Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2119/18.2T8LRA.C3
Nº Convencional: JTRC
Relator: TERESA ALBUQUERQUE
Descritores: EXCLUSÃO DE PARTES PRESUNTIVAMENTE COMUNS DO REGIME DA PROPRIEDADE HORIZONTAL
PARTES COMUNS OBJECTIVAMENTE DESTINADAS AO USO DE DETERMINADA FRACÇÃO AUTÓNOMA
DIREITOS PESSOAIS DE GOZO
OBRAS ILÍCITAS
ABUSO DE DIREITO
Data do Acordão: 01/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 334.º; 335.º, 2; 1418.º, 2, B); 1421.º, 1, A), 2, A) E 3; 14222.º, 1, 3 E 4; 1425.º, 1 E 1429.º-A, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário:
I –Os condóminos podem organizar-se e constituírem-se em assembleia, desde que constituída a propriedade horizontal, não carecendo de inscreverem o  condomínio no registo e tão pouco de possuírem regulamento de condomínio.
II - Relativamente às partes que presuntivamente são comuns – como sucede com os pátios e os jardins anexos ao edifício, cfr al a) do nº 2 do art 1421º CC -  podem convencionar que as mesmas sejam excluídas desse regime, desde que no titulo constitutivo da propriedade horizontal as afectem a uma ou mais fracções. Essa  afectação vinculará os futuros adquirentes das fracções, independentemente do seu assentimento, desde o registo desse titulo.
III - Diferente dessa situação é a das «destinações objectivas», igualmente incidentes sobre partes presuntivamente comuns do edifício, e que decorrem da circunstância fáctica de uma tal parte se encontrar, desde data anterior à da constituição da propriedade horizontal, destinada objectivamente a determinada fracção autónoma.
IV – Ainda relativamente a partes presuntivamente comuns, podem os condóminos, desde que na sua totalidade, e mesmo antes da constituição da propriedade horizontal,  constituir direitos pessoais de gozo a favor de todos ou de parte deles, fazendo-o por mero acordo verbal.
V – Esses  direitos pessoais de gozo não são oponíveis  a terceiro que adquira a fracção sobre que os mesmos incidam, a menos que a exclusividade deles decorrente for ou vier a se, referida no título constitutivo da propriedade horizontal, caso em que se  passará a estar  perante  um direito real.
VI - O direito pessoal de gozo traduz-se no poder de agir directa e autonomamente sobre uma coisa, mas apenas em função do seu aproveitamento naturalístico - o aproveitamento directo e efectivo das utilidades de certa coisa, que  permite o uso, a fruição e por vezes a transformação da coisa    - não se compaginando com obra que afecte parte imperativamente comum do prédio, que sempre carecerá de ser aprovada nos termos do art 1425º/1 do CC.
VII – Quando se conclua que o terceiro, relativamente ao acordo de que resultou a atribuição de direitos pessoais de gozo à totalidade dos condóminos do prédio e que adquiriu subsequentemente uma das fracções, também ele agiu ilicitamente, por ter procedido a obras que alteraram a estrutura arquitéctonica daquele, haverá que ponderar e graduar os resultados das contrapostas ilicitudes, para se concluir se o mesmo agiu, na interposição da acção, em abuso de direito na modalidade de tu quoque.
Decisão Texto Integral:

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra

I -  AA, intentou acção declarativa com processo comum, contra BB e contra CC e marido, DD, pedindo que:
a) Os RR. sejam condenados a ver declaradas ilícitas as obras realizadas, nomeadamente as construções no logradouro e a abertura de novas portas;
b) Sejam também condenados a demolir, a expensas suas, as obras supra descritas, e a reporem o imóvel no mesmo estado em que antes se encontrava, designadamente o encerramento das portas que dão acesso ao logradouro;
c) E condenados cada um dos RR. no pagamento de uma indemnização de € 10.500,00, cada, referente aos danos pela privação do uso do prédio, por ocupação ilícita pelos mesmos.
Alegou para tanto, e em síntese, que, sendo dono da fracção autonóma designada pela letra “C”, correspondente ao 1ª andar dto do prédio em questão nos autos, tendo-o adquirido por doação da sua mãe registada em 4/4/2017, e sendo o 1º R., BB, dono da fracção “A”, correspondente ao r/ch dto desse prédio, e os 2º e 3ª RR., donos da fração “B”, correspondente ao seu r/ch esq, constando da escritura da constituição da propriedade horizontal do mesmo, que teve lugar em 27/2/1995, que «é comum a todas as fracções o logradouro  com a área de 1771 m2 situado na frente  e traseira da edificação», os RR. construíram nas suas fracções portas de acesso privado ao logradouro, fazendo, assim, esse acesso, por porta distinta da porta comum do prédio, e sem terem de aceder às partes comuns do mesmo, e construíram duas edificações no logradouro, sendo que, anos depois, vedaram esses espaços, excluindo os demais condóminos daquela área e daquelas edificações, tudo isto sem discutirem essas obras em sede de Assembleia de Condóminos. Mais alega que as vantagens ilicitamente advindas para os RR. com a sua exclusão dessa área e a sua consequente privação desse uso lhe implicou danos, pedindo o respectivo ressarcimento.
O R. BB contestou, referindo ter adquirido a fracção “A” em 22/9/2011,  da empresa R... SA, que, por sua vez, a havia recebido de permuta de EE, referindo desconhecer os factos que o A. alega referentes à abertura das portas e à construção das edificações, pois, quando adquiriu a fracção em causa a porta de acesso ao logradouro já estava aberta e  já estava construída a edificação, tendo-lhe sido explicado na visita tendente  à aquisição, existirem quatro espaços no logradouro, devidamente identificados, pertencendo cada um deles a cada uma das fracções.
Os RR. CC e DD contestaram, excepcionando a ilegitimidade, por não estarem na acção a totalidade dos condóminos, e, impugnando, referiram que o prédio foi construído pelo avô do A. e atribuídas três das suas fracções, a três filhos daquele - a R., Mº CC, FF e EE -  e a quarta, ao próprio avô, porque a mãe do A., quarta filha daquele,  GG, ao contrário dos irmãos,  não quis contribuir para a construção do prédio. Mais referem que desde que a propriedade horizontal foi constituída, mas em altura em que ainda não existia condomínio (cfr art 28º) que, todos os co-proprietários acordaram que o logradouro seria dividido e utilizado, independentemente, por cada um deles, nos exactos termos em que o vêm fazendo, com as construções que nessas partes se encontram edificadas, e com a abertura das portas a que o A. se refere, mas sem que esteja impedido o acesso de seja quem for aos quatro espaços em causa. Alegam ainda – art 36º da p i - que o A. realizou obras na sua fracção que chegam inclusivamente a alterar a fachada do prédio e que não foram autorizadas por nenhum dos demais condóminos (porque efectuadas depois da constituição do condomínio), explicando no art 37º que alterou a janela do WC da sua fracção para alumínio, em desfasamento face a todas as outras janelas do prédio, que são em madeira. Em sede de direito, invocam o abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, vincando que, todas as construções que foram efectuadas foram realizadas com o consentimento de todos os proprietários à altura, sendo do conhecimento do A. e da sua mãe que sucedeu na propriedade ao seu avô, pelo que foram sempre do conhecimento do A. .

Na sequência de despacho de adequação formal, em que se convidou o A. a responder por escrito à excepção invocada, veio, aquele, pronunciar-se pela sua legitimidade e a dos RR. na acção.

Foi proferido despacho em que se julgou verificada a excepção dilatória de falta de legitimidade dos RR., sendo estes absolvidos da instância, despacho que foi revogado por este Tribunal da Relação na sequência de recurso do A.
 
Foi dispensada a realização de audiência prévia, fixado à acção o valor de € 58.800,00, proferido despacho saneador, identificados o objecto do litigio e enunciados os temas de prova.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença, que julgou parcialmente procedente a acção e, em consequência, declarou  ilícitas as construções no logradouro e a abertura de novas portas, e condenou os RR. BB, CC e DD a demolir, a expensas suas, as construções realizadas no logradouro acima descritas e a reporem o imóvel no mesmo estado em que antes se encontrava, encerrando as portas que dão acesso ao logradouro, absolvendo os RR. do restante pedido deduzido pelo A.

 Do assim decidido, apelaram, autonomamente, o R. BB e os RR. CC e HH.

Este Tribunal, nos termos do art 662º/2 al c) CPC, anulou a sentença proferida na 1ª instância para que aí se procedesse à ampliação da matéria de facto, em função da alegada nos arts 36º e 37º da contestação dos RR. CC e marido, (referente às acusadas alterações na janela da casa de banho por parte do A.).

Na 1ª instância foi proferido despacho ampliando a matéria de facto sujeita a tema de prova àqueles arts 36º e 37º, tendo-se convidado as partes a indicarem os meios de prova correspondentes que se mostrassem já juntos aos autos (como o caso de documentos ou outros) ou meios de prova que pretendessem ainda produzir sobre a referida matéria.

O A., referindo existir uma impossibilidade física para a alteração da fachada, pois que a referida “janela” é uma fresta, cuja visibilidade do exterior se encontra obstaculizada por “gradeamento” de betão, conforme fotografias que juntou, referiu não pretender a audição de qualquer das testemunhas que arrolara, requerendo, no entanto, a inspecção judicial ao prédio.

Os RR. CC e DD renovaram, quanto ao referido tema de prova, o requerimento de prova já apresentado e requereram as suas declarações de parte.

As partes foram convidadas para juntarem aos autos fotografias da fachada do prédio, o que os acima referidos RR. fizeram, tendo o A. junto cópia simples das Plantas dos Alçados juntas à Camara Municipal ....

Teve lugar audiência final, na qual foi prescindida a prova testemunhal e a requerida inspecção ao local, tendo os respectivos mandatários dado por reproduzidas as alegações produzidas na anterior audiência de julgamento.

Após o que foi proferida sentença, em que se julgou parcialmente procedente a acção, declarando  ilícitas as construções no logradouro e a abertura de novas portas, e se condenaram os RR. BB, CC e DD a demolir, a expensas suas, as construções realizadas no logradouro acima descritas e a reporem o imóvel no mesmo estado em que antes se encontrava, encerrando as portas que dão acesso ao logradouro, absolvendo-se os mesmos do restante pedido deduzido pelo A..

II – Do assim decidido, apelaram os RR. CC e DD, tendo concluído as respectivas alegações nos seguintes termos:

 1. Em causa, na presente ação, está a realização de obras em parte comum de um edifício, sobre o qual se encontra constituída propriedade horizontal, com o conhecimento e acordo expresso de todos os proprietários.

2. À data da realização das obras de abertura das portas da fração dos Recorrentes diretamente para o logradouro todos os comproprietários deram o seu assentimento.

3. Como não se encontrava ainda constituído o condomínio, facto que só ocorreu em setembro de 2017, os coproprietários não estavam sujeitos às regras indicadas nos artigos 1422.º e 1425.º do CC – violados pela sentença em crise - quanto à forma de deliberação dos coproprietários para a realização de obras inovatórias em partes  comuns.

4. Pelo que andou mal o Tribunal a quo quando aplicou as normas referidas ao caso em apreço, na medida em que as mesmas não têm cabimento verificada a factualidade concreta.

 5. O acordo entre os anteriores proprietários, ao abrigo do artigo 1372.º do CC, não carece de forma especial pelo que se basta, para a sua perfeição e validade, que seja realizado de forma verbal, pelo que o referido artigo foi violado pela Sentença em crise,

6. Pelo que, mais uma vez, incorreu o Tribunal a quo numa incorreta aplicação das normas substantivas quando decidiu pela invalidade e ineficácia do acordo em causa por carecer de forma necessária.

7. O acordo entre os anteriores proprietários é extensível ao Recorrido, que adquiriu a propriedade por doação, na forma em que, torna-se impraticável a situação contrária, em que carece de consentimento a aprovação de todas as inovações realizadas há longos tempos a todos os eventuais comproprietários que possam vir a surgir.

 8. Mais uma vez, errou o Tribunal a quo, ao decidir pela não aplicação do acordo ao Recorrido.

9. No que toca à divisão do logradouro comum, e as consequentes edificações efetivas nas mesmas partes destinadas a cada um dos proprietários, a mesma não se fez, de forma nenhuma, à margem da lei.

10. O acordo em causa, mais uma vez, foi realizado com a observância de todas as formalidades legais.

11. Na mesma linha de argumentação tida na questão anterior, como à data não encontrava constituído condomínio, não se encontrava formada a assembleia de condóminos, pelo que o pressuposto lógico de aplicação das normas vertidas nos artigos 1422.º e 1425.º do CC, que a sentença em crise violou, não se encontram verificadas, pelo que não podem, de maneira alguma, ter aplicação no caso concreto.

12. Pelo que incorreu o Tribunal a quo numa incorreta aplicação do Direito ao caso em apreço.

13. Deveriam ser aplicadas as normas relativas à compropriedade, que quanto aos acordos entre os comproprietários sobre o uso de uma coisa comum, não prescrevem forma especial, pelo que o simples acordo verbal e expresso entre os comproprietários da altura é suficiente para a divisão do logradouro.

 14. O acordo entre os comproprietários da altura é extensível ao Recorrido, tal como é perfilado pelo Acórdão do Superior Tribunal da Justiça citado supra – “Sendo este direito pessoal de gozo conferido nas apontadas condições, vincula não só os que então já tinham a qualidade de condóminos, como aqueles que posteriormente assumiram tal qualidade e ao adquirirem fracções autónomas deste edifício.”

 15. Pelo que tanto a divisão, como as edificações no logradouro foram realizadas de forma correta, não se comportando com as demolições das mesmas, tal como foi decidido pelo Tribunal a quo.

 16. Pelo que deve ser alterada a Sentença em crise e proferido Douto Acórdão que absolva os Recorrentes do pedido.

 17. Não prescindindo, a forma como o Recorrido exerce o seu direito é claramente abusiva, em óbvia violação do artigo 334.º do CC, que o Tribunal a quo aplicou erradamente por ter apreciado de forma menos correta os factos materiais.

18. O Recorrido incorre em abuso de direito, na modalidade de tu quoque, quando invoca a violação de um direito que ele mesma viola ao alterar janelas na sua fração que modificam a linha arquitetónica do edifício em propriedade horizontal.

 19. Efetivamente, e quanto a esta questão, o Tribunal a quo efetuou uma errada apreciação da matéria de facto, redundando num manifesto erro de julgamento, ao dar como não provada a alteração da janela do WC do Recorrido.

20. Errando igualmente ao apreciar a questão das obras na fração do Recorrido ao abrigo dos artigos 1360.º, 1363.º e 1364.º do CC (que foram, assim, violados), e que se aplicam a relações entre vizinhos de prédios distintos e já não às relações entre condóminos, como é o caso, em que se aplicam as regras dos artigos 1422.º e ss do CC.

21. Efetivamente, as obras realizadas pelo Recorrido na sua fração, foram-no em clara violação dos artigos 1422.º n.º 3 e 1425.º n.º 1 ambos do CC, qua a Sentença em crise, ao sancionar tais obras violou, na medida em que foram realizadas obras consistentes na instalação de janelas de alumínio, que não se assemelham em nada às restantes janelas de madeira do edifício, modificando, desde modo, e igualmente, a linha arquitetónica do edifício.

22. O erro de julgamento é manifesto, bastando para a sua verificação verificar que não só o Recorrido nunca impugna que fez tais obras, antes o admitindo, com as fotografias constantes dos autos demonstram claramente os diferentes materiais utilizados e a cor diferente das janelas.

23. Sendo por isso mesmo, manifesta a violação pelo Recorrido, em data muito posterior à da constituição do Condomínio, do artigo 1422.º nº 3 do CC, preceito que a decisão em crise igualmente violou ao confundir os conceitos de alçado com o de linha arquitetónica ou arranjo estético.

 24. Pelo que não só deverá ser alterada a matéria de facto, dando-se como provado que o Recorrido alterou a janela do seu WC, nomeadamente alterando a cor e material da mesma – como resulta da própria versão do Recorrido e das fotografias juntas aos autos.

25. Como a matéria em questão terá que ser apreciada à luz dos critérios do artigo 1422.º, nº3 do CC, e não à luz dos artigos 1360.º e ss do CC, que se referem a relações de vizinhança diferentes.

26. O Recorrido invoca a violação de um direito por parte dos Recorrentes, o que não acontece, como se conclui pela exposição supra, quando ele próprio viola essa mesma regra de procedimento quanto à realização de obras na sua fração, incorrendo em claro abuso de direito na modalidade do tu quoque

27. O Recorrido incorre igualmente em abuso de direito, na modalidade de suppressio, quando alimentou uma situação de confiança durante largos anos – mais de 20 - não só nos momentos em que se tornou efetivamente proprietário da fração, como também, em momentos anteriores quando habitava na fração com o seu avô e posteriormente mãe, e usava parte do logradouro, sem nunca colocar em causa a divisão e quaisquer edificações do logradouro.

28. Pelo que deve ser igualmente modificada a Sentença da qual se recorre na parte do não reconhecimento do abuso de direito do Recorrido.

O R BB aderiu o recurso interposto pelos acima referidos RR .

Não foram produzidas contra-alegações.


III -   O Tribunal da 1ª instância julgou provados os seguintes factos:
 1. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...28 o prédio urbano denominado “...”, localizado em ..., Rua ..., freguesia ... (...), composto de “Casa de habitação de cave com 4 garagens, rés-do-chão e 1º andar direitos e esquerdos e sótão com 4 arrecadações e logradouro”, inscrito na matriz sob o art. ...24.º (conforme doc. n.º 1) [1.º P.I.].
2. E pela Ap. ...4 de 1994/06/28 está inscrita a aquisição a favor de “EE casado/a com II no regime de Comunhão geral e de JJ/a com EE no regime de Comunhão geral, por “Divisão de coisa comum” (conforme doc. n.º 1) [1.º P.I.].
 3. Em 27 de Fevereiro de 1995, o referido EE solicitou à Câmara Municipal ... a vistoria para fim da constituição da propriedade horizontal no prédio sito na Rua ..., no lugar da ..., denominado "...", freguesia ... (...), descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...20 (conforme doc. n.º 4) [6.º P.I.].
4. Tendo proposto a constituição da propriedade horizontal nos seguintes moldes [7.º P.I.]: “Fracção A: Rés do chão direito, destinado a habitação, composta por 4 divisões assoalhadas, uma cozinha, duas casas de banho, um corredor, uma dispensa, uma marquise, uma arrecadação no sótão designada pela letra A e uma garagem individual na cave. Fracção B: Rés do chão esquerdo, destinado a habitação, composta por 4 divisões assoalhadas, uma cozinha, duas casas de banho, um corredor, uma dispensa, uma marquise, uma arrecadação no sótão designada pela letra B e uma garagem individual na cave. Fracção C: 1º andar direito, destinado a habitação, composta por 4 divisões assoalhadas, uma cozinha, duas casas de banho, um corredor, uma dispensa, uma marquise, uma arrecadação no sótão designada pela letra C e uma garagem individual na cave. Fracção D: 1º andar esquerdo, destinado a habitação, composta por 4 divisões assoalhadas, uma cozinha, duas casas de banho, um corredor, uma dispensa, uma marquise, uma arrecadação no sótão designada pela letra D e uma garagem individual na cave. Acessos: Todas as fracções (A, B, C e D) têm entrada comum pela porta, que dá acesso às escadas, com o referido n.º ... de polícia. A entrada para as garagens é feita por portões individuais que deitam para o logradouro fronteiro e deste para o arruamento. Logradouro Comum: É comum a todas as fracções o logradouro com a área de 1771 m2, situado na frente e na traseira da edificação.”
 5. Tendo o título constitutivo da propriedade horizontal, inclusive subscrito pelos segundo e terceiros Réus, previsto aquela divisão [8.º P.I.].
6. Por escritura pública de "Propriedade Horizontal e Compra e Venda" outorgada em 10 de Agosto de 1995 no Cartório Notarial ..., foi constituída a propriedade horizontal do referido prédio (conforme docs. n.º 5) [9.º P.I.].
 7. A constituição em propriedade horizontal do referido prédio conta da Ap. ...3 de 1996/01/04 (conforme doc. n.º 1) [1.º P.I.]: Fracção A: Permilagem: 250 Fracção B: Permilagem: 250 Fracção C: Permilagem: 250 Fracção D: Permilagem: 250.
8. O prédio acima descrito é composto por quatro fracções autónomas (A, B, C, D) com quatro garagens, arrecadações e sótão, e ainda por um logradouro comum, situado na frente e nas traseiras do imóvel [10.º P.I.].
9. Tendo uma saída comum pelo n.º ... da Rua ....I.].
 10. Em data não apurada do ano de 1995, mas sensivelmente contemporânea ou posterior à data da constituição da propriedade horizontal, que EE e mulher II, CC [2.ª Ré], FF, EE (à data todos proprietários das fracções) e ainda GG, acordaram verbalmente que o logradouro seria dividido em 4 parcelas (tantas quanto as fracções) e para utilização independente por cada um dos proprietários das 4 fracções [20.º Contestação dos 2.º e 3.º RR.].
 11. Sendo que os proprietários de ambos os Rés-do-chão, ora Réus, ficaram com as duas parcelas mais próximas ao edifício e os proprietários dos primeiros andares com as parcelas mais afastadas [21.º Contestação dos 2.º e 3.º RR.].
12. A aquisição da fracção autónoma designada pela letra “B”, do aludido prédio correspondente ao “Rés-do-chão esquerdo, destinado a habitação, composto por quatro assoalhadas, uma arrecadação no sótão, designada por letra B e uma garagem individual na cave” encontra-se inscrita a favor dos 2.º e 3.º RR. CC e DD por compra a EE e II, pela AP. ...3 de 1996/03/21(conforme doc. n.º 3) [4.º e 5.º P.I.].
13. Em data não apurada, mas depois da realização do acordo verbal acima referido, os Réus muraram e vedaram as parcelas correspondentes no modo visível nas fotografias juntas à P.I. como doc. 7 [17.º P.I.].
 14. O que sucedeu com conhecimento e consentimento de todos os demais proprietários das demais fracções à época [56.º Cont. 2.º e 3.º RR.].
 15. E na mesma altura foi feito um “caminho” sensivelmente a meio do logradouro para que os dois proprietários dos primeiros andares pudessem aceder às suas parcelas, que ainda se mantém visível [22.º Contestação dos 2.º e 3.º RR.].
16. O que sucedeu com conhecimento e consentimento de todos os demais proprietários das demais fracções à época [56.º Cont. 2.º e 3.º RR.].
17. Em data não apurada sensivelmente entre o ano 2000 e o ano de 2009, o anterior proprietário da fracção actualmente do 1.º Réu construiu uma “edificação” na parte do logradouro que lhe foi atribuída no acordo de 1995 acima mencionado e os 2.º e 3.º RR. de igual modo construíram uma “edificação” na parte do logradouro que lhes foi atribuída no acordo de 1995 acima mencionado (ambas visíveis na fotografia junta na P.I. como doc n.º 7) [16.º P.I. e 24.º Cont. 2.º e 3.º RR.].
18. As referidas edificações foram construídas com conhecimento e consentimento dos demais proprietários [24.º Cont. 2.º e 3.º RR.].
 19. Uma das edificações encontra-se totalmente vedada, sem permitir acesso dos demais condóminos [18.º P.I.].
 20. E a outra edificação configura uma “casa” com janelas e portas que impedem o acesso de qualquer dos demais condóminos ao seu interior [19.º P.I.].
21. Nenhuma das referidas obras foi alvo de aprovação camarária [20.º P.I.].
 22. Nem discutida/aprovada em sede de Assembleia de Condóminos [21.º P.I.].
 23. As construções referidas impendem a plena utilização de todo o logradouro pelos demais condóminos, incluindo o Autor após aquisição da sua fracção [25.º, 36.º e 38.º P.I.].
24. Em data não apurada, mas próxima do ano de 2009, o anterior proprietário da fracção actualmente pertencente ao 1.º Réu construiu na sua fracção uma “porta” para acesso privado ao logradouro e os 2.º e 3.º RR. construíram na sua fracção uma “porta” para acesso privado ao logradouro, ambas distintas da porta comum do prédio (visíveis na fotografia junta na P.I. como doc. 6) [13.º, 14.º e 15.º P.I.].
25. O que sucedeu com o conhecimento e consentimento de todos os proprietários de todas as demais fracções à data daqueles [56.º Contestação dos 2.º e 3.º RR. ].
26. A referida abertura de portas altera a fachada do imóvel [23.º P.I.].
27. Os Réus não convocaram a Assembleia de Condóminos [35.º P.I.].
28. A aquisição da fracção autónoma designada pela letra “A”, do aludido prédio correspondente ao correspondente ao “Rés-do-chão direito, destinado a habitação, composto por quatro assoalhadas, uma arrecadação no sótão, designada pela letra A e uma garagem individual na cave” encontra-se inscrita a favor do Réu BB por compra a R... S.A., pela AP. ...08 de 2011/09/22 (conforme doc. n.º 2) [3.º P.I.].
29. A referida R... S.A. havia adquirido a fracção “A” a EE, por permuta, pela Ap. ...41 de 2011/09/22 (cfr. doc. 2) [4.º Contestação do R. BB].
30. Em 2011/2012, com o consentimento de todos os demais proprietários à data, os 2.º e 3.º RR. fizeram obras de restauro e melhoramento da “edificação” acima referida [25.º Contestação dos 2.º e 3.º RR.].
31. Todos os factos acima descritos eram do conhecimento do Autor e de GG (mãe do Autor) [73.º e 74.º Contestação dos 2.º e 3.º RR.].
32. A aquisição da fracção autónoma designada pela letra “C”, do aludido prédio correspondente ao “Primeiro andar direito destinado habitação composto por quatro assoalhadas, uma arrecadação no sótão designada pela letra C e uma garagem individual na cave”, encontra-se inscrita a favor do Autor AA por doação de GG, pela Ap. ...43 de 04 de Abril de 2017 (conforme doc. n.º 1) [2.º P.I.].
Mais se provou ainda:
33. No w/c da fracção do Autor existe uma abertura para o exterior com gradeamento de betão, como sucede com as demais aberturas do prédio na correspondente fachada, sem alteração do alçado [36.º e 37.º, P.I.].

E julgou não provados os seguintes factos:
 a) Foi há cerca de cinco anos que os Réus muraram e vedaram as partes do logradouro que acordaram ficar para sua utilização independente [17.º P.I.].
 b) Nenhum dos demais condóminos concordou com tais alterações [22.º P.I.].
c) As referidas construções impedem que o logradouro seja utilizado para o fim a que se destina [26.º P.I.].
d) Os Réus tinham conhecimento que aquele espaço não era apenas para uso exclusivo e acesso dos mesmos [28.º P.I.].
e) O Autor e antes a sua mãe, e o seu avô (uma vez que o imóvel foi herdado em 2017), sempre utilizaram o logradouro na totalidade [31.º P.I.].
 f) Há mais de 20 anos que o avô do Autor, a sua mãe e agora o Autor têm a posse e o uso do logradouro na sua totalidade, conjuntamente com os demais condóminos [32.º P.I.].
g) Os Réus tinham conhecimento que tais obras eram contra a vontade dos outros proprietários [33.º P.I.].
h) Uso esse que é seu direito enquanto proprietário e condómino [37.º P.I.].
 i) O Autor não pode utilizar o logradouro para as actividades de lazer para a qual estava destinado [39.º P.I.].
j) Ao invés, os Réus beneficiam “quase” em exclusivo da capacidade do logradouro [40.º P.I.].
k) Ali recebendo visitas e organizando “churrascos” [41.º P.I.].
 l) Guardando pertences pessoais e armazenando objectos [42.º P.I.].
m) Plantando vegetais para consumo humano e retirando benefícios económicos em exclusivo [43.º P.I.].
 n) Os Réus obtiveram vantagens da utilização do logradouro com exclusão do Autor, no montante mínimo de €21.000,00 [47.º P.I.], correspondentes a: - €7.200,00 por cada um dos imóveis construídos, correspondente ao valor de renda que os Réus pagariam por imóveis de iguais características num período de 2 anos [48.º P.I.], - €3.300,00 por cada uma das áreas do logradouro que ocupam, correspondente ao valor de renda que pagariam por imóveis com iguais características e finalidades, num período de dois anos [49.º P.I.].
 o) Foi em 1995 que os ora RR. edificaram o edifício para arrumos e churrasqueira mencionado nos factos provados [24.º Contestação dos 2.º e 3.º RR.].
 p) O Autor alterou a “janela” do WC da sua fracção para alumínio, em desfasamento face a todas as outras “janelas” do prédio, que são em madeira [36.º e 37.º, P.I.].

IV – Do confronto das conclusões das alegações com a decisão impugnada, resultam para apreciar as seguintes questões, que correspondem ao objecto do recurso, e que aqui se enunciam pela ordem da sua precedência lógica:
-  se há que aplicar às obras realizadas no logradouro do prédio as normas que regem a compropriedade e não as que regem as relações condominiais, por terem sido feitas antes da constituição do condomínio, e com o conhecimento e acordo de todos os proprietários das fracções, à época;
-  se esse acordo é válido;  
- se o mesmo vincula o A.;
- a, assim não se entender, apreciar a alteração da matéria de facto pretendida pelos apelantes, de modo a conhecer-se do abuso de direito pelo A. na interposição desta acção, na modalidade de tu quoque;  
- de todo o modo, se se verificou abuso de direito na interposição da acção,  agora na modalidade de  suprressio.

Antes de mais, vejamos a argumentação usada pelo Tribunal da 1ª instância para concluir, no seu essencial, pela procedência da acção.
Distinguindo na realização de obras não permitidas, por um lado, a abertura de portas pelos RR. no edifício, e por outro, as vedações, as  edificações e os muros feitos pelos mesmos no logradouro, veio, afinal, a resolver a acção, em função, num caso e noutro, do disposto nos arts 1422º/3 do CC (“As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio), 1422º/4 ( “Sempre que o título constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção autónoma, a alteração ao seu uso carece da autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio), e o disposto no art. 1425º/1 ( “Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio”), considerando estarem em causa em ambas as situações “inovações, concluindo: «Tratando-se de inovações, quer a  abertura de “portas” para o exterior, quer as acima referidas obras dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio, o que não sucedeu».
Considerou adjacentemente que «o mero acordo (verbal) não tem validade e eficácia», não tendo «a virtualidade de substituir a exigida deliberação da Assembleia de Condóminos». E que, além disso, «o mero acordo verbal, ou mesmo que tivesse sido escrito, dos demais condóminos quanto à abertura das “portas” (sem a existência de deliberação prévia da competente Assembleia de Condóminos) configura apenas um mero direito pessoal de gozo, com mera eficácia inter partes, ou seja, não é por si só susceptível de conferir qualquer direito real com eficácia erga omnes, portanto, não é oponível a terceiros, não é eficaz, como sucede com o Autor – porque não fez parte desse acordo e adquiriu posteriormente a fracção».
No que à abertura das portas respeita, considerou ainda, que, «mesmo que em abstracto se considerasse que a abertura de “portas” para o exterior não configurasse “inovações”, sempre seriam obras que modificaram a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, as quais apenas podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, ao abrigo do disposto do art. 1422.º, n.º 3, do CC»
E porque, como adiante melhor se ponderará, entendeu que o A. não actuou com abuso de direito na interposição da acção, referiu, em jeito final, que, «Em suma, os Réus realizaram obras nas suas fracções e/ou logradouro, não permitidas, devido à inexistência de qualquer deliberação da Assembleia de Condóminos a autorizá-las, porque qualquer acordo verbal entre os proprietários anteriores é inválido e ineficaz relativamente ao Autor e porque este não actua em abuso do direito, por isso, aqueles estão obrigados a proceder à demolição das mencionadas obras e a repor a situação anterior».
Os apelantes vieram contrapor – mais explicitamente do que o fizeram na sua contestação – que, pese embora a propriedade horizontal do prédio em causa nos autos tivesse sido constituída em 1995, a constituição do condomínio só ocorreu a 29/9/2017, remetendo, neste particular, para documento oportunamente junto com a contestação  - cfr fls 62 dos autos – de que resulta  que o condomínio do edifício em causa, enquanto entidade equiparada a pessoa colectiva,  foi inscrito no RNPC, em 29/9/2017.  Do que advém, no seu entender, que antes da existência do condomínio e, por isso, sem assembleia de condóminos, não haveria que aplicar o regime do condomínio, mas o sempre subjacente da compropriedade, como resulta do disposto no art 1422º/1 (“Os condóminos, nas relações entre si estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que exclusivamente lhes pertençam e quanto às partes comuns às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis»), sendo que, à luz das regras da compropriedade, se tem de entender válido e eficaz o acordo havido entre todos os condóminos, à época, no sentido da divisão do logradouro em quatro parcelas (tantas quanto as fracções) para utilização independente por cada um dos proprietários das mesmas, acordo de que resultou um correspondente direito pessoal de gozo,  de que o A. usufrui por ter adquirido a respectiva fracção por doação da mãe, e que o vincula, pelo mesmo motivo, perante os demais condóminos.
Vejamos.
Antes demais, chamando a atenção para o facto de dando-se o caso de o titulo constitutivo da propriedade horizontal não conter o regulamento do condomínio (que é o instrumento em que se disciplina o uso, a fruição e conservação, quer das partes comuns, quer das fracções autónomas), o mesmo – o regulamento do condomínio -  não ser obrigatório, quando no condomínio não haja mais de quatro condóminos, como resulta do art 1429º-A (cuja actual redacção decorreu do DL 267/94 de 25/10), conjugado com a al b) do nº 2 do art 1418º.[1]
Mas a inexistência de regulamento nada tem a ver com  inscrição ou não do condomínio no RNPC, que também  ela não é obrigatória[2], podendo, por isso acontecer que estando o condomínio dos autos inscrito naquele Registo desde 2017, nem por isso disponha de regulamento para o mesmo, como não disporá visto que nenhuma das partes lhe fez referência.
Por outro lado, ao contrário do que os apelantes o parecem pretender, a circunstância de apenas ter sido inscrito o condomínio no RNPC em 2017, nem por isso isentava os condóminos de em qualquer momento anterior a esse, desde que subsequente à constituição da propriedade horizontal, se tivessem constituído em assembleia de condóminos.
Por isso, nenhuma razão têm quando referem que só a partir daquela inscrição é que passaram a ter assembleia de condóminos e administrador e, consequentemente, a estarem aptos a tomar deliberações. È que, repete-se, desde que a propriedade horizontal foi constituída – em 1995, tendo sido registada em 1996 – que, independentemente da inscrição do condomínio no registo, e independentemente da existência de regulamento, se poderiam ter organizado e constituído assembleia de condóminos.
Feita esta ressalva, vejamos ainda.
Como é sabido, «os pátios e os jardins anexos ao edifício»  - expressões em que se integram os logradouros – presumem-se comuns, segundo o nº 2 al a) do art 1421º CC. Não está em causa parte imperativamente comum – essas são definidas no nº 1 dessa norma, norma essa imperativa. «Diferentemente, a norma do nº 2 é de carácter supletivo, conferindo a natureza de comuns a coisas que, por não serem essenciais à fruição exclusiva de uma das fracções autónomas nem fazerem parte da estrutura do edifício, os condóminos podem convencionar sejam excluídas desse regime». «Assim por exemplo, aos pátios e aos jardins pode renunciar qualquer condómino, que neles não terá então qualquer direito, convencionando os restantes frui-los em comum ou dividi-los entre si em propriedade singular – isto desde que da divisão de qualquer desses logradouros resultem fracções com a necessária autonomia».
Deste modo, «as partes que só presuntivamente são comuns, podem deixar de o ser  no caso de se afectarem, no titulo constitutivo da propriedade horizontal, a uma ou mais fracções, ilidindo-se por essa forma a apontada presunção», como decorre do nº 3 do art 1421º  [3].
Assim - evidencia Abílio Neto[4] - «o titulo constitutivo da propriedade horizontal, a par da sua eficácia enquanto acto gerador da autonomização jurídica das fracções do edifício, pode desempenhar também uma outra função da maior relevância prática, sempre que nele se estabeleçam os poderes dos condóminos  sobre as fracções autónomas e se definam, ampliando ou restringindo o regime legal, as afectações das partes presuntivamente comuns  do edifício . Se tal ocorrer o titulo constitutivo assumirá  a função de “acto modelador  do estatuto da propriedade horizontal“ e as regras que nele se estabeleçam, quer completem o regime legal,  quer dele se afastem, na medida em que a lei o permita, adquirem força normativa, vinculando, desde que registadas, os futuros adquirentes das fracções, independentemente do seu assentimento  - M . H Mesquita , 94. Nota 41 e 100[5]
Como o refere Sandra Passinhas, sobre a mesma temática,  [6], «a afectação no titulo constitutivo terá de ser respeitada enquanto estatuto da coisa  e resulta como direito real de uso. Se a titulo atribuir a algum ou a alguns dos condóminos direitos especiais de uso sobre determinadas partes comuns, não poderão estes direitos ser suprimidos ou coarctados pela assembleia. A sua força vinculativa decorre da natureza real do titulo, sem prejuízo de, por unanimidade, as partes acordarem na sua modificação».
Não foi o caso na situação dos autos relativamente ao logradouro do prédio, pois que, como resulta do facto 4 a 8,  no documento complementar à  escritura pública de "Propriedade Horizontal e Compra e Venda", outorgada em 10/10/1995 , e que o integra, e pelo qual foi constituída a propriedade horizontal do prédio, consta que «É comum a todas as fracções o logradouro com a área de 1771 m2, situado na frente e na traseira da edificação», nada mais se referindo a respeito desse logradouro.
Situação diferente da acima referida - afectações das partes presuntivamente comuns do edifício no titulo constitutivo da propriedade horizontal – é a das «destinações objectivas». Estas, como o faz notar Sandra Passinhas [7] – colocam-se «num estádio temporal anterior, existente já à data da constituição do condomínio». «É a coisa que, pela sua estrutura objectiva, pela sua situação ou por qualquer outra circunstância juridicamente relevante, se encontra destinada à fracção autónoma  ( v g um jardim a que só se possa aceder pela sala do rés do chão). Estas coisas que, não estando especificados no titulo constitutivo, deveriam ser consideradas comuns, nos termos da presunção do nº 2 do art 1421º, não poderão, todavia, deixar de ser consideradas como parte próprias. A destinação objectiva da coisa funciona como um elemento limitador do seu domínio» (…). Uma coisa que pela sua destinação objectiva só possa servir um condómino não pode deixar de ser considerada coisa própria» [8].
Evidentemente, que também não é esta a situação dos autos, pois que o logradouro comum às quatro fracções nunca serviu em qualquer das suas partes ao uso e gozo de qualquer parte do edifício.
 Mas há uma terceira situação, diferente das anteriores, que é a que, segundo se entende, se verifica no caso dos autos, e que na situação dos autos decorreu dos condóminos iniciais  - EE e mulher, II, CC (2ª R.), FF, EE e GG, mãe do A. – terem acordado, entre eles, e  para cada um deles, o direito de uso exclusivo sobre uma  parcela, das quatro em que dividiram o logradouro, mais estabelecendo que os proprietários dos Rés-do-chão ficariam com as duas parcelas mais próximas ao edifício e os proprietários dos primeiros andares com as parcelas mais afastadas (factos 10 e 11) .
Está em causa nesse procedimento a constituição de direitos pessoais de gozo, em função dos quais resulta para o respectivo titular o poder de agir directa e autonomamente sobre uma coisa, enquanto direito de crédito[9].
Tem sido entendido que a constituição no condomínio  desses direitos pessoais de gozo pode  resultar de acordo verbal de todos os condóminos e que não tem que ser feita antes  da constituição da propriedade horizontal [10].
Assim refere Sandra Passinhas [11]:  «O direito pessoal de gozo é um direito de crédito referente a uma coisa e não um direito real sobre uma coisa, que se constitui validamente por simples acordo verbal, não necessitando, para tanto, de escritura pública. A exclusividade conferida não implica que seja referida no título constitutivo da propriedade horizontal. Se aí viesse referida estávamos perante um direito real. A atribuição de um direito pessoal de gozo não tem de ser feita antes da constituição da propriedade horizontal; tal atribuição pode ser feita posteriormente, desde que por todos os condóminos».
Irreleva, portanto, a circunstância de não se ter provado, propriamente, que o acordo em causa  haja antecedido a  constituição da propriedade horizontal ( cfr facto 10).
Estando em causa direito pessoais de gozo – que proporcionam ao seu titular o gozo de uma coisa corpórea – referindo o facto 10 «utilização independente», não se pode estranhar que «Em data não apurada, mas depois da realização do acordo verbal acima referido, os Réus tenham murado e vedado as parcelas correspondentes, e que tenham feito um “caminho” sensivelmente a meio do logradouro para que os dois proprietários dos primeiros andares pudessem aceder às suas parcelas – facto 13.
Como não pode estranhar que, «em data não apurada sensivelmente entre o ano 2000 e o ano de 2009, o anterior proprietário da fracção actualmente do 1.º Réu, Fracção A, correspondente ao rc dto, EE, e os 2.º e 3.º RR.  CC e KK – aquele e aquela, filhos, tal como FF – proprietário da fracção D, correspondente ao 1º esq  -  e tal como GG, mãe do A., de  EE e mulher, II – tenham construído  uma “edificação” na parte do logradouro que lhes foi atribuída no acima referido acordo de 1995,  (facto 17) e que uma dessas  edificações se encontre totalmente vedada, sem permitir acesso dos demais condóminos, e a outra  configure uma “casa” com janelas e portas que impedem o acesso de qualquer dos demais condóminos ao seu interior, impedindo  a plena utilização de todo o logradouro pelos demais condóminos  (factos 19 e 20 e 23).
È que, e como o refere  José Andrade Mesquita[12] os direitos pessoais de gozo implicam os poderes de usar, fruir e por vezes de transformar, «enquanto aspectos do aproveitamento das utilidades de uma coisa». 
Já porém, e salvo melhor entendimento, não podem admitir-se as actuações  subsequentes, correspondentes, a,  em data não apurada, mas próxima do ano de 2009,  EE, e os 2.º e 3.º RR. , CC e KK, terem construído  nas suas respectivas fracções  uma “porta” para acesso privado aos respectivos logradouros, ambas distintas da porta comum do prédio.
Para assim procederem, tiveram que fazer uma abertura em parede mestra, que é , segundo  a al a) do nº 1 do art 1421º , uma parte imperativamente comum do prédio, não se vendo  que o direito pessoal de gozo que lhes assistia sobre a respectiva parcela do logradouro pudesse ser usado para afectar tal parte comum do prédio,  estrutural e funcionalmente ao serviço de todos os condóminos e que não pode, por natureza, ser objecto de apropriação individual.
Afinal, o direito pessoal de gozo traduz-se no poder de agir directa e autonomamente sobre uma coisa, mas apenas em função do seu aproveitamento naturalístico - o aproveitamento directo e efectivo das utilidades de certa coisa  - com o que se não compagina a actuação daqueles condóminos sobre parte comum do prédio.
Pelo que se têm de ter por licitas as actuações dos 2º RR, bem como a de EE implicadas nos factos 13, 15, 17, 19 e 20 mas não as implicadas no facto 24, ainda que, como se refere no facto 25, esse procedimento tenha ocorrido  com o conhecimento e consentimento de todos os condóminos  de todas as demais fracções à data .
Estas aberturas em parede mestra traduzem inovações [13], caindo na alçada do disposto no art 1425º/1, carecendo por isso da aprovação da maioria  dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.
E concorda-se com a sentença recorrida quando refere que a aprovação da maioria dos condóminos deve ser realizada em assembleia de condóminos, não sendo suficiente o conhecimento e consentimento de todos os proprietários de todas as demais fracções à data daqueles, a que se refere o facto 25.
Como é salientado no Ac R C 5/7/2005 [14], «A aprovação de obra inovadora apenas pode ser dada através de deliberação tomada em assembleia de condóminos, não sendo válida a aprovação obtida fora da assembleia, designadamente através de voto constante de documento escrito», pelo que, e como se concluiu na decisão recorrida, «se não basta deliberação escrita, por maioria de razão, de igual modo não basta o acordo verbal dos demais condóminos como sucedeu no caso concreto, ou seja, o acordo verbal não tem a virtualidade de substituir a exigida deliberação da Assembleia de Condóminos»[15]. Dizendo-se ainda naquele acórdão, que «a assembleia de condóminos e o administrador, enquanto órgãos administrativos, são, um instrumento para a emissão de declarações de vontade comum e para a execução desta mesma vontade, de modo a tornar possível a actividade da colectividade»,  e que «só ocorrendo deliberação tomada em assembleia de condóminos, com a possibilidade de discussão oral, seguida de votação, é que fica aberta a possibilidade de o condómino impugnar as deliberações contrárias à lei (…) não se podendo eliminar uma discussão oral tão útil e necessária a uma ponderada deliberação. Por outro lado, é sempre necessária a elaboração de uma acta, para se poder fazer a prova da deliberação e para o administrador proceder à sua execução e a comunicação aos condóminos ausentes». E acrescenta-se que, «a entender-se o contrário, poderia acontecer que alguns condóminos fossem surpreendidos com aprovação de obras inovadoras ou até de outros assuntos relativos ao condomínio sobre os quais nem sequer foram convidados a pronunciar-se ou a que foram completamente alheios».
De igual forma faz  sentido a argumentação da 1ª instância – explorando a circunstância de, no nº 1 do art 1425º não se referir, ao contrário do que sucede no nº 3 do art 1422º, «autorização da assembleia de condóminos» -  no sentido de que, «mesmo que em abstracto se considerasse que a abertura de “portas” para o exterior não configurasse “inovações”, sempre seriam obras que modificaram a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, as quais apenas podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, ao abrigo do disposto do art. 1422.º, n.º 3, do CC».
O que implica que sempre haveria de se confirmar a sentença no que a este aspecto respeita – a ilicitude da abertura das portas que dão acesso ao logradouro  e a necessidade do seu enceramento a expensas dos RR.

A situação das construções no logradouro implica, no entanto, outras considerações, desde o momento em que o actual condómino da fracção C, correspondente ao 1º dto, e aqui A., não participou no acordo referido no facto  10,  mas sim a sua mãe, de quem recebeu o imóvel por doação.
Se o acordo em referência relativo a uma parte comum do edifício – que se traduz, como se referiu, num direito pessoal de gozo  - tivesse sido objecto de deliberação da assembleia de condóminos, dúvidas não haveria em que vincularia  todos os condóminos, presentes e futuros, enquanto efeito externo das deliberações da assembleia de condóminos: «vincula todos os condóminos presentes, ainda que não tenham participado na reunião ou que, tendo participado na reunião, se tenham abstido de votar; e vincula todos os condóminos futuros, ou seja, todos os aqueles que tenham adquirido a qualidade de condóminos ao adquirirem fracções autónomas do edifício., como se lê no já citado Ac STJ de 4/7/2019 ( Nuno Manuel Pinto Oliveira)e resulta do acima referido por Sandra Passinhas.
Não tendo sido o caso, a transmissão da propriedade do imóvel por doação, não parece que deva abranger o referido direito pessoal de gozo. Configurando-se o direito pessoal de gozo estruturalmente como um direito de crédito, e operando estes apenas inter partes, apenas pode vincular as pessoas determinadas  que são os sujeitos da relação.
O que significa que a transmissão da fracção autónoma por doação fez caducar o direito pessoal de gozo constituído pela e a favor da mãe do A.
Sucedendo que, porque este direito pessoal de gozo se mostrava indissoluvelmente ligado aos demais constituídos em função do mesmo acordo, caducando o mesmo, dever-se-ão ter por igualmente caducados os constituídos a favor dos demais condóminos.
Com o que há, também aqui, há que acompanhar a sentença recorrida, embora em função de uma abordagem diversa das situações jurídicas implicadas.

Resta ponderar os abusos de direito invocados pelo apelante.
No que respeita  ao referente ao da interposição da presente accção, que os apelantes fazem assentar na supressio, impõe-se aqui também o entendimento da 1ª instância: «Quanto ao abuso do direito do Autor, invocado pelos Réus, só poderia ser susceptível de aplicação se ficasse demonstrado (e alegado) que o Autor tinha dado expressa autorização às mesmas, o que não sucedeu, nem podia, porque não era o proprietário da fracção à data, por isso não existe comportamento contraditório e o decurso do tempo não tem a virtualidade de alterar essa circunstância (cfr. art. 334.º, do CC)».
Repare-se ainda, em abono do defendido na 1ª instância, que o A. adquiriu a fracção em 2017 e interpôs a acção logo em 8/6/2018.

No que se refere ao abuso de direito, na modalidade de tu quoque, por força do qual os apelantes pretendem impedir, ou mesmo excluir, o direito do A. a fazer-se valer na presente acção  da ilicitude das obras que o R. nela defende em função do facto dele  ter alterado a janela do wc da sua fracção para alumínio, em desfasamento face a todas as outras janelas do prédio que são em madeira, sem que tenha informado nenhum dos condóminos, procedendo, em consequência, “também ele”, ilicitamente, importa ponderar a alteração da matéria de facto pretendida por aqueles.
Não são os mesmos muito precisos relativamente a esta matéria, nem nas conclusões das alegações nem no respectivo corpo, limitando-se a referir na conclusão 19ª, que «quanto a esta questão o tribunal a quo efectuou uma errada apreciação da matéria de facto, redundando num manifesto erro de julgamento  ao dar como não provada a alteração da janela do wc do recorrido».
Não obstante a menor precisão, percebe-se, evidentemente, estar em causa o ponto 33 da matéria de facto provada e o ponto p) da não provada, aquela dando como adquirido que no  w/c da fracção do A. existe uma abertura para o exterior com gradeamento de betão, como sucede com as demais aberturas do prédio na correspondente fachada, sem alteração do alçado, esta, dando como não adquirido que o A. alterou a “janela” do WC da sua fracção para alumínio, em desfasamento face a todas as outras “janelas” do prédio, que são em madeira.
Evidenciou o Tribunal a quo na motivação da decisão da matéria de facto que «a prova produzida a respeito deste tema acabou por ser a valoração objectiva  dos documentos juntos aos autos, considerando que as partes prescindiram dos demais meios de prova».
Há, no entanto, e como o observam os apelantes, que juntar à prova documental constante dos autos, o acordo das partes a respeito da matéria de facto em apreço, pois que, efectivamente, o A. admitiu ter alterado a “janela” do WC da sua fracção de madeira para alumínio, quando respondeu a essa matéria no seu requerimento de prova sobre a mesma.
Quanto ao desfasamento relativamente às outras janelas do prédio da mesma fachada, que parecem ser efectivamente de madeira, não sendo ostensivo, é também perceptível das fotografias.
Por outro lado, das fotografias juntas, resulta ainda, sem rebuço, que no w/c da fracção do Autor existe uma abertura para o exterior – a referida janela - com gradeamento de betão, como sucede com as demais aberturas do prédio – janelas - na correspondente fachada.
E resulta também que aquela modificação de madeira para alumínio não produz  alteração, pelo menos sensível, do alçado, ou se se quiser, da fachada.
Por isso, assistindo em parte razão aos apelantes quando pretendem que a matéria julgada não provada em P, deverá ser julgada provada – o que se faz nestes temos, «o Autor alterou a janela do WC da sua fracção para alumínio, em desfasamento face às outras  janelas da mesma fachada do prédio, que são em madeira, fazendo-o sem autorização dos demais condóminos» – e assistindo-lhes também razão quando no facto 33 se fala de “aberturas” em vez de janelas – por isso, alterando-se esse ponto 33 para, «No w/c da fracção do Autor existe uma janela com gradeamento de betão, como sucede com as demais janelas  do prédio na correspondente fachada»- dessas alterações  não resulta qualquer proveito para os apelantes,  visto que tal alteração  – traduzindo-se embora numa obra nova  realizada pelo A. sem autorização da assembleia em função da  maioria qualificada  de 2/3 do valor total do prédio, nos termos da al a) do nº 2 e 3 do art 1422º -  não interferiu na linha arquitectónica do prédio, nada tendo sido alegado pelos apelantes no que se reporta ao conceito de «arrranjo estético» do edifício.[16]
Dir-se-á, no entanto, que ainda que fosse de concluir pela ilicitude da referida actuação do A., por, ao contrário do que se entende, ter resultado prejudicada a linha arquitectónica do prédio  ou mesmo o seu arranjo estético com a referida alteração da janela do wc,  sempre para se concluir se o mesmo agiu na interposição da acção em abuso de direito à luz do tu quoque, se haveria de proceder a uma gradação dos resultados das contrapostas ilicitudes.
E porque dessa gradação resultaria como francamente mais desvantajoso o resultado da ilicitude dos condóminos para o A., relativamente ao resultado do procedimento do A. para aqueles,  sempre estaria legitimada  a interposição da presente acção por dever prevalecer o direito deste  à luz dum critério semelhante ao do nº 2 do art 335º CC, respeitante à colisão de direitos[17].
Faz-se notar que se a gradação se operasse apenas ao nível das ilicitudes – o que já se excluiu fazendo intervir os resultados práticos delas resultantes – ainda aí se teria que ter como de superior ilicitude a abertura de portas pelos condóminos dos rch, referentemente à alteração da linha arquitectónica do prédio com alteração da janela.
.
Tudo para concluir pela procedência da acção, devendo confirmar-se a sentença recorrida.

V – Pelo exposto, acorda este Tribunal em julgar improcedentes as apelações, confirmando a sentença recorrida.

Custas pelos apelantes.

                                                                       Coimbra, 23 de Janeiro de 2024
Maria Teresa Albuquerque                                                                                                                                               Falcão de Magalhães

                                                                                   Pires Robalo

            (…)






               [1] -Cfr Ac R L 5/3/2009 , José Eduardo Sapateiro, onde se refere:  «II – A equiparação entre o título constitutivo e o regulamento, muito embora possa recolher um aparente apoio – essencialmente literal – nos textos legais em análise, não corresponde à melhor interpretação dos mesmos, não só em função da específica razão de ser, conteúdo, função e finalidade de cada um desses instrumentos normativos da propriedade horizontal e do condomínio, como dos próprios interesses em presença.
XIII - Em primeiro lugar, que o legislador estabelece uma clara diferenciação entre regulamento e título constitutivo, mesmo quando aquele formalmente integra este último, não sendo, nessa medida, o primeiro anulado, absorvido ou sequer esgotado pelo segundo nem sequer assumindo a sua natureza jurídica própria».

               [2] - Cfr Ac R P 27/9/2018, Leonel Serôdio, onde se diz: « …do DL n.º 129/98, de 13 de maio, que regulamenta o Registo Nacional de Pessoas Colectivas, concretamente do seu art. 4º, não decorre que a inscrição dos “Condomínios”, seja obrigatório no Ficheiro Central de Pessoas Colectivas (FCPC). (…) Entendemos, que o condomínio não integra a previsão de nenhuma das alíneas do n.º 1 mas antes o n.º 2 al. a), 2ª parte, do transcrito artigo, por isso, não é obrigatória a inscrição do condomínio no Registo Nacional de Pessoas Colectivas. A sua inscrição é facultativa e efectuada como "entidade equiparada a pessoa colectiva". Por outro lado, perante as normas do CC e CPC que regulam o regime de propriedade horizontal, entendemos que no nosso ordenamento jurídico o condomínio não pode ser considerado uma pessoa colectiva»
               [3] - Cfr , Rui Vieira Miller, «A Propriedade Horizontal», p 158
               [4] - «Direitos e Deveres dos Condóminos na Propriedade Horizontal»,  1988, p 33
               [5] - Neste sentido, Ac STJ 11/6/1986, BMJ nº 358-529
               [6] - «A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal», 3ª ed, p 49/50
               [7] - Obra referida, p 44/45
[8] - Neste sentido, entre muitos, cfr  Ac STJ 17/6/1993, CJ II,158 e 8/4/1997, CJ II, 34; Ac STJ 15/5/2012 (Helder Roque), Ac STJ 8/3/2000 (Salazar Casanova), Ac R C 30/6/2015 (Luís Cravo) 14/22012 (Carlos Moreira)

            [9] Ac STJ 19/10/2006, Proc n.º 06B2983 e de 31/5/2012, Proc 678/10.7TVLSB.L1.S1

            Sobre os direitos pessoais de gozo, como direitos de regime dualista ou misto, cfr Manuel Henrique Mesquita, «Obrigações Reais e Ónus Reais», p.. 127-189; José Manuel Andrade Mesquita, «Direitos Pessoais de Gozo», 1999, Nuno Manuel Pinto Oliveira, «Princípios de Direito dos Contratos», 2011, p.57-61.


               [10] - Cfr Ac STJ 4/7/2019 (Nuno  Pinto Oliveira); Ac  R P 9/2/2006
 Pinto de Almeida Trajano, em cujo sumário se refere:  
«III - Mas no âmbito da propriedade horizontal podem ainda ser concedidos direitos pessoais de gozo. IV- Trata-se de um direito de crédito referente a uma coisa e não um direito real sobre uma coisa, que se constitui validamente por simples acordo verbal, não necessitando, para tanto, de escritura pública.
               [11] - Obra referida, p 51
               [12] - «Direitos Pessoais de Gozo» 1999, p 12/13

               [13] - Parece ser opinião dominante, quer na doutrina, quer na jurisprudência, a de que as "obras novas" a que alude o nº 2 do Art. 1422º, são aquelas que os condóminos efectuem nas fracções autónomas de que são os exclusivos proprietários, enquanto as "inovações" referidas no art. 1425º, dizem respeito às introduzidas nas partes comuns. Assim, Ac STJ de 20.3.2012, Moreira Alves, Henrique Mesquita , «A Propriedade . Horizontal no C.C. Português».  RDES - XXIII - 139, nota 3, Antunes Varela , «C.C. Anotado »- nota ao art. 1425º), Ana Prata (Coord.), «Código Civil Anotado», Vol. II, 2017, pp. 266-267. Como se refere ainda no Ac RL 8/12/2019, Luis  Filipe Soares,  que aqui se está a seguir, «no que tange à densificação do conceito de inovação, para efeitos do art. 1425º,nº1, do Código Civil, no Ac STJ de 19.1.2012, 1359/07, Sumários, entendeu-se que obra inovadora é aquela que constitui uma modificação ou transformação da parte comum, nela cabendo as alterações introduzidas na substância ou forma da coisa, como as modificações à sua afetação ou destino».
               [14]  - Mencionado na decisão a quo, relatado por Ferreira de Barros, proc. n.º 1754/05, www.dgsi.pt)
               [15] -  Nesse acórdão faz-se referência a acórdão do STJ, publicado no BMJ n.º 450º, p. 498, onde  se escreve que «a aprovação de tal obra inovadora por parte dos condóminos não pode ser feita por qualquer modo. Aquela aprovação constitui uma deliberação social que só pode ser tomada colegialmente pelo órgão próprio, que é a assembleia de condóminos, nos termos do disposto nos artigos 1430º e seguintes do Código Civil».
               [16] - Há mesmo quem entenda que, desde que se respeite a traça geral do edifício, nada obsta a que cada condómino, na sua fração, instale uma caixilharia que corresponda às suas necessidades, nomeadamente de isolamento térmico e acústico.
               [17]- Tratar-se-ia de uma colisão de “não direitos”, devendo avaliar-se, como o faz notar Menezes Cordeiro, «Tratado de Direito Civil Português», I , Parte geral, Tomo IV», 2005, p 390/391, «as consequências do não-exercício ou do não-exercício pleno por parte de cada um dos envolvidos»