Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1847/22.2T8CLB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PIRES ROBALO
Descritores: REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
COMPETÊNCIA INTERNACIONAL DOS TRIBUNAIS PORTUGUESES
ADMISSÃO DE DOCUMENTO
RESIDÊNCIA HABITUAL DA MENOR
Data do Acordão: 01/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 425.º; 596.º, 2; 607.º, 4 E 5; 639.º, 4; 640.º; 651.º E 655.º, 1, DO CPC
ARTIGOS 3.º E 5.º DA CONVENÇÃO DA HAIA DE 1996
ARTIGO 8.º, DO REGULAMENTO BRUXELAS II BIS
CONSIDERANDO 12 E ARTIGOS 1.º, 2, 1, A) E B) E 3; 2.º, 7; 8.º, 1 E 2; 9.º, 1; 10.º E 12.º, 1 E 3, DO REGULAMENTO 2201/2003, DO CONSELHO DA EU, DE 27/1
Sumário:
            I – É lícita a junção de uma decisão judicial, posteriormente à apresentação das alegações, de cópia de uma decisão judicial relativa a uma acta de julgamento, anteriormente junta, sendo a decisão proferida em data posterior a tal junção, devendo entender-se que se trata de uma extensão ou complemento do documento (acta) anteriormente junta.

            II – Salvas as excepções previstas, a competência internacional dos tribunais de um Estado-Membro da EU, fixa-se pelo critério da residência habitual da criança, entendida como o lugar onde a criança reside habitualmente, ou seja, o local onde tem organizada a sua vida, com maior estabilidade, frequência, permanência e continuidade, onde desenvolve habitualmente a sua vida e se encontra radicada.

            III - Por ser na Polonia que a menor, tem desde, pelo menos 17 de maio de 2022, o seu centro de vida e o seu convívio, carecem os tribunais portugueses de competência internacional para a apreciação dos presentes autos

Decisão Texto Integral:

            Acordam na Secção Cível (3.ª Secção), do Tribunal da Relação de Coimbra     

Proc.º 1847/22.2T8LRA.C1

1. - Relatório

1.1.- O Ministério Público propôs a presente ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais referente à criança AA, contra os progenitores BB e CC.

                                                           ***

1.2. - Citada, a progenitora excecionou a incompetência internacional dos tribunais portugueses para conhecer da presente ação, uma vez que a criança reside consigo na Polónia desde setembro de 2021.

                                                           ***

1.3. - O Ministério Público promoveu a procedência da exceção dilatória de incompetência internacional.

                                                           ***

1.4. - Notificado para se pronunciar, o progenitor pugnou pela competência dos Tribunais portugueses, aduzindo, em súmula, que a residência da criança sempre foi em Portugal e que nunca foi acordado entre os progenitores a fixação da sua residência na Polónia.

                                                           ***

1.5.- Em face da natureza controvertida da matéria fáctica alegada essencial para a decisão a proferir quanto à competência internacional dos tribunais portugueses, foram tomadas declarações aos progenitores.

Foi solicitada informação ao Tribunal de Varsóvia, que não se logrou obter e que, em face da prova produzida, se dispensa, uma vez que os autos contêm todos os elementos necessários à decisão a proferir.

***

1.6. – Foi proferida decisão, onde se decidiu:

a)- julgar procedente a exceção dilatória de incompetência absoluta e declarar este Tribunal internacionalmente incompetente para conhecer da presente ação, absolvendo os Requeridos da instância.

*

Fixar o valor da causa em 30.000,01 € (artigos 303º, nº 1, 304º, nº 1 e 306º, nº 1 e 2 do CPC).

*

Sem custas (artigo 4º, al. l) do RCP).

*

Registe e notifique.

                                                           ***

            1.7. – Inconformado com tal decisão dela recorreu o progenitor - BB – terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem:

            “(a) A título de questão prévia e correndo termos, no “District Court”, em Varsóvia, o processo n.º ..., ao abrigo da Convenção de Haia sobre o Rapto Internacional de Crianças, devem ser os presentes autos suspensos até ser proferida decisão naquele âmbito.

(b) Considera o Recorrente que a decisão em crise enferma de vícios vários como o erro na apreciação da matéria de facto e erro de julgamento em matéria de apreciação da competência dos Tribunais Portugueses, que importam a revogação da douta Sentença.

(c) A Sentença recorrida conclui, mal, que o Tribunal a quo é internacionalmente incompetente para a ação, uma vez que a residência habitual da Menor se situa na Polónia.

(d) Desde logo, porquanto, incorretamente decidiu o Tribunal recorrido quanto aos factos provados 3., 4. 5., 6., 7., 10., 12., 13., 14., 15., 16., 21 e 23., desconsiderando factos comprovados por documentos e aceites pelas partes, bem como declarações do

Recorrente e da Requerida, prestados em audiência, pelo que violou o disposto no art.

607.º, n.º 4 do Código de Processo Civil. Assim,

(e) No que respeita ao facto provado 3., entende-se que, por irrelevante, pois que a Menor residiu com ambos os Pais, nos primeiros meses de vida, deve ser eliminado da matéria de facto.

(f) Quanto ao facto provado 4., deve ser precisado o período de tempo durante o qual a Menor esteve ausente de Portugal, conforme resulta do art. 20.º e 21.º do requerimento da Requerida, de 15-09-2022, aceite somente relativamente às datas das viagens, pelo que deve passar a ler-se: “4. Em 27-04-2021, a criança e a progenitora, com a concordância do progenitor, deslocaram-se à Polónia onde permaneceram até 13-07-2021, para a progenitora melhorar as notas de alguns exames com vista a entrar na Universidade”.

(g) O facto provado 5. deve ser alterado para “5. Em 13 de julho de 2021, ambas regressaram a Portugal e em agosto a progenitora regressou à Polónia, mantendo-se a criança a residir com o pai em Portugal, onde iniciou a frequência do Pré-Escolar”, tendo em vista as declarações do Recorrente (min 00:04:27 a 00:04:38), o art. 21.º do requerimento da Requerida de 15-09-2022 (que se aceita no que se refere à data indicada), e os doc. 2, 15 e 16, juntos com o requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, não impugnados.

(h) Tomando em consideração os doc. 3 e 4, não impugnados, do requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, e as declarações do Recorrente (min 00:05:25 a 00:06:11), o facto provado 6. deve ser corrigido para: “6. Entre 09 de outubro e até 04 de dezembro de 2021, a criança esteve na Polónia, com a progenitora e com a concordância do progenitor.”.

(i) Insistindo-se que deve ser precisada a data em que a Menor regressou a Portugal, como se retira do doc. 4 junto com o requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, não impugnado, e incluído o facto provado 7., como segue: “7. Em 04 de dezembro de 2021, a progenitora e a criança vieram para Portugal, onde estiveram até ao Natal.”.

(j) Dos docs. 5 a 7, não impugnados, e das declarações do Recorrente (min 00:07:31 a 00:08:00), resulta que o facto provado 10. deve ser alterado para: “Após o período natalício, e porque a progenitora se encontrava em fase de exames na Universidade, e a criança ia reiniciar a escola, regressou com o pai a Portugal, a 04 de janeiro de 2022 e onde esteve até 15 de janeiro de 2022, altura em que se deslocou à polónia para festejar o aniversário da progenitora, tendo aí permanecido durante alguns dias, até ao dia 25.”.

(k) Não se retirando fundamento para o facto provado 12., só poderá o mesmo manter-se com a seguinte redação: “No dia 15 de fevereiro de 2022, a Menor deslocou-se à Polónia com a progenitora onde permaneceu até 29 de março”

(l) A manter-se o facto provado 12., somente poderá ser com a redação que segue, atendendo aos doc. 8 e 9, juntos com o requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, não impugnados: “No dia 15 de fevereiro de 2022, a Menor deslocou-se à Polónia com a progenitora onde permaneceu até 29 de março”.

(m) Atento o conteúdo do doc. 10 do requerimento do Recorrente de 05-12-2022, deve o facto provado 13. ser alterado para: “13. No dia 24 de março, o progenitor deslocou-se à Polónia para trazer a filha para Portugal, o que ocorreu a 29 de março”.

(n) Perante as declarações do Recorrente (min 00:10:10 a 00:11:36) e por inexistir meio de prova que o fundamente diversamente, deve ler-se o facto provado 15: “15. Em face disso, a progenitora deslocou-se a Portugal em maio e os progenitores acordaram que a criança iria à Polónia por um mês.”.

(o) Das declarações das partes e do art. 35.º do requerimento do Recorrente, de 30-09-2022, que se tem por aceite, deve o facto provado 16. ser alterado em conformidade como segue: “16. Desde 17 de maio de 2022, a criança permanece em Varsóvia com a progenitora, não tendo esta autorizado o seu regresso a Portugal com o pai”.

(p) Retira-se das declarações do Recorrente (min min 00:04:27 a 00:04:38) e do conteúdo da declaração emitida, em 22 de Setembro de 2022, pela Presidente da CAP do Agrupamento de Escolas de ..., não impugnada, que: “21. A criança frequentou o ensino pré-escolar na Escola Básica ..., em ..., no ano letivo de 2021/2022 e de 2022/2023”, sendo, assim, eliminada a última parte deste facto dado por provado.

(q) O facto provado 23. deve ter a seguinte redação: “23. Encontra-se inscrita na Unidade de Saúde Infantil USF ... desde 12.02.2021, onde foi medicamente acompanhada até .../.../2022, bem como pelo C. H. ... E.P.E.”, como resulta do doc. 15 junto com o requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, e das declarações da Requerida (min00:51:40 a 00:52:55) pois que apenas com a presença da Menor na Polónia, desde .../.../2022, tem a mesma sido ali assistida medicamente, uma vez, até então, sempre foi seguida em Portugal.

(r) Enquanto facto provado deve ser aditado e passado a constar também que: “27. A progenitora auferiu abono de família, atribuído pelo Estado Português, durante os anos de 2021 e 2022”, por isso mesmo decorrer do art. 63.º do requerimento do Recorrente, de 30-09-2022 e do doc. 13 do requerimento de 05-12-2022, não impugnado.

(s) Às matérias da responsabilidade parental é aplicável o Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro de 2003 (adiante Regulamento), designadamente o seu art. 8.º, que dispõe ser competente para apreciar estas questões o Tribunal do Estado-Membro onde a criança reside habitualmente, à data da instauração da ação.

(t) Mal andou o Tribunal a quo ao entender que “tendo permanecido a maioria do tempo na Polónia, na companhia da progenitora (…) e desde maio de 2022 aí reside

permanentemente, com a progenitora, sua principal cuidadora (...)”, ao abrigo do critério da proximidade, o Tribunal competente é o Tribunal Polaco.

(u) Com efeito, independentemente da decisão quanto à impugnação da matéria de facto que venha a ser tomada por este Tribunal, a verdade é que, mesmo mantendo-se a decisão em crise, os autos contêm elementos suficientes para determinar a competência dos Tribunais Portugueses.

(v) Na verdade, a Menor, nasceu em Portugal e aqui viveu até .../.../2022; pelo facto 5., é provado que o Recorrente vem residindo com a Menor em exclusivo desde Julho de 2021; desde Setembro de 2020 que sempre frequentou estabelecimento de ensino português (facto provado 21 e doc. 1, 2 e 16, do requerimento do Recorrente de 05-12-2022); só após 09 de Outubro de 2021, passou a frequentar estabelecimento de ensino em Varsóvia, nas temporadas em que ali se encontrava (facto provado 21 e doc. 3 junto com o requerimento do Recorrente de 05-12-2022); erai acompanhada medicamente e apenas, pela Unidade de Saúde Infantil USF ... e pelo C. H. ... E.P.E. (facto provado 23. com as alterações requeridas no presente).

(w) Realce-se que, no ano de 2021, a Menor esteve 220 dias em Portugal e 141 dias na Polónia, e no ano de 2022 (e até .../.../2022), a Menor esteve 78 dias em Portugal e 53 dias na Polónia (não se contabilizando os dias em que viajou de um local para outro).

(x) Face ao que antecede, tanto a relação de proximidade como a residência habitual só podem conceber-se como sendo em Portugal, pois que aqui residiu e esteve a maior parte dos seus dias.

(y) Não se encontrando reguladas as responsabilidades parentais, as questões da vida da Menor, como é o caso da alteração de residência, cabe a ambos os progenitores (art. 1906.º do Código Civil), pelo que não é pelo facto da Requerida ter decidido regressar à Polónia que se deve considerar que a Menor fixou ali também a sua residência.

(z) Não colhe a argumentação do Tribunal em crise quando refere que só o Tribunal Polaco pode decidir sobre as questões das responsabilidades parentais, porque a Menor aí reside desde Maio de 2022, ao desconsiderar que é a Requerida que tem impedido, ilicitamente, o regresso da Menor a Portugal (facto provado 16.), bem como a delonga do Tribunal a quo na tramitação deste processo, que se crê urgente.

(aa) A não se determinar a competência dos Tribunais Portugueses para a presente ação, ao abrigo do art. 8.º do Regulamento, também aqui, nas situações de deslocação ou retenção ilícitas de uma criança, estabelece o art. 10.º do Regulamento que são competentes os Tribunais “do Estado-Membro onde a criança residia habitualmente imediatamente antes da deslocação ou retenção ilícitas” (vide Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 03-07-2010), pelo que dúvidas não há de que os Tribunais Portugueses sempre serão os internacionalmente competentes para decidir a presente ação.

Termos em que, deve a Sentença em crise ser revogada por Acórdão que, considerando procedente o recurso, determine a competência dos Tribunais Portugueses para conhecer da presente ação”.

                                                           ***

1.8. – Feitas as notificações a que alude o art.º 221, do C.P.C., respondeu o recorrido – Ministério Público – e a recorrida – CC, terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem:

Conclusões apresentadas pelo Ministério Público.

 “1 - Em nosso entendimento, o Tribunal a quo efectuou uma correcta interpretação dos elementos constantes dos autos, bem como efectuou uma correcta interpretação e aplicação das normas aplicadas ao caso em concreto, não ocorrendo erro de julgamento quanto a matéria de facto não merecendo a douta decisão proferida qualquer censura, não tendo ocorrido qualquer vício processual, violação de direitos e princípios, violação de normas que acarretem nulidades ou irregularidades que coloquem em causa os fundamentos da decisão que veio a ser proferida, não merecendo a douta decisão proferida qualquer censura uma vez que salvaguardou e respeitou o superior interesse da criança.

2 - A criança é titular de direitos reconhecidos juridicamente – artigos 64.º n.º2, 67.º, 68.º e 69.º da Constituição da República Portuguesa.

3 - O critério orientador e que terá necessariamente de presidir à decisão do tribunal é o interesse superior da criança e não os dos progenitores, o qual apenas terá e deverá ser considerado, até por imposição constitucional (artigos 36.º n.ºs 3 a 6, 67.º, 68.º e 69.º da Constituição da República Portuguesa), na medida em que se mostrem conformes ao interesse superior da criança, não colocando em crise esse interesse.

4 - A lei não define o que deve entender-se por “interesse superior da criança”, estando-se na presença de um conceito aberto, a concretizar atentando nas necessidades físicas, intelectuais, religiosas e materiais da criança, na sua idade, sexo, grau de desenvolvimento físico e psíquico, na continuidade das relações daquela, a sua

adaptação ao ambiente escolar e familiar, bem como as relações que vai estabelecendo com a comunidade em que se integra.

5 - O superior interesse deve presidir à decisão do tribunal e, em caso de incompatibilidade entre os direitos e os interesses dos progenitores e os da criança, é o interesse desta última que deve impreterivelmente prevalecer.

6 - Ora, em conformidade com o disposto no artigo 8.º. n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, as normas emanadas da União Europeia (designadamente os regulamentos) vigoram directamente na ordem jurídica interna e prevalecem sobre as suas normas, vinculando imediatamente o Estado e os cidadãos, independentemente de qualquer acto de mediação, tendo o nosso ordenamento acolhido a doutrina da recepção automática das normas do direito internacional e o princípio do primado do direito comunitário.

7 - Isto é, quer as normas comunitárias originárias, quer as derivadas, que sejam dotadas de aplicabilidade directa são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União» (artigo 8.º n.º 4, da Constituição da República Portuguesa).

8 - Assim, em conjugação com o disposto no artigo 288.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia, os regulamentos adoptados pela União Europeia têm natureza vinculativa em todos os seus elementos e aplicabilidade directa.

9 - No caso, a acção intentada respeita à regulação do regime de exercício das responsabilidades parentais.

10 - Nesta matéria, estamos no âmbito material do Regulamento (CE) n.°2201/2003 do Conselho da União Europeia de 27.11 conhecido como Regulamento Bruxelas II A, que define as regras de competência internacional vigentes para os Estados Membros da Comunidade Europeia, no que concerne a questões matrimoniais e de responsabilidade parental, revisto posteriormente pelo Regulamento 2019/1111 do

Conselho de 25.06.2019 que se tornou aplicável a partir de 1.08.2022.

11 - Dispõe no artigo 8.º n.º1 do citado Regulamento (CE) n.°2201/2003 que Os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data em que o processo seja instaurado no tribunal.

12 -Trata-se de uma concretização do superior interesse da criança através do princípio da proximidade, assente no pressuposto de que o Tribunal de residência da criança é o que está em melhor posição de conhecer a sua situação e o estado do seu desenvolvimento.

13 - A “residência habitual” de um menor é o local onde se encontra organizada a sua vida familiar em termos de maior estabilidade e permanência, onde desenvolve habitualmente a sua vida, em suma, onde está efetivamente radicado.

14 - Mostra-se previsto no considerando n.º12 do Regulamento que As regras de competência em matéria de responsabilidade parental do presente regulamento são definidas em função do superior interesse da criança e, em particular, do critério da proximidade. Por conseguinte, a competência deverá ser, em primeiro lugar,

atribuída aos tribunais do Estado-Membro de residência habitual da criança, excepto em determinados casos de mudança da sua residência habitual ou na sequência de um acordo entre os titulares da responsabilidade parental.

15 - Assim, a residência supõe, para além da presença física, Ac. do TJUE de 02-04-2009 Proc. C-523 /07, uma determinada integração do menor num ambiente social e familiar. Para esse fim, deve ser tido em conta, as condições e as razões de permanência no território de um Estado e da mudança da família para esse Estado, a

nacionalidade da criança, o local e as condições de escolaridade e os laços familiares e sociais que a criança tiver no referido Estado (Ac. TJUE de 2.04.2009) assim como quaisquer outros elementos que indiquem que essa presença não tem carácter temporário ou ocasional, incluindo a residência habitual das pessoas de referência com as quais vive, que a guardam efectivamente e dela cuidam (Ac. TJUE de 22.10.2010, Barbara Mercredi, Proc. C-497/10, pelo que se deverá concluir que a residência habitual da criança é com a progenitora.

16 - Encontrando-se a criança a maior parte do tempo a cargo da progenitora e frequentando a criança estabelecimento de ensino, entendemos que o centro de vida da criança também se encontraria estabilizado.

17 - Por isso, os tribunais portugueses são internacionalmente incompetentes para a regulação do exercício das responsabilidades parentais da criança.

18 - Neste enquadramento, e tendo em consideração o superior interesse da criança, impõe-se concluir pela maior proximidade à ordem jurídica polaca e pela sua residência habitual nesse país.

19 - Decorre da factualidade apurada a maior proximidade da criança à ordem jurídica polaca, tendo em consideração que desde abril de 2021 aí passou a residir maioritariamente, em alternância com a residência em Portugal, e desde maio de 2022 aí reside permanentemente, com a progenitora, sua principal cuidadora – que a ela se dedicou exclusivamente nos seus três primeiros anos de vida, só após retomando os estudos –, encontrando-se nesse país, cuja língua domina, integrada em equipamento educativo e mantendo relações afetivas e contactos com os avós maternos.

20 - Nos termos do disposto nos artigos 59.º, 96.º alínea a), 97.º, 99.º n.º1, 278.º n.º1 alínea a), 576.º n.º1 e n.º2, 577.º alínea a) e 578.º todos do Código de Processo Civil, a violação de regras de competência determina a incompetência absoluta do Tribunal, configurando uma exceção dilatória, a qual obsta ao conhecimento do

mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância.

21 – O Tribunal a quo não podia deixar de conhecer da excepção em causa e absolver a requerida da instância, pelo que o despacho recorrido não merece reparos que o recorrente lhe assaca.

Pelo exposto, entendemos que mantendo a decisão proferida, negando provimento ao recurso Vossas Ex.as, decidindo, farão Justiça.”

                                                           *

Conclusões apresentadas por CC.

“A. Veio o Requerente interpor recurso da Sentença proferida a 1 de maio de 2023, pelo Tribunal a quo, que julgou procedente a invocada exceção de incompetência absoluta e declarou-se internacionalmente incompetente para conhecer da presente ação, absolvendo os Requeridos da instância.

B. Alega o Recorrente que a Sentença recorrida enferma de erro na apreciação da matéria de facto, bem como, de erro de julgamento em matéria de apreciação da competência dos tribunais portugueses.

C. Não se alcança tampouco que hermenêutica de interpretação é aquela que o Recorrente sugere que deveria ser aplicada pelo Digníssimo Tribunal a quo e, como se verá, não lhe assiste qualquer razão.

D. Veio o Recorrente informar que foi apresentado um processo ao abrigo da Convenção de Haia sobre o Rapto Internacional de Crianças que aguarda decisão e que, como tal e sem mais, daqui se deveriam retirar “(…) as devidas consequências, designadamente quanto à suspensão dos presentes autos”.

Não há lugar a qualquer suspensão, desde logo, visto que um processo intentado ao abrigo da Convenção sobre os Aspetos Civis do Rapto Internacional de Crianças não tem a virtualidade de infligir no presente processo de regulação das responsabilidades parentais.

E. A Sentença objecto de recurso não integra nenhumas das decisões, cuja  pelação o legislador atribuiu efeito suspensivo (vide artigo 647.º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 33.º, n.º 1, do RGPTC).

F. Em segundo lugar, não existe lugar a suspensão tendo em conta que o Recorrente não se ofereceu para prestar caução, conforme exige o artigo 647.º, n.º 4, do Código de Processo Civil (aplicável ex vi do artigo 33.º, n.º 1, do RGPTC).

G. Não logrou sequer o Recorrente demonstrar que se verifica, com o  prosseguimento dos presentes autos, um prejuízo considerável ou irreparável. Ou, sequer que, com o prosseguimento deste, o outro se tornaria inútil. Aliás, nem resulta alegado qualquer fundamento que pudesse suscitar a avaliação do Tribunal a quo deste prejuízo.

H. Antes sequer da pronúncia de incompetência por este Tribunal, o Tribunal Polaco já se tinha declarado competente para decidir da regulação das  responsabilidades parentais, fixando aliás, a residência da criança junto da Mãe – (cfr. Documento n.º 2 junto com Req. Ref. 43585710 de 17/10/2022), pelo que a pendência de qualquer processo intentado ao abrigo da convenção de Haia em nada influi na competência para a regulação das responsabilidades parentais.

I. Vem o Recorrente impugnar a matéria de facto dada como provada nos factos n.º 3, 4, 5, 6, 7, 10, 12, 13, 14, 15, 16, 21 e 23 da Douta Sentença recorrida, bastando uma mera leitura da fundamentação de facto da Douta Sentença recorrida para se concluir – sem margem para qualquer dúvida – que a mesma foi elaborada com clareza, objetividade e discriminadamente.

J. O Tribunal a quo fundou a sua convicção quanto aos factos dados como  provados na prova documental aí referida, a saber : certidão de assento de nascimento, requerimento dirigido ao Tribunal Distrital de Varsóvia, certificados do Jardim de Infância de Varsóvia, certificado do Centro Médico de Varsóvia, certificado de matrícula de ..., certificado do Centro Médico ... e data de registo da entrada da Petição Inicial.

K. Tendo ainda fundado a sua convicção no acordo das partes nos  requerimentos de 15.09.2022, e declarações dos progenitores que «(…) revelaram-se coerentes e escorreitas, «bem como, na sua globalidade, concordantes, particularmente no que tange aos períodos de residência (estadia da criança em Portugal e na Polónia

(…)

L. Impugna ainda o Recorrente os concretos meios probatórios, alegando a existência de erro na apreciação das provas gravadas, nomeadamente, nas declarações prestadas pelos Progenitores na realizada Conferência de Pais, porém, fá-lo de forma deficiente, ao limitar-se a indicar os minutos da Conferência de Pais, não procedendo à transcrição de nenhuma passagem, não tendo sequer concretizando em que medida esses excertos têm a virtualidade de alterar a factualidade dada como provada, e, pior, extraindo conclusões erradas do que aí foi dito.

M. Não logrou cumprir o ónus a que a lei o sujeita para que possa impugnar a matéria de facto através da reapreciação da prova gravada (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 167/11.2TTTVD.L1.S1, datado de 12-07-2018), razão pela qual, quanto à impugnação dos factos provados n.º 5, 6, 10, 15, 21 e 23, o recurso deve ser imediatamente rejeitado, nos termos da alínea a), do n.º 2 do artigo 640.º do CPC.

N. Não se verifica a existência de qualquer erro de julgamento da matéria de facto que justifique o merecimento de censura da Sentença recorrida. A análise do Tribunal a quo foi perfeitamente fundamentada, e conjugada com as regras da lógica e das máximas da experiência comum, não se poderia ter chegado a outra conclusão e a diferentes factos provados que não aqueles a que o Digníssimo Tribunal a quo, tão doutamente, referiu na sua Sentença.

O. As declarações dos progenitores foram claras quanto aos períodos em que a Menor passou com cada um deles e por quanto tempo, sendo de recordar aqui, a explicação de ambos os progenitores quanto à alternância entre Polónia e Portugal, sendo que, em qualquer caso indubitavelmente com maior proximidade da Menor à Progenitora, ora Recorrida.

P. Questão essencial, e corretamente apreciada pelo Tribunal a quo é que quando a criança se desloca à Polónia há acordo do Pai, desde logo em abril de 2021, e depois da instalação da progenitora na Polónia igualmente. Omite convenientemente o Recorrente, que é ele quem reteve ilicitamente a Menor em Abril de 2022, quando, conforme acordado, era suposto este ter levado a Menor à Mãe, à Polónia, tendo obrigado a Mãe, ora Recorrida a poupar dinheiro para a viagem a Portugal para assim regressar com a Menor. Porém, nesse momento, já a residência se encontrava fixada na Polónia.

Q. Omite convenientemente o Recorrente, e esquece, é que existiu efetivamente alternância de residência entre Portugal e Polónia, e que não sendo possível o estabelecimento de residência habitual em dois locais, a de maior proximidade é a que revelará para efeitos de competência – Acórdão do TJUE - (Terceira Secção), e novembro de 2021, Conceito de “residência habitual” do requerente - processo C-289/20.

R. Invoca ainda o Recorrente a existência de erro de julgamento em matéria de apreciação da competência dos tribunais portugueses, sem razão ou fundamento de facto ou de direito.

S. Quanto a esta alegação já se pronunciou o Ministério Público nas suas promoções datadas de 20/09/2022, 12/11/2022 e 27/01/2023, no sentido da declaração de incompetência internacional dos tribunais portugueses, culminando com a douta Sentença proferida, que acolheu integralmente a promoção do Ministério Público, fundando-se na correta aplicação do direito com base nos factos dados como provados.

T. Desde logo, andou bem o Tribunal a quo, ao invocar o n.º 1 do artigo 8.º do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003 para justificar a sua incompetência internacional.

U. Afirmando que mesmo que se verificasse que, precisamente no dia 5 de maio de 2022 – data da propositura da presente ação – a Menor se encontrava em Portugal, não se poderia concluir sem mais pela residência daquela em Portugal e não na Polónia, não sendo esta residência aferida pela mera presença física de um Menor num local específico.

V. Bem andou o Tribunal a quo ao densificar o conceito de residência habitual porquanto para determinar qual a residência habitual de uma criança, a sua mera presença física em determinado local não releva por si só – cfr. Acórdão OL vs. PQ do Tribunal de Justiça da União Europeia; Acórdão de 28 de junho de 2018, HR, C 512/17, EU:C:2018:513; e Acórdão n.º 132/08.7TBPTB-F.G1, de 10-07-2019 do Tribunal da Relação de Guimarães.

W. É pacífico na jurisprudência nacional e europeia que o critério essencial para a determinação do lugar da residência habitual dessa criança, é sim o ambiente social e familiar dos pais da criança, em especial de tenra idade – que, no caso sub judice, será a Polónia.

X. O Tribunal a quo num juízo que se entende como exímio da questão, fundado em toda a prova carreada para o processo e tendo como pano de fundo o superior interesse da Menor sempre será de concluir pela incompetência dos tribunais portugueses para a regulação das responsabilidades parentais da Menor, e sim pelos Tribunal Polacos.

Y. (1) Em primeira instância por se considerar a residência habitual da Menor a Polónia, segundo a aceção do artigo 8.º do Regulamento e com base na jurisprudência que preenche o conceito de residência habitual. Entendendo-se preenchido o conceito pela maior proximidade à ordem jurídica polaca.

(2)Em segundo lugar, pelo facto indubitável de ser o Tribunal Polaco o tribunal competente ao abrigo do artigo 13.º do Regulamento, pela criança aí se encontrar ininterruptamente desde Maio de 2022, tendo aliás, o Tribunal polaco fixado a residência da criança junto da Mãe na Polónia, e estando já agendada conferência de pais para regulação das responsabilidades parentais na Polónia.

(3) E por último, ainda que os argumentos e preceitos supra mencionados não se verificassem – o que não se concede e apenas por exercício de patrocínio e em acompanhamento com o raciocínio irrepreensível efetuado pelo Tribunal – sempre se imporia a transferência do processo ao abrigo do artigo 15º do Regulamento, em face da ligação particular da criança com a ordem jurídica polaca: «por ser evidente que a criança adquiriu residência habitual nesse país, aí se situando a residência da progenitora».

Z. Há uma razão pela qual os tribunais competentes para regular as  responsabilidades parentais são os tribunais da residência habitual, e esta razão prende-se essencialmente pelo facto de serem os tribunais melhor colocados para defender o superior interesse da Menor. Numa perspetiva prática da questão questiona-se: quid do recurso aos meios auxiliares do direito da família? Quid da Audição Técnica especializada? Quid do apoio a prestar por técnicos da segurança social?

AA. No caso, a Menor encontra-se na Polónia, como se encontra desde Abril de 2021, tendo uma ligação intrínseca com o país, como ficou demonstrado à saciedade: frequentou o Jardim de Infância na Polónia no ano letivo 2021/2022 e encontra-se inscrita para nele permanecer no presente ano letivo de 2022/2023 (cfr. Documentos n.º 2 e 3 juntos com o Requerimento da Requerida de 15/09/2022, referência n.º 43274967). É também na Polónia que a Menor é medicamente assistida e usufrui dos cuidados de saúde de que necessita, sendo paciente declarada desde 22 de novembro de 2021(cfr. Documento n.º 4 junto com o Requerimento da Requerida de 15/09/2022, referência n.º 43274967).

BB. É na Polónia que a Menor tem as suas rotinas estabelecidas, é lá que tem a sua mãe, a sua família materna e os seus amigos da escola. É indubitável que o seu centro familiar, social e escolar se encontra na Polónia. E é aí que deverão ser reguladas as responsabilidades parentais, onde com certeza se fixará direitos de visita a ambos os progenitores, sendo o Tribunal Polaco o melhor colocado para decidir da questão.

CC. O Recorrente não logrou alcançar o verdadeiro sentido das normas do Regulamento (CE) n.º 2201/2003 e, em claro prejuízo da Menor, pretendeu vir sindicar uma decisão fundamentada e sustentava no acervo factual – e que corresponde à verdade.

DD. Num último reduto para sustentar a sua – indefensável – tese, vem o Recorrente invocar o artigo 10.º do Regulamento (CE) n.º 2201/2003, que de facto não é in casu aplicável por não se ter verificado qualquer deslocação ilícita para o estabelecimento da residência habitual da Menor na Polónia, a residência estabelece-se ainda no ano de 2021, tendo o pedido sido apresentado em 2022, quiçá em 2023, porquanto apenas no ano de 2023 tomou dele a Requerida conhecimento.

EE. Resultou incontestavelmente demonstrado pelas declarações prestadas pela Requerida em sede de Conferência de Pais que esta sempre teve o consentimento do Recorrente para se deslocar com a Menor para a Polónia, o Recorrente levou várias vezes a sua filha à Polónia, aí passaram o Natal, acompanhou a Recorrida e a Menor ao aeroporto de todas as vezes que a Recorrida a veio buscar a Portugal.

FF. Foi tão parca a argumentação do Recorrente quanto a esta alegada deslocação ilícita – desde logo, por manifestamente não corresponder à verdade – que não logra colocar em crise em qualquer momento a decisão tomada pelo Tribunal a quo.

GG. Nestes termos – de acordo com o decido na Douta Sentença recorrida e promovido na resposta do Ministério Público – deve o presente Recurso ser julgado totalmente improcedente e a invocada exceção dilatória, fundada na violação das regras de competência internacional, ser julgada procedente, com a consequente absolvição dos Requeridos da instância (artigos 59.º; 96.º, n.º 1, alínea a); 97.º; 99.º, n.º 1; 576.º, n.º 1 e 2 e 577.º, alínea a) e 578.º, todos do CPC).

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. Mui doutamente suprirão, requer-se:

i) Seja rejeitada a impugnação da decisão relativa aos factos provados n.º 5, 6, 10, 15, 21 e 23, nos termos da alínea a), do n.º 2 do artigo 640.º do CPC;

ii) Seja julgada procedente a invocada exceção dilatória e declarados internacionalmente incompetentes os tribunais portugueses para conhecer da presente ação, nos termos dos artigos 59.º; 96.º, n.º 1, alínea a); 97.º; 99.º, n.º 1; 576.º, n.º 1 e 2 e 577.º, alínea a) e 578.º, todos do CPC;

iii) Seja o Recurso interposto julgado totalmente improcedente, por não provado, proferindo-se Acórdão que confirme a Douta Sentença recorrida e absolva os Requeridos da instância com todas as legais consequências.

Crê-se que ao julgardes desta forma estarão V. Exas., Venerandos Desembargadores, a realizar a almejada e costumada

JUSTIÇA!”

                                                           ***

1.9. – Foi proferido despacho a receber o recurso do seguinte teor:

  Considerando o disposto no artigo 17º, nºs 2, 4 e 5 e tabela IV, em face do valor peticionado, decide-se alterar o valor anteriormente fixado para o montante 2 UCs, a que acrescem as despesas de transporte calculadas de acordo com a aludida tabela, isto é, 0,20 € por km, inexistindo fundamento legal para peticionar as demais quantias a título de despesas.

Proceda ao pagamento em conformidade.

Notifique.

*

Tomei conhecimento do documento junto pelo progenitor em 07.07.2023, do qual deflui ter sido ordenado o regresso da criança a Portugal no âmbito de um pedido até então desconhecido pelo Tribunal.

*

Por incidir sobre decisão que o admite, apresentado por quem tem legitimidade, dentro do prazo legalmente previsto, contendo alegações e conclusões, admite-se o recurso interposto pelo progenitor, que é de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo (artigos 631º, nº 1, 637º, 638º, nº 7, 644º, nº 1, alínea a), 645º, nº 1, alínea a), 647º, nº 1, todos do CPC e artigo 33º, nº 2 do RGPTC).

Notifique.

Subam os autos ao Venerando Tribunal da Relação de Coimbra”.

                                                           ***

            1.10. Colhidos os vistos cumpre decidir.

                                                           ***

                                                 2 – Fundamentação de facto

Factos provados:

Com relevo para a decisão a proferir, encontram-se demonstrados os seguintes factos:

1.-AA nasceu em .../.../2018, na freguesia ..., ..., ... e ... e encontra-se registada como sendo filha de BB, de nacionalidade portuguesa e de CC, de nacionalidade polaca.

2.- Após o nascimento, a criança residiu com os progenitores em Portugal e também em Espanha por motivos profissionais do progenitor.

3.- Durante os seus primeiros três anos de vida, a progenitora dedicou-se exclusivamente a cuidar da filha, tendo amamentado durante esse período.

4. -Em abril de 2021, a criança e a progenitora, com a concordância do progenitor, deslocaram-se à Polónia onde permaneceram cerca de três meses, para a progenitora melhorar as notas de alguns exames com vista a entrar na Universidade. (redação dada pela 1.ª instância).

 “Em 27-04-2021, a criança e a progenitora, com a concordância do progenitor, deslocaram-se à Polónia onde permaneceram até 13-07-2021, para a progenitora melhorar as notas de alguns exames com vista a entrar na Universidade”. (Redação dada por este Tribunal).

5.- Em julho de 2021, ambas regressaram a Portugal e em agosto a progenitora regressou à Polónia, tendo a criança permanecido com o pai em Portugal. (redação dada pela 1.ª instância).

”Em 13 de julho de 2021, ambas regressaram a Portugal e em agosto a progenitora regressou à Polónia, mantendo-se a criança a residir com o pai em Portugal, onde iniciou a frequência do Pré-Escolar” (redação dada por este Tribunal)

6.- Em outubro e novembro de 2021, a criança residiu na Polónia, com a progenitora e com a concordância do progenitor. (redação dada pela 1.ª instância)

“Entre 09 de outubro e até 04 de dezembro de 2021, a criança esteve na Polónia, com a progenitora e com a concordância do progenitor”. (redação dada por este Tribunal)

7.- Em dezembro de 2021, a progenitora e a criança vieram para Portugal, onde estiveram até ao Natal (redação dada pela 1.ª instância).

“Em 04 de dezembro de 2021, a progenitora e a criança vieram para Portugal, onde estiveram até ao Natal” (redação dada por este Tribunal)

8.- Os progenitores e a criança passaram o Natal na Polónia com a família da progenitora.

9.- A relação dos progenitores terminou em dezembro de 2021.

10. - Após o período natalício, e porque a progenitora se encontrava em fase de exames na Universidade, a criança regressou com o pai a Portugal, onde esteve até meados de janeiro de 2022, altura em que se deslocou à Polónia para festejar o aniversário da progenitora, tendo aí permanecido durante alguns dias. (redação dada em 1.ª instância)

Após o período natalício, e porque a progenitora se encontrava em fase de exames na Universidade, a criança regressou com o pai a Portugal, onde esteve até meados de janeiro de 2022, altura em que se deslocou à Polónia para festejar o aniversário da progenitora, tendo aí permanecido durante alguns dias, regressando dia 25/1/2022” Redação dada por este Tribunal.

11.- Seguidamente, a criança regressou com o pai a Portugal e a progenitora permaneceu na Polónia porque estava em época de exames.

12. - No final de janeiro/início de fevereiro, a progenitora deslocou-se a Portugal para recolher a filha e regressaram ambas à Polónia. Redação dada em 1.ª instância.

Em 15/2/2022 a progenitora deslocou-se a Portugal para recolher a filha e regressaram ambas à Polónia. Redação dada por este Tribunal.

13.- No final de março, o progenitor deslocou-se à Polónia para trazer a filha para Portugal e aqui passaram cerca de um mês. (redação dada pela 1.ª instância)

No dia 24/3/2022, o progenitor deslocou-se à Polónia para trazer a filha, o que aconteceu em 29/3/2022, para que aquela aqui passa-se cerca de um mês (redação dada por este Tribunal)

 14.- No final de abril, a filha não regressou à Polónia como havia sido acordado entre os progenitores.

15. - Em face disso, a progenitora deslocou-se a Portugal em maio para recolher a filha e os progenitores acordaram que esta permaneceria na Polónia por um mês.

16. -Desde maio de 2022, a criança permanece em Varsóvia com a progenitora, não tendo esta autorizado o seu regresso a Portugal com o pai. (redação dada pela 1.ª instância).

Desde 17 de maio de 2022, a criança permanece em Varsóvia com a progenitora, não tendo esta autorizado o seu regresso a Portugal com o pai – redação dada por este Tribunal

17. -Desde então, o progenitor visitou a filha, pelo menos três vezes, na Polónia.

18. - A presente ação deu entrada em juízo em 05.05.2022.

19.- Nesta data, a criança encontrava-se em Portugal com o progenitor.

20. - Em 18.05.2022, a progenitora deu entrada no Tribunal de Varsóvia de ação para determinação da residência da criança.

21.- A criança frequentou o ensino pré-escolar na Escola Básica ..., em ..., no ano letivo de 2021/2022 e de 2022/2023, nos períodos em que se encontrava em Portugal.

22.- E frequentou o jardim de infância em Varsóvia no ano letivo de 2021/2022 e de 2022/2023, que frequenta ininterruptamente desde maio de 2022.

23. - Encontra-se inscrita na Unidade de Saúde Infantil USF ... desde 12.02.2021, onde era medicamente acompanhada.

24.- E desde 22.11.2021 que se encontra inscrita no centro médico em Varsóvia.

25.- Fala as línguas portuguesa e polaca.

26.- Os avós maternos vivem em Varsóvia e a criança mantém convívios com os mesmos, tendo passado juntos o verão de 2022.

27 - A progenitora auferiu abono de família, atribuído pelo Estado Português, durante os anos de 2021 e 2022” (aditado por este Tribunal)

28 –  Em 16/6/2023 foi proferida sentença, ainda não transitada, no processo n.º ..., onde era requerente BB e requerida CC, onde se ordenou o regresso a Portugal da menor AA, nascida a .../.../2018, sendo que, em .../.../2023 teve lugar a audição dos progenitores da menor, no Tribunal Distrital de Varsóvia - (aditado por este Tribunal).

*

Factos não provados:

Com relevância para a decisão, não se demonstrou que:

a) No verão de 2021, os progenitores concordaram que a partir de setembro a residência dos três passaria a ser na Polónia, de molde a que a progenitora pudesse retomar os estudos.

b) O progenitor nunca chegou a cumprir o que tinham combinado e manteve a sua residência habitual em Portugal, o que, aliado a outros fatores, levou a uma rutura na relação dos Requeridos.

***     

   3. Motivação

É sabido que é pelas conclusões das alegações dos recorrentes que se fixa e delimita o objeto dos recursos, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (artºs. 635º, nº. 4, 639º, nº. 1, e 608º, nº. 2, do CPC).

Constitui ainda communis opinio, de que o conceito de questões de que tribunal deve tomar conhecimento, para além de estar delimitado pelas conclusões das alegações de recurso e/ou contra-alegações às mesmas (em caso de ampliação do objeto do recurso), deve somente ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, ou seja, abrange tão somente as pretensões deduzidas em termos do pedido ou da causa de pedir ou as exceções aduzidas capazes de levar à improcedência desse pedido, delas sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes, bem como matéria nova antes submetida apreciação do tribunal a quo – a não que sejam de conhecimento oficioso - (vide, por todos, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª. ed., Almedina, pág. 735.

Assim, as questões a decidir são:

            A)- Saber se a matéria de facto fixada em 1.ª instância deve ser alterada

            B)- Saber se a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por acórdão, que determine a competência dos Tribunais Portugueses para conhecer da presente ação.

            Tendo presente que são duas as questões a decidir, por uma questão de método iremos apreciar cada uma de per si.

            Porém, antes de entrarmos na analise de qualquer dessas questões, iremos analisar duas questões prévias.

i)- Saber se o documento junto pelo recorrente deve ou não ser admitido e por consequência suspender os presentes autos, até ser proferida decisão nos autos que correm termos no “District Court”, em Varsóvia, o processo n.º ..., ao abrigo da Convenção de Haia sobre o Rapto Internacional de Crianças, até ser proferida decisão naquele âmbito.

ii)- Saber se o recurso da matéria de facto, deve ser liminarmente rejeitado, quanto aos pontos n.ºs 5, 6, 10, 15, 21 e 23, nos termos da alínea a), do n.º 2 do artigo 640.º, do CPC., como pugna a recorrida CC.

Por uma questão metodológica, vejamos cada um dos pontos.

Assim;

i)- Saber se o documento junto pelo recorrente deve ou não ser admitido.

Segundo o recorrente tal documento deve ser admitido, por (a) A título de questão prévia e correndo termos, no “District Court”, em Varsóvia, o processo n.º ..., ao abrigo da Convenção de Haia sobre o Rapto Internacional de Crianças, devem ser os presentes autos suspensos até ser proferida decisão naquele âmbito.

Opinião oposta tem o recorrente, (DD), referindo, desde logo, não haver lugar a qualquer suspensão, porquanto um processo intentado ao abrigo da Convenção sobre os Aspetos Civis do Rapto Internacional de Crianças não ter a virtualidade de infligir no presente processo de regulação das responsabilidades parentais.

Entretanto, o recorrente, por requerimento de 7/7/2023, veio juntar requerimento do seguinte teor:

Este Tribunal proferiu despacho datado de 3/11/2023 do seguinte teor:

“Uma vez que o recorrente nas suas alegações alude ao processo, cuja decisão junta, agora com o requerimento de 7/7/2023, tendo nas mesmas pedido a suspensão dos presentes autos, e, podendo este Tribunal se vier admitir tal documento, introduzir tal facto na matéria de facto provada e tirar as conclusões, pertinentes, que daí entenda, mormente no acórdão a proferir, como seja se tal facto poderá, ou não ter pertinência, na atribuição da competência, e para evitar, que venha a ser invocada, nulidade com base em eventual decisão surpresa, notifique as partes, para querendo, se pronunciarem sobre tal matéria, nos termos do n.º 3, do art.º 3.º, do C.P.C.”

Face a tal notificação, a recorrida CC, respondeu referindo, entre o mais, que a referida decisão não se encontra transitada em julgado, pelo que, não poderá ter o Recorrente a pretensão de que a mesma produza efeitos ou tenha implicações como se de uma decisão definitiva se tratasse. Acresce que o «Children's Ombudsman (Provedor de Justiça para as crianças)», manifestou durante as sessões de julgamento da convenção de Haia que estaria na disponibilidade de interpor «recurso de cassação» para o Supremo caso o veredicto viesse a confirmar a posição da primeira instância.

Por outro lado o Tribunal a quo para proferir a decisão Recorrida, ponderou a decisão proferida pelo Tribunal Regional de Varsóvia em 30 de agosto de 2022, em que este, se declarou competente para decidir da regulação das responsabilidades parentais, fixando que no período de duração do presente processo, a residência da Menor AA seria em qualquer residência onde se estabelecesse a sua mãe CC, aqui Recorrida –conforme Documento n.º 2, já junto com o Requerimento da Recorrida de 17 de outubro de 2022, com referência n.º 43585710.

Nesta medida verifica-se que existe uma decisão precedente do Tribunal Polaco a julgar-se competente para decidir da regulação das responsabilidades parentais – que é o mais relevante levar a cabo neste momento, nos termos de um cumprimento sério e estrito do superior interesse da Menor.

Assim, já antes de qualquer decisão por parte do Tribunal a quo, já o Tribunal de Varsóvia Praga-Pólnoc, Seção de Família e Menores, havia proferido decisão, determinando-se competente e fixando a residência da Menor com a Recorrida, na Polónia.

Acresce que a decisão proferida ao abrigo da Convenção de Haia referida pelo Recorrente não é definitiva, pelo que uma eventual ordem de regresso da Menor ainda está a ser julgada, e sempre seria contraditória com uma pronuncia prévia do Tribunal polaco a determinar-se como competente e que a Recorrida é a figura de referência da Menor.

Por sua vez o recorrente, entre o mais refere que, em sede de recurso de apelação, requereu a suspensão da instância, tendo em vista a iminente decisão que estava para ser proferida pelo “District Court” em Varsóvia, no âmbito do processo n.º ..., a qual poderia ter relevância nos presentes autos, quanto à discutida (in)competência dos Tribunais Portugueses. Assim, obtida aquela e junta aos autos, entende-se dever ser a mesma admitida, ainda que haja sido apresentada em momento posterior ao termo do prazo para a interposição de recurso, uma vez que não o pôde ser antes e o respetivo conteúdo afigura-se de interesse à boa decisão da causa, porquanto, dela resulta que a Menor deve regressar ao seu País de residência, ou seja, Portugal.

O Ministério Público notificado nada disse.

À questão da junção de documentos na fase de recurso se refere expressamente o artigo 651º, nº 1 do CPC, cujo teor ora se transcreve:


Artigo 651º
Junção de documentos e de pareceres

1 - As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o artigo 425º ou no caso da junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância.

E dispõe o artigo 425º para o qual remete o texto da norma acabada de transcrever:


Artigo 425º
Apresentação em momento posterior

Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
E importará ter presente, enfim, enquanto norma contendo o “princípio geral” que referencia, na dinâmica do processo, o
momento da apresentação de prova por documentos, o artigo 423º do CPC:

Artigo 423º
Momento da Apresentação

1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.

2 - Se não forem juntos com o articulado respectivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, excepto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.

3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
Da articulação lógica destas normas decorre – e estamos a cingir-nos à questão aqui relevante – que a junção de documentos em sede de recurso (junção que é positivamente considerada apenas a título excepcional) depende da caracterização (
rectius, da alegação e da prova) pelo interessado nessa junção de uma de duas situações: (1) a impossibilidade de apresentação do documento anteriormente ao recurso, valendo aqui a remessa do artigo 651º, nº 1 para o artigo 425º; (2) o ter o julgamento da primeira instância introduzido na acção um elemento de novidade que torne necessária a consideração de prova documental adicional, que até aí – até ao julgamento em primeira instância – se mostrava desfasada do objecto da acção ou inútil relativamente a este.

O primeiro elemento referido – a impossibilidade de apresentação anterior – legitima as partes a utilizar no recurso, juntando-os com a motivação deste, documentos cuja apresentação não tenha sido possível até esse momento (até ao julgamento em primeira instância), o que pressupõe aquilo que se refere como superveniência objectiva ou subjectiva do documento pretendido juntar (cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, 2013, p. 184..

Ora, sendo superveniente (objectivamente superveniente) o que só ocorreu historicamente depois de um determinado momento considerado, ou (superveniência subjectiva) o que justificadamente só foi conhecido por alguém depois desse momento, vale a asserção de superveniência aqui relevante – vale, portanto, como integração positiva da facti species do nº 1 do artigo 651º do CPC – pela constatação da ocorrência da situação revelada pelo documento só posteriormente à decisão recorrida (superveniência objectiva, pressupondo esta a criação posterior do documento) ou pela justificação de que o conhecimento da situação documentada, ou do documento em si, não obstante a sua existência ser anterior ao momento considerado, só teve lugar posteriormente, por razões que se prefigurem como atendíveis, no sentido de serem razões aptas a demonstrar a impossibilidade daquela pessoa (quer o artigo 423º, nº 3 como o artigo 425º, ambos do CPC, falam em “não [ter] sido possível”), num quadro de normal diligência referida aos seus interesses, ter tido conhecimento anterior da situação ou ter tido conhecimento anterior da existência do documento. Estas razões, todavia – rectius, a atendibilidade delas – pressupõem à partida a respectiva invocação e a prova da não possibilidade (da impossibilidade) de um conhecimento anterior novo a nota de António Santos Abrantes Geraldes ao artigo 651º, nº 1 do CPC, dir-se-á que “[a] jurisprudência anterior [ao Novo CPC] sobre esta matéria [da superveniência] não hesita em recusar a junção de documentos para provar factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova, não podendo servir de pretexto a mera surpresa quanto ao resultado” (Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., p. 185). e abrem caminho, quando alegadas, à respectiva indagação.

Saliente-se que o artigo 651º, nº 1 do CPC também admite, no seu trecho final, a junção de documentos com as alegações de recurso nos casos em que o julgamento proferido em primeira instância torne necessária a consideração desse documento. Pressupõe esta situação, todavia, a novidade da questão decisória justificativa da junção pretendida, como questão operante (apta a modificar o julgamento) só revelada pela decisão, sendo que isso exclui que a decisão se tenha limitado a considerar o que o processo já desde o início revelava ser o thema decidendum. Com efeito, como refere expressivamente António Santos Abrantes Geraldes, “[p]odem […] ser apresentados documentos quando a sua junção apenas se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, maxime quando este se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo” (cfr. António Abrantes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, cit., p. 184).

No caso em apreço, dada a data colocada na decisão junta 16/6/2023 e a data de entrada das alegações 14/6/2023, verificamos que o mesmo é posterior à data da entrada das alegações, pelo que, nesta vertente, temos para nós, não haver razão para não admitir tal documento.

Contudo, coloca-se-nos a questão, de saber se tal documento deve ser admitido, porquanto deu entrada após as alegações.

Sobre esta temática, entendemos que os documentos juntos com o recurso, devem-no ser nas alegações, e não em momento posterior, desde logo, por resultar do art. 651º, nº1 do CPC, que a junção de documentos, em fase de recurso, apenas é consentida com as alegações.

Aliás, trata-se, de um mecanismo de utilização excecional, pois pressupõe a verificação das situações previstas no art. 425º ou que a apresentação do documento se tenha tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.

Assim, em principio, e pelo explanado, tal documento, não deve ser admitido, por ter entrado em 7/7/2023, logo após as alegações, entradas em 14/6/2023.

Porém, no caso em apreço, temos para nós, que o recorrente, logo nas conclusões juntou um documento uma acta do seguinte teor:

 

É certo que não juntou a decisão, que apenas veio a juntar em 7/7/2023. Porém, a mesma pode ser considerada como uma extensão do documento junto, que não podia juntar, por não haver decisão, sobre o que se passou na audiência do dia 24 de maio de 2023, conforme ata que juntou.

Nestes termos, afigura-se-nos, que tal documento deve ser admitido, por no fundo ser, como já dissemos a extensão da ata, junta em devido tempo.

A tal poderia obstar, se a matéria em causa fosse nova. Isto é não fosse trazida à 1.ª instância, pois seria admitir um documento inócuo, na medida em que poderia ter ou não relevo para matéria nova, mas vedado o seu conhecimento a este Tribunal.

Pois como se sabe é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não ser lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objecto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação, podendo ver-se neste sentido entre outros os acórdãos do S.T.J. de 1.12.1998, in BMJ n.º 482/150; 12.12.1995, CJSTJ, Tomo III, pág 156; e os acórdãos de 24/2/2015, processo nº 1866/11.4TTPRT.P1.S1, relatado por Melo Lima, de 14/5/2015, 2428/09.1TTLSB.L1.S1, relatado por Melo Lima e  de 7 de Julho de 2016, proc.º 156/12.0TTCSC.L.S1, relatado por Gonçalves Rocha.

Porém, temos para nós, que tal matéria não é nova, por ser alegada pelo, agora recorrente, nos art.ºs 35 a 42 do requerimento que deu entrada em 1/10/2022.

Aliás, a sentença na matéria de facto provada alude a tal matéria nos art.ºs 16 e 17.

            Pelo exposto, e pelas razões já expostas admitimos tal documento, a fim de assegurar as várias soluções plausíveis de direito.

Aqui chegados, passemos ao ponto seguinte.

                                                                       *

ii)- Saber se o recurso da matéria de facto, deve ser liminarmente rejeitado, quanto aos pontos n.ºs 5, 6, 10, 15, 21 e 23, nos termos da alínea a), do n.º 2 do artigo 640.º, do CPC., como pugna a recorrida CC.

Refere a recorrida que o recorrente não observou o preceituado na al.ª a), do n.º 2, do art.º 640.º, do C.P.C., desde logo, por invocar as declarações prestadas pelos Progenitores na realizada Conferência de Pais, não o fazendo, contudo de forma deficiente, ao limitar-se a indicar os minutos da Conferência de Pais, não procedendo à transcrição de nenhuma passagem, não tendo sequer concretizando em que medida esses excertos têm a virtualidade de alterar a factualidade dada como provada, e, pior, extraindo conclusões erradas do que aí foi dito.

Como se sabe, com a reforma processual de 1995/96 foi introduzida no nosso direito processual civil a possibilidade de recurso contra a decisão proferida sobre os factos, designadamente na parte em que esta assentava na livre apreciação da prova por parte do juiz, sendo, porém “(…) rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto (…)” e “(…) tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente. “ cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª edição, pág. 163)

      Com o C.P.C. de 2013 esta concretização ficou expressa no art,º 640º, com um elevado grau de exigência que visa garantir a seriedade da impugnação formulada, sendo que esse grau de exigência pode repercutir-se favoravelmente na medida em que o recorrente contribui para a consecução de uma justiça mais perfeita e eficaz.

No entanto, importa evitar que esse grau de exigência possa contribuir para prejudicar o objetivo almejado.

Quanto ao regime legal da impugnação da decisão proferida sobre os factos, há que atentar, desde logo, no comando constante do nº 1 do citado art. 640º.

Sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, manda o seguinte:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”

A propósito da obrigação de especificação dos concretos pontos de facto tidos como incorretamente julgados, escreve Abrantes Geraldes, in Obra citada, págs. 165-166: “a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; (…)”, o que no caso em apreço, foi observado..

No caso em apreço, o que esta em cima da “mesa” é saber se o recorrente, quanto aos pontos, supra aludidos, observou o exigido pela al.ª a), do n.º 2, do citado art.º 640.º. Efetivamente, temos, que não observou corretamente o exigido. Contudo, como salienta (Abrantes Geraldes, in Obra citada, págs. 171-173.) a consequência da rejeição não deve exceder o que razoavelmente esteja dentro de um princípio de proporcionalidade.

Na verdade o Supremo Tribunal de Justiça, tem vindo a temperar tal obrigação, com a necessidade de consideração dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na apreciação do cumprimento das exigências de especificação feitas no art. 640º (cfr. a título de exemplo os  acórdãos de 8.02.2018, Proc. nº 88440/14.1T8PRT.P1.S1, relatora Cons. Maria da Graça Trigo e de 28.04.2016, Proc. nº 1006/12.2TBPRD.P1.S1, relator Cons. Abrantes Geraldes).

No caso em apreço, e tendo presente o teor das conclusões do recorrente, sobre tal matéria, embora não primando pela desejável excelência, permite ver, sem margem para dúvida razoável, onde assenta o seu ponto de vista e porque razão o faz.

Face ao exposto, temos para nós, que o apelante, deu cumprimento de forma suficiente ao ónus em discussão, não se verificando o invocado fundamento para o não conhecimento da impugnação deduzida, até por o recorrente, não invocar apenas as declarações dos requeridos, mas também a documentos juntos.

Aqui chegados, passemos à análise propriamente do recurso.

Assim,

                                                           *

Rejeição oficiosamente por este Tribunal – quanto ao ponto 14

Muito embora a recorrida CC não pugne pela rejeição do facto 14, este Tribunal, rejeita liminarmente o mesmo por não observância do preceituado no n.º 1, al.ºs b) e c) do n.º 1 do art.º 640.º, do C.P.C., e n.º 2 al. a), do mesmo preceito, pois não refere as provas onde assenta para que o facto 14 seja alterado, nem o sentido que o mesmo deve ter.

                                                           *

            A)- Saber se a matéria de facto fixada em 1.ª instância deve ser alterada.

            Segundo o recorrente o Tribunal “a quo” errou de facto, ao dar como provados os factos 3., 4. 5., 6., 7., 10., 12., 13., 14., 15., 16., 21 e 23., desconsiderando factos comprovados por documentos e aceites pelas partes, bem como declarações do Recorrente e da Requerida, prestados em audiência.

Assim, refere:

Ponto 3 – É irrelevante, pois que a Menor residiu com ambos os Pais, nos primeiros meses de vida, deve ser eliminado da matéria de facto.

            Ponto 4 -  deve ser precisado o período de tempo durante o qual a Menor esteve ausente de Portugal, conforme resulta do art. 20.o e 21.o do requerimento da Requerida, de 15-09-2022, aceite somente relativamente às datas das viagens, pelo que deve passar a ler-se: “4. Em 27-04-2021, a criança e a progenitora, com a concordância do progenitor, deslocaram-se à Polónia onde permaneceram até 13-07-2021, para a progenitora melhorar as notas de alguns exames com vista a entrar na Universidade”.

            Ponto 5 . deve ser alterado para “5. Em 13 de julho de 2021, ambas regressaram a Portugal e em agosto a progenitora regressou à Polónia, mantendo-se a criança a residir com o pai em Portugal, onde iniciou a frequência do Pré-Escolar”, tendo em vista as declarações do Recorrente (min 00:04:27 a 00:04:38), o art. 21.o do requerimento da Requerida de 15-09-2022 (que se aceita no que se refere à data indicada), e os doc. 2, 15 e 16, juntos com o requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, não impugnados.

Ponto 6 – o mesmo deve ser corrigido para “6. Entre 09 de outubro e até 04 de dezembro de 2021, a criança esteve na Polónia, com a progenitora e com a concordância do progenitor.”, desde logo, tomando em consideração os doc. 3 e 4, não impugnados, do requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, e as declarações do Recorrente (min 00:05:25 a 00:06:11).

            Ponto 7- deve passar a ter a seguinte redação, ““7. Em 04 de dezembro de 2021, a progenitora e a criança vieram para Portugal, onde estiveram até ao Natal”, desde logo, com base, como se retira do doc. 4 junto com o requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, não impugnado.

            Ponto 10 – deve passar a ter a seguinte redação “Após o período natalício, e porque a progenitora se encontrava em fase de exames na Universidade, e a criança ia reiniciar a escola, regressou com o pai a Portugal, a 04 de janeiro de 2022 e onde esteve até 15 de janeiro de 2022, altura em que se deslocou à polónia para festejar o aniversário da progenitora, tendo aí permanecido durante alguns dias, até ao dia 25.”, desde logo, tendo por base os docs. 5 a 7, não impugnados, e das declarações do Recorrente (min 00:07:31 a 00:08:00).

            Ponto 12 – deve passar a ter a seguinte redação “No dia 15 de fevereiro de 2022, a Menor deslocou-se à Polónia com a progenitora onde permaneceu até 29 de março”, desde logo, por não se retirar fundamento para o facto provado 12., o mesmo só poderá ter a redação supra, até por força dos documentos 8 e 9, juntos com o requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, não impugnados.

            Ponto 13 – deve passar a ter a seguinte redação “13. No dia 24 de março, o progenitor deslocou-se à Polónia para trazer a filha para Portugal, o que ocorreu a 29 de março”, desde logo, tento o conteúdo do doc. 10 do requerimento do Recorrente de 05-12-2022

            Ponto 15 – deve passar a ter a seguinte redação “15. Em face disso, a progenitora deslocou-se a Portugal em maio e os progenitores acordaram que a criança iria à Polónia por um mês.”, desde logo, tendo por base as declarações do Recorrente (min 00:10:10 a 00:11:36) e por inexistir meio de prova que o fundamente diversamente.

            Ponto 16 – deve ter a seguinte redação “ 16. Desde 17 de maio de 2022, a criança permanece em Varsóvia com a progenitora, não tendo esta autorizado o seu regresso a Portugal com o pai”., desde logo, tendo por base as declarações das partes e do art.º 35.º do requerimento do Recorrente, de 30-09-2022, que se tem por aceite.

            Ponto 21 – deve ser retirada a parte final do mesmo, desde logo, tendo por base as  declarações do Recorrente (min min 00:04:27 a 00:04:38) e do conteúdo da declaração emitida, em 22 de Setembro de 2022, pela Presidente da CAP do Agrupamento.

            Ponto 23 – deve passar a ter a seguinte redação “23. Encontra-se inscrita na Unidade de Saúde Infantil USF ... desde 12.02.2021, onde foi medicamente acompanhada até .../.../2022, bem como pelo C. H. ... E.P.E.”, desde logo, como resulta do doc. 15 junto com o requerimento do Recorrente, de 05-12-2022, e das declarações da Requerida (min 00:51:40 a 00:52:55) pois que apenas com a presença da Menor na Polónia, desde .../.../2022, tem a mesma sido ali assistida medicamente, uma vez, até então, sempre foi seguida em Portugal.

                                                                                   *

Mais refere que deve ser aditado à matéria provada um ponto 27, com a seguinte redação “A progenitora auferiu abono de família, atribuído pelo Estado Português, durante os anos de 2021 e 2022”, por isso mesmo decorrer do art. 63.o do requerimento do Recorrente, de 30-09-2022 e do doc. 13 do requerimento de 05-12-2022, não impugnado.

                                                                       *

Ambos os recorridos M.P. e progenitora, pugnam pela improcedência do recurso quer nesta vertente, quer na vertente do direito.

Sendo que a recorrida progenitora, afirma que, o Tribunal a quo fundou a sua convicção quanto aos factos dados como provados na prova documental aí referida, a saber : certidão de assento de nascimento, requerimento dirigido ao Tribunal Distrital de Varsóvia, certificados do Jardim de Infância de Varsóvia, certificado do Centro Médico de Varsóvia, certificado de matrícula de ..., certificado do Centro Médico ... e data de registo da entrada da Petição Inicial, bem como no acordo das partes nos Requerimentos de 15.09.2022, e declarações dos progenitores que «(...) revelaram-se coerentes e escorreitas, «bem como, na sua globalidade, concordantes, particularmente no que tange aos períodos de residência (estadia da criança em Portugal e na Polónia.

                                                                       *

Como se sabe, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova, o juiz aprecia livremente as provas, decidindo segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição. 

É sabido que, frequentemente, tanto ou mais importantes que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, etc. (cfr. Abrantes Geraldes in “Temas Prova, II Vol. cit., p. 201) “E a verdade é que a mera gravação sonora dos depoimentos desacompanhada de outros sistemas de gravação audiovisuais, ainda que seguida de transcrição, não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância” (ibidem). “Existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores” (cfr. Abrantes Geraldes in “Temas de Prova”  II Vol. cit., p. 273).

Ora, contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.

“O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela sobre o julgamento do facto como provado ou não provado” (cfr. Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 348).

Nesta perspectiva, se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.

Daí que conforme orientação jurisprudencial prevalecente o controle da Relação sobre a convicção alcançada pelo tribunal da 1ª instância deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, sendo certo que a prova testemunhal é, notoriamente, mais falível do que qualquer outra, e na avaliação da respectiva credibilidade tem que reconhecer-se que o tribunal a quo, pelas razões já enunciadas, está em melhor posição.

Em conclusão: mais do que uma simples divergência em relação ao decidido, é necessário que se demonstre, através dos concretos meios de prova que foram produzidos, que existiu um erro na apreciação do seu valor probatório, conclusão difícil quando os meios de prova porventura não se revelem inequívocos no sentido pretendido pelo apelante ou quando também eles sejam contrariados por meios de prova de igual ou de superior valor ou credibilidade, não descurando a vertente que a prova tem de ser analisada em conjunto.

É que o tribunal de 2ª jurisdição não vai à procura de uma nova convicção (que lhe está de todo em todo vedada exactamente pela falta desses elementos intraduzíveis na gravação da prova), mas à procura de saber se a convicção expressa pelo Tribunal “a quo” tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si.

Sendo, portanto, um problema de aferição da razoabilidade da convicção probatória do julgador recorrido, aquele que essencialmente se coloca em sede de sindicabilidade ou fiscalização do julgamento fáctico operado pela 1ª instância, forçoso se torna concluir que, na reapreciação da matéria de facto, à Relação apenas cabe, pois, um papel residual, limitado ao controle e eventual censura dos casos mais flagrantes, como sejam aqueles em que o teor de algum ou alguns dos depoimentos prestados no tribunal a quo lhe foram indevidamente indiferentes, ou, de outro modo, eram de todo inidóneos ou ineficientes para suportar a decisão a que se chegou (cfr. cfr. Miguel Teixeira de Sousa obra citada, pág. 348).

Casos excepcionais de manifesto erro na apreciação da prova, de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e a decisão do tribunal recorrido sobre matéria de facto serão, por exemplo, os de o depoimento de uma testemunha ter um sentido em absoluto dissonante ou inconciliável com o que lhe foi conferido no julgamento, de não terem sido consideradas- v.g. por distracção-determinadas declarações ou outros elementos de prova que, sendo relevantes, se apresentavam livres de qualquer inquinação, e pouco mais.

A admissibilidade da respectiva alteração por parte do Tribunal da Relação, mesmo quando exista prova gravada, funcionará assim, apenas, nos casos para os quais não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação.

Cabe ainda referir que advogamos o defendido no Ac. desta Relação de 10/7/2018, proc.º n.º 1445/16.0T8FIG.C1, relatado por Luiz José Falcão de Magalhães, do qual somos 1.º adjunto, onde refere citando o Ac. da mesma relação de 4/4/2017, proc.º n.º 516/12.6TBPCV.C1), relatado por Jorge Arcanjo «… o controle da Relação sobre a convicção alcançada pelo tribunal da 1ª instância, embora exija uma avaliação da prova (e não apenas uma mera sindicância do raciocínio lógico) deve, no entanto, restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, sendo certo que a prova testemunhal ou por depoimento de parte é, notoriamente, mais falível do que qualquer outra, e, na avaliação da respectiva credibilidade, tem que reconhecer que o tribunal a quo, está em melhor posição.

Por isso, se entende não bastar qualquer divergência de apreciação e valoração da prova, impondo-se a ocorrência de erro de julgamento ( cf., por ex., Ac STJ de 15/9/2010 ( proc. nº 241/05), de 1/7/2014 ( proc. nº 1825/09), em www dgsi.pt ), tanto mais que o nosso sistema é predominantemente de reponderação (…)».

Ao que acresce que o dever de fundamentação da decisão de facto, exige actualmente a indicação do processo lógico – racional que conduziu à formação da convicção do julgador, relativamente aos factos que considerou provados ou não provados, de acordo com o ónus de prova que incumbia a cada uma das partes, conforme dispõe, no que concerne à sentença, o artº 607º, nº 4 do CPC, segundo os diversos critérios legais e jurisprudenciais, tendo em conta que, na formação da convicção do julgador rege o princípio da livre apreciação das provas, excepto nos casos previstos no nº 5 do artº 607 do C.P.C.-aqueles para cuja prova seja exigida formalidade especial, os que só possam ser provados por documentos e os que estejam já provados por acordo, documento ou confissão das partes.

É este dever de fundamentação imprescindível a um processo equitativo e contraditório, salvaguardando as garantias das partes e possibilitando a sua cabal reacção, em caso de discordância em relação a esta convicção, bem como assegurando que o tribunal de recurso tem todos os elementos necessários para a apreensão e reapreciação da matéria fáctica.

Conforme referido por Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, págs. 296, 297,), “o dever de fundamentação introduzido pela reforma de 1961, reforçado em 1995 e agora transferido para a própria sentença que simultaneamente deve conter a enunciação dos factos provados e não provados e as respectivas implicações jurídicas “ exige que “se estabeleça o fio condutor entre a decisão sobre os factos provados e não provados e os meios de prova usados na aquisição da convicção, fazendo a respectiva apreciação crítica nos seus aspectos mais relevantes. Por conseguinte, quer relativamente aos factos provados, quer quanto aos factos não provados, o juiz deve justificar os motivos da sua decisão, declarando por que razão, sem perda da liberdade de julgamento garantida pela manutenção do princípio da livre apreciação das provas (…), deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, julgou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos ou achou satisfatória ou não a prova resultante de documentos. É na motivação que agora devem ser inequivocamente integradas as presunções judiciais e correspondentes factos instrumentais (…).

Por último, no que toca à possibilidade e limites da reapreciação da matéria de facto, não obstante se garantir um duplo grau de jurisdição, tem este de ser enquadrado com o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, previsto no artº 607 nº 5 do C. P. Civil, sendo certo que decorrendo a produção de prova perante o juiz de 1ª instância, este beneficia dos princípios da oralidade e da mediação, a que o tribunal de recurso não pode já recorrer.

De acordo com Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, pág. 347, “Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (…) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (…) Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.º 655.º, n.º1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência”.

Assim, para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.

                                                           *

Sobre esta matéria refere a decisão

O Tribunal formou a sua convicção quanto aos factos dados como provados com base na análise crítica e conjugada, à luz das regras da lógica e das máximas da experiência comum, da prova carreada para os autos.

Assim, o Tribunal estribou-se na prova documental junta aos autos, a saber: certidão de assento de nascimento junto com a petição inicial, docs. 1 a 4 do requerimento de 15.09.2022, ref.ª 9020979, docs. 15 e 16 do requerimento de 05.12.2022, ref.ª 9261197 e data de registo da entrada da petição inicial com a ref.ª 8671568.

Valorou-se, ademais o acordo das partes nos requerimentos de 15.09.2022 e de 01.10.2022, bem como as declarações dos progenitores que, pese embora o natural interesse no desfecho da causa e as emoções coenvolvidas, revelaram-se coerentes e escorreitas, bem como, na sua globalidade, concordantes, particularmente no que tange aos períodos de residência/estadia da criança em Portugal e na Polónia, divergindo, porém, quanto ao acordo de fixação de residência do agregado familiar na Polónia a partir de setembro de 2021 e desentendimento subsequente, razão pela qual, e na ausência de outros meios de prova corroborantes, tal factualidade quedou indemonstrada.

Por fim, importa anotar que os demais factos alegados que não se encontram especificamente dados como provados ou não provados são conclusivos ou irrelevantes para a decisão da causa”

                                                           *

            Da audição da prova resulta.

            BB, em declarações refere.

            A AA nasceu em Portugal, onde viveu, com exceção o ano de 2019, em que foram viver para Espanha, por ter ido para lá trabalhar.

            Em 2021 a AA frequentou a cheche, tendo em 2021 ido para uma escola pública. Acrescenta que iam passar férias e ver a família da CC.

            Em maio de 2022, viajou com a AA para a Polonia, para visitarem a mãe desta, que já se encontrava na Polónia desde agosto de 2021. A CC foi para a Polonia porque não estava a trabalhar em Portugal, sendo que esteve a amamentar a filha durante 2 anos, sendo que ao fim destes dois anos a CC resolveu amamentar a filha mais um ano, pelo que foram três anos que esteva amamentar a filha. Ao fim deste tempo o declarante conversou com a CC e perguntou-lhe o que queria fazer da vida. Em maio de 2021 a CC foi fazer melhoria de notas. Em junho desse ano, quando veio referiu-lhe que ia estudar para a Polonia, tendo ele ficado surpreendido. A CC em agosto de 2021 foi para a Polonia à procura de casa para ir estudar e para se instalar, tendo a AA ficado consigo.

            A AA em meados de outubro de 2021 levou a AA à Polonia para visitarem a mãe.

            A AA ficou com a mãe durante o mês de novembro de 2021, por isso a mãe inscreveu-o numa creche, já que não tinha tempo para estar com ela por estar a estudar. Em dezembro desse ano a CC e a filha vieram para Portugal, onde ele já se encontrava. Combinaram ir passar o Natal e fim de Ano à Polonia, com os avós da AA. Foram no dia 22 ou 23 de dezembro. Regressou em janeiro tendo a AA vindo consigo, para iniciar as aulas. A CC em fevereiro de 2022 veio buscar a AA, tendo ele ido busca-la em meados de março do mesmo ano (altura em que a relação entre eles já tinha acabado).

            Meteu os papéis no Ministério Público para resolver as questões parentais, porque na escola foi alertado de que a AA quando vinha da Polonia vinha perturbada, do que avisou a CC. Esta veio buscar a filha, em maio de 2023, e a partir daí não mais viu a filha, contra a vontade desta.

            Refere que ao que sabe a filha está numa creche e que também fica com a avó. Já foi à Polonia várias vezes 3 ou 4 vezes, após maio de 2023, e nunca viu a filha, à exceção de uma vez no meio familiar da CC.

            Perguntado se sabe existir um processo na Polonia a correr termos, refere que sim mas ainda não foi notificado.

            CC, em declarações refere.

            Que no verão de 2021 começou a procurar casa na Polonia e a partir de outubro do mesmo ano foi viver para a Polonia e a filha foi consigo. Porém, refere que havia um acordo com o BB, de que assim fosse. Mais tarde a instância da advogada, sobre aforma como iriam viver, refere que o acordo, abrangia essa situação, ou seja, iam trabalhar os dois. O BB não foi logo, ficou em Portugal a trabalhar para arranjar mais algum dinheiro. Diz que o BB arranjava trabalho na sua área, obras, e ela também arranjava trabalho. Por isso, a casa que procurou foi maior. Em dezembro, teve aulas à distância e veio a Portugal, voltando os três para a Polonia, onde passaram o Natal, até porque o seu avó estava numa fase terminal.

            O pai (o BB) veio para Portugal com a filha. Voltou à Polonia com a filha, na data do seu aniversário (aniversário da aqui depoente), sublinhado é nosso, onde estiveram alguns dias, tendo o pai e a filha voltado de novo para Portugal, tendo ela ficado por ter aulas e exames. Veio para Portugal em fins de janeiro ou princípios de fevereiro, nessa altura já não estavam juntos, veio buscar a filha, levou-a passados 2 ou três dias, após a sua chegada, tendo o BB em finais de março, por acordo ido buscar a filha, devendo a mesma, face ao acordo ficar um mês em Portugal com o pai. Em finais de abril, contactou o pai, para falarem sobre a filha, mas ele desviava a conversa, por isso, veio a Portugal buscar a filha.

            Refere que a filha na Polonia esteve inscrita em creche desde outubro de 2021 a maio de maio de 2022. Em Portugal não sabe, mas pensa que sim por o BB o referir. Mais tarde instada sobre essa matéria acaba por referir, saber que a filha estava na creche, não sabia era da inscrição por o BB não lhe ter dito.

            Afirma que a filha não vem a Portugal desde maio de 2022, que esta inscrita e frequenta uma creche. Nas férias de verão a filha não frequenta a creche e só nessa altura o fazia, ficando nessa altura, em casa de seus pais (avós da AA). Ela passa as férias de verão com os pais e numa casa dos avós.

            Perguntada sobre o processo a correr termos na Polonia refere que nada está decidido, até por não ter havido qualquer conferência, agendada para abril.

            Refere ainda que a filha teve um problema de saúde e foi assistida, sendo que se encontra inscrita na unidade de saúde infantil.

            Assim, cabe ver se assiste razão ao recorrente.

                                                                       *

Atendendo ao teor das declarações, prestadas pelos progenitores, da menor AA, em conjugação dom o teor dos documentos juntos.

            Assim,

            Quanto ao ponto 3, que o recorrente pretende ver eliminado, temos para nós, não lhe assistir razão, desde logo,  por nos permitir em conjugação com a demais matéria factual o relacionamento da menor com os seus progenitores e deste para com ela.

            Quanto ao ponto 4, cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

 Afigura-se-nos assistir-lhe razão. Se é verdade que das declarações dos pais da menor não resulta com segurança as respetivas datas, não é menos verdade que no requerimento apresentado pela requerida – CC – em 15/9/2022, nos art.ºs 20 e 21 alude às datas 27/7/2021 (como data de ida para a Polonia) e 13/7/2021 (como data em que vieram a Portugal), o que não foi contraditado.

Assim, no local respetivo a negrito e etálico será colocada a nova redação, dada por este Tribunal.

            Quanto ao ponto 5, cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

            Afigura-se-nos que lhe assiste razão. Quer face ao referido pelo progenitor, quer pelo art.º 21.º do requerimento entrado em 15/9/2022, apresentado pela requerida CC, onde consta a data de regresso 13/7/2022, quer pelo teor dos documentos 2 (certificado de matricula),  15 (documento unidade saúde) e 16 (declaração referente à pré-escola), do requerimento apresentado pelo recorrente em 5/12/2022.

            Redação colocada a negrito e etálico no local respetivo.

Quanto ao ponto 6, cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

Afigura-se-nos que lhe assiste razão, desde logo face ao teor dos doc 3 (bilhete voo de Porto para Varsóvia datado de 9/10/2021) e doc 4 (bilhete voo de Varsóvia para Porto datado de 4/12/2021), junto com o requerimento datado de 5/12/2022, não impugnados.

            Redação colocada a negrito e etálico no local respetivo.

            Quanto ao ponto 7 – cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

Afigura-se-nos que lhe assiste razão, desde logo face ao teor do doc 4 (bilhete voo de Varsóvia para Porto datado de 4/12/2021), junto com o requerimento datado de 5/12/2022, não impugnado, em conjugação com o referido pelos declarantes pais da menor AA que ambos referem que a CC e a AA vieram a Portugal próximo do Natal tendo depois voltado à Polonia a passar o Natal, até por o avô da CC estar em fase terminal.

            Redação colocada a negrito e etálico no local respetivo.

            Quanto ao ponto 10 – cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

            Afigura-se-nos que tem apenas parcialmente razão. Das declarações dos progenitores não resulta com segurança as datas de ida e volta. Dos documentos 5 a 7 a que alue o recorrente, o doc 5 contem a data 1/1/2022 ( passageiros BB e AA, Varsóvia Porto), o doc 6  contem a data 22/1/2022 ( passageiros BB e AA, Varsóvia Porto) e o doc 7 contem a data 25/1/2022 passageiros BB e AA), todos juntos com o requerimento datado de 5/12/2022.

            Redação colocada a negrito e etálico no local respetivo

Quanto ao ponto 12 – cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

Quanto a este ponto assiste parcialmente razão ao recorrente quer das declarações dos progenitores que aludem a tais viagens quer do documento 8 junto com o requerimento datado de 5/12/2022, de onde consta como passageiros CC e AA, partida Porto destino Varsóvia em 15/2/2022, sendo que o doc. 9 se reporta a uma data de 10/2/2022, como passageira CC, partida Varsóvia destino Lisboa.

            Assim, a redação do mesmo passa a ser a colocada a negrito e etálico no lugar respetivo.

Quanto ao ponto 13 – cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

            Quanto a este ponto assiste parcialmente razão ao recorrente, desde logo, tendo por base as declarações dos progenitores da menor, que aludem a tais viagens, quer ao documento n.º 10, junto dom o requerimento datado de 5/12/2022, de onde resulta como passageiro BB, partida Lisboa destino Varsóvia, datada de 24/3/2022, e regresso de Varsóvia – Porto, data de 29/3/2022, passageiros BB e AA.

            A redação a este ponto colocada a negrito e etálico passa a ser.

Quanto ao ponto 15 –cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

Quanto a este ponto temos para nós não assistir razão ao recorrente, desde logo, por da conjugação das declarações dos progenitores ir no sentido da redação dada pelo Tribunal. Advogando nós, que este Tribunal da Relação apenas deve alterar a matéria de facto fixada em 1.ª instância, quando algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes, o que não sucede no caso em apreço, antes indo no sentido da prova feita.

Quanto ao ponto 16 - – cuja redação o recorrente pretende ver alterada.

Quanto a este ponto assiste razão ao recorrente, quer tendo por base as declarações que aludem que deste maio de 2022 a menor não vem a Portugal, por a mãe não o permitir, quer por tal facto ser referido no art.º 35 do requerimento, datado de 1/10/2022, e não ser impugnado.

            Redação colocada a negrito e etálico no local respetivo.

Quanto ao ponto 21 – cuja redação o recorrente pretende ver alterada

Quanto a tal matéria não vemos assistir razão ao recorrente. Quer da conjugação das declarações do progenitor da menor, quer das regras da experiência comum, na verdade, nos períodos de tempo em que a menor se encontrava na Polónia não podia frequentar a creche em Portugal.

            Quanto ao ponto 23  – cuja redação o recorrente pretende ver alterada

            Quanto a este ponto não vemos assistir razão ao recorrente, quer da conjugação das declarações dos progenitores da menor, quer do documento 15 junto com o requerimento datado de 5/12/2022, pois do mesmo conta declarações de que a menor ali foi assistida, onde também foi observada em consultas externas.

            Mas, quanto a nós, não se pode tirar a ilação pretendida pelo recorrente

                                                                       *

            Pretende o recorrente que seja aditado um ponto com o n.º 27, com a seguinte redação “A progenitora auferiu abono de família, atribuído pelo Estado Português, durante os anos de 2021 e 2022”

            Atendendo ao art.º 662.º, do C.P.C. e por tal facto poder ter pertinência para as várias soluções de direito, e tendo por base o art.º 63.º do requerimento datado de 1/10/2022 e ao teor do documento 13 junto com o requerimento datado de 5/12/2022, adita-se o mesmo. 

            Colocado a negrito e etálico no respetivo local

                                                                       *

            Este Tribunal tendo por base o mesmo preceito, adita ainda, o facto com o n.º 28 do teor colocado a negrito no respetivo local.

            Aqui chegados passemos ao ponto seguinte.

                                                                          **

B) - Saber se a decisão recorrida deve ser revogada e substituída por acórdão, que determine a competência dos Tribunais Portugueses para conhecer da presente ação.

            Como se evidencia do despacho recorrido o tribunal a quo propendeu para o entendimento de que se verificava a sua incompetência internacional para os termos da acção, por a residência habitual da menor ser na Polonia na companhia da mãe.

Deste entendimento dissente o recorrente alegando que o tribunal recorrido é o internacionalmente competente para a acção.
Quid iuris?

Como refere Manuel de Andrade, In Noções Elementares de Processo Civil, 1976, pág. 92, a competência internacional “é a competência dos tribunais portugueses no seu conjunto, em face dos tribunais estrangeiros. Verdadeiramente, do que se trata aqui é dos limites da jurisdição do Estado Português; de definir quando é que este se arroga o direito e se impõe o dever de exercitar a sua função jurisdicional”.

A questão de competência neste âmbito surge quando no pleito se desenham elementos em conexão com outra ordem jurídica, para além da portuguesa.

No caso em apreço, trata-se de saber se a questão submetida a tribunal deve ser resolvida pelos tribunais portugueses ou se pelos tribunais polacos, dado que são as duas ordens jurídicas em conexão.

Sobre esta matéria refere o art.º 59.º, do C.P.C. “Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62.º e 63.º ou quando as partes lhes tenham atribuído competência nos termos do artigo 94”.

Neste contexto, para determinar a competência internacional, importa recorrer ao Regulamento 2201/2003, do Conselho da União Europeia, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental (também denominado de Regulamento “Bruxelas II bis”), que vincula os Estados-Membros, com exceção da Dinamarca.

Este regulamento (entrado em vigor em 1 de Agosto de 2004 e aplicável a partir de 1 de Março de 2005, com exceção dos artigos 67º a 70º, que são aplicáveis desde aquela primeira data), surge no seguimento do Regulamento Bruxelas II (Regulamento n.º 1347/2000, do Conselho da União Europeia de 29 de Maio de 2000), e veio alargar as regras de reconhecimento mútuo e de execução do anterior regulamento a todas as decisões sobre responsabilidades parentais, garantir à criança o direito de manter o contacto com ambos os pais, e dissuadir o rapto parental das crianças dentro da Comunidade.

Trata-se de um texto de direito processual civil internacional, prevendo normas uniformes sobre competência judicial internacional (Capítulo II) e reconhecimento de decisões em matéria matrimonial e de responsabilidades parentais (Capítulo III), contendo ainda normas relativas à cooperação entre autoridades em matéria de responsabilidades parentais (capítulo V), cooperação esta facilitada pela criação da Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial.

No tocante ao seu âmbito espacial de aplicação, o Regulamento (CE) n.º 2201/2003, de 27/11, regula as decisões proferidas por tribunais de Estados-Membros, com exceção da Dinamarca (artigos 21º, n.º 1, e 2º, n.º 3), como se disse, e, relativamente ao seu âmbito material, aplica-se às matérias civis, relativas ao divórcio, à separação e à anulação do casamento e à atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental, entendendo-se por tal expressão o conjunto dos direitos e obrigações conferidos a uma pessoa singular ou coletiva, por decisão judicial, por atribuição de pleno direito ou por acordo em vigor relativo à pessoa ou aos bens de uma criança (cfr. artigo 2º, nº 7).

Nessa expressão inclui-se, em particular, o direito de guarda, o direito de visita, a tutela, a curatela e outras instituições análogas, bem como a designação e funções de qualquer pessoa ou organismo encarregado da pessoa ou dos bens da criança e da sua representação ou assistência, a colocação da criança ao cuidado de uma família de acolhimento ou de uma instituição e ainda as medidas de proteção da criança relacionadas com a administração, conservação ou disposição dos seus bens [cfr. artigo 1.º, nº 2 e art.º 1.º, nº 1, als. a) b)].

Caracterizado por Moura Ramos, In Estudos de Direito Internacional Privado e de Direito Processual Civil Internacional, II, Coimbra Editora, 2007, p. 146, como um direito «inclusivo», o direito comunitário constitui um sistema de normas disciplinadoras da vida jurídica da sociedade «comunitária», cuja aplicação se torna diretamente vinculativa na ordem interna dos Estados-Membros. Assim, o Regulamento (CE) nº 2201/2003, diretamente aplicável na nossa ordem jurídica, contém, entre o mais, regras diretas de competência internacional quanto às matérias nele abrangidas, estabelecendo, como regra geral, no seu artigo 8º nº 1 a competência dos tribunais do Estado-Membro em que a criança resida habitualmente à data em que seja instaurado processo relativo a responsabilidade parental, definida no seu artigo 2º nº 7 como “o conjunto dos direitos e obrigações conferidos a uma pessoa singular ou colectiva por decisão judicial, por atribuição de pleno direito ou por acordo em vigor relativo à pessoa ou bens de uma criança”, conceito que abrange, como expressamente afirmado, “o direito de guarda e o direito de visita”.

O princípio geral fundado no critério da «residência habitual» da criança mostra-se bem vincado no ponto 12 dos considerandos que antecedem a parte dispositiva do Regulamento (CE) nº 2201/2003, no qual se consagrou que:

As regras de competência em matéria de responsabilidade parental do presente regulamento são definidas em função do superior interesse da criança e, em particular, do critério da proximidade. Por conseguinte, a competência deverá ser, em primeiro lugar, atribuída aos tribunais do Estado-Membro de residência habitual da criança, exceto em determinados casos de mudança da sua residência habitual ou na sequência de um acordo entre os titulares da responsabilidade parental”.

Na verdade, a «residência habitual» da criança, enquanto critério atributivo da competência internacional, sofre desvios nos casos de prolongamento da competência do Estado-Membro da anterior residência habitual da criança (artigo 9º nº 1) – caso em que a criança se desloca legalmente e passa a ter residência habitual noutro Estado-Membro e o primeiro Estado-Membro conserva a competência durante os três meses seguintes à data da deslocação com vista a eventual alteração da decisão quanto ao direito de visita – de extensão da competência fixada para as ações de divórcio, de separação ou de anulação do casamento (artigo 12º nº 1) – hipótese em que é dada prevalência à competência por conexão – ou de extensão da competência por razão de especial ligação da criança a um Estado-Membro – o que pode acontecer caso exista acordo das partes no processo e essa competência seja exercida no superior interesse da criança (artigo 12º, nº 3).

Para além das situações acabadas de enunciar, uma outra afasta a referida regra geral de competência contida no artigo 8º nº 1, do Regulamento (CE) nº 2201/2003, como o evidencia o disposto no nº 2 do mesmo artigo.

 Trata-se do rapto da criança (artigo 10º), ou seja, de deslocação ou retenção ilícitas de uma criança, situação em que os tribunais do Estado-Membro onde residia habitualmente, antes da deslocação, se mantêm competentes, só cessando essa competência quando a criança passa a ter a sua residência noutro Estado-Membro e o titular do direito de guarda dá o seu consentimento à deslocação ou retenção ou desde que a criança esteja a residir no novo Estado-Membro durante, pelo menos, um ano e se encontre integrada no seu novo ambiente, sem que exista qualquer decisão que determine o seu regresso (alíneas a) e b)).

Em qualquer dos casos, a questão que se coloca é a da determinação do conceito aberto de «residência habitual» da criança para efeitos de aplicação da regra geral de competência estabelecida no Regulamento (CE) nº 2201/2003, cuja concretização se impõe, até por esta parecer constituir a questão nuclear colocada pelo recorrente.

A propósito do conceito de «residência habitual» à luz do referido Regulamento (CE) nº 2201/2003, escreveu Maria Helena Brito (in Estudos em Memória do Professor Doutor António Marques dos Santos, vol. I, Almedina, p. 323) que, na ausência de uma definição (cfr. artigo 2º), o mesmo “deve interpretar-se autonomamente, de acordo com a jurisprudência do TJCE (se bem que em domínios diferentes do da Convenção de Bruxelas de 1968), como «o local onde o interessado fixou, com a vontade de lhe conferir carácter estável, o centro permanente ou habitual dos seus interesses, entendendo-se que, para efeitos de determinação dessa residência, é necessário ter em conta todos os elementos de facto dela constitutivos».

Pronunciando-se no âmbito de um pedido de reenvio prejudicial sobre a interpretação do conceito de residência habitual na aceção dos artigos 8º e 10º do Regulamento (CE) nº 2201/2003 para efeito de determinação do tribunal competente para se pronunciar sobre questão relativa ao direito de guarda de uma criança deslocada licitamente pela mãe para Estado-Membro diferente daquele onde tinha a sua residência habitual, considerou o Tribunal de Justiça (Primeira Secção), por Acórdão de 22 de Dezembro de 2010 (acessível em http://curia.europa.eu/júris/document.jsf;jsessionid), que, não remetendo o regulamento expressamente para o direito interno dos Estados-Membros, a determinação daquele conceito há-de ser feita à luz das disposições e do objectivo do dito regulamento, nomeadamente do constante do seu considerando décimo segundo, daí ressaltando que “as regras de competência nele fixadas são definidas em função do superior interesse da criança, em particular do critério da proximidade”.

No mesmo aresto escreveu-se, ainda,  que, “A fim de que este superior interesse da criança seja respeitado da melhor forma, O Tribunal de Justiça já declarou que o conceito de «residência habitual», na acepção do artigo 8º nº 1 do regulamento, corresponde ao lugar que traduz uma certa integração da criança num ambiente social e familiar”. E mais adiante, que “para determinar a residência habitual de uma criança, além da presença física desta num Estado-Membro, outros factores suplementares devem indicar que essa presença não tem carácter temporário ou ocasional”.

Como factores suplementares podem considerar-se, nomeadamente, a duração, a regularidade, as condições e as razões da permanência no território de um Estado-Membro e da mudança, a nacionalidade da criança, a idade e, bem assim, os laços familiares e sociais que a criança tiver no referido Estado (neste sentido o Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção), de 2 de Abril de 2009).

Também a nossa jurisprudência se tem pronunciado no mesmo sentido (cfr. entre outros Ac.s do S.T.J. de 20/1/2009, proc.º n.º 08B2777, relatado por Garcia Calejo, de 26 de Janeiro de 2017, Processo n.º 1691/15.3T8CHV-A.G1.S1, relatado por Olindo Geraldes, Ac. da Rel. do Porto de 24 de Janeiro de 2022 – proc.º n.º1176/10.4TBVCD-A.P2, relatado por Manuel Domingos Fernandes e Ac. Rel. de Lisboa de 27 de outubro de 2022, proc.º n.º 12856/20.T8LSB-G-L1.8, relatado por Cristina Lourenço).

Ainda a respeito desta matéria, se pronunciaram António José Fialho, in Regime Geral do Processo Tutelar Cível Anotado, Almedina, 2021, pág. 136), onde refere “a residência é o lugar onde a criança reside habitualmente, ou seja, o local onde tem organizada a sua vida, com maior estabilidade, frequência, permanência e continuidade, onde desenvolve habitualmente a sua vida e se encontra radicada”. Mais explica (pág. 137) que “o critério da atribuição da competência em função da residência, com carácter de estabilidade, permanência e frequência, é também aquele que adequa as disposições de direito interno às disposições de direito convencional ou europeu que regulam a competência internacional (art.º 5º da Convenção da Haia de 1996 e 8º do Regulamento Bruxelas II bis)”.

Do mesmo modo, e fazendo apelo ao afirmado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27/6/2019 (relatado por Raimundo Queirós e disponível em www.dgsi.pt), “para efeitos de determinação da competência internacional dos tribunais portugueses, há que considerar que “a “residência habitual” de um menor é o local onde se encontra organizada a sua vida familiar em termos de maior estabilidade e permanência, onde desenvolve habitualmente a sua vida, em suma, onde está efetivamente radicado”.

No mesmo sentido vai o Ac. da Rel. de Lisboa, de 5/3/2020, relatado por Inês Moura, que “o elemento determinante para a aferição da competência internacional do tribunal em matéria das responsabilidades parentais relativa a uma criança (…) é o da residência habitual da criança, quer em face da Lei nacional, quer do direito internacional expresso na Convenção de Haia de 19 de Outubro de 1996.

Também nós advogamos tal entendimento, desde logo, por traduzir em especial uma ideia de estabilidade do domicílio, assente, designadamente, num conjunto de relações sociais e familiares, demonstrativas da integração na sociedade local. Tendo a criança a sua vida estabilizada num Estado-Membro é este que, em princípio, oferece melhores condições para proceder à regulação do exercício da responsabilidade parental, designadamente para a realização do inquérito às condições sociais, morais e económicas dos pais, que, nesta matéria, se reveste de inegável importância.

Assim, cabe ponderar se ao caso será de aplicar a regra geral, contida no art.º 8, do Regulamento (CE) nº 2201/2003, como se entendeu na sentença recorrida, ou se pelo contrário, teremos de aplicar ao caso em apreço, alguma das exceções aludidas no citado regulamento, designadamente a contida no art.º 10.º, de onde resulta que havendo deslocação ou retenção ilícitas de uma criança, os tribunais do Estado-Membro onde a criança tem residência habitual imediatamente antes daquelas deslocação ou retenção conservam a sua competência – art.º 10º, corpo; cessa esta continuação de competência quando, passando a criança a ter residência habitual noutro Estado-Membro, tal se verifique durante, pelo menos, um ano após a data em que do seu paradeiro tenha ou deva ter tomado conhecimento a pessoa titular do direito de guarda, verificando-se ainda, cumulativamente, o seguinte: a) estar a criança integrada no seu novo ambiente; b) não ter sido apresentado pelo mesmo titular, no prazo de um ano a contar daquele conhecimento, qualquer pedido de regresso da criança às autoridades do Estado-Membro para onde a criança foi deslocada ou se encontra retida – art.º 10º, corpo e al. b).

No caso em apreço, resulta que a mãe da menor levou-a para a Polónia em 17 de maio de 2022, onde permanece em Varsóvia com a progenitora, não tendo esta autorizado o seu regresso a Portugal com o pai. Tendo este, desde então, visitado a sua filha, pelo menos três vezes, na Polónia. Ao que acresce o facto de em 16/6/2023 ter sidoproferido sentença, ainda não transitada, no processo n.º ..., onde se ordenou o regresso a Portugal da menor AA.

Temos para nós, ainda que o documento (sentença supra aludida) sido admitida, para as várias soluções plausíveis de direito, não deve revelar para o caso em apreço, desde logo, por não transitada, e em caso de recurso, poder ou não ser revertida.

Porém, neste quadro coloca-se-nos, em primeira linha, a questão de saber, se o comportamento da mãe da menor será ilícito, e em caso afirmativo se poderá, ter interferência, na atribuição da competência internacional do Tribunal.

 Neste âmbito rege o artº. 3º da Convenção de Haia de 25 de outubro de 1980, que determina que “a deslocação ou a retenção de uma criança é considerada ilícita quando: a) Tenha sido efectivada em violação de um direito de custódia atribuído a uma pessoa ou a uma instituição ou a qualquer outro organismo, individual ou conjuntamente, pela lei do Estado onde a criança tenha a sua residência habitual imediatamente antes da sua transferência ou da sua retenção; e b) Este direito estiver a ser exercido de maneira efectiva, individualmente ou em conjunto, no momento da transferência ou da retenção, ou o devesse estar se tais acontecimentos não tivessem ocorrido.

O direito de custódia referido na alínea a) pode designadamente resultar quer de uma atribuição de pleno direito, quer de uma decisão judicial ou administrativa, quer de um acordo vigente segundo o direito deste Estado.”, sendo que, nos termos do  artº. 5.º da citada Convenção “O «direito de custódia» inclui o direito relativo aos cuidados devidos à criança como pessoa, e, em particular, o direito de decidir sobre o lugar da sua residência.”.

Feitos os considerandos, supra a respeito da matéria em causa, teremos de aferir, desde logo, qual era a residência habitual, da menor, antes do dia 17 de maio de 2022, na medida em que, foi a partir dessa data que a mãe da desta, não autorizou o seu regresso, a  Portugal, com o pai. Nas vezes anteriores a menor ia e vinha sem que houvesse, qualquer objeção, ao que acresce que a menor em 17 de maio de 2022, foi para a Polónia, por acordo de ambos os progenitores. Desde logo, para se analisar se a conduta da mãe da menor se enquadra no art.º 10.º, do regulamento (CE) nº 2201/2003, e na eventualidade assim ser, quais as consequências a retirar.

Face à matéria factual apurada, e, tendo por base os critérios, definidores do que é residência habitual, para efeitos de fixar a competência, não resulta, quanto a nós, onde a mesma, tinha essa residência, na medida em que ora estava em Portugal ora estava na Polónia (cfr. factos 4 a 10).

Assim, sendo, e independentemente, da conduta da progenitora ser ou não ilícita, quanto a nós, ao caso em apreço não se aplica o art.º 10 do regulamento (CE), citado, pelas razões que diremos.

O corpo do citado artigo refere “onde a criança residia habitualmente”, querendo, o legislador, quanto a nós, dizer que o preceito se aplica apenas, aos casos, onde se possa aquilatar, onde a criança tenha essa residência, sendo que no caso em apreço, tal não é possível, na medida em que, como resulta da matéria de facto provada, a mesma ora estava em Portugal, ora estava na Polónia. Compreende-se que assim seja, na medida em que todo o regulamento citado, gira, e bem, em torno do superior interesse da criança.

Nem se diga, que muito embora o corpo do citado 10.º utilize o termo “onde a criança reside habitualmente”, se aplica também, a situações onde não é possível definir essa residência, pois se assim fosse, certamente que o teria referido, pois por certo não desconhecia essas situações.  Aliás, da leitura do art.º 10.º no seu conjunto sempre alude à residência da criança.

Assim, pelo exposto, e face às razões supra aludidas não vemos razão para alterar a decisão recorrida, por ser na Polonia que a menor, tem desde, pelo menos 17 de maio de 2022, o seu centro de vida e o seu convívio (cfr. factos 22 a 24 e 26).

                                               ***

                                         4. Decisão

Pelo exposto, decide-se, por acórdão, julgar o recurso improcedente e manter a decisão recorrida.

 Custas a cargo do recorrente.

 Coimbra, 23/1/2024

Pires Robalo (relator)

Henrique Antunes (ajunto)

Falcão de Magalhães (adjunto)