Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
356/09.0PBCVL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALICE SANTOS
Descritores: BUSCA DOMICILIÁRIA
CONSENTIMENTO
Data do Acordão: 05/08/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COVILHÃ
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 177º CPP
Sumário: Realizada uma busca no domicílio da irmã do arguido, local onde nessa altura este por um acaso estava e onde viriam a ser encontrados objetos relacionados com a prática do crime, não tinha o arguido que dar o seu consentimento para a busca a um espaço de habitação que não era o seu, bastando apenas a autorização da irmã, pessoa que tinha a disponibilidade do local.
Decisão Texto Integral: Acordam  no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal.

***
            No processo supra identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferido acórdão que julgou provada a acusação pública e assim, condenou o arguido A...:
- Pela prática como autor de um crime de roubo p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 204º, nº 2, al f) e 210 nº. 1 e 2, al b) do CPenal, na pena de oito anos de prisão.
 - Pela prática como autor de um crime de furto qualificado p.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14º, nº 1, 26º, 202º, alª e), 203º, nº 1 e 204º, nº 2, al e) todos do CPenal, na pena de seis anos de prisão.
- Em cúmulo condenou o arguido, A..., na pena de 11 anos de prisão.

Desta sentença interpôs recurso o arguido, A... .

São do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do recurso, interposto pelo arguido:

1.O presente recurso vem interposto da matéria de facto e de direito, nos termos do artigo 412.° do CPP, do douto acórdão que condenou o aqui ora Recorrente pela prática de um crime de roubo, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 204°, n.° 1, al f) e 210º, n°s 1 e 2, aIª b) do Código Penal na pena de oito anos de prisão, de um crime de furto qualificado, previsto e punível pelas disposições conjugadas dos artigos 14°. n° 1, 26°, 202°, alª e), 203°, n° 1 e 204°, n° 2, alª e) todos do Código Penal na pena de seis anos de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 11 anos de prisão;
2. São objecto do presente o presente recurso as seguintes questões:
- nulidade da diligência de busca e apreensão, que sustentou, em grande
medida, a condenação do Recorrente pela prática de um crime de furto
qualificado;

- erro na qualificação dos factos como integradores do crime de roubo;
- excessiva gravidade das penas parcelares aplicadas ao Recorrente.
3. Com referência ao crime de furto qualificado, verificou-se, em sede de audiência de julgamento, não terem as testemunhas arroladas sobre os factos em crise presenciado a matéria factual supra mencionada não podendo as mesmas afirmar ou relatar qual o alegado modus operandi do aqui Recorrente.
4. Para sustentar a aludida matéria factual quanto ao crime de furto qualificado baseou-se, sobremaneira, o douto Tribunal A QUO numa diligência de busca e apreensão realizada à residência do Recorrente em 9 de Fevereiro de 2010.
5. A mencionada diligência foi realizada pela PSP da Covilhã a coberto do disposto nos artigos 174°, n,° 5 alínea c) e 251.° do CPP, tendo sido lavrado um documento designado por “termo de consentimento” subscrito por R.... irmã do Recorrente, no qual a mesma deu autorização a que agentes da esquadra de investigação da PSP da Covilhã efectuassem busca ao seu domicilio.
6. O Recorrente, desde o final do ano 2009 e à data da mencionada diligência, encontrava-se a residir em casa de R....
7. A diligência em causa não foi ordenada, nem autorizada, pela autoridade judiciária titular do inquérito àquela data.
8. O consentimento prestado pela Sra. D. R..., titular do direito à habitação no local em que foi efectuada a busca, não tem qualquer relevância para os efeitos do disposto na alínea b) do n,° 5 do artigo 174.° do CPP, uma vez que não era a D. R... a visada com a diligência em questão, mas sim o aqui Recorrente (neste sentido vejam-se o acórdãos da Relação de Évora de 17-09-2009 e do Tribunal Constitucional nº 507/94, publicado na II série do DR, nº 285
em 12/12/1994)

9. A mencionada diligência carreou provas para os autos através de métodos proibidos nos termos do disposto no nº 3 do artigo 126º do CPP, não
podendo as mesmas servir, como serviram, para sustentar a condenação do aqui Recorrente pela prática de um crime de furto qualificado às instalações do Centro de Saúde da Covilhã.

            10. Considerando que o consentimento para a busca domiciliária foi ilegitimamente prestado, houve uma intromissão ilegal, por parte do órgão de polícia criminal que executou a diligência, na vida privada e no domicilio do aqui arguido.
11. Todas as provas obtidas por via da realização da mencionada busca não poderiam ter sido utilizadas em juízo, porque as mesmas foram obtidas através de métodos proibidos, tendo assim sido violados a alínea b) do nº 5 do artigo 174º e o artigo 251º do CPP, e 34°, n.° 2 da CRP, pelo que devem tais provas ser declaradas nulas nos termos e para os efeitos do disposto no nº 3 do artº 126º do CPP e, consequentemente, ser o aqui recorrente absolvido da prática do crime de furto  qualificado, ás instalações do Centro de Saúde da Covilhã.
12. O ora foi Recorrente condenado pelo douto Tribunal A Quo pela prática de um crime de roubo, nos termos dos arts 204º, nº 2 al. f) e 210º, nº 1 e 2 al. b) do CP. CP.
13. O douto acórdão A Quo deu como provado que: “… Nessa altura o arguido agarrou nas notas ali existentes, no montantes de 45 euros, bem assim como em dois envelopes que continham cheques e outra informação bancária ausentando-se do local, a correr, e levando tais bens consigo…
14. Entendemos que o douto Tribunal A Quo efectuou uma errada interpretação e aplicação dos artigos 204°. nº 2 al f) e 210º, nº 1 e 2 al b) do CP.
15. No caso em apreço o douto Tribunal A Quo enquadrou os factos praticados pelo Recorrente, nas instalações do BPI sito na Alameda Europa, no n.° 2 do artº 210º do CP.
16. Ora, salvo o devido respeito, esqueceu o Tribunal A QUO, a parte final da alínea b) do nº 2 do artº 210º do CP que manda aplicar, quando for o caso, o disposto  no nº 4 do art 204º do CP.
17. A aplicação do referido preceito deve ser efectuada quando a coisa furtada for de diminuto valor, como sucedeu nos presentes autos, pois o produto subtraído pelo Recorrente das instalações do BPI sito na Alameda Europa, quantificou-se, conforme dado como provado pelo douto acórdão a quo na soma de € 45,00!!!.
            18. Nos termos e para os efeitos da alínea b) do n.° 2 do artigo 412.° do CPP, os factos praticados pelo recorrente nas instalações do BPI sito na Alameda Europa deveriam ter sido enquadradas, pelo douto Tribunal a quo na moldura penal
estatuída no nº 1 do artº 210.° do CP e não, como erradamente sucedeu, na moldura penal do nº 2 do artº 210º do CP.

19. Deve o douto acórdão a quo, quanto aos factos praticados nas instalações do BPI sito na Alameda Europa, na previsão do nº 1 do artº 210º, com a consequente reformulação da dosimetria da pena, que cremos, em face do exposto, mais baixa do que a foi aplicada.
20. Nos termos do nº 2 do artº 40 do CP a pena aplicável tem de se fundar na medida da culpa e a medida daquela, em caso algum, pode ultrapassar a medida desta.
            21. O facto de o recorrente se ter remetido ao silêncio não significa que o mesmo não tenha demonstrado arrependimento pelos factos praticados nas instalações do BPIU si na Alameda Europa.
22. Foi dado como provado pelo douto acórdão A QUO que, cinco minutos após ter abandonado as instalações bancárias em causa, o
Recorrente regressou ás mesmas devolvendo o produto do roubo tendo, instantes após, ido entregar-se às autoridades.

23. Em face desta conduta, a culpa do Recorrente apresenta-se diminuta, pelo que deve a pena aplicada pelo douto acórdão A QUO, quanto a este crime, ser enquadrada na moldura penal do n° 1 do artigo 210,° do CP e quantificada próxima do mínimo legal ai estatuído.
24. Deve ser a pena aplicada ao Recorrente pela prática destes factos, especialmente atenuada nos termos da alínea c) do n.° 2 do artigo 72.° e artigo 73.° do CP
25. A pena única de 11 anos de prisão em que o Recorrente foi condenado pelo douto Tribunal A QUO mostra-se, manifestamente, desproporcionada, devendo ser substituída por outra com referência a apenas um crime de roubo e próxima do mínimo legal definido pela moldura penal do artigo 210.° n.° 1 do CP.
Nestes termos, nos melhores de direito aplicáveis e nos que doutamente forem supridos, deve ser dado provimento ao presente recurso com as legais consequências, porque assim se fará JUSTIÇA.

O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.

Respondeu o Digno Procurador Adjunto, manifestando-se pela parcial procedência do recurso.

Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta pela parcial procedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência, cumpre agora decidir.

O recurso abrange matéria de direito e de facto já que a prova foi documentada.

Da discussão da causa resultaram provados os factos seguintes constantes da decisão recorrida:

No dia 25.11.2009, pelas 11h30m, o arguido dirigiu-se às instalações do Banco Português de Investimento (BPI) sitas na Alameda Europa, Bloco 1, nº 15, Covilhã, sendo que é cliente desta instituição bancária.

Neste local encontravam-se, no exercício das suas funções, vários funcionários bancários, entre os quais Q...e H..., bem como o gerente L....

O arguido dirigiu-se a Q..., a qual, na altura, se encontrava ao balcão de atendimento e caixa, exibiu-lhe uma navalha, com uma lâmina com alguns centímetros de comprimento (seguramente não superior a 8 ou 9 centímetros), exigindo-lhe a entrega de dinheiro.

Esta disse que não tinha dinheiro consigo, continuando o arguido a exigir-lhe a entrega de dinheiro sendo que, nessa altura, Q...chamou pelo gerente.

Ato contínuo, o arguido mandou-a calar, apontando-lhe sempre a aludida navalha e dirigiu-se, pela entrada lateral, para o interior do balcão, afastando-se a funcionária do local.

Entretanto, apareceu o gerente da agência, perguntando ao arguido o que estava ele ali a fazer.

O arguido saiu do interior do balcão, dirigiu-se ao gerente, agarrando-o pela lapela e ameaçando-o com a navalha que empunhava, dizendo que queria dinheiro.

O gerente foi arrastado pelo arguido, para o interior do balcão de atendimento tendo a funcionária Q...aberto uma das gavetas, com trocos e notas “isco”.

Nessa altura, o arguido agarrou nas notas ali existentes, no montante de 45 euros, bem assim como em dois envelopes que continham cheques e outra informação bancária ausentando-se do local, a correr, e levando tais bens consigo.

Cerca de cinco minutos depois, o arguido regressou às instalações do BPI, as quais se encontravam com a porta fechada, fazendo menção de restituir os bens que acabara de retirar.

Perante a recusa dos funcionários bancários em abrir a porta do Banco ao arguido, por aqueles foi dada a indicação, a este, para que depositasse os aludidos bens na caixa do correio da instituição, afixada na parede exterior do prédio, o que o mesmo fez, ali deixando um envelope com treze cheques em banco do BPI, com os números compreendidos entre 1269291257 e 9869291269 e um outro envelope com sete folhas manuscritas, referentes a registos de movimentos de conta bancária, além da importância de 45 euros em notas do Banco Central Europeu.

De seguida, o arguido ausentou-se, novamente, do local pelo seu pé.

Momentos após, pelas autoridades policiais foi visto o arguido a caminhar, uma vez mais, em direção ao BPI tendo sido detido, nessa altura, e tendo-lhe sido apreendidas pelas autoridades policiais, na sua posse, duas navalhas.

No dia 09.02.2010, pelas 06h00m, o arguido dirigiu-se às instalações do Centro de Saúde da Covilhã, sitas na Alameda Pêro da Covilhã, na Covilhã, com a intenção de fazer um assalto, subtraindo objetos que ali se encontrassem e fazendo-os seus.

Introduziu-se no interior das instalações do referido Centro de Saúde, após ter danificado a porta principal exterior do edifício.

Uma vez ali introduzido, o arguido dirigiu-se junto à entrada principal, forçou a abertura de uma máquina de venda automática de bebidas ali existente, tendo retirado do seu interior café, vários snacks de chocolate, bebidas, sandes e chocolates, no valor aproximado de 40,00€, tendo, ainda, retirado a quantia de 113,65€ em dinheiro.

De seguida, dirigiu-se ao segundo piso onde se encontrava um cofre, pertencente à Instituição de Saúde, e destruiu o dispositivo que fechava o mesmo, usando para o efeito um pé-de-cabra, e retirou do seu interior vários cheques e dinheiro (notas e moedas).

Antes de se ausentar do local, o arguido ainda subtraiu e levou consigo a quantia de 695,58€, dois cheques à ordem do Centro de Saúde da Covilhã, mais alguns géneros alimentícios, uma pasta com a inscrição Generis, uma esferográfica e dois sacos.

No dia 09.02.2010, após busca domiciliária consentida à residência do arguido, sita na Rua ..., Covilhã, foram apreendidos objetos e dinheiro melhor descritos no auto de fls. 241 – que aqui se dá por integralmente reproduzido – entre os quais notas e moedas do Banco Central Europeu, cheques do BPI, pastilhas, chocolates, snacks, sumos, dois quilos de café Delta, uma esferográfica, dois sacos plásticos e uma pasta de cor verde com a inscrição Generallis.

O arguido, ao actuar da forma descrita, agiu livre e conscientemente, com o propósito de se apoderar dos objetos e bens patrimoniais alheios em questão, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos lhe não pertenciam e que atuava, assim, contra a vontade dos seus proprietários, sabendo que tal conduta era proibida e punida por lei.

Além disso, o arguido ao atuar da forma descrita, agiu livre e conscientemente, com o propósito de subtrair bens patrimoniais alheios que ali se encontrassem, quer no BPI, quer no Centro de Saúde, bem sabendo que tal conduta era proibida e punida por lei.

Por outro lado, o arguido ao exibir a navalha, nos termos descritos, com a mesma incutiu uma séria ameaça de perigo eminente para a vida e integridade física das suas vítimas, as quais, perante esta advertência e ficando receosas de que o arguido logo ali usasse a referida arma, caso não lhe entregassem o dinheiro, tendo conseguido, dessa forma, os seus intentos.

Além disso, o arguido ao atuar da forma descrita, fê-lo com o propósito de se introduzir em local que se encontrava vedado ao público, por se tratar de um Centro de Saúde, após ter forçado a entrada nesse local, e ali permanecer, sem se encontrar autorizado para tal, e contra a vontade do proprietário desse local, bem sabendo que tal conduta era proibida e punida por lei.

Em tudo agiu o arguido de forma livre, voluntária e consciente, sabendo perfeitamente que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

Mais se provou que:

O arguido é manobrador de máquinas e encontra-se, atualmente, a cumprir pena de prisão pela prática de crimes contra o património e contra as pessoas.

         Com efeito, já foi julgado e condenado pela prática dos seguintes crimes:

         Furto simples (2) e furto qualificado (7) ; homicídio qualificado (1);

         Não obstante isso, é pessoa estimada e considerada no bairro onde mora contando com o apoio da família em termos de alimentação e alojamento.

         Não logrou provar-se que:

         A navalha usada pelo arguido para cometer os fatos referentes ao BPI fosse verde ou tivesse cerca de 7,3cm de comprimento.

         O arrombamento da porta principal do edifício do Centro de Saúde foi feito com o auxílio de um martelo e de um arranca-pregos.

         Fundamentação da matéria de facto

         A convicção do tribunal assentou na análise crítica e analítica dos seguintes meios de prova, valorados segundo os critérios de experiência comum:

         Prova pessoal

Testemunhas de acusação:

GG... , 56 anos, médico, divorciado, Covilhã.

Delegado de Saúde, não conhece o arguido e nada tem, pessoalmente, contra ele.

Prestou depoimento nos seguintes termos:

Foi o segundo assalto ao Centro de Saúde, sendo que este terá ocorrido em 2009, talvez em Janeiro.

Chegado ao local, constatou o arrombamento da porta principal, arrombamento de uma máquina de distribuição de bolos e bebidas, portas arrombadas, arrombamento do cofre monobloco. No piso -1, constatou que as ferramentas estavam totalmente espalhadas.

Foram furtados mais de 1.000,00€, pacotes de café em grão, géneros alimentícios da máquina de vender bolos, chocolates, galões, etc.

Confrontado com fls. 226 e seguintes (fotos), confirmou que foi o furto feito naquelas instalações, bem como os danos lá verificados e os móveis e/ou portas arrombados, instalações devassadas.

Quanto ao pé-de-cabra confirmou que não pertencia ao Centro de Saúde. Quanto ao martelo, pensa que fazia parte do Centro de Saúde.

O dinheiro estava na contabilidade, no cofre que foi arrombado. Estavam lá dois cheques que também foram furtados, sendo que foram ambos anulados (taxas moderadoras e taxas sanitárias) tendo sido, posteriormente repostos. Desapareceram também as pastilhas

Confirmou a lista de fls. 282, feita pela ora testemunha coadjuvado pelos funcionários do Centro de Saúde.

Parte dos objetos furtados foi recuperada e entregue pelo Ministério Público.

Teve conhecimento dos fatos porque foi um dos primeiros a entrar, nesse dia, no Centro de Saúde: quando se encontrava a cerca de 100 metros do local, a empregada da limpeza telefonou-lhe a dizer o que se passava.

H.. , 33 anos, casada, bancária, Vila Verde.

Foi uma das funcionárias bancárias que se encontravam presentes no assalto ao BPI. Reconheceu o arguido presente na Sala de Audiências.

Num depoimento isento e coerente relatou os fatos constantes dos pontos 1. a 12., não se lembrando da cor da navalha, nem da quantia de dinheiro levado.

Mais esclareceu que o arguido, quando voltou para restituir os bens, declarou estar arrependido, tendo insistido pela entrega dos bens roubados.

Conseguia, do local onde estava, ver toda a cena.

I... , 41 anos, casado, Inspetor da PJ, Sabugal.

Nada tem contra o arguido o qual não conhece.

Apenas foi ao local do assalto ao banco tendo a investigação sido feita pela PJ de Coimbra a qual tem competência para tal investigação. Desta forma, não realizou qualquer diligência de prova.

J... , 41 anos, casado, Inspetor da PJ, Soure.

Nada tem contra o arguido o qual apenas conhece da investigação dos presentes autos.

Quando chegou ao local, já a PSP havia identificado e detido o arguido.

Ouviu o arguido em interrogatório bem como ouviu algumas testemunhas.

Procedeu à recolha de dados para posterior análise das sapatilhas do arguido, o que foi enviado para o LPC.

Havia registos do sistema de vídeo do banco os quais foram, por ele, vistos.

L... , 53 anos, casado, bancário, Covilhã.

Reconheceu o arguido presente na Sala de Audiências.

Num depoimento isento e coerente relatou os fatos constantes dos pontos 1. a 12., não se lembrando da cor da navalha. Quanto à quantia de dinheiro levado, sabe que foram cerca de 40€ a 50€.

Mais esclareceu que o arguido, quando voltou para restituir os bens, declarou estar arrependido, tendo insistido pela entrega dos bens roubados.

Confrontado com fls. 61 não conseguiu precisar qual das navalhas teria sido usado. No entanto, conseguiu referir que o montante roubado seria aquilo.

Confrontado com fls. 63 e ss. e 163 e ss. reconheceu o local bem como identificou o arguido tendo declarado que estas imagens foram recolhidas na altura.

M... , 54 anos, casado, agente da PSP, Fundão.

Identificou o arguido após o assalto ao banco, tendo confirmado os fatos constantes dos pontos 13. O arguido, na altura, confessou, declarou-se arrependido e disse que tinha procedido à entrega dos bens roubados.

N..., 46 anos, divorciado, agente da PSP, Covilhã.

Identificou o arguido após o assalto ao banco, tendo confirmado os fatos constantes dos pontos 13. O arguido, na altura, confessou, declarou-se arrependido e disse que tinha procedido à entrega dos bens roubados.

O... , 44 anos, casado, agente da PSP, Covilhã.

Foi o agente que fez a busca à residência da irmã, sendo que esta deu autorização para proceder à busca. O arguido encontrava-se a dormir na sala. Estava junto ao arguido a pasta apreendida nos autos, tendo sido encontrados, naquele local, objetos furtados ao Centro de Saúde, tendo confirmado o auto de fls. 241 bem como as fotos subsequentes.

Confrontado com o auto de fls. 251, esclareceu que tal talão respeita à máquina do Centro de Saúde que foi arrombada pelo arguido.

P... , 34 anos, empresária, casada, Orjais.

Dona da máquina automática que fornece cafés, galões, chocolates no Centro de Saúde.

Não conhece o arguido, nada tendo contra ele excepto os fatos em apreço nos autos.

Há cerca de dois anos houve um assalto no qual a sua máquina foi arrombada. Devolveram-lhe os chocolates – que teve de deitar fora – e restituíram-lhe o dinheiro.

Fls. 243: reconheceu os objetos bem como parte dos de fls. 227.


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         Todas as testemunhas prestaram depoimentos absolutamente isentos e coerentes sendo certo que se aperceberam, por via das funções que exerciam junto das entidades ofendidas, diretamente os fatos, ou porque se encontravam no local aquando da sua comissão pelo arguido – funcionários bancários – ou porque acudiram ao local e reconheceram os objetos furtados pelo arguido – médico e empresária que, junto do Centro de Saúde furtado, exerciam funções. Há, ainda, que referir que, apesar dos objetos furtados no Centro de Saúde serem iguais a tantos outros, certo é que foram reconhecidos por quem de direito e que a forma como se mostravam juntos – ou seja, aquelas quantidades daqueles produtos ou artigos em concreto – levaram a que fossem reconhecidos indubitavelmente pela testemunha P... tanto mais que foram apreendidos na posse do arguido muito pouco tempo após a comissão do crime.

         Por outro lado, os agentes de autoridade que prestaram depoimento, prestaram-nos em termos absolutamente isentos e coerentes sendo certo que os fatos que diretamente presenciaram foram-no no âmbito da sua investigação criminal tendo trazido tal conhecimento aos autos.



         Testemunhas arroladas pelo arguido e que depõem quanto à sua personalidade

B..., 50 anos, carpinteiro de construção civil, casado, Teixoso.

Conhece o arguido desde que este é pequeno, nada tem contra ele.

C... , 40 anos, casado, pedreiro, Amigo do arguido, nada tendo contra ele.

Nada tem a dizer contra o arguido. Pessoa bem integrada. No entanto, sabe que ele esteve preso.

D... , 59 anos, casado, reformado, Boidobra, Amigo do arguido, nada tendo contra ele.

Nada tem a dizer contra o arguido a quem conhece há cerca de dois anos.

É bom rapaz e pessoa bem integrada. Morava com os pais. No entanto, sabe que ele esteve preso.

E... , 38 anos, casada, doméstica, Boidobra.

Amiga do arguido, nada tendo contra ele, conhece-o desde pequeno.

É bom rapaz e pessoa bem integrada. No entanto, sabe que ele esteve preso. A família ajuda-o e dá-lhe apoio.

F... , 55 anos, casada, desempregada, Boidobra.

Amiga do arguido, nada tendo contra ele, conhece-o desde pequeno.

É bom rapaz e pessoa bem integrada. No entanto, sabe que ele esteve preso.

A família ajuda-o e dá-lhe apoio.

G... , 47 anos, solteira, desempregada, Boidobra.

Companheira do arguido, desde 2008, nada tendo contra ele.

Pessoa calma e que não trata mal ninguém.

         Prova documental e pericial

         Foi ainda determinante, quanto aos antecedentes criminais, o Certificado de Registo Criminal do arguido juntos a fls. 351 e ss. resultando de tal CRC uma personalidade avessa ao direito, tendo sido condenado pela prática de crimes graves, nomeadamente furtos qualificados e um homicídio qualificado.
         Foram, ainda, analisados e tidos em conta os documento que constituem fls. 8; auto de apreensão de fls. 3 e ss.; fotogramas de fls. 36. e ss., reportagem fotográfica dos objetos apreendidos de fls. 61 e ss.; auto de apreensão de fls. 80 e ss.; fotogramas do sistema de vídeo vídeo-vigilância; fotografias de fls. 226 e ss.; relatório de exame pericial de fls. 342 e ss.; e auto de reconhecimento pessoal de fls. 121 e ss., referindo-se que os objetos apreendidos são em tudo similares aos furtados e que objetos, como a pasta verde, são muito individualizados; e que as impressões digitais recolhidas coincidem com as do arguido.

                Cumpre, agora, conhecer do recurso interposto.

O âmbito do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação (Ac do STJ de 19/6/96, no BMJ 458-98).
São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar (cfr Germano marques da Silva, in “Curso de Processo penal”, III, pg 335).

Questões a decidir:
- A nulidade da diligência de busca e apreensão;
            - A qualificação jurídica do crime de roubo;
- A medida da pena;

O arguido interpôs recurso questionando a legalidade da busca domiciliária realizada no domicílio de sua irmã sustentando que a diligência de busca e apreensão realizada, pela PSP, a coberto do disposto nos arts 174º, nº 5, al c) e 251º do CPP e, tendo sido lavrado um documento designado por “termo de consentimento” subscrito por R..., irmã do recorrente, no qual autorizava a busca ao seu domicilio. Mais alega que o arguido residia na mesma morada e que, não tendo sido a diligência autorizada judicialmente, é tal diligência ilegal, constituindo meio de prova proibido, de acordo com o disposto no artº 126º, nº 3 do CPP.
Nos termos do art. 174ª do CPP as buscas são, em princípio, ordenadas por autoridade judiciária, podendo no entanto ser levadas a cabo por órgão de polícia criminal (OPC) sem precedência de mandado nos casos previstos no nº 5 daquele mesmo art. 174º, designadamente no caso de consentimento do visado, desde que o consentimento prestado fique, por qualquer forma documentado, conforme disposição expressa da al. b) do citado nº5 do art. 174º.
O art. 177º do CPP que regula especialmente a busca domiciliária, como é o caso presente, admite a realização da busca por OPC com consentimento do visado, sem precedência de mandado, sem especialidades face ao regime geral.
A lei exige apenas que o consentimento fique documentado, o que, para além de afastar a possibilidade de o consentimento ser tácito ou presumido, nos parece admitir que o registo possa ter lugar em qualquer suporte compatível com a noção de documento contida no art. 255º do C.Penal, por remissão do art. 164º do CPP, dada a necessidade de certeza que subjaz à exigência de documentação do consentimento, por um lado, e, por outro, à amplitude com que admite qualquer forma de documentação.
No caso presente apenas se discute se do auto de busca e apreensão devia constar o consentimento do arguido para a realização da busca.
Na verdade, a questão que o arguido suscitou perante o tribunal a quo e que integra agora o objeto do presente recurso é de saber se a busca realizada no domicílio da irmã do arguido não foi consentida por este, o que, in casu, se reconduz a saber se o auto de busca e apreensão documenta consentimento do arguido, nos termos e para efeitos da citada al. b) do nº4 do art. 174º do CPP.
            Dispõe o artº 174 nº 5 al b) do CPP:

Ressalvam-se das exigências contidas no nº 3 as revistas e as buscas efectuadas por órgão de polícia criminal nos casos em que os visados consintam, desde que o consentimento prestado fique, por qualquer forma, documentado.
 Nos presente autos temos que a busca foi efectuada ao domicilio de R..., irmã do arguido, que culminou em apreensões para a prova do crime, cometido umas horas antes.
Apesar do arguido, agora, afirmar que residia com a sua irmã e ali se encontrar no momento da realização da busca o facto é que o arguido no próprio dia da diligência ao ser constituído arguido e ao ser sujeito a termo de identidade e residência (fls 245) indica como residência a Rua das Cerzideiras, lote 3, r/c, esq. 6200, Covilhã, morada esta que também indicou à Mma Juiz de Instrução Criminal a fls 275.
O recorrente vem agora afirmar que reside no domicílio da sua irmã porque ali se encontrava no momento da realização da busca e porque dá-lhe um certo interesse na medida em que é visado nos presentes autos. No entanto, o facto de se encontrar, por um acaso em casa de sua irmã, e sendo a busca legal, não tinha este que dar o seu consentimento para uma busca a um espaço de habitação que não é o seu.
Na realização da busca tendo sido encontrados naquela habitação objectos que estavam relacionados com a queixa apresentada, foram apreendidos.
Assim, a busca foi legal e como tal é válida.

No que respeita ao crime de roubo sustenta o recorrente que foi condenado pelo douto Tribunal a quo pela prática de um crime de roubo, nos termos dos arts 204º, nº 2 al. f) e 210º, nº 1 e 2 al. b) do CP. CP. Contudo, foi dado como provado que: “… Nessa altura o arguido agarrou nas notas ali existentes, no montantes de 45 euros, bem assim como em dois envelopes que continham cheques e outra informação bancária ausentando-se do local, a correr, e levando tais bens consigo…assim entende o recorrente, que o douto Tribunal a quo efectuou uma errada interpretação e aplicação dos artigos 204°. nº 2 al f) e 210º, nº 1 e 2 al b) do CP.
Tem razão o recorrente.
Efectivamente o tribunal dá como provado que o arguido “agarrou nas notas ali existentes, no montante de € 45,00 (quarenta e cinco euros), bem assim como em dois envelopes que continham cheques e outra informação bancária ausentando-se do local a correr e levando tais bens consigo”.
Dispõe o artº 204 nº 4 do Cod. Penal que não há lugar á qualificação se a coisa furtada for de diminuto valor.
E o artº 202º nº 2 al c) Valor diminuto – aquele que não exceder uma unidade de conta avaliada no momento da prática dos factos, ou seja, € 102
Ora, atendendo ao montante em dinheiro e aos envelopes temos de concluir que o recorrente subtraiu do banco bens de valor diminuto de acordo com o estatuído no artº 202, al c). Assim, o recorrente praticou um crime de roubo p. e p. pelo artº 210 nº 1, do Cod Penal, por força do disposto no artº 204, nº 4 do mesmo diploma, em vez de um crime do crime de roubo p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts 204, nº 2, al f) e 210 º 1 e 2, al b) do Cod Penal.

No que respeita à determinação da medida da pena temos que considerar o que dispõe os arts 40, 70 e 71 do Código Penal.
            Dispõe o art 40 que “a aplicação das penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”. Sendo certo que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”, ou seja, a medida da culpa condiciona a própria medida da pena, sendo assim um limite inultrapassável da sua medida.
            Como se diz no acórdão desta relação de 17/1/1996 na CJ, Ano XXI, Tomo I, pg 38,  (...) a pena há-de ser determinada (dentro dos limites mínimo e máximo fixados na lei) mediante critérios legais, quais sejam, em primeiro lugar, o da culpa do agente, intervindo depois (ao mesmo nível) as exigências de prevenção especial e geral”.
            “(...) Na determinação da medida judicial da pena, o julgador terá de se movimentar tendo em atenção, em primeira linha, a culpa do agente, entendida esta no sentido atrás referido, qual seja de que o objecto de valoração da culpa é prevalentemente o facto ilícito praticado.
            Por outro lado, o preceito que vimos de analisar (...) manda igualmente que o julgador, proceda à fixação do quantum de pena concreto, tendo em conta considerações de prevenção (geral e especial), concretizadas pelo seu nº 2.
            (...) Os critérios legais de fixação da medida da pena a aplicar a cada caso, submetido a julgamento, são a culpa (num primeiro momento) e a prevenção (na fase subsequente, mas ao mesmo nível, consabido que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”
O critério para a escolha da pena, bem como os limites a observar no que respeita ao seu quantum encontram-se fixados nos arts 70 e 71 do Código Penal. O art 70 dá primazia às penas não detentivas; o segundo aponta para a determinação da medida da pena a culpa do agente e as exigências de prevenção bem como, a todas as circunstâncias que não fazendo parte do crime, depuserem a favor do agente ou contra ele.
“Atribuindo-se à pena um critério de reprovação ética, têm de se levar em conta as finalidades de prevenção geral e especial; fazendo apelo a critérios de justiça, procurar-se-á uma adequada proporcionalidade entre a gravidade do crime e a culpa por um lado e a pena por outro” (CJ, Ano XVII, Tomo I, pg 70).

No caso vertente, temos de atender a todo o circunstancialismo envolvente e considerar que o arguido, não só não confessou o crime, como já apresenta um vasto passado criminal – o arguido já foi julgado e condenado pela prática de um crime de homicídio qualificado, vários crimes contra o património, está actualmente detido em cumprimento de pena por um destes crimes, os factos destes autos foram praticados quando o arguido se encontrava em liberdade condicional e também quando decorria o período de suspensão da execução da pena que lhe havia sido imposta num outro processo.
Quanto à atenuação especial das penas, cabe dizer que, nos termos do art 72, nº 1 do CP, ela só será aplicada, para além dos casos previstos na lei “quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena”.
Por seu lado o nº 3 do mesmo artigo dispõe que “só pode ser tomada em conta uma única vez a circunstância que, por si mesma ou conjuntamente com outras circunstâncias, der lugar simultaneamente a uma atenuação especialmente prevista na lei e à prevista neste artigo”.
Ora dos factos apurados não há qualquer circunstância que nos leve a concluir que o arguido actuou de forma a diminuir a ilicitude dos factos a culpa ou a necessidade da pena. Ao contrário do que sustenta o recorrente de que se entregou à autoridades instantes depois, o que se encontra apurado é que “momento após, pelas autoridades policiais foi visto o arguido a caminhar uma vez mais, em direcção ao BPI tendo sido detido, nessa altura, e tendo-lhe sido apreendidas (…) duas navalhas”. Concluímos, pois, que bem andou o tribunal “a quo” ao não atenuar especialmente a pena ao arguido.
Assim, atento o caminho percorrido pelo recorrente que mostra indiferença pelas regras de conduta social, criando com o seu comportamento um perigo para a vida e integridade física de terceiros e, mostrando, ainda, que não interiorizou as penas que já lhe tinham sido aplicadas, temos de concluir que bem andou o Sr juiz na graduação da pena aplicada no que respeita ao crime de furto qualificado que não nos merece qualquer censura mesmo no que respeita ao seu quantum por esta se mostrar adequada, proporcional e equilibrada.
No que respeita ao crime de roubo e atendendo á moldura penal, condena-se o arguido na pena de cinco anos de prisão.
Fazendo o cúmulo vai o arguido condenado na pena única de sete anos de prisão.

Termos em que se tem o recurso interposto por parcialmente procedente e, em consequência, pela prática de um crime de roubo p. e p. pelo art 210º nº 1 do Cod. Penal vai o arguido A... condenado na pena de cinco anos de prisão.
Em cúmulo, vai condenado na pena única de sete anos de prisão.

No mais mantém-se o decidido.

Sem custas.

                                                                                                                                                                    

Alice Santos - Relatora

Belmiro Andrade