Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
737/08.6TMAVR-E.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: APENSAÇÃO DE PROCESSOS
FUNDAMENTAÇÃO
DECISÃO JUDICIAL
Data do Acordão: 10/29/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA – JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DE AVEIRO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ANULADA
Legislação Nacional: ARTºS 158º E 275º, Nº 1 DO CPC DE 1961; 154º, Nº 1, E 267º, Nº 1 DO NCPC; 205º, Nº 1 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA.
Sumário: I – A junção de processos obedece a dois objectivos: a economia de actividade processual; a coerência ou a uniformidade de julgamento.

II - A apensação tem como consequência a instrução, a discussão e o julgamento conjunto das causas conexas e não a extinção de um dos processos apensados.

III - Os princípios estruturantes da legalidade do processo e do dever de fundamentação valem, por inteiro, na providência tutelar cível de alteração da regulação das responsabilidades parentais, com processo especial de jurisdição voluntária.

IV - Apenas a ausência absoluta de qualquer fundamentação constitui causa de nulidade substancial da decisão.

V - Independentemente da nulidade substancial da sentença, por falta de fundamentação, à Relação é lícito, no exercício dos seus poderes de controlo sobre a matéria de facto, mesmo oficiosamente, cassá-la sempre, por exemplo quando repute deficiente a matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação dessa matéria, i.e., quando se tenha verificado a omissão do julgamento de determinado facto ou quando entenda que deve ser produzida prova sobre factos alegados pelas partes que não foram sujeitos ao exercício da prova.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

1. Relatório.
D… propôs, no Juízo de Família e Menores de Estarreja, da Comarca do Baixo Vouga, através de requerimento apresentado por via electrónica no dia 24 de Dezembro de 2012, contra P…, providência tutelar cível de alteração da regulação das responsabilidades parentais, com processo especial de jurisdição voluntária, relativas à filha de ambos, A…, nascida no dia 12 de Junho de 2002 – a que foi atribuído o nº 907/12 – pedindo a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais.
Alegou, como fundamento desta pretensão, que, por decisão transitada em julgado no âmbito do processo que correu termos no Tribunal de Família e Menores de Lisboa, a guarda e o poder paternal da criança lhe foram atribuídos, tendo ficado prevista a possibilidade de fins-de-semana em alternatividade e um regime relativamente às férias de Carnaval, Páscoa, Natal e Verão.
Que o requerido, desde que a filha passou a viver em Aveiro, nunca exerceu o seu direito a visitas quinzenais, nem passou com a menor as férias do Carnaval; que nas férias da Páscoa e de Verão foi quase sempre a requerente a levar a menor a casa do pai para passar alguns dias com ele, suprindo a ausência do requerido, que casou, no dia 30 de Setembro de 2012, com …
Que a requerente casou há alguns anos, tendo deste casamento três filhos.
Que a menor convive bem com esta nova realidade familiar e estabeleceu laços de grande proximidade e cumplicidade com o actual marido da requerente, e que no próximo ano iria residir para o Brasil, tendo cumprido o dever de informação a que está obrigado e comprometido-se a manter o requerido informado acerca das circunstâncias da vida da menor.

O requerido foi citado para alegar o que tivesse por conveniente, por carta registada com aviso de recepção assinado por pessoa diversa, devolvido pelo serviço postal no dia 15 de Janeiro de 2013 e, por despacho de 8 de Janeiro de 2013, ordenou-se, a requerimento da requerente, a remessa do processo para o Juízo de Família e Menores de Aveiro, para correr por apenso ao processo nº 737/08.

P… propôs, no Juízo de Família e Menores de Aveiro, da Comarca do Baixo Vouga, através de requerimento apresentado por via electrónica no dia 26 de Dezembro de 2012, contra D…, providência tutelar cível de alteração da regulação das responsabilidades parentais, com processo especial de jurisdição voluntária, relativas à filha de ambos, A…, nascida no dia 12 de Junho de 2020 – a que foi atribuído o nº 504/12 - pedindo se determinasse, como medidas provisórias e cautelares, a proibição da menor de se ausentar do território nacional e a alteração da sua guarda e residência, bem como a titularidade em comum com a mãe das responsabilidades parentais.
Fundamentou esta pretensão no facto de na sentença proferida pelo 4º Juízo, 2ª secção, Tribunal de Família e Menores de Lisboa, no dia 24 de Novembro de 2003, que regulou o exercício do poder paternal da criança, ter ficado estabelecido que esta seria entregue à guarda e cuidados da mãe, com a qual residiria e a qual exerceria quanto à mesma o poder paternal; de a requerida ir ausentar-se, definitivamente, para o Brasil, pretendo levar consigo a filha; e de entender que a saída definitiva da sua filha para o estrangeiro, para a acompanhar a mãe, não corresponde ao melhor bem-estar nem defende os seus superiores interesses, pelo que não a autoriza, já que a menor tem, desde o nascimento, as suas raízes culturais e familiares em Portugal, vivendo em Lisboa; além de que o requerente, os seus avós paternos, a avó materna, irmãos, tios e primos, e de a deslocação da menor para o Brasil não será a melhor forma de defender os interesses da criança, dado que a mãe tem em Portugal um estatuto socioeconómico compatível com a sua função – Juíza dos Julgados de Paz – e não tem qualquer informação sobre a situação sociocultural e económica da filha no estrangeiro.
O aviso de recepção da carta registada expedida para citar a requerida para alegar o que tivesse por conveniente foi assinado por aquela no dia 14 de Janeiro de 2013.
 Na alegação que ofereceu na providência proposta por D…, P… arguiu a excepção dilatória própria da litispendência e, com fundamento no facto de a primeira ter sido citada para o processo nº 504/12, em data anterior ao processo nº 737/08, pediu que a alteração da regulação das responsabilidades parentais prosseguisse naquele primeiro processo.
Por sua vez, D…, na alegação que produziu no processo da providência nº 504/12, alegou igualmente a excepção dilatória da litispendência. 
Por despacho de 12 de Fevereiro de 2013, proferido no processo nº 504/12, ordenou-se a apensação deste ao nº 737/08, indeferiu-se o pedido de P… de proibição da filha se ausentar do território nacional e também – por a progenitora ser a figura primária de referência – o pedido de alteração da guarda e residência da criança.
Por despacho proferido no dia 13 de Janeiro de 2013, no processo nº 737/08, indeferiu-se o pedido de P… de proibição da filha se ausentar do território nacional e também – por a progenitora ser a figura primária de referência – o pedido de alteração da guarda e residência da criança e convidou-se os progenitores a apresentarem acordo de alteração, no prazo de 10 dias.
Por requerimento apresentado por via electrónica no processo nº 737/08, no dia 20 de Fevereiro de 2013, P… alegou que se verificava a excepção da litispendência entre os dois pedidos e que o processo nº 737/08 deveria ceder ao processo nº 504/12, pelo que deveria ter sido arquivado ou seguir como apenso a este último, e que tendo o processo nº 504/12 merecido despacho de apensação ao processo nº 737/08, tal configurava uma irregularidade processual face ao disposto no artº 499 do CPC, que se impunha rectificar.
Porém, por despacho proferido no dia 7 de Março de 2013 – cuja notificação às partes foi elaborada no dia 8 do mesmo mês - o Sr. Juiz de Direito decidiu que os pedidos formulados em ambos os processos são distintos. Daí inexistir a invocada excepção de litispendência.
D… declarando-se disponível para a celebração de acordo, reformulou a sua proposta, nestes termos:
 A menor passará então 15 dias de férias no mês de Julho, de acordo com a interrupção escolar, com o pai, que diligenciará pelas correspondentes passagens aéreas e eventual necessária companhia de bordo, responsabilizando-se pela partida e chegada da filha ao aeroporto de Lisboa.
A menor passará 30 dias de férias, entre os meses de Dezembro e Janeiro de acordo com a interrupção escolar, com o pai, a acordar com a mãe até 31 de Março de cada ano, responsabilizando-se a mãe pelas correspondentes passagens aéreas e eventual necessária companhia de bordo, e o pai pela eventual necessidade de partida e chegada da filha ao Aeroporto de Lisboa.
Para além do referido período de 30 dias a marcar, mantém-se em vigor o actual regime das férias de Natal, bem como a sua alternância, sendo a véspera de Natal e o dia de Natal alternadamente passados com cada progenitor, fazendo coincidir um mínimo de 10 dias com cada acontecimento, ou seja, 10 dias até à consoada do dia 24 de Dezembro com um progenitor e desde a manhã do dia 25 durante 10 dias com o outro progenitor, indo o pai buscar e entregar a filha a casa da mãe, em Aveiro, em data e hora a acordar com a mãe, com pelo menos 48 horas de antecedência.
Respeitando e mantendo a alternância do actual regime das férias de Natal, no ano de 2013, a filha estará com o pai o período mínimo de 10 dias que antecedem a véspera de Natal, e desde a manhã do dia de 25 de Dezembro por um período de 10 dias, com a mãe, e assim sucessiva e alternadamente. No ano seguinte trocarão de posição nos referidos períodos.
Porém, P…, depois de declarar que não aceitava a alteração do regime de visitas da filha proposto pela progenitora, requereu a continuação dos trâmites do processo até final e, designadamente, que nos termos no artº 178 nº 3 da OTM se ordenasse a realização de inquérito sobre a situação social moral e económica da requerente, do requerido e da menor, e que se fosse entendido e adequado e no interesse superior do menor, fosse ordenada a realização de exames médicos e psicológicos necessários para o esclarecimento da personalidade da requerente, do requerido e da filha menor, bem como da avaliação dos efeitos das suas relações mútuas, na personalidade e no desenvolvimento da criança, a ter lugar em instituição própria – o Instituto de Medicina Legal.
Pelo Sr. Juiz de Direito foi, então, proferida esta decisão:
Indefiro as diligências pedidas pelo Requerido pai nos pontos 1 e 2 do requerimento de 21/03/2013 (fls. 115), por não me parecerem úteis ou indispensáveis para a boa decisão da causa – art.ºs 147º-B, nº 3 e 147º-E, nº 2, ambos da O.T.M.
O Requerido pai declara não aceitar (fls. 98) a proposta de alteração do regime de visitas apresentada pela Requerente mãe no requerimento de 11/03/2013 (fls. 93 a 95), mas não apresenta outra modalidade alternativa, parecendo insistir na mudança da guarda da criança, pretensão que já lhe foi indeferida por sentença proferida a 12/02/2013 no Processo apenso “F”.
A Digna Magistrada do Ministério Público elaborou douto Parecer pugnando que a proposta apresentada pela Requerente mãe com vista à alteração do regime de visitas da filha ao progenitor e requerido P… é consentânea com o superior interesse da criança, atendendo às suas actuais circunstâncias, salvaguardando-se de forma adequada e equilibrada o direito da filha estar e conviver com o pai.
Considerando que a filha encontra-se a residir com a Requerente mãe na República Federativa do Brasil, também me parece que a proposta apresentada pela Requerente mãe se mostra razoável, em face das circunstâncias, razão pela qual se acolhe na íntegra tal proposta.
Assim, decido desde já alterar a regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente à criança A…, nascida a 12/06/2002, filha de D… e de P…, apenas no concernente ao direito de visita, da seguinte forma, sem prejuízo de qualquer outro acordo que pontualmente os progenitores venham a fazer entre eles:
1 - A criança passará então 15 dias de férias no mês de Julho, de acordo com a interrupção escolar, com o pai, que diligenciará pelas correspondentes passagens aéreas e eventual necessária companhia de bordo, responsabilizando-se pela partida e chegada da filha ao aeroporto de Lisboa.
2 - A criança passará 30 dias de férias, entre os meses de Dezembro e Janeiro de acordo com a interrupção escolar, com o pai, a acordar com a mãe até 31 de Março de cada ano, responsabilizando-se a mãe pelas correspondentes passagens aéreas e eventual necessária companhia de bordo, e o pai pela eventual necessidade de partida e chegada da filha ao Aeroporto de Lisboa.
3 - Para além do referido período de 30 dias a marcar, mantém-se em vigor o actual regime das férias de Natal, bem como a sua alternância, sendo a véspera de Natal e o dia de Natal alternadamente passados com cada progenitor, fazendo coincidir um mínimo de 10 dias com cada acontecimento, ou seja, 10 dias até à consoada do dia 24 de Dezembro com um progenitor e desde a manhã do dia 25 durante 10 dias com o outro progenitor, indo o pai buscar e entregar a filha a casa da mãe, em Aveiro, em data e hora a acordar com a mãe, com pelo menos 48 horas de antecedência.
4 - Respeitando e mantendo a alternância do actual regime das férias de Natal, no ano de 2013, a filha estará com o pai o período mínimo de 10 dias que antecedem a véspera de Natal, e desde a manhã do dia de 25 de Dezembro por um período de 10 dias, com a mãe, e assim sucessiva e alternadamente, respeitando-se a regra da alternância, rotatividade e igualdade.
               
É justamente esta decisão – cuja notificação às partes foi elaborada no dia 29 de Maio de 2013 - que o pai da criança, P…, impugna através do recurso ordinário de apelação, no qual pede a sua revogação e a sua substituição por outra que determine o prosseguimento dos autos.
O recorrente extraiu da sua alegação – oferecida por via electrónica no dia 26 de Junho de 2013, na qual, como ponto prévio ao objecto do recurso, sob a epígrafe litispendência, salienta que o requerimento que produziu no dia 20 de Fevereiro de 2013 não mereceu qualquer atendimento análise ou rectificação, pelo que se mantém a ordenada apensação - estas conclusões:

Na resposta, a apelada, depois de observar que os despachos de 13 de Fevereiro e de 7 de Março 2013, transitaram em julgado, por serem autonomamente recorríveis, dado que a sua impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil – concluiu pela improcedência do recurso.
Por sua vez, o Ministério Público, depois de declarar que acompanhava o contexto das alegações da recorrida, concluiu que a decisão recorrida deveria ser mantida na íntegra.
2. Factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso.
Os factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso são os relativos ao conteúdo das alegações e requerimentos das partes, à dinâmica processual e ao conteúdo da decisão impugnada, que o relatório documenta.
3. Fundamentos.
3.1 Delimitação objectiva do âmbito do recurso[1].
O âmbito do recurso é determinado, antes de mais, pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida. Dentro do objecto do processo e com observância dos casos julgados formados na acção, o âmbito do recurso delimita-se objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente, âmbito que pode ainda ser restringido pelo próprio recorrente, no requerimento de interposição do recurso ou nas conclusões da alegação (artºs 684 nº 2, 1ª parte, e nº 3 do CPC).
O recurso ordinário não pode, desde logo, incidir sobre matéria sobre a qual se formou, na instância recorrida, caso julgado[2].
Uma das questões que, sob a epígrafe, ponto prévio, da litispendência, o recorrente suscitou na sua alegação, respeita a ausência de atendimento, análise ou rectificação do tribunal a quo no tocante ao requerimento que apresentou no dia 20 de Fevereiro de 2013, no qual alegou que se verificava a excepção da litispendência entre os dois pedidos e que o processo nº 737/08, deveria ceder ao processo nº 504/12, pelo que deveria ter sido arquivado ou seguir como apenso a este último, e que tendo o processo nº 504/12, merecido despacho de apensação ao processo nº 737/08, tal configurava uma irregularidade processual face ao disposto no artº 499 do CPC, que se impunha rectificar.
Todavia, a apelada salienta, na sua resposta ao recurso, que a questão da litispendência foi decidida pelos despachos de 13 de Fevereiro e de 7 de Março de 2013, respectivamente, que transitaram em julgado, por se tratar de decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil, sendo, portanto, extemporânea a sua alegação no recurso que decidiu do mérito da causa.
A providência tutelar cível de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais mais não é que uma nova regulação desse exercício (artº 182 nº 1, in fine, do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro).
                A providência tutelar cível de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais visa, naturalmente, regular de novo a função parental, em todos ou apenas em alguns dos três aspectos essenciais em que se desdobra: a fixação da residência da criança, os direitos de visita do progenitor com quem não resida habitualmente e os alimentos devidos que lhe são devidos e o modo da sua prestação (artºs 1905 e 1906, nº 5 do Código Civil e 180, nºs 1 e 2 do Decreto Lei nº 314/78, de 27 de Outubro).
                Contudo, nem sempre a regulação dos interesses conflituantes pode aguardar o proferimento de uma decisão definitiva do tribunal, que resolva, de modo definitivo, o conflito. Por vezes, torna-se necessário obter uma composição provisória da situação controvertida antes da decisão definitiva.
                Nos termos gerais, tal composição justifica-se sempre que ela seja necessária para assegurar a utilidade da decisão ou a efectividade da tutela jurisdicional (artºs 2 nº 2, in fine, do CPC de 1961 e 2 nº 2, in fine, do NCPC, ex-vi 161 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro, e 157 nº 1 deste último diploma legal).
                A tutela processual provisória decorrente das decisões provisórias e cautelares é instrumental perante as situações jurídicas decorrentes do direito substantivo, porque o direito processual é meio de tutela dessas situações. A composição provisória realizada através da providência cautelar não deixa de se incluir nessa instrumentalidade, porque também ela serve os fins gerais de garantia que são prosseguidos pela tutela jurisdicional[3].
                Maneira que na pendência da providência de alteração da regulação do cuidado parental pode mostrar-se necessário acautelar certos efeitos dessa regulação ou definir regimes provisórios relativamente a alguns desses efeitos. Isso justifica a consagração legal de algumas providências provisórias e cautelares específicas que podem ser cumuladas com o respectivo processo definitivo (artº 157 nº 1 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro).
                Algumas dessas providências provisórias e cautelares concorrem com as providências cautelares comuns: assim, por exemplo, o progenitor que pretenda que seja fixado um regime provisório de alimentos relativamente ao filho menor pode requerê-lo quer através da providência cautelar comum quer através da decisão provisória (artºs 399 do CPC de 1961 e 284 do NCPC e 157 nº 1 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Out.)[4]. Há, no entanto, uma diferença significativa entre essas categorias de providências. Com efeito, ao contrário do que sucede quanto às providências cautelares comuns, aquelas providências cautelares especiais são reguladas segundo critérios de conveniência. E segundo critérios de conveniência num duplo sentido: quanto ao conteúdo da decisão; quanto à iniciativa, necessidade e momento do seu proferimento (artºs 157 nº 1 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro, e 1410 do CPC de 1961 e 987 do NCPC, ex-vi artº 150 do primeiro diploma legal).
                Quer num caso quer noutro trata-se nitidamente de providências de antecipação, visto que atribuem, em substância, através da antecipação da tutela requerida ou pretendida, o mesmo efeito jurídico que se pode obter na composição definitiva.
                Como quer que seja, exacto é sempre que na providência tutelar cível de alteração da regulação das responsabilidades parentais é admissível sempre que haja necessidade de assegurar a utilidade da decisão e a efectividade da tutela jurisdicional, uma composição provisória de índole cautelar de qualquer das vertentes em que o cuidado parental é juridicamente decomponível (artº 157 nº 1 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro).
Ora, o despacho de 13 de Fevereiro de 2013 estatuiu sobre dois objectos: a apensação de processos; a providência cautelar e provisória requerida pelo recorrente.
Se se tem por certo que a decisão desta última questão era susceptível de apelação autónoma – quer por ter recusado a concessão da providência, quer por ter posto termo ao respectivo incidente – o mesmo não ocorre no tocante à decisão da questão da apensação (artº 691 nº 2 j) e l) do CPC). Aliás, o recorrente não impugna, no seu recurso, a decisão relativa à recusa da concessão da providência cautelar – mas apenas a relativa à apensação dos processos. De resto, a impugnação da decisão que negou o decretamento da providência seria, de todo, inútil, visto que – como linearmente decorre da alegação do recorrente – a criança já se encontra a residir no Brasil (artºs 137 do CPC de 1961 e 130 do NCPC).
Entra as decisões que admitem apelação autónoma – i.e., apelação que pode ser interposta, independentemente de qualquer outro recurso de outra decisão, no prazo de 15 dias – contam-se aquelas cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil (artº 691 nº 2 m) e 3 do CPC).
A jurisprudência exige, porém, que a inutilidade da impugnação decorra da criação de uma situação irreversível, irreversibilidade que se não confunde com a mera probabilidade de a procedência do recurso implicar a anulação ou a inutilização de parte do processo[5].
Mas não é seguramente o caso tanto da decisão que ordena a apensação, por uma certa ordem de processos, como da decisão que julga improcedente a excepção dilatória própria da litispendência.
A decisão do tribunal superior que concedesse provimento ao recurso – ainda que dessa procedência resultasse uma inutilização mais ou menos extensa de parte do processo - não seria em qualquer dos casos absolutamente inútil e sempre aproveitaria ao recorrente: tanto no caso como noutro, a decisão do tribunal ad quem, caso o recurso procedesse, sempre seria útil para o recorrente, alterando, no primeiro caso, a ordem de apensação dos processos e, no segundo, absolvendo o impugnante da instância de uma das causas litispendentes.
Portanto, por este motivo, qualquer daquelas decisões não era autonomamente apelável, podendo, por isso, ser impugnadas com o recurso interposto da decisão final (artºs 691 nº 1 e 3 do CPC).
Simplesmente, como se notou, a delimitação do âmbito – subjectivo ou objectivo - do recurso é feita pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo, aliás, o tribunal superior conhecer de matéria não incluída nas conclusões (artº 684 nº 3 do CPC).
 Ora, no caso, apesar de no corpo da alegação do recurso, o recorrente se referir à questão da litispendência, a verdade é que nas conclusões com que a rematou omitiu, de todo, qualquer menção a essa questão, limitando-se a reiterar a relativa à apensação dos processos.
Portanto, o recorrente restringiu, nas conclusões da sua alegação o objecto do recurso à decisão que ordenou a apensação dos processos e, evidentemente, à decisão de regulação do exercício do cuidado parental, que pôs termos à causa.
Através da restrição apontada, o recorrente renunciou tacitamente à impugnação da decisão interlocutória relativa à excepção dilatória da litispendência, limitando o objecto do recurso à decisão que ordenou a apensação dos processos das providências e à sentença final da causa, restrição de que decorre o trânsito em julgado de todas as decisões interlocutórias anteriores, designadamente da que conheceu da excepção dilatória da litispendência (artºs 677 do CPC de 1961 e 628 do NCPC, e 681 nº 3, 2ª parte, do CPC e 217 do Código Civil). E, em face desse trânsito em julgado, é claro que o recurso não pode incidir sobre a matéria dessa excepção dilatória que, por constituir res judicata que se tem, neste processo, por irrepetivelmente decidida (artº 672 nº 1 do CPC de 196 e 620 nº 1 do NCPC).
Um outro fundamento da impugnação consiste no facto de a causa em vez de prosseguir os termos marcados na lei, designadamente com a realização da conferência dos pais, ter logo, após as alegações liminares, sido julgada.
Esta alegação do recorrente é inteiramente exacta.
Notou-se já que a alteração da regulação das responsabilidades parentais – que mais não é do que uma nova regulação dessas mesmas responsabilidades - é actuada num processo qualificado, ex-vi legis, como de jurisdição voluntária (artºs 150 e 183 nº 1, in fine, do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro).
                O formalismo do processo de que há-de servir-se quem pede a alteração da regulação do cuidado parental, posto em esquema, é o seguinte: requerimento contendo os fundamentos do pedido de alteração; citação do requerido para alegar o que tiver por conveniente; junta esta alegação, ou expirado o prazo do seu oferecimento, o juiz decide se o pedido é ou não infundado ou desnecessária a alteração; caso julgue que o pedido é fundado ou a alteração necessária, o juiz deve designar dia para a conferência de pais com vista à obtenção de uma decisão negociada da alteração; caso se fruste uma decisão contratualizada, os pais são logo notificados para alegarem o que tiverem por conveniente quanto á alteração – alegação com a qual deverão propor as provas; oferecida esta alegação, ou extinto o direito de oferecer, procede-se a inquérito sobre a situação dos pais e às perícias julgadas necessárias para esclarecer a personalidade e o carácter dos membros da família e dinâmica das suas relações recíprocas; se for oferecida àquela alegação, efectuadas as diligências necessárias, há lugar à audiência de discussão e julgamento (artº 182 nºs 1 a 4, 1ª parte, e 174 a 179 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Out., ex-vi artº 182 nº 4, 2ª parte, do mesmo diploma legal). Finda a produção das provas, o juiz declara, por decisão fundamentada, que factos julga provados ou não provados e, por fim, profere a sentença (artº 302 nº 1, ex-vi artº 1409 nº 1 do CPC de 1961, e 295, ex-vi artº 986 do NCPC, ex-vi artº 150 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro).
                Ora, no caso, o processo sofreu uma compressão e um entorse deveras notáveis, dado que, sem qualquer transição, passou da alegação(ões) de resposta ao(s) requerimento(s) de alteração – para a sentença final. Não foi realizada a conferência com os pais - nem praticado um único acto de instrução, não se procedeu à audiência de discussão e julgamento, não se decidiu a matéria de facto, etc.
Tem-se por evidente que um tal desvio não pode justificar-se pelo carácter de jurisdição voluntária ou graciosa que a lei assinala ao processo da providência.
Um dos princípios estruturantes do processo civil - i.e., dos princípios que lhe são conaturais e, por isso, lhe são indispensáveis - é decerto, o princípio da legalidade, que reparte em dois subprincípios: princípio da legalidade das formas processuais; princípio da legalidade da decisão.
No tocante à marcha do processo, de harmonia com o princípio da legalidade das formas processuais, o processo pode ser rígido, pode ter a sua marcha fixada na lei, ou flexível, por a sua marcha poder ser estabelecida pelas juiz ou pelas próprias partes. O processo civil português é, em regra, um processo rígido: a marcha do processo é aquela que estiver fixada na lei.
A regra apenas admite uma excepção, determinada pelo juiz. De harmonia com a previsão específica vigente ao tempo da proposição da providência e do proferimento da decisão impugnada, em caso de inadequação da tramitação processual às especificidades da causa, o juiz devia, mesmo oficiosamente, e depois de ouvidas as partes, determinar a prática dos actos que melhor se ajustassem ao fim do processo e introduzir as necessárias adaptações (art.º 265-A do CPC de 1961). Assim, o juiz tanto pode prescindir da realização de actos impostos pela lei, como impor a prática de actos não previstos na lei[6]. O princípio mantém-se no Código de Processo Civil vigente, que lhe assinala como finalidade última - correcta mas talvez desnecessariamente - a garantia do carácter equitativo do processo. A adequação formal deve, pois, ser actuada de modo a assegurar um processo equitativo ou justo, i.e., um processo que permita a aplicação correcta da lei a factos verdadeiros, portanto um processo orientado pelos princípios do direito à igualdade de posições no processo, do direito de defesa e de contraditório, do direito a prazos razoáveis de acção e de recurso, do direito à fundamentação das decisões, do direito à decisão em tempo razoável, do direito à prova, do direito ao conhecimento de dados processuais, do direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas, etc. (artºs 547 do NCPC e 20 nº 4 da Constituição da República Portuguesa). 
 Sempre que haja necessidade de adequar a tramitação processual às especificidades da causa, o juiz deve proceder à adequação formal: mas deve fazê-lo sempre com inteiro respeito e com o objectivo último de assegurar as várias dimensões que densificam o princípio do processo equitativo.
O princípio da legalidade da decisão diz-nos que, em regra, o tribunal deve decidir segundo a lei, ou seja, indicar, interpretar e aplicar as normas correspondentes (art.º 659 nº 2 do CPC de 1961, e 607 nº 3 do NCPC).
Por força deste princípio, o julgamento do tribunal deve fundamentar-se, exclusivamente, nos critérios legais, embora os critérios que fundamentam a decisão possam ser normativos, quando são extraídos de uma norma jurídica, ou não normativos quando se reconduzem à equidade ou a poderes discricionários (artºs 4 do Código Civil, 1410 do CPC de 1961 e 987 do NCPC).
 Excepção relevante ao princípio da legalidade do conteúdo da decisão são, pois, os processos de jurisdição voluntária, dado que nestes processos as resoluções assentam num critério de conveniência e de oportunidade (artºs 1410 do CPC 1961 e 987 do NCPC).
O distinguo entre os processos de jurisdição voluntária - ou graciosa - e os processos de jurisdição litigiosa ou contenciosa assenta, nitidamente, no critério de decisão.
Seja qual for, em definitivo, a natureza que se deva assinalar aos processos de jurisdição voluntária, o seu regime diverge do regime geral dos processos contenciosos, desde logo, em dois pontos essenciais:
a) Predomínio, quanto ao objecto do processo, do princípio do inquisitório sobre o dispositivo, dado que o tribunal pode investigar livremente os factos, não estando limitado aos factos articulados pelas partes, como sucede, por regra, no processo contencioso (artºs 264 nº 1, 664, 2ª parte, e 1409 nº 2 do CPC de 1961, 5 nº 1 e 986 nº 2 do NCPC).
b) Predomínio da conveniência sobre a legalidade, porque nas providências a tomar não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adoptar em cada caso a solução que julgue conveniente e oportuna (artºs 1410 do CPC de 1961 e 987 do NCPC).
Apesar de subjacente ao critério de distinção entre os processos de jurisdição voluntária e os processos contenciosos, parecer estar a ideia de que nos processos de jurisdição graciosa não se deve aplicar tanto o direito como critérios de conveniência e oportunidade, a verdade é que uma tal ideia é algo simplista e quadra mal a toda uma constelação de casos ou situações que se podem configurar. Assim, por exemplo, o juiz - ou o conservador do registo civil - não pode decretar o divórcio por mútuo consentimento sem se verificarem os pressupostos exigidos pela lei substantiva civil (artºs 1775 nº 1 e 1794 do Código Civil). Identicamente, verificados esses requisitos tanto o juiz como o conservador não podem deixar de decretar esse mesmo divórcio, sob o pretexto de que, no caso, a dissolução do vínculo não é conveniente ou oportuna.
Um tal entendimento negaria a juridicidade - dado que nega a imperatividade em face do tribunal - a vastas zonas do direito privado, sobretudo do direito da família e do direito comercial, que são actuadas através de processos de jurisdição voluntária. Sendo isto exacto, então há que dar àquele critério um outro significado.
Realmente, a lei não diz que o tribunal de jurisdição voluntária escapa ao império da lei sempre que profere quaisquer decisões - mas só quando toma providências. Há, assim, condicionalismos perante os quais a lei só reconhece uma solução como admitida e lícita.
Em face de regimes imperativos - preceptivos ou proibitivos - o juiz está vinculado à solução legal, sem que lhe possa aproveitar os critérios não normativos representados pelos poderes discricionários (artºs 1410 do CPC de 1961 e 987 do NCPC).
Pode, porém, suceder que a lei tenha um sentido permissivo ou genérico: em tal caso, actua, em toda a sua plenitude, o artº 1410 do CPC de 1961 e 987 do NCPC. Na subsunção de casos concretos a conceitos indeterminados e a princípios regulativos - como, por exemplo, o interesse da criança - e na sua aplicação a casos concretos pode também o tribunal deixar-se guiar por critérios de conveniência e oportunidade, sendo que é muitas vezes a própria lei que inculca a remissão de uma determinada decisão para o prudente arbítrio do juiz (v.g., artº 1901 nº 2 do Código Civil).
O princípio da legalidade das formas processuais vale, em toda a sua extensão, também para a providência de regulação das responsabilidades parentais, com processo especial de jurisdição voluntária tutelar cível: a sua tramitação tem a forma legalmente estabelecida que se impõe às partes e ao tribunal, não podendo a sua marcha ser determinada pelas partes – nem mesmo pelo tribunal, dado que, por ser comprovadamente adequado à especificidade do seu objecto - a regulação, ex-novo ou não, das responsabilidades parentais – não deixa qualquer espaço para a actuação do princípio da adequação.
Na espécie sujeita é patente que a sentença impugnada violou, ostensiva e extensivamente, este princípio.
Simplesmente, a ofensa do princípio da legalidade das formas processuais inclui-se na cláusula geral das nulidades processuais (artºs 201 do CPC de 1961 e 195 do NCPC): dada a importância do princípio, é indiscutível que a sua inobservância pelo tribunal é susceptível de influir no exame ou decisão da causa. Portanto, no caso, dada a supressão da prática de todo um conjunto de actos impostos pela lei, é clara a comissão pelo tribunal a quo de uma nulidade.
Trata-se, porém, de uma nulidade inominada ou secundária – e não de uma nulidade da sentença, sujeita a um numerus clausus - que só é apreciada mediante reclamação da parte interessada na repetição ou eliminação do acto e que deve ser alegada no prazo de 10 dias a contar de qualquer intervenção da parte na acção ou da sua notificação para qualquer termo do processo, sempre que a parte não esteja presente no momento em que ela foi cometida (artºs 153 nº 1, 202, 2ª parte, 203 nº 1 e 205 nº 1 do CPC de 1961, 149, 195, 196, 2ª parte, e 199 nº 1 do NCPC)[7]. Esta nulidade deve ser imediatamente julgada pelo tribunal após a resposta da contraparte (artºs 206 nº 3 e 207 nº 1 do CPC de 1961 e 196 nº 3 e 201 do NCPC).
Ora, o que pode ser impugnado no recurso é uma decisão do tribunal a quo anterior, pelo que é claro que a parte não pode aproveitar esse recurso para suscitar ex-novo uma qualquer questão que deveria ter colocado em momento anterior. Assim, no caso de nulidades cometidas na 1ª instância, o que pode ser impugnado por via do recurso é a decisão que conhecer da reclamação por nulidade – e não a nulidade ela mesma. A perda do direito à impugnação por via da reclamação – v.g., por caducidade – importa a extinção do direito à impugnação por via do recurso ordinário.
Isto só não é assim no tocante às nulidades cujo prazo de arguição comece a correr depois da expedição do recurso para o tribunal ad quem e no tocante às nulidades que sejam de conhecimento oficioso e de que seja lícito conhecer em qualquer estado do processo, enquanto não devam considerar-se sanadas, dado que estas últimas constituem objecto implícito do recurso, pelo podem ser sempre alegadas no recurso ainda que anteriormente o não tenham sido (artº 205 nº 3 do CPC de 1961 e 199 nº 3 do NCPC).
Mas não é isso, decerto, o que sucede com a nulidade resultante da violação do princípio da legalidade das formas processuais. Uma tal nulidade não é de conhecimento oficioso e o prazo de arguição esgotou-se antes mesmo da expedição do recurso para esta Relação.
Efectivamente, na espécie sujeita é claro que o recorrente tomou conhecimento da nulidade alegada no momento em que foi notificado da sentença impugnada, dado que nesse momento tomou necessariamente consciência que, sem a observância da tramitação marcada na lei, tinha sido proferida a sentença final da causa.
Dado que a notificação daquela sentença foi elaborada no dia 29 de Maio de 2013 mas recorrente só arguiu a nulidade na alegação do seu recurso – oferecida no dia 26 de Junho do mesmo ano – é irrecusável a extinção, por caducidade, do direito de reclamar contra ela (artºs 144 nºs 1 a 3, 145 nºs 1 e 3 e 153 nº 1 do CPC de 1961, e 138 nº 1, 139 nºs 1 a 3 e 149 do NCPC).
A nulidade apontada – além de não constituir fundamento e objecto admissível do recurso – deve, por isso, considerar-se sanada ou suprida.
Maneira que as questões concretas controversas que importa resolver são as de saber se:
a) O despacho que ordenou a apensação do processo da providência proposta pelo recorrente ao processo da providência instaurada pela recorrida deve ou não ser revogado e substituído por outro que ordene o arquivamento deste último processo ou, ao menos, que inverta a ordem de apensação;
b) A decisão final da causa, que alterou o exercício da regulação das responsabilidades parentais deve ou não ser revogada e logo substituída por outra que ordene o prosseguimento da instância.
Nestas condições, a resolução do problema enunciado vincula, naturalmente, à ponderação, ainda que breve, dos pressupostos e dos efeitos da junção de causas ou de processos, do princípio estruturante do processo civil - de qualquer processo civil - do dever de fundamentação dos actos decisórios do tribunal e do valor negativo que decorre da violação deste último dever e, por último, dos poderes de controlo desta Relação no tocante à decisão da matéria de facto da 1ª instância.
3.2. Pressupostos e efeitos da junção de processos.
Na hipótese de se proporem separadamente acções que, por força da admissibilidade do litisconsórcio, da coligação, da oposição ou da reconvenção, poderiam ser reunidas num único processo, será ordenada a junção delas a requerimento de qualquer das partes, ainda que pendam em tribunais diferentes, a não ser que o estado do processo ou outra razão especial contra-indique a apensação (artºs 275 nº 1 do CPC de 1961 e 267 nº 1 do NCPC).
                A junção não está, porém, dependente de instância da parte no caso de os processos conexos penderem perante o mesmo juiz: neste caso, a apensação pode ser determinada ex-offício, embora deva ser precedida de audição das partes (artºs 275 nº 3 do CPC de 1961 e 267 nº 4 do NCPC).
                O fundamento da junção de processos é a conexão. As causas são juntas para se obterem dois benefícios: a economia de actividade processual; a coerência ou a uniformidade de julgamento.
                Dado que a apensação tem como consequência que as causas conexas são instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente, é clara a economia de meios. Todavia, a vantagem que sobreleva é, seguramente, a do julgamento uniforme, dado que se evita a as causas sobre questões idênticas ou ao menos conexas, sejam decididas de modo diverso e, porventura, contraditório.
A razão justificativa da junção por conexão será, pois, antes de tudo, de economia processual.
Mas não só, pois a ela acrescem – quando não mesmo se sobrepõem – razões de boa administração da justiça – juntando processos será provavelmente mais esgotante a produção probatória e respectiva cognição – e mesmo de prestígio das decisões – pois desaparecerá o perigo de uma pluralidade de decisões sobre questões idênticas ou conexas se contradizerem materialmente: a unificação de processos tem como consequência natural que a sentença é só uma para as várias causas que se juntarem; todas elas hão-de, por isso, ser decididas, pelo mesmo juiz, no mesmo acto jurisdicional.
                Como a lei não fixa qualquer limite directo quanto ao momento até ao qual se pode provocar a junção, pareceria que a apensação poderia ser decretada, a requerimento ou oficiosamente, em qualquer altura. Todavia, os fundamentos da apensação – a economia de actividade e a uniformidade do julgamento – traçam um limite inultrapassável: o julgamento da causa que se pretende apensar ou da causa a que a apensação devia fazer-se.
                Realmente, as causas reúnem-se para que possam ser instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente, no mesmo momento e acto; ergo, a junção não tem qualquer justificação nem utilidade, se uma das causas já está julgada. Numa palavra: a apensação só deve operar no tocante a processos pendentes. Conclusão que, aliás, é imposta não apenas pelos fundamentos finais da apensação, mas pelo teor literal da lei, como linearmente decorre da exigência de que os processos pendam, o que, por certo, não ocorre quando já tenham sido julgados (artº 275 nºs 1 e 2, in fine, 3 e 4, do CPC de 1961 e 367 nºs 1 nºs 1 e 2, 3 e 4 do NCPC).
                A apensação também não deve ser ordenada, a requerimento ou oficiosamente, quando uma das causas esteja de tal modo adiantada em relação à outra que a junção se resolva para a primeira num atraso considerável. Esta conclusão é imposta pela exigência de que o estado do processo não torne inconveniente a apensação (artº 275 nº 1, in fine, do CPC de 1961 e 267 nº 1, in fine, do NCPC).
Sempre que a junção importe, por exemplo, uma dilação desrazoável no julgamento de uma das causas conexas – e, portanto, não seja compensada pelos benefícios da apensação – esta não deve ser ordenada.
                E qual o processo a que os outros têm de ser apensados?
                Responde a lei: os processos apensam-se ao que foi instaurado em primeiro lugar – i.e., aquele cuja petição inicial primeiro deu entrada na secretaria judicial – excepto se os pedidos foram dependentes uns dos outros, caso em que a apensação há-de obedecer à ordem de dependência (artºs 267 nº 1 e 275 nº 2 do CPC de 1961, e 259 nº 1 e 267 nº 1 do NCPC).
Assim, na espécie do recurso – desde que se entendeu, discutivelmente, que a pendência simultânea de ambos os processos conexos não configurava um caso de litispendência – estava realmente indicado que se procedesse à sua apensação, sendo lícito ao juiz ordená-la oficiosamente, dado que ambos os processos pediam perante ele. E como os processos não são dependentes mas homótropos e o processo instaurado em primeiro lugar foi o da providência proposta pela recorrida, era a este que o processo da providência promovida pelo recorrente deveria ser apensado.
De resto – ao contrário do que supõe o recorrente – a apensação não tem por efeito, em caso algum, a extinção – arquivamento – de um dos processos conexos. O efeito da junção é, limitadamente, antes a instrução, a discussão e julgamento conjunto e concentrado de ambas as causas.
Quanto a este ponto, o recorrente não tem razão e, portanto, neste segmento, a impugnação deve, pois, improceder.
3.3. Princípio do dever de fundamentação.
Princípio estruturante do processo civil é também o do dever de fundamentação.
Uma importante garantia das partes é constituída pelo dever de fundamentação das decisões judiciais (artºs 205 nº 1 da Constituição da República Portuguesa e 158 do CPC de 1961 e 154 nº 1 do NCPC). Essa fundamentação permite conhecer os elementos considerados relevantes para a decisão e, por essa via, possibilita o controlo da sua coerência e racionalidade.
Toda e qualquer decisão do tribunal – despacho, sentença, acórdão – comporta, sempre, dois elementos essenciais: os fundamentos e a decisão. Os fundamentos incluem a matéria de facto relevante e o regime jurídico que lhe é aplicável; a decisão em sentido estrito contém a conclusão que se extrai da aplicação do direito aos factos.
Uma das funções essenciais de toda e qualquer decisão judicial é convencer os interessados do bom fundamento da decisão. A exigência de motivação da decisão destina-se a permitir que o juiz ou juízes convençam os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz ou juízes devem passar de convencidos a convincentes.
E para obrigar o juiz a reflectir pessoalmente sobre as razões apresentadas pelos litigantes, robustecendo a força de persuasão e da pacificação social da decisão, a lei não hesita em condenar expressamente a mera adesão do juiz, como fundamentação do despacho, da sentença ou do acórdão, aos fundamentos alegados pelas partes, seja no requerimento ou na oposição (artº 158 nº 2 do CPC de 1961, e 154 nº 1, 1ª parte, do NCPC). É o juiz que compete, sempre, a última palavra sobre qualquer pretensão, processual ou material, através do principal acto do tribunal: a decisão, que outra coisa não é que o acto de que extrai uma consequência jurídica da matéria de facto e de direito apreciada.
                Compreende-se facilmente este dever de fundamentação, pois que os fundamentos da decisão constituem um momento essencial não só para a sua interpretação – mas também para o seu controlo pelas partes da acção e pelos tribunais de recurso[8].
                A motivação constitui, portanto, a um tempo, um instrumento de ponderação e legitimação da decisão judicial e, nos casos em que seja admissível – como sucede na espécie sujeita - de garantia do direito ao recurso.
                A exigência de fundamentação decorre, pois, desde logo, da necessidade de controlar tanto a coerência interna como a correcção externa da decisão.
A coerência ou justificação interna da decisão reporta-se à sua coerência com as respectivas premissas de facto e de direito, dado que a decisão não pode ser logicamente válida se não for coerente com aquelas premissas.
A correcção ou justificação externa da decisão diz respeito à correcção da construção das suas premissas de facto e de direito: ainda que a decisão se mostre coerente com aquelas premissas e, por isso, seja logicamente válida, a decisão não pode ser correcta se aquelas premissas não tiverem sido obtidas correctamente.
                Todavia, o dever funcional de fundamentação não está orientado apenas para a garantia do controlo interno - partes e instâncias de recurso - do modo como o juiz exerceu os seus poderes. O cumprimento daquele dever é condição mesma de legitimação da decisão.
                Na motivação da decisão o juiz deve desenvolver uma argumentação justificativa da qual devem resultar as boas razões que fazem aceitar razoavelmente a decisão, numa base objectiva, não só para as partes, mas também – num plano mais geral – para toda a comunidade jurídica. Na motivação, o juiz deve demonstrar a consistência dos vários aspectos da decisão, que vão desde a determinação da verdade dos factos na base das provas, até à correcta interpretação e aplicação da norma que se assume como critério do julgamento. Da motivação deve resultar particularmente que a decisão foi tomada, em todos os seus aspectos, de facto e de direito, de maneira racional, seguindo critérios objectivos e controláveis de valoração, e, portanto, de forma imparcial[9]. Dito doutro modo: a decisão não deve ser só justa, legal e razoável em si mesma: o juiz está obrigado a demonstrar que o seu raciocínio é justo e legal, e isto só pode fazer-se emitindo opiniões racionais que revelem as premissas e inferências que podem ser aduzidas como bons e aceitáveis fundamentos da decisão[10].
                A fundamentação da decisão é, pois, essencial para o controlo da sua racionalidade. Pode mesmo dizer-se que esta racionalidade é uma função daquela fundamentação. E como a racionalidade da decisão só pode ser aferida pela sua fundamentação, esta fundamentação é constitutiva dessa mesma racionalidade.
                Ora, é exactamente da violação, pela sentença impugnada, deste dever de fundamentação, que o recorrente se queixa, e de que decorre, no seu ver, o vício grave da nulidade substancial que lhe assaca.
3.4. Nulidade da decisão impugnada.
A recorrente imputa à decisão recorrida o vício da nulidade substancial. Valor negativo que, no seu ver, tem esta causa precisa: a falta de fundamentação. Na decisão impugnada – diz o recorrente – é total a ausência de fundamentação e de indicação das provas e do exame crítico das mesmas.
                A falta de motivação ou fundamentação verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. A nulidade decorre, portanto, da violação do dever de motivação ou fundamentação de decisões judiciais (artº 208 nº 1 da CRP e 158 nº 1 do CPC de 1961 e 154 nº 1 do NCPC).
No entanto, quanto a este ponto, há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação – da motivação deficiente, medíocre ou errada. O dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (artº 158 nº 1 do CPC de 1961 e 154 nº 1 do NCPC)[11].
                Tem-se, porém, entendido que o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação[12]; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente: afecta o valor doutrinal e persuasivo da decisão – mas não produz nulidade[13]. Portanto, só a ausência total de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão: se a decisão invocar algum fundamento de facto ou de direito – ainda que exasperadamente errado - está afastada a nulidade, no tocante à justificação fáctica e jurídica da decisão. Assim, pelo que respeita aos fundamentos de direito, não é forçoso que o juiz cite os textos da lei que abonam o seu julgado: basta que aponte a doutrina legal ou os princípios jurídicos em que se baseou.
                Depois, o tribunal não está vinculado a analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as considerações, todas as razões jurídicas produzidas pelas partes, desde que não deixe de apreciar os problemas fundamentais e necessários á decisão da causa[14].
Feita uma leitura, ainda que meramente obliqua, da decisão recorrida, o primeiro ponto que fere a atenção, é a falta absoluta ausência de discriminação dos factos considerados provados – e igualmente dos julgados não provados. Deve, todavia, entender-se que a simples falta de individualização dos fundamentos de facto não produz nulidade,[15] dado que a lei associa este valor negativo não à falta de discriminação dos factos – mas à sua ausência absoluta na sentença.
E, no caso, a sentença impugnada, contém, ainda que de forma indiscriminada, pelo menos dois factos: os relativos à idade da criança e à residência desta com a mãe no Brasil.
É verdade que, com excepção dos factos à residência da criança no Brasil e à idade desta, a decisão impugnada não contém qualquer outra fundamentação de facto, a exposição de qualquer facto relevante para a decisão, como, por exemplo, os relativos as condições socioeconómicas e culturais actuais da criança e dos pais, à dinâmica da relação recíproca dos vários membros da família, etc.
Dado que o objecto da providência é constituído pela alteração da regulação das responsabilidades parentais os factos relevantes para a decisão são, decerto, a data de nascimento da criança, a superveniência, objectiva ou puramente subjectiva, de factos susceptíveis de justificar a modificação da regulação, a situação económica, social e cultural, actual da criança e dos pais, a vontade manifestada pela criança, etc.
E a razão que explica a ausência da especificação dos factos julgados provados e não provados já foi apontada: a de não se ter procedido à produção de qualquer prova, a qualquer acto de instrução da causa, dado que o processo transitou da fase liminar das alegações das partes relativas aos fundamentos do pedido de alteração para a fase da decisão final – sem que sequer se tenha realizado a conferência com os pais.
A sentença impugnada especifica, no tocante ao indeferimento da prova proposta pelo recorrente, normas jurídicas que julgou aplicáveis, e relativamente ao – fundamental - objecto material da providência – a alteração da regulação das responsabilidades parentais – aquela decisão adianta, como justificação de direito, o princípio regulativo pertinente: o interesse da criança (artºs 1901 e 1906 do Código Civil).
Tendo em consideração a particular delicadeza e importância da situação jurídica objecto da providência – cuja decisão pode constituir um marco determinante na vida de uma criança – é claro que a fundamentação adiantada pela sentença impugnada para justificar a decisão nela contida, é notoriamente parca e mesmo exasperadamente avara. Porém, desde que nela se indicam ao menos alguns factos e algumas razões de direito, há que concluir que não omitiu, em absoluto, os fundamentos de uma e de outra espécie, e, portanto, que não se encontra ferida com o desvalor da nulidade. Uma coisa é a insuficiência dos factos para apreciar a situação jurídica objecto da causa, outra, bem diferente, é a ausência absoluta da sua indicação.
 Não há, por isso, fundamento para, por esse motivo, cassar a sentença impugnada.
De resto, essa anulação não resolveria todos os problemas, visto que por o processo – por ausência absoluta de instrução - não conter os mínimos elementos para permitir a actuação, por esta Relação, dos seus poderes de substituição, apenas importaria o reenvio do processo para a instância recorrida para que nela seja proferida outra decisão que observasse, com a pontualidade indicada na lei, o apontado dever de fundamentação de facto (artº 715 nº 1 do CPC). Todavia, não se vê, em face da omissão absoluta da instrução da causa, como é que o tribunal a quo poderia suprir, com consciência e correcção, a omissão da fundamentação de facto.
Embora se não deva ter por substancialmente nula, a verdade é que quanto à questão essencial em torno da qual gravita o conflito da recorrente e do recorrido, a decisão impugnada se limita à indicação de que a criança se encontra a residir na República Federativa do Brasil, e a aderir, na íntegra, à proposta de alteração da regulação formulada pela recorrida – que o recorrente foi terminante em recusar – por também lhe parecer que se mostra razoável, em face das circunstâncias.
                Tem-se por axiomático que estes dois factos são, de todo, insuficientes para, de forma minimamente conscienciosa, resolver a questão objecto da providência.
Decididamente não se julga suficiente para se decidir um aspecto tão relevante do futuro de uma criança apenas estes dois factos: a idade dela e a sua residência actual em país estrangeiro.
                A solução exacta é, portanto, a de cassar a sentença impugnada e ordenar o prosseguimento da causa de modo a proceder-se, designadamente, à sua instrução. E para essa solução bem podem adiantar-se as razões seguintes.
                3.7. Poderes de controlo da Relação relativamente à decisão da matéria de facto da 1ª instância.
                Esta Relação, no exercício dos seus poderes de controlo sobre a matéria de facto, pode, mesmo oficiosamente, anular a decisão da 1ª instância, sempre, por exemplo, que repute deficiente a matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação dessa matéria, i.e., quando se tenha verificado a omissão do julgamento de determinado facto ou quando entenda que deve ser produzida prova sobre factos alegados pelas partes que não foram sujeitos ao exercício da prova (artºs 712 nº 4, 1ª parte, e 650 f), por analogia, do CPC). Em qualquer destas situações o recurso é julgado de harmonia com o modelo de cassação.
                Ora, no caso, como decorre da simples leitura da sentença impugnada ficaram por julgar – por não se ter procedido a um único acto de instrução da causa nem ao seu julgamento - todos os factos alegados, tanto pelo recorrente como pela recorrida, diversos da idade e da residência da criança, com irrecusável interesse para uma apreciação minimamente conscienciosa do objecto da providência. Face a esta patente deficiência da matéria da matéria de facto, a cassação da sentença impugnada deve, realmente ter-se, por irremissível. Convém que a decisão da causa seja pronta; mas convém igualmente que seja justa.
                Sendo indiscutível – em face da alegação de ambos os pais, por força da mudança da residência da criança para país estrangeiro - a necessidade de modificar a regulação, importa, pois, cassar a decisão impugnada e ordenar a substituição por outra que promova o prosseguimento do processo, através da convocação da conferência com os pais e da observância estrita dos demais termos do procedimento marcados na lei.
                Expostos todos os argumentos, afirma-se, em síntese estreita que:
a) A junção de processos obedece a dois objectivos: a economia de actividade processual; a coerência ou a uniformidade de julgamento;
                b) A apensação tem como consequência a instrução, a discussão e o julgamento conjunto das causas conexas e não a extinção de um dos processos apensados;
                c) Os princípios estruturantes da legalidade do processo e do dever de fundamentação valem, por inteiro, na providência tutelar cível de alteração da regulação das responsabilidades parentais, com processo especial de jurisdição voluntária;
                d) Apenas a ausência absoluta de qualquer fundamentação constitui causa de nulidade substancial da decisão;
                e) Independentemente da nulidade substancial da sentença, por falta de fundamentação, à Relação é lícito, no exercício dos seus poderes de controlo sobre a matéria de facto, mesmo oficiosamente, cassá-la sempre, por exemplo, que repute deficiente a matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação dessa matéria, i.e., quando se tenha verificado a omissão do julgamento de determinado facto ou quando entenda que deve ser produzida prova sobre factos alegados pelas partes que não foram sujeitos ao exercício da prova.
                As custas deste recurso serão satisfeitas pela parte que nele sucumbe: a recorrida (artº 527 nºs 1 e 2 do CPC).
Dada a pouca complexidade do tratamento processual do objecto do recurso, a respectiva taxa de justiça deve ser fixada nos termos da Tabela I-B que integra o RCP (artº 6 nº 2 deste diploma legal).
 4. Decisão.
Pelos fundamentos expostos, concede-se provimento ao recurso, anula-se a decisão impugnada e determina-se a sua substituição por outra que promova o prosseguimento da instância - através da designação dia para a conferência com o recorrente e com a recorrida e da observância dos ulteriores termos do processo fixados na lei.
Custas pela recorrida, devendo a taxa de justiça ser fixada nos termos da Tabela I-B integrante do RCP.
                                                                                                              13.10.29
                                                                                                              Henrique Antunes (Relator)
                                                                                                                             José Avelino Gonçalves
                                                                                                                             Regina Rosa

[1] Dado que o recurso foi interposto de decisão proferida em data anterior a 1 de Setembro de 2013, ao julgamento do recurso não é aplicável o regime dos recursos reconformado pelo Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho (artº 7, 1ª parte, deste última diploma legal). Mas, em contrapartida, à acção - rectior, à providência tutelar cível de regulação das responsabilidades parentais, com processo especial de jurisdição voluntária - dado que se encontrava pendente naquela mesma data, é aplicável - sem prejuízo, evidentemente, da validade de todos os actos praticados à sombra do Código revogado, por extensão subsidiária de regime - o Código aprovado por aquela mesma Lei (artºs 5 nº 1 da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, e 161 do Decreto-Lei nº 314/78, de 27 de Outubro).
[2] Ac. do STJ de 04.02.93, CJ, STJ, I, pág. 137.
[3] Rita Lynce de Faria, A Função Instrumental da Tutela Cautelar não Especificada, págs. 74 a 95.
[4] Ac. RP de 03.03.98, BMJ nº 475, pág. 769; contra, sem razão, o Ac. RC de 14.06.83, CJ, 83, III, pág. 65.
[5] Acs. do STJ de 04.03.79, BMJ nº 285, pág. 243, de 21.07.87, BMJ nº 369, pág. 489, e de 21.05.87, BMJ nº 467, pág. 536, da RC de 14.01.93, CJ, I, pág. 10, e de 04.12.84, CJ, V, pág. 79, e da RP de 24.05.84, CJ, III, pág. 246.
[6] Madeira de Brito, AAVV, Aspectos do Novo Processo Civil, Lex, Lisboa, 1997, págs. 31 e ss.
[7] Acs. do STJ de 14.02.04 e de 14.05.09, www.dgsi.pt.
[8] Ac. do STJ de 09.12.87, BMJ nº 372, pág. 369.
[9] Michele Tarufo, Páginas sobre justicia civil, Marcial Pons, 2009, pág. 53.
[10] Michele Tarufo, cit., págs. 36 e 37.
[11] Acs. do STJ de 08.07.87, BMJ nº 369, pág. 481, da RP de 06.01.94, CJ, 94, I, pág. 197 e da RL de 03.11.94, CJ, 94, V, pág. 90.
[12] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra, 1984, pág. 140, Lebre de Freitas/Montalvão Machado/Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra, 2001, pág. 703, e Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lisboa, Lex, 1997, págs. 221 e 222.
[13] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, cit., pág. 139 e 140 e Acs. da RP de 06.01.94 e da RL de 03.11.94 e 17.1.91, CJ, 94, I, págs. 197, 94, V, pág. 90 e 91, I., pág. 121, respectivamente.
[14] Ac. do STJ de 26.09.95, CJ, 95, III, pág. 22 e da RE de 24.11.94, BMJ nº 441, pág. 420.
[15] Em sentido diferente, cfr. o Ac. do STJ de 17.10.90, AJ, 12, pág. 20. Concluindo, porém, pela anulação do julgamento, por actuação dos poderes de controlo da Relação relativamente à decisão da matéria de facto, no caso de falta de discriminação dos factos relevantes para a decisão, cfr., os Acs. da RL de 21.05.09 e de 21.03.12, www.dgsi.pt.