Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4369/18.2T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: RAMALHO PINTO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
PROCESSO ESPECIAL EMERGENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO
FASE CONTENCIOSA
REGIME PROCESSUAL A SEGUIR
Data do Acordão: 12/18/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO DO TRABALHO DE LEIRIA – JUIZ 3
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 99º, 104º, 108º, 109º, 111º, 112º, 117º, 119º, 138º E 139º DO C. PROCESSO DO TRABALHO.
Sumário: I – O processo especial emergente de acidente de trabalho, nos termos do artº 99º do CPT, inicia-se por uma fase conciliatória dirigida pelo MºPº, na qual este magistrado procura certificar-se da verdade dos elementos constantes do processo, das circunstâncias em que o acidente ocorreu e das consequências do mesmo (lesões, sequelas e incapacidades sofridas pelo sinistrado) (artº 104º), fase essa que termina com uma tentativa de conciliação, na qual o MºPº promove o acordo das partes de harmonia com os direitos consignados na lei, tomando por base os elementos fornecidos pelo processo, nomeadamente o resultado de exame médico e as circunstâncias que possam influir na capacidade de ganho do sinistrado (artºs 108º e 109º).

II - Se o acordo for alcançado, o respectivo auto, além da identificação completa dos intervenientes, deve conter a indicação precisa dos direitos e obrigações que lhe são atribuídos e a descrição pormenorizada do acidente e dos factos que servem de fundamento aos referidos direitos e obrigações (artº 111º).

III - Na eventualidade de se frustrar a tentativa de conciliação, como sucedeu no âmbito dos presentes autos, no respectivo auto ficam consignados os factos sobre os quais tenha havido acordo, referindo-se expressamente se houve ou não acordo acerca da existência e caracterização do acidente, do nexo causal entre a lesão e o acidente, da retribuição do sinistrado, da entidade responsável e da natureza e grau da incapacidade atribuída (artº 112º, nº 1).

IV - De acordo com o disposto no artigo 119º, a fase contenciosa do processo emergente de acidente de trabalho pode iniciar-se de dois modos diferentes, com regimes diferentes, consoante o âmbito da discordância entre as partes na fase conciliatória do processo:

- quando na tentativa de conciliação apenas tiver havido discordância quanto à questão da incapacidade (artº 138º, nº 2), a fase contenciosa do processo inicia-se mediante requerimento do interessado que não se tiver conformado com o resultado do exame médico realizado na fase conciliatória do processo (artº 117º, nº 1, alínea b)), no qual formula pedido de junta médica.

Após segue-se a realização do exame pedido (artº 139º) e a sentença onde se fixa de modo definitivo a natureza, o grau de desvalorização do sinistrado e o valor da causa (artº 140º, nº 1);

- quando a questão da discordância entre as partes não é a anteriormente referida ou não é só essa, a fase contenciosa tem o seu início com a petição inicial, em que o sinistrado, doente ou respectivos beneficiários formulam o pedido, expondo os seus fundamentos (artº 117º, nº 1, alínea a), contra a entidade responsável, seguindo-se a citação (artº 128º), a contestação (artº 129º), a eventual resposta (artº 129º, nº 3 ), o saneamento e condensação processual (artº 131º), a instrução (artºs 63º e ss, por remissão do artº 131º, nº 2 ) – realizando-se exame por junta médica, se for caso disso (artº 138º, nº 1), o qual corre por apenso (artºs 131º, nº 1, alínea e) e 132º) – o julgamento e a sentença (artº 135º), em que se decide globalmente a causa.

V - No primeiro caso a tramitação é processualmente mais simples, uma vez que a única questão que se mantém em pé apenas demanda a realização de prova pericial (junta médica), pois a parte ou as partes não se conformaram com o resultado do exame efetuado pelo perito médico na fase conciliatória.

VI - No caso em apreço tem de se considerar que se verifica apenas discordância quanto à questão da incapacidade, pelo que a fase contenciosa do processo apenas poderia ter na sua base requerimento de exame por junta médica pela seguradora, como aconteceu.

VII - Como refere o recorrente, o que ficou por determinar, após a tentativa de conciliação, foi se o sinistrado, após a consolidação das lesões, havia ficado com incapacidade permanente (ou seja, necessariamente, com sequelas numa relação de nexo de causalidade com o acidente e as lesões sofridas) ou se sem incapacidade, curado sem desvalorização.

Decisão Texto Integral:   








                  Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

                    Nesta acção emergente de acidente de trabalho  em que é Autor L..., patrocinado pelo MºPº, e Ré / entidade responsável A..., Companhia de Seguros S.A, na  fase conciliatória o perito médico concluiu que, em consequência da queda sofrida, o sinistrado sofreu traumatismo do joelho esquerdo e que, consolidadas efectivamente as lesões em 6 de Novembro de 2018 (mesma data indicada pela Ré-seguradora), o sinistrado ficou com incapacidade permanente parcial de 1%, devido a ser portador das seguintes sequelas: “Membro inferior esquerdo: joelho seco sem instabilidade ligamentar com dor residual da face anterior e sinais menisco ligamentares negativos. Sem amiotrofia”.

          Em sede de tentativa de conciliação,  a Ré- seguradora  aceitou a ocorrência do acidente (nas circunstâncias de tempo, modo e lugar expressamente descritas no respetivo auto) e a sua caracterização como de trabalho, tendo também aceite que, do acidente, haviam resultado as lesões descritas no seu boletim de alta e no exame do GML e, assim, enquanto lesões, “torção/traumatismo do joelho esquerdo”.

                    Contudo, não aceitou conciliar-se por entender que o sinistrado não apresenta quaisquer sequelas do acidente (estando, assim, curado sem desvalorização) sendo as sequelas descritas na perícia médica de  natureza degenerativa, patologia pré-existente.

                    Consequentemente, a Ré-seguradora deu início à fase contenciosa do processo, requerendo a realização de exame por junta médica, ao abrigo do disposto nos artigos 117º, nº 1, al. a) e 138º, nº 2, do CPT (que expressamente invocou) pretensão que foi deferida por despacho de 7/02/2020, no qual se designou data para a sua realização.

                    Efectuado tal exame por junta médica, os peritos do Tribunal e do sinistrado foram de parecer que da torção/traumatismo do joelho esquerdo sofrido pelo sinistrado havia efectivamente resultado lesão meniscal, enquanto o perito da seguradora opinou no sentido de que se trata de problema degenerativo, pré-existente, não imputável ao acidente e ao traumatismo/torção sofrida a nível do joelho esquerdo.

                    Notificada do resultado do exame por junta médica, a Ré- seguradora responsável apresentou reclamação contra o relatório pericial, solicitando, a final, “a prestação de esclarecimentos pelos doutos peritos médicos, por ausência de fundamentação da decisão e contradição das respostas dadas, de forma a afastar a eventual nulidade cumprindo o douto parecer  pericial o seu fim (artigo 484º e 485º do CPC”.

                    Foi, então, proferido o seguinte despacho:

                    “A Seguradora deu início à fase contenciosa nos termos da al. b) do nº 1 do art. 117º CPT, com a apresentação do requerimento para realização de junta médica, a que se reporta o nº 2 do art. 138º do referido diploma.

                        Todavia, compulsados os autos, verifica-se que as divergências entre as partes na fase conciliatória deste processo exorbitaram da “mera” questão da incapacidade do sinistrado, por estar em causa o apuramento/verificação de um nexo de causalidade entre as sequelas apresentadas pelo Autor e o evento ocorrido, entendendo aquela que tais sequelas derivam de doença degenerativa, pré-existente à data do acidente; assim, deveria o Autor dar início a esta fase com a apresentação da petição inicial a que se refere a al. a) do nº 1 do art. 117º do CPT, expondo os fundamentos da acção e concluindo pela formulação do respectivo pedido, não podendo a acção, de ora em diante, prosseguir com o requerimento apresentado pela Seguradora (que só por lapso, do qual nos penitenciamos, foi admitido), aproveitando-se, se disso caso for, a junta médica já realizada.

                        Assim, e tendo já decorrido o prazo previsto no art. 119º, nº 4 do CPT sem que tivesse sido apresentada a referida petição inicial, sendo certo que sempre seria necessário dar início à fase contenciosa para se decidirem as questões suscitadas nos autos (cfr. arts. 119º, nº 1, 126º, nº 1 e 138º, nº 2, este a contrario), suspende-se a presente instância pelo prazo de 30 dias, em conformidade com o disposto no art. 119º, nº 4 do CPT.

                        Decorrido tal prazo, sem que nada seja requerido, proceda-se ao arquivamento condicional dos autos”.

                                                 x
                    Inconformado, veio o Autor interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:

                    1º- Decorre dos artigos 138º, n.º 2 e 117º, n.º 1, al. a) do CPT que, se na tentativa de conciliação apenas tiver havido discordância quanto à questão da incapacidade, a fase contenciosa do processo tem por base (apenas) requerimento de Junta Médica do interessado que se não conformar com o resultado da perícia médica realizada na fase conciliatória do processo para efeitos de fixação de incapacidade para o trabalho.

                        2º- Ao mencionar a “questão da incapacidade” o artigo 138º, n.º 2 referido não se limita ao grau de desvalorização, mas engloba nessa expressão também e pelo menos as sequelas.

                        3º- A questão da incapacidade é indissociável da questão das sequelas (que estejam numa relação de nexo de causalidade com o acidente e as lesões sofridas), constituindo as duas faces da mesma moeda.

                        4º Na perícia médica, sem sequelas do acidente não pode haver atribuição de incapacidade permanente para o trabalho, o que equivale a dizer que para a atribuição de incapacidade permanente é absolutamente necessário a identificação de sequelas do acidente.

                        5º -Sempre que na perícia médico-legal realizada na fase conciliatória se atribui um determinado grau de desvalorização permanente, essa atribuição tem na sua base, necessariamente, a identificação de determinadas sequelas que o Sr. Perito médico considera numa relação de causalidade com o acidente e as lesões dele resultantes, socorrendo-se, ainda, para a fixação do grau de incapacidade atribuído da respetiva previsão e graduação na TNI.

                        6- No caso dos autos, na tentativa de conciliação, a seguradora responsável tomou posição no sentido de que, consolidadas as lesões, o sinistrado ficou sem incapacidade permanente (CSD) entendendo, assim, necessariamente, que do acidente, em relação causal com o mesmo, não sobrevieram quaisquer sequelas para o sinistrado e, desse modo, que as sequelas descritas na perícia médica realizada na fase conciliatória e consequente incapacidade permanente fixada em 1%, não podem ser atribuídas (não estão numa relação de nexo de causalidade) ao acidente.

                        7º - Essa divergência quanto ao resultado da perícia médica realizada na fase conciliatória reconduz-se a uma mera divergência quanto à incapacidade, nos termos e para os efeitos dos artigos 138º, n.º 2 e 117º, n.º 1, al. a), pelo que a fase contenciosa do processo apenas poderia ter na sua base requerimento de exame por Junta Médica pela seguradora.

                        8º - Assim o entendeu efetivamente a seguradora, que, no caso dos autos, deu início à fase contenciosa do processo requerendo a realização de exame por Junta Médica, ao abrigo dos artigos 138º, n.º 2, e 117º, n.º 1 , al. b), pretensão que foi deferida, com a efetiva realização de Junta Médica.

                        9º. Ao determinar posteriormente a suspensão da instância, por despacho de 15 de julho de 2020, ora em crise, a M.ma Juiz a quo fez uma incorreta interpretação e violou o preceituado nos artigos 117º, nº 1, al b) e 138º, n.º 2 do CPT.

                        10º- Em consequência, concedendo-se procedência ao recurso, deve o despacho recorrido ser revogado e ser determinando o prosseguimento dos autos, com a apreciação, como deveria ter sido, do requerimento apresentado pela seguradora, por via do qual esta apresentou reclamação relativamente ao resultado da Junta Médica realizada nos autos.

                    Não foram apresentadas contra-alegações.

                    Foram colhidos os vistos legais.

                                                           x       

                    Definindo-se o âmbito do recurso pelas suas conclusões,  temos, como única questão em discussão, a de saber se havia lugar, como se decidiu, à suspensão da instância, por não estar em causa apenas a questão da incapacidade do sinistrado, devendo o Autor dar início à fase contenciosa com a apresentação da petição inicial a que se refere a al. a) do nº 1 do artº 117º do CPT.

Como factualidade relevante temos a descrita no relatório do presente acórdão.

                    O direito:

                    Como se viu, o despacho recorrido entendeu que  as divergências entre as partes na fase conciliatória deste processo exorbitaram da única questão da incapacidade do sinistrado, por estar em causa o apuramento/verificação de um nexo de causalidade entre as sequelas apresentadas pelo Autor e o evento ocorrido, entendendo a Ré-seguradora que tais sequelas derivam de doença degenerativa, pré-existente à data do acidente. Como tal, deveria o Autor ter dado início à fase contenciosa com a apresentação da petição inicial a que se refere a al. a) do nº 1 do artº 117º do CPT, não podendo os autos prosseguir na sequência da apresentação do requerimento a que se reporta o nº 2 do artº 138º do referido diploma, embora aproveitando-se a junta médica realizada.

                    Com isto não se conforma o recorrente, que argumenta que a divergência quanto ao resultado da perícia médica realizada na fase conciliatória se reconduz a um mero desacordo quanto à incapacidade, pelo que a fase contenciosa do processo apenas poderia ter na sua base requerimento de exame por junta médica, como aconteceu.
                    Há que conceder razão ao recorrente.

                    O processo especial emergente de acidente de trabalho, nos termos do artº 99º do CPT (diploma a que pertencerão as disposições que se passam a citar sem menção de origem), inicia-se por uma fase conciliatória dirigida pelo MºPº, na qual este magistrado procura certificar-se da verdade dos elementos constantes do processo, das circunstâncias em que o acidente ocorreu e das consequências do mesmo (lesões, sequelas e incapacidades sofridas pelo sinistrado) (artº 104º), fase essa que termina com uma tentativa de conciliação, na qual o MºPº promove o acordo das partes de harmonia com os direitos consignados na lei, tomando por base os elementos fornecidos pelo processo, nomeadamente o resultado de exame médico e as circunstâncias que possam influir na capacidade de ganho do sinistrado (artºs 108º e 109º).

Se o acordo for alcançado, o respectivo auto, além da identificação completa dos intervenientes, deve conter a indicação precisa dos direitos e obrigações que lhe são atribuídos e a descrição pormenorizada do acidente e dos factos que servem de fundamento aos referidos direitos e obrigações (artº 111º).

                    Na eventualidade de se frustrar a tentativa de conciliação, como sucedeu no âmbito dos presentes autos, no respectivo auto ficam consignados os factos sobre os quais tenha havido acordo, referindo-se expressamente se houve ou não acordo acerca da existência e caracterização do acidente, do nexo causal entre a lesão e o acidente, da retribuição do sinistrado, da entidade responsável e da natureza e grau da incapacidade atribuída (artº 112º, nº 1).

    De acordo com o disposto no artigo 119º, a fase contenciosa do processo emergente de acidente de trabalho pode iniciar-se de dois modos diferentes, com regimes diferentes, consoante o âmbito da discordância entre as partes na fase conciliatória do processo:

    - quando na tentativa de conciliação apenas tiver havido discordância quanto à questão da incapacidade (artº 138º, nº 2), a fase contenciosa do processo inicia-se mediante requerimento do interessado que não se tiver conformado com o resultado do exame médico realizado na fase conciliatória do processo (artº 117º, nº 1, alínea b)), no qual formula pedido de junta médica.

    Após segue-se a realização do exame pedido (artº 139º) e a sentença onde se fixa de modo definitivo a natureza, o grau de desvalorização do sinistrado e o valor da causa (artº 140º, nº 1);

    - quando a questão da discordância entre as partes não é a anteriormente referida ou não é só essa, a fase contenciosa tem o seu início com a petição inicial, em que o sinistrado, doente ou respectivos beneficiários formulam o pedido, expondo os seus fundamentos (artº 117º, nº 1, alínea a), contra a entidade responsável, seguindo-se a citação (artº 128º), a contestação (artº 129º), a eventual resposta (artº 129º, nº 3 ), o saneamento e condensação processual (artº 131º), a instrução (artºs 63º e ss, por remissão do artº 131º, nº 2 ) – realizando-se exame por junta médica, se for caso disso (artº 138º, nº 1), o qual corre por apenso (artºs 131º, nº 1, alínea e) e 132º) – o julgamento e a sentença (artº 135º), em que se decide globalmente a causa.

    No primeiro caso a tramitação é processualmente mais simples, uma vez que a única questão que se mantém em pé apenas demanda a realização de prova pericial (junta médica), pois a parte ou as partes não se conformaram com o resultado do exame efetuado pelo perito médico na fase conciliatória.

                    Ora, no caso em apreço, tem de se considerar que se verifica apenas discordância quanto à questão da incapacidade, pelo que a fase contenciosa do processo apenas poderia ter na sua base requerimento de exame por junta médica pela seguradora, como aconteceu.
                    É o seguinte o teor do auto de tentativa de conciliação:

                    “Assim, e em face do exposto, pelo Exmo. Senhor Procurador da República foi proposto o seguinte

                                                           ACORDO

                        A seguradora responsável pagará ao sinistrado:

                        1- o capital de remição calculado com base na pensão anual no montante de €70,16 reportada a 07-11-2018 e calculada com base no salário anual auferido e transferido de €10.022,30 e na desvalorização de 1,00% , atrás referida, nos termos do disposto no artº 48º nº 3 al. c) e artº 75º, nº 1 da Lei 98/2009 de 4 de Setembro e de acordo com a base técnica de calculo de remição das pensões de acidente de trabalho, anexa à Portaria nº 11/2000, de 13 de Janeiro.

                        2 - a quantia de €10,00 a título de despesas efectuadas com deslocações obrigatórias a este Tribunal e ao Gabinete Médico-Legal.

                        3 - Juros de mora á taxa legal sobre o capital de remição indicado em 1 e demais quantias em dívida desde 07-11-2018, até integral pagamento;

                        PELO SINISTRADO foi dito: que concorda com os elementos acima descritos pelo Ministério Público e com o teor do auto de exame médico do Gabinete Médico-Legal, nomeadamente com o coeficiente de desvalorização ali indicado e com a data da alta, pelo que aceita conciliar-se nos termos do acordo proposto.

                        PELA LEGAL REPRESENTANTE DA A... COMPANHIA DE SEGUROS S.A : foi dito que aceita:

                        - a existência e caracterização do acidente como de trabalho nas circunstâncias de tempo, modo e lugar acima descritos;

                        - que dele resultaram, directa e necessariamente, as lesões descritas no seu boletim de alta, a fls. 26 dos autos, e, assim, como aí se refere e consta igualmente do exame do GML, enquanto lesões, torção/traumatismo do joelho esquerdo.

                        - a data da alta (6-11-2018), tendo o sinistrado ficado curado sem desvalorização

                        - a responsabilidade com base no salário anual transferido de €10.022,30.

                        - pagar ao sinistrado a quantia de €10,00 a título de despesas efectuadas com deslocações obrigatórias a este Tribunal e ao Gabinete Médico-Legal, caso venha a ser a atribuída IPP ao sinistrado.

                        - Não aceita conciliar-se porquanto:

                        - os serviços clínicos da sua representada entendem que o sinistrado ficou curado sem desvalorização na data referida, concluindo que, de acordo com a informação clinica de que dispõe, a lesão do menisco, e assim as sequelas descritas no exame do GML, têm natureza degenerativa, não tendo resultado do Acidente de Trabalho participado, configurando uma patologia já pré existente”.

                    Ou seja, a seguradora aceitou expressamente a existência e caracterização do acidente como de trabalho, que, como consequência directa do mesmo, o sinistrado sofreu lesão, consistindo em torção/traumatismo do joelho esquerdo, e  que a consolidação da lesão ocorreu em 6/11/2018.
                    Todavia, não aceitou as sequelas dessa lesão, já que entendia que tais sequelas têm natureza degenerativa. Não está em causa a lesão que o Autor - sinistrado apresenta, mas apenas o grau de  desvalorização arbitrado. E foi este que levou a  Ré- seguradora a não se conciliar.

                    Assim sendo, e como refere o recorrente, o que ficou por determinar, após a tentativa de conciliação, foi se o sinistrado, após a consolidação das lesões, havia ficado com incapacidade permanente (ou seja, necessariamente, com sequelas numa relação de nexo de causalidade com o acidente e as lesões sofridas) ou se sem incapacidade, curado sem desvalorização.

                    Seguindo nós, por não haver fundamento para dele divergir, o decidido no acórdão desta Relação e secção social de 27/11/2008, proferido no proc. 26/07.3TTLRA.C1, que se pronunciou sobre situação em que, na tentativa de conciliação, apenas tinha havido discordância quanto ao grau de incapacidade permanente e também quanto às sequelas, temos que aí se escreveu, de relevante, para este caso, que, ao mencionar a “questão da incapacidade”, o artº 138º, nº 2, do CPT, não se limita ao grau de desvalorização, englobando também nessa expressão pelo menos as sequelas.
                    E, no caso do autos, limitando-se a divergência a saber se as sequelas das lesões apresentados pelo sinistrado são de natureza degenerativa ou são consequência da lesão que o sinistrado apresenta- e que, repete-se, a seguradora aceitou - estamos perante uma questão de incapacidade, a dirimir com a necessária ajuda técnica de entidade mais vocacionado para isso- os peritos médicos.

                    Mais uma vez se concorda com o recorrente quando afirma que, na perícia médico-legal, sem sequelas do acidente não pode haver atribuição de incapacidade permanente - para a atribuição de incapacidade permanente é absolutamente necessária a identificação de sequelas.

                    O que está em causa continua a ser, apenas, divergência quanto à questão da incapacidade e, necessariamente (porque para haver incapacidade tem que haver sequelas) quanto à existência ou não de sequelas.
                    Procede, assim, o recurso.        

                    Decisão:

                    Nesta conformidade, acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se o despacho recorrido, que deverá ser substituído por outro que determine o prosseguimento dos autos, com a apreciação do requerimento apresentado pela seguradora, por via do qual esta apresentou reclamação relativamente ao resultado da junta médica realizada nos autos, sendo proferida posterior decisão nos termos do artº 140º, nº 1, do CPT.
                    Sem custas o recurso.

                                                 Coimbra, 18/12/2020