Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4431/21.4T8CBR-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: RUI MOURA
Descritores:
INCIDENTE DE DESPEJO IMEDIATO
FALTA DE PAGAMENTO DE RENDAS
COMPENSAÇÃO POR CRÉDITOS POR DESPESAS COM A REALIZAÇÃO DE OBRAS NO LOCADO
Data do Acordão: 04/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 20.º, 1 E 4, DA CRP
ARTIGO 14.º, 4 E 5, DO NRAU
ARTIGOS 428.º; 1022.º; 1031.º, B); 1036.º; 1038.º, A); 1040.º E 1074.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário:
I - O despejo imediato com fundamento em falta de pagamento de rendas vencidas na pendência da ação nele previsto não é automático, sendo o seu requerimento livremente apreciado pelo juiz, pelo que, nos casos em que na ação de despejo persista controvérsia quanto à existência ou exigibilidade do próprio dever de pagamento de renda, o réu não deve ser impedido de exercer o contraditório mediante a utilização dos correspondentes meios de defesa;

II - Alegando os réus na contestação – a compensação do crédito pelas despesas com a realização de obras com a obrigação do pagamento da renda, nos termos do artigo 1074º, 4 do CC, tendo junto documentos, nomeadamente notificação judicial avulsa do senhorio para esses fins específicos, e que ainda falta decidir, não pode o pedido de despejo imediato proceder.

Decisão Texto Integral:
  -//- 
Acordam os Juízes na 2ª Secção Judicial do Tribunal da Relação de Coimbra:
 
I - RELATÓRIO 
 
i)- 
No processo principal, com a referência citius 92695257 e em 16 de Janeiro de 2023, foi prolatada a douta decisão que segue, a qual
decidiu o pedido de despejo imediato deduzido pelos Autores e  constitui a decisão recorrida:
 
(sublinhados nossos)
 
Os autores AA e mulher BB
, casados sob o regime de comunhão de adquiridos, residentes na
Urbanização ..., ... e
...88 instauraram a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra A... UNIPESSOAL,LDA., com sede em ..., ... ..., pessoa coletiva ...96 e CC, solteiro, maior,
 
sócio-gerente, residente na Rua ..., ... ..., contribuinte fiscal ...59.
Os autores formulam o seguinte pedido:
a)-ser declarado resolvido o contrato de arrendamento invocado nos artº 1 a 5 da petição inicial, referente ao prédio inscrito na matriz urbana sob o artº da freguesia ..., concelho e freguesia ..., por falta de pagamento das rendas vencidas e não pagas.
b)-serem os réus condenados ao despejo imediato do prédio locado, e a entregá-lo livre e devoluto de pessoas e bens aos autores.
c)- serem os RR condenados a pagar as rendas vencidas e não pagas e que se reportam a 12 meses de 2018, 12 meses de 2019, 12 meses 2020 e janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e novembro de 2021 na importância total de 39.163,00(trinta e nove mil 163 euros), por falta de pagamento das rendas, bem assim as que se forem vencendo até á entrega definitiva e efetiva do locado, livre de pessoas e bens.
d)-Além disso, serem os réus condenados ao pagamento de mais vinte por cento ex vi do artº1041 do CC, o que perfaz até hoje quantia de 7832,00(sete mil oitocentos e trinta e dois euros), mais a indemnização que ser for vencendo por falta de pagamento da renda devida mensalmente.
Para fundamentar essa pretensão alegam que deram de arrendamento para fins não habitacionais por período de tempo limitado o prédio descrito primeiro ao segundo R. e depois a sociedade a constituir, por escrito particular denominado CONTRATO DE ARRENDAMENTO. Mais alegam que os RR. tomaram de arrendamento o supra citado prédio pelo prazo de 1 ano, com início no dia 1 de janeiro de 2016 e términus em 1 de Janeiro de 2017. Alegam ainda que foi a primeira R. que pagou as rendas referentes ao ano de 2016;
Quando o segundo R. deu conhecimento aos AA que, já tinha constituído a sociedade, tendo os mesmos emitido o recibo em 2/8/2017, referente ao ano de 2016 2017.
Os RR. não pagaram aos AA. as rendas vencidas e não pagas, dos anos 2018, 2019 e 2020 e as rendas vencidas e não pagas de Janeiro a Novembro de 2021, o que perfaz a quantia de 39.163,00(trinta e nove mil cento e sessenta e três euros).
Além disso os autores também imputam ao réu “comportamento premeditado e enganoso, teve como finalidade deixar de pagar as rendas que se venceram a partir de Janeiro de 2018 até ao mês de Novembro de 2021” alegando que só assinaram e concordaram que fosse possível a transmissão da posição contratual do R, por terem acreditado que o mesmo iria criar uma sociedade para o substituir na posição de arrendatário e ainda que se tivessem tido conhecimento deste ardiloso comportamento do R. singular nunca teriam assinado o contrato da maneira que o foi. Alegam ainda que O R singular omitiu que a sociedade já estava constituída, com a intenção de deixar de pagar as rendas aos AA. e que se os AA tivessem tido conhecimento que a primeira R. já existia, não teriam de certeza assinado o contrato nos moldes em que assinaram.
Os réus contestaram, invocando a ilegitimidade passiva do R. CC. Sustentam que desde sempre foi a ré sociedade quem ocupou o imóvel bem como quem procedeu ao pagamento das rendas devidas e concluem que a legitimidade passiva “pertence em exclusivo á ré sociedade e não ao réu CC”.
Mais alegam que a sociedade ré procedeu ao pagamento das rendas referentes aos dois primeiros meses de 2018 e ao pagamento parcial da renda referente ao mês de março de 2018. Invocam a exceção de não cumprimento alegando que desde o final de 2017 o imóvel locado começou a ser alvo de infiltrações do interior impedindo a utilização deste e que logo em final de 2017 o pai do réu CC enviou um email aos AA. através do qual os alertou para a necessidade de serem efetuadas obras de natureza urgente e indispensável. Mais alegam que
 
em março de 2018 o telhado desabou, levando ao encerramento da atividade da ré. Mais alegam que os AA. não diligenciaram pelas reparações e a ré adjudicou os trabalhos de reparação do telhado, tendo pago € 12690,00€ do valor total devido de € 42.300,00.
E a ré deduziu reconvenção. Reclama a quantia de € 61.680,31 (sessenta e um mil, seiscentos e oitenta euros e trinta e um cêntimos), acrescida dos juros de mora desde a notificação da reconvenção até efetivo e integral pagamento.
Alega que efetuou reparações de natureza urgente e indispensável que não foram efetuadas pelos Reconvindos. mas sim pela sociedade Reconvinte com conhecimento e concordância dos Reconvindos designadamente as que descreve ao nível do telhado de cobertura, Parede das traseiras da discoteca, pladur dentro da discoteca e que gastou já, até esta data, a importância de € 18.890,00 e tendo ainda a suportar pelo menos, € 23.410,00 referente à totalidade da quantia orçamentada para as obras necessárias. Pede ainda € 12.000,00 a título de indemnização pelo rendimento que perdeu no período em que o estabelecimento esteve encerrado no período compreendido entre 3 de março e final de outubro de 2018 e € 1248,76 correspondente às despesas que manteve no mesmo período. 
Na sequência de despacho que convidou autores e réus ao aperfeiçoamento dos respetivos articulados, a ré corrigiu o seu articulado.

E também os autores apresentaram petição inicial corrigida. Concluem pedindo:
a)- ser declarado resolvido o contrato de arrendamento ajuizado, celebrado entre AA e Réu, referente ao prédio descrito sob o artigo 01 desta PI;
b)- serem os RR condenados ao despejo imediato do locado e à restituição do mesmo aos AA, inteiramente livre e devoluto;
c)- Serem os RR solidariamente condenados a pagarem aos AA a importância de 39.163€ (trinta e ove mil cento e sessenta e três euros), respeitantes aos anos de 2018, 2019, 2020 (integralmente) e 2021 até Novembro, importância esta acrescida das que se forem vencendo na pendência da ação até entrega efetiva do locado, livre e desocupado de pessoas e bens;
d)- serem os RR condenados no pagamento de juros moratórios vencidos desde a citação até integral e efetivo pagamento.
Para tanto alegam:
- Os AA são os legítimos proprietários e possuidores de um prédio urbano sito na Rua ..., União de Freguesias ... e ..., concelho ..., prédio esse destinado a comércio, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo nº ...39 (anterior artigo 8915) e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...92 (Docs 1 e 2); - Os AA deram de arrendamento ao R., para fins não habitacionais, o supra identificado prédio, pelo prazo de um ano, com início em 1 de Janeiro de 2016, devendo tal contrato terminar em 1 de Janeiro de 2017.
- Foi convencionada a renda anual de 10.000€ (dez mil euros), que corresponderia à renda mensal de 833€, a pagar aos senhorios anualmente através de depósito ou transferência, para a sua (deles senhorios) conta com o nº ...92 do Banco 1..., balcão de ... da qual os AA são titulares (Doc. 3).
- Ainda que fosse intenção do R. (e tivesse chegado a ser falado entre as partes) transmitir o arrendamento para uma sociedade sua, a sociedade “A..., Unipessoal, Lda.”, facto é que tal transmissão ou cessão de posição contratual nunca se concretizou, nunca tendo sido emitido qualquer documento entre AA e R a esse respeito, titulando qualquer cessão de posição contratual.
- O R. procedeu porém ao pagamento da primeira renda, respeitante ao ano de 2016 e solicitou aos AA a emissão de recibo em nome da Ré, ao que estes anuíram, tendo emitido os recibos juntos com datas de 2 de Agosto de 2017 e de 19 de Setembro do mesmo ano.

 
- Tratou-se efetivamente dos únicos pagamentos realizados e dos únicos recibos emitidos.
- Pelo que em nossa modesta opinião, não tendo existido contrato de cessão de posição contratual, o R. manteve sempre a qualidade de inquilino (sendo consequentemente parte legítima) do prédio arrendado até final, ou seja, até à atualidade apesar da emissão de dois recibos de renda em nome da sociedade, ainda que eventualmente a sociedade possa igualmente ser considerada locatária, após a emissão de tais recibos, caso em que coexistirão dois locatários.
- Os RR, quer o R. singular quer a sociedade (que não foi parte no contrato, apesar de já se encontrar constituída à data da sua celebração, apesar de ser em seu nome desenvolvida a atividade em vista da qual foi celebrada a locação), não pagariam mais qualquer renda, relativamente aos anos de 2018, 2019, 2020 e 2021 até Novembro, que continuam em dívida na sua totalidade, pelo que continuam a ser solidariamente responsáveis pelo seu pagamento. - Os RR foram notificados em Março 2021, por Notificação Judicial Avulsa, solicitada no Juízo Local de Competência Genérica ... e realizada por este Juízo, cujos termos constantes do Doc. 6 ora junto, aqui se dão por integralmente reproduzidos, sendo observada a tramitação legal.
- Tendo consequentemente operado a resolução do contrato de arrendamento nos termos legais e consequentemente a sua cessação.
- Os AA têm consequentemente direito às rendas que se venceram e não foram pagas na vigência do contrato, as quais como se deixou dito se referem aos anos de 2018, 2019, 2020 e até Novembro de 2021.
- Estando consequentemente em dívida a importância global de 39.163€ (trinta e nove mil cento e sessenta e três euros).

A presente ação foi proposta em 17/10/2021.

Em 28/2/2023 os autores deduziram incidente de despejo imediato com fundamento na falta de pagamento de rendas na pendência da ação.

Encontram-se pagas as rendas referentes aos anos de 2016 e 2017 tendo os AA. emitidos recibos em nome da ré A... UNIPESSOAL LDA (documento 4 da pi a fls. 15).
 

Cumpre apreciar e decidir o incidente de despejo imediato, sendo os factos relevantes para o

efeito os acima constantes do relatório.
 
O despejo imediato está previsto nos art.s 14º, nºs 3 a 5 do NRAU, da Lei nº6/2006 de 27 de fevereiro, que estabelecem:

3 - Na pendência da ação de despejo, as rendas que se forem vencendo devem ser pagas ou depositadas, nos termos gerais.

4 - Se as rendas, encargos ou despesas, vencidos por um período igual ou superior a dois meses, não forem pagos ou depositados, o arrendatário é notificado para, em 10 dias, proceder ao seu pagamento ou depósito e ainda da importância da indemnização devida, juntando prova aos autos, sendo, no entanto, condenado nas custas do incidente e nas despesas de levantamento do depósito, que são contadas a final.

5 - Em caso de incumprimento pelo arrendatário do disposto no número anterior, o senhorio pode requerer o despejo imediato, aplicando-se, em caso de deferimento do requerimento, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 7 do artigo 15.º e nos artigos 15.º-J, 15.º-K e 15.ºM a 15.º-O.
A lei apenas prevê a notificação do arrendatário para, em 10 dias, proceder ao pagamento ou depósito das rendas em dívida e da importância da indemnização devida. É completamente omissa quanto a uma eventual oposição do arrendatário.

 
E poderia assim entender-se que ao requerido no incidente apenas é admissível defender-se do despejo imediato pagando ou depositando as rendas e a indemnização devida.
Essa limitação dos meios oponíveis ao despejo imediato suscitou problemas de constitucionalidade que chegaram ao conhecimento do Tribunal Constitucional, o qual através do acórdão nº 673/2005, ainda na vigência do RAU, decidiu que na apreciação da questão o parâmetro constitucional mais pertinente se centrava no princípio da proibição da indefesa, que decorre, em primeira linha, do princípio do contraditório, a que se deve subordinar todo o processo, concluindo: “ pela inconstitucionalidade, por violação do princípio da proibição da indefesa, ínsito no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, da norma do artigo 58.º do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, na interpretação segundo a qual, mesmo que na acção de despejo persista controvérsia quer quanto à identidade do arrendatário, quer quanto à existência de acordo, diverso do arrendamento, que legitimaria a ocupação do local pela interveniente processual, se for requerido pelo autor o despejo imediato com fundamento em falta de pagamento das rendas vencidas na pendência da acção, o único meio de defesa do detentor do local é a apresentação de prova, até ao termo do prazo para a sua resposta, de que procedeu ao pagamento ou depósito das rendas em mora e da importância da indemnização devida.”
E já na vigência do NRAU (na redação da Lei 31/2012, de 14 de agosto) o Tribunal Constitucional voltou a pronunciar-se sobre questão similar no acórdão 327/2018, em idêntico sentido, indicando o sentido interpretativo da norma, nos termos do disposto no artigo 80.º, n.º 3, da LTC. Aí se decidiu: “ Interpretar o artigo 14.º, n.º 4 da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, alterado pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, em consonância com o n.º 5 do mesmo artigo, em conformidade com princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo
20.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição, no sentido de que o despejo imediato com fundamento em falta de pagamento de rendas vencidas na pendência da ação nele previsto não é automático, sendo o seu requerimento livremente apreciado pelo juiz, pelo que, nos casos em que na ação de despejo persista controvérsia quanto à existência ou exigibilidade do próprio dever de pagamento de renda, o réu não deve ser impedido de exercer o contraditório mediante a utilização dos correspondentes meios de defesa.”

Tendo em consideração tais padrões de decisão, afigura-se que o direito de o senhorio recorrer ao incidente de despejo imediato se mantém, mas o arrendatário pode aduzir outros meios de defesa para além do pagamento ou depósito dos montantes das rendas vencidas na pendência da causa, pois, caso contrário, incorrer-se-ia em situação de violação do princípio da proibição de indefesa.
No caso, verifica-se que, na contestação, os RR. suscitaram em sua defesa, para além do mais, dois fundamentos distintos:
- Invocaram a exceção do não cumprimento do contrato;
- A ré invocou o direito a compensação pelas quantias despendidas com obras urgentes realizadas no locado.
Dos factos assentes, considerando que a ação de despejo deu entrada em 17/10/2021 e os RR. não pagaram a renda correspondente aos meses de novembro e dezembro de 2021 nem as subsequentes, não restam dúvidas de que à data do pedido de despejo imediato estavam em dívida várias rendas há mais de 60 dias.
A exceção do não cumprimento do contrato, tal como estabelecida no art. 428.º do C.C. só legitima o incumprimento do devedor relativamente a prestações principais recíprocas, ligadas entre si por um vínculo sinalagmático.
O inquilino não pode deixar de cumprir a obrigação de pagamento das rendas com fundamento
no facto do senhorio não cumprir a obrigação de fazer obras no locado, porque a

 
obrigação de pagar a renda é uma obrigação principal do contrato de arrendamento (art.ºs 1022.º e 1038.º al. a) do C.C.) que não é correspetiva daquela outra obrigação, meramente acessória, a cargo do senhorio (art. 1074.º do C.C.).
 
A obrigação de pagamento da renda é, no entanto, correspetiva da obrigação, a cargo do senhorio, de proporcionar o gozo da coisa (art. 1022.º, conjugado com os art.s 1031.º al. b) e
1038.º al. a) do C.C.).
Tanto assim é que o art. 1040.º n.º 1 do C.C. prevê que se o locatário sofrer uma privação ou diminuição do gozo da coisa, haverá lugar a uma redução da renda proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta.
Ou seja, o inquilino não pode deixar de cumprir a obrigação de pagamento das rendas com fundamento no facto do senhorio não cumprir a obrigação de fazer obras no locado, porque a obrigação de pagar a renda é uma obrigação principal do contrato de arrendamento (art.ºs 1022.º e 1038.º al. a) do C.C.) que não é correspetiva daquela outra obrigação, meramente acessória, a cargo do senhorio (art.º 1074.º do C.C.), mas antes da obrigação de proporcionar o
gozo da coisa (art.º 1022.º, conjugado com os art.ºs 1031.º al. b) e 1038.º al. a) do C.C.). Daí que o art.º 1040.º n.º 1 do C.C. preveja a redução proporcional da renda nas situações de privação ou diminuição do gozo da coisa locada sofridas pelo locatário.
E neste sentido vem decidindo a maioria da jurisprudência como o Ac. da RG, 21/10/2021, processo 8357/17.8T8VNF-A.G1, des. Maria Eugénia Pedro, dgsi.pt/jtrg, cuja fundamentação se vem seguindo, e o nele citado acórdão da RL de 10.12.2009 (Abrantes Geraldes) disponível in www.dgsi.pt, onde também no âmbito da oposição a um incidente de despejo imediato se escreveu: “ Por certo que a vida corrente é susceptível de gerar situações em que a falta de pagamento das rendas vencidas na pendência da acção pode não ser reflexo de uma pura atitude de rebeldia do arrendatário, antes resposta a determinados comportamentos do senhorio, traduzidos, por exemplo, na omissão da realização de obras de conservação do prédio. Porém, sem questionar o direito do arrendatário de reagir contra tal situação, o mesmo não pode ser feito no âmbito do incidente fundado no incumprimento da sua obrigação principal e que justificou a cedência do uso do imóvel.
O contrato de arrendamento é de natureza sinalagmática. Todavia, tal característica não envolve a generalidade dos direitos e das obrigações, sendo necessária estabelecer uma distinção. Atento o art. 1022º do CC, a sinalagmaticidade verifica-se entre a obrigação do senhorio de proporcionar ao arrendatário o gozo do imóvel e a obrigação do arrendatário de pagar a renda acordada. Já não se verifica entre o pagamento de rendas e a mera realização de obras de conservação do locado a cargo do senhorio, obrigação de natureza complementar, submetida a condicionalismo diversificado que varia em função do teor do contrato, da sua natureza ou de outras circunstâncias que emergem de normas dispersas, designadamente do art. 1036º do CC, e das que regulam determinados contratos em razão da sua natureza ou da data da celebração.”
Finalmente, a lei permite a compensação entre o valor das rendas e o das obras realizadas pelo inquilino na pendência do contrato de arrendamento, mas essa possibilidade está subordinado às regras dos n.ºs 3 e 4 do art. 1074.º do C.C., cujos pressupostos claramente não se verificam nos autos, nem foram invocados pelos RR. na sua contestação.

Não se verificando os meios de defesa invocados pelos réus para fundamentar a inexigibilidade do pagamento das rendas em dívida e verificando-se que, à data do requerimento de despejo apresentado pelos AA., estavam em dívida há mais de sessenta dias várias rendas vencidas na pendência da ação, é forçoso concluir pela verificação dos requisitos legais do despejo imediato.

 

Decide-se:

Julgar procedente o incidente e determinar o despejo imediato do imóvel identificado na petição inicial, condenando-se os RR. a entrega-lo aos AA. livre e devoluto de pessoas e bens.
Valor do incidente: o da causa. Custas a cargo dos RR.
 
(sublinhados nossos)
 ii)-
 
Inconformado veio o Réu CC, com apoio judiciário, recorrer, recurso admitido como de apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo. 
 iii)-  
O Apelante apresenta as seguintes conclusões: 
 
A. Os Recorridos, instauraram incidente de despejo imediato no dia 28/02/2023 com fundamento na falta de pagamento de rendas na pendência da ação.

B. No dia 08-03-2023, foi o aqui Recorrente notificado, apenas, para proceder ao pagamento ou depósito das rendas vencidas na pendência da ação e ainda da importância da indemnização devida.

C. Prova que o mesmo não juntou, uma vez que considera que essa mesma obrigação se encontra a ser paga pelo montante que o mesmo despendeu em obras de caráter urgente, sem as quais o mesmo jamais poderia fazer uso do locado.

D. Uso este que consubstancia uma obrigação principal do locador assegurar, nos termos dos art.s 1022º, 1031º, b) 3 1038º, a) do CC…

E. Obrigação esta que não fui cumprida, tal como referido na contestação apresentada pelo aqui Recorrente - Arts. 29º a 70º…

F. Por despacho datado de 16-11-2023, decidiu-se pela “procedência do incidente e determinação do despejo imediato do imóvel identificado na petição inicial, condenando-se os RR. a entregá-lo aos AA, livre e devoluto de pessoas e bens.” G. Decisão fundamentada na seguinte premissa: “ a lei permite a compensação entre o valor das rendas e o das obras realizadas pelo inquilino na pendência do contrato de arrendamento, mas essa possibilidade está subordinada às regras dos n.ºs 3 e 4 do art. 1074º do CC, cujos pressupostos claramente não se verificam nos autos, nem foram invocados pelos RR. na sua contestação.

H. Ora, tal como referido em 5. e E., tal preceito foi, na sua contestação, devidamente invocado pelo aqui Recorrente, como infra melhor se referirá.

 

I. Razão pela qual o aqui Recorrente não se conforma, nem se pode conformar, com a decisão de procedência do incidente de despejo proferida pelo douto despacho datado de 16-11-2023.

J. Estabelece o nº 1 do art. 1036º, ex vi art. 1074º do CC, que “Se o locador estiver em mora quanto à obrigação de fazer reparações ou outras despesas e umas ou outras, pela sua urgência, se não compadecerem com as delongas do procedimento judicial, tem o locatário a possibilidade de fazê-las extrajudicialmente, com direito ao seu reembolso.”

K. Ora, cfr. documentos já juntos aos autos (doc. 3, 4, 5 e 7), os Recorridos foram devidamente interpelados de que eram necessárias obras de caráter urgente, cuja não realização impediria o uso do locado para o fim a que o mesmo se destinava, encontrando-se o espaço de discoteca encerrado e, consequentemente, o Recorrente, enquanto sócio da co-Ré, e a própria Co-Ré enquanto sociedade, a sofrer os prejuízos a tal inerentes.

L. Pois é impensável manter um espaço de discoteca aberto, como o que funcionava no locado, e que correspondia à atividade da co-Ré, sem um telhado nas suas mínimas condições, em que chovesse em cima dos clientes do estabelecimento… M. Pelo que não pode sequer equacionar-se que o locado pudesse estar, ainda que parcialmente, suscetível de utilização por parte da co-Ré, da qual o aqui Recorrente é gerente.
N. Não tendo os Autores efetuado qualquer diligência, ainda que devidamente informados, cfr documentos juntos aos autos e supra mencionados em K., no sentido de efetuar as referidas obras…

O. Ocorrendo uma impossibilidade de gozo do locado, para o fim contratado, por omissão de obras a cargo do senhorio, ficando o locatário, aqui Recorrente, em posição de total sacrifício do seu interesse contratual, pelo que não lhe seria exigível, enquanto a situação se mantivesse, o pagamento das rendas.
P. Ora, encontrando-se o estabelecimento comercial explorado pela co-Ré encerrado a março de 2018…

Q. Com o consequente prejuízo económico que para a mesma advém, bem como para o aqui Recorrente enquanto sócio da mesma…

R. Optou o aqui Recorrente, enquanto sócio da Co-Ré, locatária do contrato de arrendamento objeto do presente incidente, efetuar as obras urgentes necessárias e que lhe permitissem recuperar o gozo do locado.

S. Pois não se pode exigir aos Réus que suportem um sacrifício com o pagamento das rendas superior ao sacrifício que os mesmos já estavam a suportar, primeiramente, com a impossibilidade de gozo do locado e posteriormente com as obras que se viram obrigados a realizar!

 

T. Pois tal consistiria numa total desproporcionalidade entre as obrigações das partes do presente contrato de arrendamento, onerando-se o locatário com a obrigação de pagamento, acrescida do prejuízo que sofria com a impossibilidade de gozo do imóvel e posteriormente com a realização das obras urgentes necessárias, e
ignorando-se a correspondente obrigação por parte do locador, de gozo do locado.

U. Assim, outra conclusão não se pode retirar que não a de que estamos perante uma exceção de não cumprimento, pelo que têm os R. o direito de não proceder ao pagamento das quantias que eventualmente forem devidas aos Recorridos até que se perfaça o valor que os mesmos despenderam para assegurar o uso do locado, o qual se cifra em 61.680,31 €, nos termos e com os fundamentos que na contestação se referem e cujos documentos juntos demonstram.

V. A Constituição da Republica Portuguesa no seu artigo 20º consagra, nos seus n.º 4 e 5, o princípio da tutela jurisdicional efectiva, prescrevendo-se que nas causas em que as partes intervenham, a decisão deve ser tomada mediante processo equitativo, nomeadamente à luz do o princípio do contraditório.

W. Assim, deve o douto Tribunal, antes de tomar qualquer decisão, permitir que as partes se pronunciem.

X. Nesse sentido, o próprio despacho datado de 15-11-2023, refere que “Tendo em consideração tais padrões de decisão, afigura-se que o direito de o senhorio recorrer ao incidente de despejo imediato se mantém, mas o arrendatário pode aduzir outros meios de defesa para além do pagamento ou depósito dos montantes das rendas vencidas na pendência da causa, pois, caso contrário, incorrer-se-ia em situação de violação do princípio da proibição de indefesa. ”.
Y. Ora, no seguimento da notificação para “proceder ao pagamento ou depósito das rendas vencidas na pendência da ação e ainda da importância da indemnização devida”, pronunciou-se a co-Ré A..., LDA, no sentido de que “os Réus/Reconvintes são credores aos Autores/Reconvindos da importância global de
61.680,31 €, a título de benfeitorias e despesas relativas ao locado durante o período em que a Ré/Reconvinte se viu privada da sua utilização plena e para os fins a que o mesmo se destinava. Pelo que, o valor peticionado pelos AA., a título de rendas, bem assim, as rendas entretanto vencidas, é inferior ao que a Ré/Reconvinte despendeu com as obras realizadas pela mesma no locado, com caráter urgente e indispensável. Posto isto, uma vez que o crédito devido pelos AA./Reconvindos à Ré/Reconvinte é superior ao que aqueles reclamam, tem esta o direito de não proceder ao pagamento das quantias que eventualmente lhes forem devidas até perfazer o valor supra referido, o que se requer a V. Exa. se digne determinar, para todos os devidos e legais efeitos.” 

 
Z. Argumento que, indiscutivelmente, a co-Ré procurou enquadrar na situação de privação de gozo do locado, quando se refere à privação da utilização plena e para os fins que o locado se destinava.
AA. Pelo que não se compreende como pode o douto despacho considerar que “a lei permite a compensação entre o valor das rendas e o das obras realizadas pelo inquilino na pendência do contrato de arrendamento, mas essa possibilidade está subordinado às regras dos n.ºs 3 e 4 do art. 1074.º do C.C., cujos pressupostos claramente não se verificam nos autos, nem foram invocados pelos RR. na sua contestação.”

BB. Nos termos do art. 615º/1/d) do CPC, a sentença é nula quando “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

CC. Ora, ao considerar que o R. não invocou na sua contestação a compensação entre o valor das rendas e as obras realizadas pelo inquilino na pendência do contrato de arrendamento, o Exmo Senhor Juiz de Direito deixou de se pronunciar sobre uma questão sobre a qual se deveria ter pronunciado, uma vez que tal compensação foi invocada, tendo dado como provados factos que não poderia ter dado…

DD. Invocação que consta dos art. 29º a 57º da contenção apresentada, onde se refere, nomeadamente, que:
55.º
Ou seja, desde dezembro de 2017, e sem prejuízo do agravamento do estado de deterioração do telhado de cobertura do locado, que conduziu ao encerramento do estabelecimento da sociedade R., os AA. nada fizeram para permitir o efetivo gozo do imóvel. -
56.º
Omitindo as concretas razões pelas quais a sociedade R. deixou de pagar as rendas, precisamente, a partir de meados de março de 2018. 57.º
Sendo que, a falta de pagamento das rendas protagonizada pela sociedade R. encontra fundamento legal na exceção de não cumprimento prevista no art. 428.º do Cód. Civil. (…)
63.º
Quanto ao arrendamento de prédios urbanos, o artigo 1074º, remetendo para o regime geral do artigo 1036º, prevê, no seu nº 3, que nas situações aí previstas – realização de obras pelo locatário em caso de urgência – o arrendatário possa

 
efetuar a compensação do crédito pelas despesas com a realização da obra com a obrigação de pagamento da renda.
64.º
Ora, aqui chegados, cumpre recordar que a sociedade R. avisou, atempadamente, os AA. da necessidade dos mesmos promoverem a realização de obras no locado de natureza urgente e indispensável, face ao estado do locado não permitir o seu gozo.
65.º
Tendo a sociedade R. que, fruto da inadimplência dos AA., dar início, a suas expensas às obras necessárias no sentido de reduzir, ao máximo, os danos causados pelo encerramento do edifício e consequente encerramento da atividade a que a sociedade R. se dedica.
66.º
Pelo que a falta de pagamento das rendas radica, exclusivamente, no incumprimento do contrato de locação por parte dos AA. 67.º
Tendo disso mesmo sido, previamente, avisados.
68.º
Sendo, portanto, a posição adotada pela sociedade R. lícita face à normatividade vigente.
69.º
Trata-se a dita exceptio de uma exceção dilatória de direito material cujo ónus de alegação incumbe ao locatário, não sendo de conhecimento oficioso; de direito material porque fundada em razões de direito substantivo (sinalagma funcional); dilatória porquanto não excluindo definitivamente o direito invocado pelo autor apenas o «paralisa» temporariamente, isto é, até ao momento em que o senhorio venha a cumprir integralmente a sua obrigação em falta ou prestada defeituosamente. Vide, neste sentido, J. CALVÃO da SILVA, Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória., p. 334.
70.º
Exceção que se deixa, expressamente, invocada.” 
EE. Assim, nos termos do art. 615º/1/d) do CPC, deve o douto despacho ser considerado nulo falta de pronúncia.
FF. No seguimento do acordão do TRL de 20-12-2018, Proc. 1830/17.0T8VFX.L1-
7: “O espírito da lei ao criar o incidente de despejo imediato, agora previsto no Art. 14.º n.º 4 e 5 do N.R.A.U., foi sempre o de não permitir que alguém pudesse, gratuitamente, desfrutar de imóvel, durante o longo período que poderia durar a ação até ao despejo efetivo, numa situação que não seria reparável por nenhuma condenação em indemnização, ou pelo pagamento das rendas vencidas, por ser
 
frequente o despejado não ter bens bastantes para o efeito. Pretendia-se evitar que o devedor da renda permanecesse no gozo da coisa injustificadamente e à custa alheia.”
GG. Pelo que outra interpretação não pode existir que não a de que o despejo imediato deve ser decretado quando está em causa uma situação cujo prejuízo para o locador resulta da morosidade da ação judicial.
HH. E não as situações em que existe controvérsia sobre a existência, nomeadamente, sobre a existência do próprio prejuízo para o locador.
II. Sob pena de resultar de tal incidente um prejuízo desproporcional para o locatário, que vê o efeito útil da ação de despejo substancialmente reduzido em caso de improcedência da mesma…
JJ. Assim, entende a maioria da jurisprudência que, no incidente de despejo, se deve encontrar assente a existência de obrigação de pagamento das rendas.
KK. Decidiu o Tribunal da Relação de Évora, em 13-02-2014, Proc. 285/12.0TBLLE-A.E1, que “Em consequência, tem sido defendido que o pedido de despejo imediato deve ser indeferido ou, pelo menos, suspensa a decisão do requerimento de despejo imediato, por pendência de questão prejudicial, até esta ser decidida, quando seja controvertida: a) a existência do direito a receber a renda; b) a exigibilidade das rendas e concomitante mora” (ob. cit. p. 62).”  LL. Acórdão que seguiu a jurisprudência de um acórdão anterior do Tribunal da Relação do Porto, de 12-05-98, Proc. 9820329 que decidiu no seguinte sentido: “II - A decisão do incidente de despejo imediato por falta de pagamento de rendas na pendência da acção pressupõe que se acha assente a relação processual entre demandante e demandado, ou seja, indiscutido ou tornado líquido que ao demandante assiste o direito de reclamar as rendas do demandado.” 
MM. Mais recentemente, decidiu nesse mesmo sentido o Tribunal da Relação de Lisboa, em 20-05-2021, Proc. 273/20.2T8AMD-B.L1-6:
“O incidente implica que a existência e validade do contrato de arrendamento e da obrigação de pagamento das rendas em causa pelo Requerido não sejam objecto de discussão na acção principal.
Temos assim como requisitos de procedência do incidente:
1) não pagamento ou depósito das rendas na sequência da notificação a que alude o artigo 14.º, n.º 4, da Lei 6/2006.
2)pendência de acção de despejo.
3)não pagamento de rendas vencidas na pendência da acção.
4)inexistência de controvérsia, entre os intervenientes processuais na acção principal, quanto à existência e validade do arrendamento.
 
5)inexistência de controvérsia, entre os intervenientes processuais na acção principal, quanto à obrigação de pagamento das rendas e à mora do devedor.”  NN. Ora, resulta de toda a jurisprudência exposta que, existindo controvérsia quanto à obrigação de pagamento das rendas, como no caso sub judice ocorre, jamais poderia ter sido procedente o incidente de despejo imediato.
OO. Controvérsia que, de acordo com o supra exposto, é um dos pontos essenciais da contestação dos Có-Réus e aqui Recorrente, pelo que é inquestionável a sua existência.
 
Pugna a final: ser o douto despacho revogado por não se encontrarem preenchidos os requisitos para a procedência do incidente de despejo.
 
iv)-
 
Não se contra-motiva.
 
Na 1ª instância sustenta-se a inexistência da nulidade invocada.
 
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Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.
 
II- ENQUADRAMENTO JURÍDICO
 
Pelas conclusões das alegações do recurso se afere e delimita o objecto e o âmbito do mesmo. “Questões” são as concretas controvérsias centrais a dirimir. 
 
III - OBJECTO DO RECURSO  
 
A questão que se coloca ao julgador através da apelação consiste em saber se cabia ou não proferir despacho de deferimento à pretensão dos Autores, AA e esposa BB.
 
IV- mérito do recurso  
 
Relevante a mesma factualidade tida em conta na decisão recorrida e transcrita no relatório supre, para que se remete.
 
 
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O Apelante argumenta que a decisão recorrida padece do vício de omissão de pronúncia previsto no artigo 615º, 1, h) do CPC pois retira dela que se não considera que os Réus na contestação tenham invocado a compensação do crédito das obras com o crédito das rendas devidas. Porém o que vem escrito na decisão recorrida é que:
 
, a lei permite a compensação entre o valor das rendas e o das obras realizadas pelo inquilino na pendência do contrato de arrendamento, mas essa possibilidade está subordinado às regras dos n.ºs 3 e 4 do art. 1074.º do C.C., cujos pressupostos claramente não se verificam nos autos, nem foram invocados pelos RR. na sua contestação.
 
Isto é, houve pronúncia sobre o ponto, mas considerou-se que a compensação invocada estava fora das regras dos nºs 3 e 4 do artigo 1074º do CC.
 
Assim, vai improcedente a arguição, não padecendo a decisão recorrida do invocado vício.
 
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Considerações gerais

 
(Seguimos agora de perto, com a devida vénia, o ensinamento do Ac. TRL de 24-11-2020 prolatado no p. nº 2452/20.3T8LSB-B.L1-7 (Relator Diogo Ravara) acessível no site da dgsi.net.) A decisão apelada foi proferida no âmbito de incidente de despejo imediato deduzido pelos Autores contra os Réus.
O incidente está previsto no Art. 14.º n.º 4 e 5 do NRAU, o qual é de particular difícil aplicação atentas as vicissitudes que este instituto jurídico tem vindo a sofrer ao longo da sua história.
Desde cedo o legislador nacional foi sensível à necessidade de celeridade do processo de despejo, mas nem sempre foi particularmente consequente nas soluções que encontrou para esse efeito.
Não havendo necessidade de recuar muito, diremos que já no quadro do Art. 979.º do C.P.C. de 1961 se previa o “incidente de despejo imediato”.
Nos termos desse Art. 979.º do C.P.C., na versão aprovada pelo Decreto-Lei n.º 44.129, de 28 de dezembro de 1961, caso o arrendatário deixasse de pagar as rendas vencidas na pendência da ação de despejo, o locador poderia requerer, por esse

 
motivo, que se procedesse ao despejo imediato do primeiro (n.º 1), o qual só não seria decretado caso, ouvido o arrendatário, este provasse que procedeu ao pagamento das quantias devidas (n.º 2).
O espírito da lei ao criar este incidente foi sempre o de não permitir que alguém pudesse, gratuitamente, desfrutar de imóvel, durante o longo período que pode durar uma ação até ao despejo efetivo, numa situação que não seria reparada por nenhuma condenação em indemnização, ou pelo pagamento das rendas vencidas, por ser muito frequente que o despejado não tivesse bens bastantes para o efeito.
Por outras palavras, pretendia-se obstar a que o devedor da renda pudesse permanecer no gozo da coisa injustificadamente e à custa alheia.
Era considerando o espírito desta norma que a doutrina e jurisprudência ao tempo ia maioritariamente no sentido de que a única defesa possível ao incidente de despejo imediato por falta de pagamento de rendas na pendência da ação de despejo, quando o contrato era válido e eficaz, seria o pagamento ou o depósito das rendas em mora, disso fazendo prova nos autos.
A este propósito, Alberto dos Reis (in R.L.J. n.º 78º, pág.s 64 e ss) afirmava categoricamente que a ação de despejo coloca o réu no dever de depositar as rendas que se forem vencendo, ainda que o senhorio as não vá, ou não queira receber, sob pena de despejo imediato.
Foram-se sucedendo as reformas legislativas do nosso Direito do Arrendamento, sendo que o Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro, que aprovou o Regime do Arrendamento Urbano, ou simplesmente “R.A.U.”, veio a revogar a secção que regulava a ação especial de despejo no Código de Processo Civil (v.g. Art. 3.º n.º 1 al. b) desse diploma preambular), passando a prever a mesma regra no seu Art. 58.º. Assim, o senhorio poderia requerer o despejo imediato do arrendatário (Art. 58.º n.º 2 do R.A.U.), com fundamento no não cumprimento da obrigação de pagamento ou depósito das rendas vencidas no decurso da ação de despejo (Art. 58.º n.º 1 do R.A.U.), sendo que, ouvindo-se o arrendatário, o direito a requerer o despejo apenas caducaria caso este último fizesse prova do pagamento ou depósito das rendas em falta (Art. 58.º n.º 3 do R.A.U.).
Também no quadro desta lei se defendia que o único meio de defesa oponível ao despejo imediato era a prova do pagamento ou depósito das rendas.
Esta limitação dos meios de defesa oponíveis ao despejo imediato suscitou evidentes problemas de constitucionalidade que chegaram ao conhecimento do Tribunal Constitucional, que por Acórdão com o n.º 673/2005, veio a declarar essa interpretação, aplicada ao Art. 58º do R.A.U., inconstitucional, por violação do Art. 20º da C.R.P. e do princípio derivado do acesso efetivo à justiça relativo à “proibição da proibição da indefesa”.
 
Ora, a Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, que aprovou o “Novo Regime do Arrendamento Urbano” (NRAU) veio prever de novo na tramitação da ação de despejo um “incidente de despejo imediato” com fundamento na falta de pagamento de rendas pelo arrendatário na pendência desse processo, à semelhança do anteriormente previsto no R.A.U. e do previamente disposto no Art. 979.º do C.P.C. de 1961.
O legislador manteve a obrigação de pagamento ou depósito das rendas que se vençam na pendência de ação de despejo (Art. 14.º n.º 3 do NRAU) e determinou que, em caso de incumprimento dessa obrigação, o arrendatário deve ser notificado para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento ou depósito das rendas vencidas por um período igual ou superior a três meses, e ainda da indemnização devida (Art. 14.º n.º 4 do NRAU), sob pena de o senhorio ficar habilitado a pedir certidão relativa a esses factos, a qual constituía título executivo para efeitos de despejo do local arrendado, na forma de processo executivo comum para entrega de coisa certa (Art. 14.º n.º 5 do NRAU).
Entretanto, a Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto, alterou o Art. 14.º do NRAU, para reduzir a 2 meses o período a que se reporta o incumprimento da obrigação de pagamento da renda (Art. 14.º n.º 4) e determinou que o exercício desse direito pelo senhorio passasse a seguir os termos do “Processo Especial de Despejo” (Art. 14.º n.º 5 e Art. 15.º n.º 1).
Assim, volta-se a colocar a questão da limitação dos meios de defesa do arrendatário habitacional ao incidente de despejo imediato deduzido na pendência da ação de despejo, nos mesmos termos que o Tribunal Constitucional já se havia pronunciado relativamente ao Art. 58.º do R.A.U..
Convirá recordar que o Acórdão n.º 673/2005 do Tribunal Constitucional pronunciou-se pela inconstitucionalidade tendo em atenção o “princípio da proibição da indefesa”, que decorrente do “princípio do contraditório” a que se deve subordinar todo o processo uma vez iniciado. Assim, sustenta-se aí que: «Como refere Carlos Lopes do Rego (“Os princípios constitucionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade dos ónus e cominações e o regime de citação em processo civil”, Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra, 2003, pp. 835‑859): “A garantia da via judiciária – ínsita no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa e a todos conferida para tutela e defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos – envolve, não apenas a atribuição aos interessados legítimos do direito de ação judicial, destinado a efetivar todas as situações juridicamente relevantes que o direito substantivo lhes outorgue, mas também a garantia de que o processo, uma vez iniciado, se deve subordinar a determinados princípios e garantias fundamentais: os princípios da igualdade, do
 
contraditório e (após a revisão constitucional de 1997) a regra do «processo equitativo», expressamente consagrada no n.º 4 da­quele preceito constitucional”, sendo do princípio do contraditório que “decorre, em primeira linha, a regra fundamental da proibição da indefesa”.»
Partindo destas considerações o Tribunal Constitucional defendeu que seria: «uma restrição constitucionalmente intolerável do direito de defesa a limitação, no incidente de despejo imediato por falta de pagamento de rendas na pendência de ação de despejo, das possibilidades de defesa do requerido à alegação e prova de que, até ao termo do prazo para a sua resposta, procedeu ao pagamento ou depósito das rendas em mora e da importância da indemnização. Tal meio de defesa é manifestamente desajustado em todos os casos em que justamente se questiona o próprio dever de pagamento de determinada renda, seja por que fundamento for (inexistência de contrato de arrendamento válido, não serem autor e/ou réu os verdadeiros locador e/ou locatário, dissídio quanto ao montante da renda ou da sua imediata exigibilidade, invocação de diverso título para justificar a ocupação do local)».
Recentemente, o Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 327/2018 (Proc. n.º 850/14 – Relator: Cláudio Monteiro) debruçou-se sobre esta mesma questão já no quadro do Art. 14.º n.º 4 e n.º 5 do NRAU, com as alterações da Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, sustentando que o incidente de despejo imediato, com os contornos legais assim estabelecidos, não seria inconstitucional, mas deveria ser sujeito aos limites de interpretação impostos pela valoração já anteriormente sustentada por esse mesmo Tribunal no acórdão n.º 673/2005 e, fazendo uso do disposto no Art. 80.º n.º 3 do LTC, conformou a norma em causa com a interpretação restritiva julgada conforme com a Constituição.
Decidiu assim: «interpretar o artigo 14.º, n.º 4 da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, alterado pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, em consonância com o n.º 5 do mesmo artigo, em conformidade com princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição, no sentido de que o despejo imediato com fundamento em falta de pagamento de rendas vencidas na pendência da ação nele previsto não é automático, sendo o seu requerimento livremente apreciado pelo juiz, pelo que, nos casos em que na ação de despejo persista controvérsia quanto à existência ou exigibilidade do próprio dever de pagamento de renda, o réu não deve ser impedido de exercer o contraditório mediante a utilização dos correspondentes meios de defesa.»
Há assim que considerar todos os meios de defesa que o arrendatário opõe ao pedido de despejo, mas subsistindo a possibilidade do senhorio recorrer ao incidente de despejo imediato, que se funda no não cumprimento da obrigação de pagamento
 
da renda na pendência da ação de despejo, teremos de ponderar se os concretos fundamentos que o inquilino invoca em sua defesa constituem causa de justificação bastante para não lhe ser exigível o pagamento da renda.
Deverá ser decretado o despejo imediato quando os fundamentos de defesa em nada afetam o cumprimento da obrigação de pagamento de renda e quando mais não sejam que uma forma de protelar o gozo da coisa de forma injustificada e à custa alheia.”
 
*
 
O Apelante e a co-Ré foram notificados para em 10 dias procederem ao pagamento ou depósito das rendas vencidas na pendência da acção e ainda da importância devida a título de indemnização.
No prazo não comprovaram o pagamento nem procederam ao depósito.
 
A Ré remeteu para o constante nos artigos 29º a 57º da contestação e 97º a 116º da reconvenção, insistindo que os Réus-Reconvintes são credores dos AutoresReconvindos da importância global de € 61.680,31 a título de benfeitorias e despesas relativas ao locado durante o período em que a Ré-Reconvinte se viu privada da sua utilização plena e para os fins a que ele se destinava – discoteca. Acrescentou que o valor peticionado pelos Autores, a título de rendas, e bem assim de rendas vencidas  (à razão de 10 mil euros por ano), é inferior ao que a RéReconvinte despendeu com as obras realizadas no locado, com carácter urgente e indispensável.
Insistiu no seu direito de não proceder ao pagamento das quantias que eventualmente foram devidas a título de rendas vencidas na pendência da acção de despejo, até perfazer o valor referido  de € 61.680,31.
O Apelante vem igualmente dizer no artigo 3º do corpo alegatório da minuta que considera que o montante eventualmente em dívida a título de rendas está a “ser pago” ou a ser descontado no montante que foi despendido com as obras - € 61.680,31.
 
Em sede de recurso o Apelante, face à decisão de deferimento do despejo imediato, invoca:
 
1- a exceção do não cumprimento do contrato;
2- o direito à compensação do eventual valor das rendas em dívida pelas quantias despendidas com obras urgentes realizadas no locado;
 
 
Estes meios de defesa já haviam sido invocados em sede de contestaçãoreconvenção. 
 
Neste momento cabe tratar esta linha de defesa em sede de incidente de despejo imediato. Nada mais. 
 
Assim –
 
A exceção do não cumprimento do contrato, tal como estabelecida no Art. 428.º do C.C. só legitima o incumprimento do devedor relativamente a prestações principais recíprocas, ligadas entre si por um vínculo sinalagmático.
A inquilina não pode deixar de cumprir a obrigação de pagamento das rendas com fundamento no facto da senhoria não cumprir a obrigação de fazer obras no locado, porque a obrigação de pagar a renda é uma obrigação principal do contrato de arrendamento (Art.s 1022.º e 1038.º al. a) do C.C.) que não é correspetiva daquela outra obrigação, meramente acessória, a cargo do senhoria (Art. 1074.º do C.C.).
A obrigação de pagamento da renda é, no entanto, correspetiva da obrigação, a cargo do senhorio, de proporcionar o gozo da coisa (Art. 1022.º, conjugado com os Art.s 1031.º al. b) e 1038.º al. a) do C.C.).
Tanto assim é que o Art. 1040.º n.º 1 do C.C. prevê que se o locatário sofrer uma privação ou diminuição do gozo da coisa, haverá lugar a uma redução da renda proporcional ao tempo da privação ou diminuição e à extensão desta.
Invocando os Réus que o locado não habitacional, mas destinado a discoteca não tem condições para abertura ao público por deficiências na cobertura, falta de realização de obras de adaptação, etc., em função do Art. 1040º do C.C., poderia colocar-se a questão do eventual direito à redução da renda, uma vez que a inquilina, apesar das condições de utilização deficientes que diz existirem, nem por isso deixou de manter o locado na sua posse.
Só que, na verdade, nada disso está em causa nos autos, porque os Réus decidiram, pura e simplesmente, deixar de pagar a renda, o que é incompatível com a sua continuação do gozo da coisa.
Os Réus podem efetivamente ter razões válidas para exigir dos Autores a realização de obras no locado por forma a que o mesmo cumpra requisitos de utilização a que está destinado, mas não podem recusar o pagamento integral da renda, continuando a deter o locado.
 
Esta linha de defesa não colhe, não impedindo a decretação do despejo imediato.
 
 
É precisamente para este tipo de situações que se justifica o incidente de despejo imediato, por forma a não se permitir que o inquilino permaneça indefinidamente no locado, beneficiando do gozo gratuito da coisa à custa do senhorio, protelando o despejo efetivo de forma injustificada.
 
Neste sentido o Ac. do TRL de 20-12-2018, prolatado no p. nº 1830/17.0T8VFX.L1-7, Relator Carlos Oliveira, acessível no mesmo site, aqui seguido de perto. 
 
Já quanto ao argumento da compensação a apreciação a ter parece diferente. 
 
Segundo as alegações o contrato de arrendamento urbano não habitacional terá sido celebrado entre Autores e Réu. Mas a Ré sociedade é quem “ocupa” o locado.
 
A Ré deduziu contra os Autores pedido reconvencional, onde recupera o alegado nos artigos 29º a 57º da contestação, e acrescenta o que vai dos artigos 98º e seguintes da peça. Alega ter levado a cabo obras no locado, de natureza urgente e indispensável, que foram por si efectuadas com a concordância dos Autores. As obras incidiram no telhado da cobertura do estabelecimento, com retirada de cumes, reparação de muros, colocação de ferros, cobertura nova, novas caleiras, impermeabilização, pintura e revisão da parte eléctrica -, traseiras da discoteca, reboco, isolamento e pintura de paredes -, pladur dentro do locado, pintura. Alega ter já gasto nestes trabalhos € 18.890,00, e ter de suportar ainda € 23.410,00 até perfazer a totalidade do orçamento que ascende a € 42.300,00 + IVA,  que junta.  Alega que o espaço de diversão, fruto da inacção dos Autores em fazerem as obras, esteve encerrado de 3 de Março a fim de Outubro de 2018, tendo por isso deixado de auferir a quantia de € 12.000,00.
Os montantes peticionados somam € 61.680,61.
No artigo 113º da reconvenção a Ré alega pretender, com a reconvenção, alcançar o direito a ver reembolsadas as despesas relativas ao locado no período em que se viu privada da sua utilização total.
Nos artigos 114º e 115º da reconvenção alega que, por entender que o valor peticionado pelos Autores, a título de rendas, é inferior ao peticionado na reconvenção, sempre existirá lugar à compensação de créditos na parte em que um e outro créditos se equiparam.
Os Réus alegam na contestação, juntando prova, que a Ré, a 18 de Setembro de
2018, requereu a notificação judicial avulsa dos Autores – p. nº603/18.... –
 
no sentido de que os ora Autores deviam pagar à ora Ré € 42.300,00, de que  Ré já suportara € 12.690,00, respeitante a obras urgentes levadas a cabo no locado, tudo no prazo de 30 dias. Invoca para tal o disposto no artigo 1036º do CC. Adverte que caso os ora Autores não reembolsem a notificante – ora Ré -  em tal prazo, pretende exercer o direito à compensação  do seu crédito  no montante de € 42.300,00, com a obrigação de pagamento  da renda, nos termos do artigo 1074º do CC. 
 
As benfeitorias necessárias, como aquelas que foram alegadas na contestação e que fundamentam o pedido reconvencional, quando realizadas com o consentimento do senhorio, são lícitas (Art. 1074.º n.º 2 do C.C.). 
A lei permite a compensação entre o valor das rendas e o das obras realizadas pelo inquilino na pendência do contrato de arrendamento, mas essa possibilidade está subordinado às regras dos n.ºs 3 e 4 do Art. 1074.º do C.C., cujos pressupostos, numa análise perfunctória, parecem verificar-se. 
 
Nesta parte a acção ainda não está decidida. 
 
Por isso, com o fundamento da alegada compensação de créditos ainda não decidida, não pode o pedido de despejo imediato proceder.
 
A decisão recorrida não é de manter. 
 
*
 
V-DECISÃO:
 
Pelo que fica exposto, acorda-se neste Tribunal da Relação em julgar a apelação procedente, indo revogada a decisão recorrida que vai substituída por outra que nega o despejo imediato do locado. 
 
Custas pelos Autores, ora Apelados.
 
Valor do incidente, o da causa € 71.995,00.
 
Coimbra, 9 de Abril de 2024.
 
(Rui António Correia Moura)                                 
 
 
(Fonte Ramos)
 
(João Moreira do Carmo)