 60 quilómetros por hora, efectuava uma ultrapassagem a, pelo menos, 90 quilómetros por hora; o condutor do DB, por ter iniciado uma manobra de mudança de direcção para a esquerda já depois de o autor ter começado a ultrapassar os veículos que o precediam, onde se incluía o DB.

            Qualquer das condutas, para além de ilegal, releva de manifesta imprudência. Ultrapassar e mudar de direcção para a esquerda são manobras de evidente risco, quanto mais não seja porque quem as executa vai ocupar a parte da faixa de rodagem destinada aos condutores que circulam em sentido oposto. Daí, a exigência legal de especiais cautelas na sua realização.

            É claro que o perigo se potencia quando a efectivação da manobra se casa com outra ou outras irregularidades na condução.

            E foi, justamente, o que sucedeu com o autor. Ao perigo da ultrapassagem somou o excesso de velocidade; e não um qualquer excesso, mas um excesso que dificilmente lhe permitiria efectuar controladamente uma manobra de recurso, caso lhe surgisse algum obstáculo, situação que nenhum condutor pode deixar de ter em mente.

            Circular a 90 ou a 60 quilómetros por hora são coisas completamente diferentes, dado que, na segunda hipótese, o tempo necessário à paragem do veículo é de cerca de metade do da primeira.

            Transitasse ele a outra velocidade (nunca superior a 60 quilómetros por hora) e poderia ter evitado o acidente ou, no mínimo, conseguido que as suas consequências fossem bem menos graves.

            Quanto ao condutor do DB, são quase desnecessárias as considerações, uma vez que iniciou a mudança de direcção para a esquerda em momento absolutamente interdito, ou seja, quando o autor já ocupava a metade esquerda da faixa de rodagem, em pleno acto de ultrapassagem.

            O acidente resultou, pois, como bem se concluiu na sentença, desta concorrência de comportamentos contravencionais e descuidados. Se o condutor do DB se tivesse abstido de virar à esquerda, parece seguro que o mesmo não teria ocorrido; mas se o autor circulasse a velocidade consentânea para o local, poderia evitá-lo ou reduzir a sua gravidade.

            Alega, porém, o autor que não podia contar com a ocupação súbita da meia faixa de rodagem em que já circulava pelo DB e que este estava obrigado a facilitar-lhe a ultrapassagem, que não a dificultá-la, para além de que se não aproximou do limite do eixo da via para efectuar a manobra de mudança de direcção para a esquerda, em contrário do prescrito no n.º 1 do artigo 44.º do Código da Estrada, pelo que só ao respectivo condutor pode ser imputada a culpa.

É pacificamente aceite na doutrina e na jurisprudência o princípio de que os condutores não estão obrigados a prever a conduta infractora dos demais utilizadores da via pública. Mas é evidente que essa não exigência não pode funcionar como factor de justificação da própria conduta, se infractora, também. E o caso é que o autor infringiu, e de forma grave, as leis que disciplinam o trânsito, como acima referido.

De resto, o argumento funciona para os dois lados; ao condutor do DB não seria exigível, igualmente, que devesse prever o aparecimento de uma viatura a velocidade muito superior à máxima permitida para o local.

A objecção não colhe, portanto.

Melhor sorte não logra a segunda parte da argumentação, porque nada existe (na matéria de facto, naturalmente) que comprove que o condutor do DB se não aproximou do eixo da via com a antecedência que se impunha. E era ao autor que cabia a prova da irregularidade da manobra e não à ré a sua regularidade.

Trata-se, de qualquer modo, de uma irregularidade que não é, só por si, causal do acidente (causal foi a entrada, a destempo, do DB, na meia faixa de rodagem por onde o autor circulava) pelo que a alegação é rigorosamente inócua.

A ré, por seu turno, descarregou toda a responsabilidade na pessoa do autor, na perspectiva de este circular em excesso de velocidade, de ter efectuado a ultrapassagem em local proibido (entroncamento) e de revelar imperícia na condução, de tal modo que se não desviou do DB, quando dispunha de, pelo menos, 2,30 metros da meia faixa esquerda para passar. Já a manobra do seu segurado teria sido regularmente realizada.

Quanto à regularidade da manobra do DB, vimos antes que não foi assim, uma vez que quando o segurado da ré entrou na metade esquerda da faixa de rodagem já o autor nela circulava na execução da ultrapassagem que projectara.

A ultrapassagem em local proibido está, também, fora de causa, por se ignorar se o entroncamento estava sinalizado.

A questão da imperícia, tal como foi colocada, não resiste a uma observação mais atenta. A circunstância de o DB ocupar cerca de um metro da faixa de rodagem na altura do embate não significa que o autor dispusesse de 2,30 metros para passar. Não há dúvida de que, quando o embate ocorreu, a distância entre o DB e o eixo da via era de 2,30 metros (visto que cada meia faixa de rodagem tinha 3,30 metros e o veículo ocupava cerca de um metro da via). Mas isso foi (repisa-se) quando o embate ocorreu.

Ora, a compreensão de um acidente não tem tanto a ver com o local do embate, senão que com a sua dinâmica. O que sucede é que, em plena ultrapassagem, o autor se deparou com a sua linha de marcha repentinamente cortada pelo DB, que iniciara, entretanto, a falada manobra de mudança de direcção. Em face disso, desviou-se para a esquerda, no intuito de evitar o embate, acabando por embater no ligeiro, já perto da berma, o qual prosseguira, naturalmente, a sua trajectória. O ponto do impacto resultou da acção conjugada de ambos os condutores: a do segurado da ré, que continuou a sua marcha em direcção à berma esquerda e a do autor, que se desviou para o mesmo lado, na execução de uma manobra de recurso.

O autor não tinha, portanto, livre a faixa de rodagem na zona do eixo da via. Não obstante, poderia vir a tê-la, se transitasse a velocidade mais baixa. Isto, pela simples razão de que a redução da marcha, por efeito da travagem (neste caso, controlada, já que é razoavelmente fácil dominar um veículo que circula a não mais de 60 quilómetros por hora), permitiria obter ganho de tempo bastante para que o DB se afastasse e deixasse desocupado o espaço necessário à passagem do motociclo.

Rejeita-se, por conseguinte, o naipe de argumentos esgrimidos pelos apelantes e insiste-se, tal como o fez a sentença, em que ambos os condutores contribuíram para a eclosão do sinistro.

Relativamente à proporção de culpas, é que se julga, ao contrário, agora, da decisão apelada, não haver motivos para distinguir. Ambos os condutores praticaram infracções causais de gravidade similar – cf., a tal propósito, as alíneas c) e e) do artigo 146.º do Código da Estrada – e ambos poderiam ter evitado o acidente se tivessem observado as pertinentes regras estradais.

O raciocínio do julgador, de que sobre o autor deveria recair um pouco mais de responsabilidade, por seguir em excesso de velocidade e trair a confiança que o condutor do DB, segundos antes, tinha depositado na observação que fizera da estrada, não parece que seja lógico nem linear.

Reporta-se a sentença, manifestamente, ao ponto 10) da matéria de facto, do qual emerge que o condutor do DB deixou transcorrer alguns instantes entre o momento em que se certificou de que não havia trânsito em sentido contrário nem estava a ser ultrapassado e aquele em iniciou a manobra de mudança de direcção para a esquerda.

Cabe a pergunta: se o condutor do DB iniciou a viragem para a esquerda só algum tempo depois de ter olhado para o trânsito, como é que poderia confiar que ele se manteria na mesma?

Não podia, pela simples razão de que o trânsito automóvel se altera a cada segundo. O segurado da ré deveria ter-se certificado da ausência de veículos no momento de virar para a esquerda e não, como o fez, algum tempo antes; é que, entre um momento e outro, a situação poderia modificar-se, como, de facto, aconteceu (o autor iniciou, nesse entretanto, a ultrapassagem), o que tornava completamente diversos os dados da situação.

Bem vistas as coisas, o que a sentença faz é imputar ao autor a falta de cuidado do condutor do DB, o que é, obviamente, falho de sentido.

Se algum condutor traiu a confiança do outro foi o condutor do DB, que mudou de direcção já depois de o autor ter iniciado a ultrapassagem.

Não se vê motivo, repete-se, para atribuir maior responsabilidade a um condutor do que ao outro, pelo que se fixa em 50% a culpa de cada um dos condutores dos veículos intervenientes no acidente, dando-se, assim, parcial provimento ao recurso do autor.

b) O montante indemnizatório

A diferente proporção de culpas haverá de reflectir-se, como é evidente, nos montantes a pagar pela ré ao autor, que haverão de ser calculados pela metade das indemnizações achadas (cujos valores nenhum dos recorrentes questionou) e não na base de 40%, como decidiu a sentença.

O mesmo não sucederá em relação à interveniente, pois que aceitou de forma expressa o teor da decisão.

Ao autor foram arbitradas as quantias de € 157,00, € 110,00, € 36.923,61, € 2.000,00 e € 21.520,00, relativas a vencimentos que deixou de auferir, despesas com consultas médicas, danos patrimoniais futuros, valor do motociclo acidentado e danos de natureza não patrimonial, respectivamente, por redução a 40% dos valores globais achados, que foram € 392,50, € 275,00, € 92.309,03, € 5.000,00 e € 53.800,00.

Fixada a proporção de culpa em 50% para cada condutor, deverão os valores a suportar pela ré ascender a € 196,25, € 136,50, € 46.154,50, € 2.500,00 e € 26.900,00, num total, portanto, de € 75.887,25.

A estas quantias acrescerão os juros de mora, nos termos que ficaram definidos na sentença.

IV. Síntese final:

1) É de imputar a responsabilidade pelo acidente de viação aos dois condutores dos veículos que embateram entre si, no circunstancialismo em que um deles efectua uma ultrapassagem a velocidade muito superior à permitida para o local e o outro muda de direcção para a esquerda já depois de aquele ter iniciado a ultrapassagem.

2) Tendo em conta a similar gravidade das infracções e o facto de ambos os condutores poderem ter evitado o embate, se agissem com as cautelas que a lei impõe, é de fixar a proporção de culpas em 50% para cada qual.

V. Decisão:

Em face do que se deixou exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação do autor e totalmente improcedente a apelação da ré, em consequência do que:

1. Se revoga a sentença apelada, na parte em que repartiu a culpa pela produção do acidente em 60% para o autor e em 40% para o segurado da ré, fixando-se, agora, a proporção da culpa em 50% para cada um dos condutores;

2. Se alteram os valores arbitrados ao autor, que passarão a ser de € 196,25 (vencimentos que deixou de auferir), € 136,50 (despesas com consultas médicas), € 46.154,50 (danos patrimoniais futuros – incapacidade), € 2.500,00 (valor do motociclo acidentado) e € 26.900,00 (danos não patrimoniais).

3. Se mantém, em tudo o mais, o decidido, mormente no que tange aos juros de mora e ao valor da indemnização atribuída à interveniente.

As custas do recurso interposto pelo autor serão suportadas por ele mesmo e pela ré, na proporção do respectivo decaimento; as do recurso interposto pela ré, ficarão a cargo desta.


GONÇALVES FERREIRA ( Relator )
VIRGÍLIO MATEUS
CARVALHO MARTINS