Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1322/20.0T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ANTÓNIO FERNANDO SILVA
Descritores: ÓNUS A CARGO DO IMPUGNANTE DA DECISÃO DE FACTO
INADMISSIBILIDADE DE CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO
REJEIÇÃO DA IMPUGNAÇÃO
CEDÊNCIA DE TERRENO POR UM PARTICULAR A UM MUNICÍPIO
FORMALIZAÇÃO EM DOCUMENTO PARTICULAR
INAPLICABILIDADE DAS EXIGÊNCIAS DE FORMA DA LEI CIVIL
Data do Acordão: 11/07/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 18.º A 20.º DO DLEI N.º 280/2007, DE 07-08, 202.º, N.º 2, DO CÓDIGO CIVIL E 640.º, N.ºS 1 E 2, DO CÓDIGO DO PROCESSO CIVIL
Sumário:
I – O recurso que vise a impugnação da matéria de facto deve respeitar os ónus fixados no art. 640.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, sob pena de rejeição sem prévio convite ao aperfeiçoamento.

II – Deve ser igualmente rejeitado o recurso que visa expurgar factos do elenco de factos provados apenas com base na circunstância de serem inócuos.

III – O acordo, entre um particular e um município, pelo qual aquele cede a este uma parcela de terreno para imediata afectação ao domínio público municipal, não está sujeito às exigências de forma civis.


(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral:
Relator: António Fernando Marques da Silva
1.º Adjunto: Henrique Antunes
2.º Adjunto: Teresa Albuquerque

Proc. 1322/20.0T8LRA.C1

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I. AA, BB e A... Unipessoal, Lda. moveram a presente acção contra o Município ..., alegando, no essencial, que os primeiros AA. são donos e possuidores do prédio urbano identificado, sendo a sociedade A... dona de estabelecimento comercial instalado, por arrendamento, no rés-do-chão e logradouro do prédio dos referidos AA., com esplanada; a R., em 25 de Julho de 2019, sob o pretexto de a A... não possuir licença de utilização do espaço público, determinou que se procedesse à destruição e remoção da esplanada, a qual foi depois removida; pelo menos desde Julho de 2019 o R. passou a fazer passar pessoas pelo logradouro do prédio dos AA., como se tratasse de espaço público; com a perda da esplanada a A... foi forçada a fechar as instalações, tendo os primeiros AA. também danos. Pediram que:

- se reconheça que os AA. são donos e possuidores do prédio que indicam;

- se reconheça que a A... é dona do estabelecimento comercial instalado no r/c do prédio dos AA.;

- se reconheça que a ocupação efectuada pelo R. do logradouro do prédio e o apossamento da esplanada é ilegítima, devendo este restituir a expensas suas o logradouro e a esplanada, abstendo-se de restringir ou dificultar o uso, fruição e disposição dos direitos dos AA., nomeadamente estar tal R. impedido de fazer passar pelo logradouro quem quer que seja;

- o R. seja condenado a indemnizar:

. os primeiros AA. no valor de 6.670 euros a título de danos patrimoniais, e 5.000 euros a título de danos não patrimoniais, acrescido do que se liquidar em execução de sentença, e

. a A. A... em 37.000 euros e 2.500 euros, acrescido do que se liquidar em execução de sentença.

O R. contestou, invocando a existência de litispendência quanto aos primeiros AA. e de questão prejudicial quanto à segunda A., impugnando a versão dos AA. (mormente alegando que o logradouro em causa está integrado no domínio público em virtude de cedência realizada pelo primeiro A.), e alegando que o direito dos AA. à restituição da posse estaria caducado e que haveria abuso de direito. Em reconvenção pediu que se reconhecesse que o R. é possuidor e proprietário da parcela em causa; e que se efectuasse a correção de áreas e confrontações do prédio em causa. 

Foi avaliada a suspensão da acção, acabando esta por prosseguir.

Os AA. replicaram, tendo recusado a verificação da litispendência ou fundamento para a suspensão da acção, e em especial impugnado o acordo de cedência, afirmando ainda que a primeira A. nele não interveio e invocando a sua nulidade formal. Opuseram-se às invocadas caducidade e abuso de direito, pugnaram pela inadmissibilidade da reconvenção, pela incompetência material do tribunal quanto a ela, e pela sua improcedência, e pronunciaram-se sobre os documentos apresentados pelo R..  

Foi dirigido convite ao aperfeiçoamento a ambas as partes, ao qual responderam. 

Após outras vicissitudes, a reconvenção foi admitida e foi proferido saneador, no qual foram julgadas improcedentes as excepções da incompetência material quanto à reconvenção, da litispendência e da caducidade, remetendo-se para julgamento a avaliação do abuso de direito.

Por óbito de AA, foram habilitados CC e BB (que já era A.).

Realizado julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu:

- declarar a A. BB e a herança aberta por morte de AA, por ela representada e também pelo habilitado CC, proprietários do prédio urbano em causa.

- declarar que a segunda A. A... Unipessoal Lda. foi proprietária desde Outubro de 2010 até Julho de 2022 de um estabelecimento comercial que se encontrava implantado no rés-do-chão do prédio referido.

- absolver o R. do demais peticionado pelos AA.

- reconhecer que a área de 351 m2 que fazia parte do logradouro do prédio indicado, no local em que confronta com o rio ..., faz parte do domínio público municipal do R. onde está implantado o passeio ribeirinho do aludido rio.

- absolver os AA. do demais peticionado pelo R. na reconvenção.

Os AA. recorreram, concluindo nos seguintes termos:

1ª) Por erro de leitura, análise e interpretação crítica, reflexiva, dos elementos probatórios constantes do processo e, da gravação de declarações e depoimentos de parte das testemunhas rectro identificadas, os factos articulados e essenciais que, constituem a causa de pedir e, aqueles em que se baseiam as exceções invocadas, os pontos de facto considerados “provados”, encontram-se incorrectamente julgados:

- Os enunciados sob os pontos 5º (parte); 9º; 10º; 11º; 12º; 13º; 14º; 15º; 16º; 17º; 18º; 19º; 20º; 21º; 22º; 23º; 25º; 26º; 27º (parte final).

Assim como,

- Os factos considerados “não provados”:

- E, sob as alíneas a); b); c); d); e); f); g);

Bem assim, omitiram-se os relevantes e úteis, sob os pontos: 44º; 45º; 48º; 52º e 61º da p.i. e; 2.8; 2.9 e 2.11 da Réplica. Com efeito,

2ª) Sem pretender postergar o livre arbítrio do julgador, tendo Tribunal a quo, na apreciação e decisão das provas, perante os elementos probatórios especificados e concretizados, nos pontos e, nas passagens concretas mencionadas e, transcritas no corpo das alegações, aqui também, impetradas e dadas por reproduzidas; deve ser proferida – sobre tais questões de facto impugnadas – a seguinte:

Dos factos considerados “provados”

Ponto 5:

- Alterar para “até, pelo menos, 26/07/2019”, passando a ter a redacção: “5- Desde a data indicada em 1, os primeiros AA têm usado e fruído o aludido prédio, procedendo a obras de recuperação do mesmo, à vista de todos, e sem qualquer oposição de quem quer que seja, e no que se refere ao logradouro até - pelo menos – 26/07/2019”.

Ponto 27:

- Passar a ter a seguinte redacção: “A A. A..., Lda. usou entre Julho de 2018 e, a data de da renovação, a esplanada que construiu”.

Dos factos considerados “não provados”

Os mencionados sob as alíneas b); b); c); d); e); f) e g) devem ser tidos como provados e, serem aditados aos factos provados; cuja redação se dá por reproduzida.

Dos factos relevantes, úteis e necessários à boa decisão da causa

Os articulados na p.i.:

Ponto 44: - A estrutura da esplanada destruída foi instalada em substituição da anteriormente existente.

Ponto 45: - A estrutura em madeira, nos topos com floreiras, com cerca de 1,20m de altura, lateralmente com vidro acrílico, intervalado por prumos e, estrado na base com 40 m2.

Pontos 48 a 52: - Foram retirados os topos, a parte lateral e, posteriormente, o estrado.

Ponto 61: - A A. A... tinha obrigações mensais certas, no valor de € 2.528,57.

Na réplica:

Ponto 2.8: - Já em 2005, o R. impôs condicionalismos à construção do prédio.

Ponto 2.9: - Os AA colocaram uma corrente, apoiada em prumos, junto à Rua ....

Ponto 2.11: - O Réu para viabilizar a construção do edifício, exigiu demolição do edifício pré-existente.

3ª) Os AA não quiseram, nem cederam qualquer área dos logradouros do seu prédio, nem há declaração ou protocolo válido e eficaz de transmissão do direito de propriedade do seu imóvel e, da posse legitima.

4ª) O corredor ribeirinho encontra-se para lá dos logradouros do prédio, dos 1ºs AA.

5ª) A conduta do R. é ilícita e violadora, de forma culposa e danosa, dos direitos dos AA.

6ª) A factualidade apurada, bem como, a pugnada, levou à procedência quanto ao direito de propriedade dos AA, relativamente ao prédio urbano identificado no art. 6º da p.i. e, do estabelecimento comercial designado “B...”, instalado no r/ch e logradouro daquele, com a estrutura em madeira, a servir de esplanada; devendo o R. ser condenado a restituir – imediatamente – a suas expensas, o logradouro e a mesma esplanada.

7ª) O R., perante atos lícitos, culposo e danosos, por si praticados; deve ser condenado a indemnizá-los nas quantias peticionadas, decorrente da sua conduta e, da que se vier a liquidar em execução de sentença.

8ª) O Réu deve ser ainda condenado, a abster-se definitivamente, de por si ou por outrêm, por qualquer força ou modo, lesar os direitos e, a posse dos AA.

9ª) A Reconvenção deverá ser julgada improcedente.

10ª) As custas da responsabilidade do R., por ter dado causa à acção.

11ª) A decisão, quanto à matéria de facto impugnada e, o direito na parte posta em crise, não se revela a mais assertiva, nem consentânea com os princípios fundamentais do direito constitucional, do direito civil, processual civil, registral e com o RCP, nem com a mens legis e, os comandos legais atinentes e aplicáveis. Pelo que,

12ª) Mostram-se violados, mormente, o disposto nos arts.: 2º; 20º, nº 4; 62º e 202º da CRP; arts.: 342º; 350º; 352º; 483º; 496º; 562º; 875º; 940º; 947º; 1305º; 1311º; 1312º; 1682-Aº do CC; arts.: 1º; 2º; 3º; 527º; 607º, nº 4 do CPC; art. 7º do Código Registo Predial e, art. 14º do RCP.

A R. respondeu, afirmando não terem os AA. cumpridos os ónus inerentes à impugnação da matéria de facto e sustentando a improcedência do recurso.

Notificados, os AA. responderam, sustentando a regularidade do seu recurso.

II. O objeto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente (art. 635º n.º4 e 639º n.º1 do CPC), «só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, a não ser que ocorra questão de apreciação oficiosa».

Assim, são as seguintes as questões a tratar:

- avaliação da impugnação da matéria de facto dada como provada, primeiramente quanto à sua admissibilidade formal, depois, aceite tal admissibilidade, quanto ao mérito da impugnação.

- avaliação da existência e validade/eficácia do acordo de cedência de parte do prédio em causa;

- avaliação da existência de conduta do R. violadora do direitos e/ou posse dos AA., mormente à luz da cedência invocada, e

 - na afirmativa, se existem danos a ressarcir, e

- avaliação da improcedência da reconvenção. 

III. 1. Na pág. 16 das suas alegações, os AA. referem-se a um «processo administrativo da Câmara Municipal ...», aditando «cuja junção se requer». A formulação da pretensão é, no mínimo, pouco ortodoxa, surgindo, tal como surge, como menção subsidiária no texto da discussão da prova e no meio das alegações. Mas é também ineficaz desde logo porquanto essa junção está sujeita a requisitos atinentes à superveniência da possibilidade de junção (art. 425º do CPC) ou à superveniente necessidade da junção determinada pelo decidido na primeira instância (art. 651º n.º1, 2ª parte, do CPC)[1] que não foram invocados nem estão minimamente revelados (além de que a junção cabe à parte, não cabendo, ao menos em princípio e, sobretudo, nesta sede, ao tribunal de recurso, por ela diligenciar). O requerido é inconsequente e improcedente.

2. Dispõe o art. 640ºdo CPC que:

1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2. — No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3. A questão da rejeição foi suscitada pelo R. e respondida pelo A.. De todo o modo, deveria ser oficiosamente conhecida.

Tem sido entendido (de forma claramente dominante na jurisprudência[2]) que não cabe despacho de aperfeiçoamento da impugnação da matéria de facto em sede de recurso, com razões que se julgam fundadas, assentes: na sequência das intervenções legislativas, na letra da norma em causa, que inculca uma sanção imediata; na contraposição sistemática e material face ao art. 639º n.º3 e ao art. 652º n.º1 al. a) do CPC, confirmando a referida asserção literal (quanto à imediata rejeição) derivada do art. 640º e indiciando quer o carácter específico (especial) do regime do art. 640º em causa, quer a existência de razões que distinguem aqueles regimes e explicam a diferença entre eles; razões estas ligadas ao tipo de recurso, no qual o tribunal ad quem intervém após a produção da prova e sobre questões factuais específicas (sem reavaliação de toda a prova produzida), exigindo-se, por razões de coerência, inteligibilidade, funcionalidade e também derivadas da sujeição do recurso ao dipositivo e ao contraditório, que a intervenção do tribunal de recurso esteja devidamente balizada (condição da possibilidade da devida discussão), obviando do mesmo passo a recursos infundados, assentes em meras considerações gerais (derivado de razões de economia mas também, com o demais, sublinhando a autorresponsabilidade das partes) – assim, a exigência legal é condição da seriedade da impugnação, e sem tal seriedade o recurso não merece ser aproveitado; a própria concessão do prazo adicional de 10 dias para recorrer tempera o rigor da exigência mas tende também a justificar a dispensa legal do aperfeiçoamento (pois a parte teve tempo adicional para cumprir, e cumprir bem). 

Nesta medida, verificado fundamento de rejeição, não cabe qualquer medida paliativa prévia mas apenas operar o efeito legal.

Quanto à avaliação do cumprimento daqueles ónus, admite-se dever valer, como referido pela R. e sustentado pelo STJ, «um critério adequado à função e conforme aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade»; os ónus previstos pretendem garantir uma adequada inteligibilidade do objecto e da finalidade do recurso e, em consequência, facultar à contraparte a possibilidade de um contraditório esclarecido, e por isso o critério de observância dos requisitos impostos há-de medir-se pelo cumprimento destas finalidades; os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade assentam na relação a estabelecer entre a gravidade da inobservância dos ónus e a gravidade das consequências impostas, exigindo uma relação de adequação, proporcionalidade e razoabilidade entre a gravidade da falha e a consequência imposta[3].

Quanto ao assento formal destas obrigações, entende-se que o requisito imposto pela al. a) do n.º1 do art. 640º deve estar enunciado quer na motivação quer nas conclusões, admitindo-se que os demais devem estar expressos nas alegações mas não têm que ter tradução, sucinta que seja, nas conclusões[4]. A esta distinção se atenderá.

Também se acentua que a relativização do ónus (tido por secundário) constante da al. a) do n.º2 do art. 640º do CPC constitui firme orientação jurisprudencial, sustentando-se que o incumprimento desse ónus apenas acarreta a rejeição do recursos nos casos em que fique gravemente dificultada a análise pelo tribunal de recurso e/ou o exercício do contraditório pela outra parte[5].

Por fim, a rejeição, a ser devida, não opera em bloco, havendo que avaliar cada um dos concretos pontos impugnados (atendendo à teleologia da regra, com lugar paralelo na parte final do n.º3 do art. 639º do CPC[6], que supõe que só se rejeita o recurso onde for inviável o seu conhecimento; ainda ao abrigo do princípio do máximo aproveitamento dos actos, a que a ideia da redução não é alheia).

4. A invocada circunstância de os AA. não explicitarem as «razões de facto» (entendidas como referindo-se à argumentação que sustentaria a pretendida alteração da matéria factual descrita) que fundamentam a sua pretensão (de alteração da matéria de facto adquirida) não constitui exigência legal para a impugnação da matéria de facto. Embora seja patente que tal elaboração (avaliação crítica das provas relevantes) poderia ser relevante, a falta da sua imposição legal implica a falta de sanção para a omissão. Esta relevará apenas na apreciação do mérito da impugnação[7], na qual o impugnante, dada a sua omissão, suporta o risco de ficar por avaliar algum argumento ou raciocínio que teria considerado relevante ou determinante. 

5. Quanto ao primeiro requisito, relativo à especificação dos concretos pontos de facto que [o recorrente] considera incorretamente julgados, julga-se que está cumprido: quer na motivação, quer nas conclusões, os recorrentes indicam de forma expressa e singular cada um dos pontos factuais que querem discutir. A utilização de remissão para a sua numeração ou para as alíneas que têm nos elencos de factos provados e de factos não provados, e para a numeração nos articulados para que remetem, permite identificá-los sem criar dificuldades (de inteligibilidade ou para o contraditório) [existem lapsos materiais que não prejudicam o exposto: na primeira conclusão indica os pontos «48º, 52º» quando estariam em causa os pontos 48º a 52º (como deriva das alegações e da conclusão 2º); na segunda conclusão indica duas vezes a al. b) quando estariam em causa as als. a) e b) (como deriva da conclusão 1ª e das alegações).

6. Quanto aos demais requisitos, impõe-se uma avaliação diferenciada. Assim:

- facto 5 da sentença: indica-se expressamente a decisão pretendida (fls. 59/60 e 72) mas, fundando-se a impugnação também nas «declarações da A. BB e do A. CC; bem assim, da testemunha DD», omite-se a indicação das passagens da gravação relevantes e bem assim qualquer elemento adicional de circunscrição das partes relevantes daqueles meios de prova orais (al. a) do n.º2 do art. 640º). O que inviabiliza a compreensão da impugnação, a sua discussão nesta sede, e mesmo o exercício do contraditório. Nesta parte o recurso tem que ser rejeitado.

- factos 9 e 10 – os AA. não indicam a decisão pretendida mas depreende-se com suficiente segurança que consideram tal matéria não provada.

Discutindo o valor de documentos que impugnaram, os AA. adicionam a ponderação da prova testemunhal («os depoimentos de EE») sem a indicação das passagens da gravação relevantes – sendo que tal indicação seria ainda mais importante, neste ponto, dado o facto de o depoimento de tal testemunha ter sido usado, e de forma relevante, na fundamentação da sentença recorrida quanto a este facto. A conduta processual dos AA. torna inviável fixar os momentos do depoimento relevantes e nessa medida aproveitar a ensaiada impugnação. Assim, impõe-se a rejeição do recurso nesta parte, por força da mesma al. a) do n.º2 do art. 640º do CPC. 

De qualquer modo, e ainda que assim não fosse, a forma articulada da fundamentação da sentença recorrida, à luz do depoimento daquela testemunha mas também da demais prova e inferências mobilizadas, não permitem dizer que se justificava, à luz das considerações dos recorrentes, a consideração de tal facto como não provado.

Sem embargo, a reavaliação destes factos (especialmente do descrito em 10, do que o descrito em 9 é meramente indiciário[8]) ainda poderia ocorrer caso se verificasse erro de direito na valoração da prova (não por força da impugnação, mas por violação de regras probatórias imperativas[9] que impusessem solução probatória distinta: art. 662º n.º1 e 607º n.º4 e 5, 2ª parte, este ex vi do art. 663º n.º2, todos do CPC). Mas tal não ocorre pois, pese embora os AA. tenham impugnado a genuinidade do documento que titula a cedência (a coincidência entre o autor aparente e o real)[10] e não tenha sido suscitado o incidente probatório do art. 445º do CPC (e assim não tenha, nesse domínio, o R., a quem cabia tal ónus, demonstrado no incidente a genuinidade do documento – art. 374º n.º2 do CC), tem sido entendido que tal omissão apenas impede o funcionamento da presunção contida no art. 374º n.º1 do CC e assim a atribuição ao documento de força probatória plena nos termos do art. 376º do CC, não eliminando totalmente o valor probatório do documento, que continua assim sujeito ao princípio geral da livre apreciação pelo tribunal[11] (art. 607º n.º5, 1ª parte, do CPC), ainda que fragilizado pela dúvida sobre a autoria do documento e os efeitos da regra legal sobre o ónus de superação de tal dúvida[12] [o que se justifica também porquanto a dúvida que o art. 374º do CC faz derivar da impugnação da letra e/ou assinatura é legalmente oposta a quem apresenta o documento e não ao tribunal, não o impedido de ao documento aceder;  porquanto o regime da impugnação em causa visa discutir especificamente um dado probatório com base numa dúvida que em julgamento pode ser superada[13] (sendo insustentável que o valor probatório do documento seja completamente eliminado apesar dessa evidência apenas por não ter sido tal demonstração implementada no âmbito do incidente respectivo – a postergação deste incidente não elimina o documento, e a prevalência de razão formal sobre um valor material, a demonstração de facto, não corresponde à lógica do sistema); e porquanto inexiste princípio geral de invalidação probatória total: v.g. o documento falso faz, nomeadamente, prova das suas circunstâncias]. Ora, no caso o documento foi utilizado para sustentar a fixação da matéria descrita em 10, o que não era vedado face ao entendimento exposto, e tal foi feito também em articulação com outros meios de prova, elencados na sentença recorrida, o que supera eventuais dúvidas, não existindo por isso qualquer violação de regras probatórias a conhecer nesta sede.

- facto 11 – os AA. não indicam de forma expressa a decisão que deve ser proferida. Admite-se que os termos da alegação ainda permitem discernir que se pretende excluir (considerar não provado) o segmento factual que os AA. autonomizam: «que fez parte do passeio pedonal ribeirinho junto àquele rio, local onde foram efectuadas obras de carácter municipal, por ali transitando livremente e, à vista de todos, pessoas e bens, sem oposição de ninguém». Assim, a omissão é, de certa forma, implicitamente sanada, ou é apenas incompleta, pelo que sujeitar a impugnação ao efeito da rejeição se mostraria desproporcionado: se a inteligibilidade da impugnação, e o contraditório estão salvaguardados, seria meramente formal a aplicação do efeito legal. O aludido requisito considera-se, nesta parte, verificado

Em termos de meios de prova, os AA. invocam genericamente «os documentos que constam do processo físico de aprovação do projecto de obra de novo edifício», «os registos documentais, juntos com o requerimento dos AA, datado de 25/10/2021» e os «documentos nº 15; 16; 17; 18; 19».

Ora, começa por notar-se que o facto impugnado se reporta expressamente a realidades posteriores a 2014 [com efeito, dizer que «pelo menos desde 2014 que …» significa que não fica demonstrado que a matéria descrita já ocorria antes dessa data, a qual ficou assim excluída]. Ora, quer o processo camarário relativo à construção de um edifício quer o documento junto com o requerimento de 25.10.2021 (certidão judicial relativa a acção ordinária, contendo elementos relativos a pedido de informação sobre a viabilidade de construção aparentemente junto ao local em causa) são anteriores a 2014, e por si nada adiantam quanto ao que, após 2014, teria ocorrido no local (mormente não revelam que a matéria descrita não poderia ter ocorrido). Os documentos 15, 16, 17, 18 e 19 (da PI) constituem, juntamente com outros também ali juntos, fotografias do local, aparentando umas serem bastante antigas e outras reproduzirem a esplanada que foi retirada do local. Por si, nada dizem, também, quanto ao que ocorreu após 2014. Sobre a demais prova invocada na sentença impugnada, mormente pessoal, nada é dito pelos AA.. Assim, as provas que os AA. indicam são, por si, inconsequentes e por isso é manifesto que não servem para alicerçar convicção diversa da manifestada na fixação do facto descrito. Não se impõe decisão diversa, na formulação do art. 662º nº 1 do CPC).

- facto 12 – os AA. não indicam a decisão que deve ser proferida e, neste ponto, não é possível discerni-la com um mínimo de segurança, tanto que, referindo-se os AA. a todo o ponto 12, depois centram a discussão na existência da esplanada antes de 2014, para de seguida passarem a extensas reproduções de meios de prova pessoais (declarações de parte[14] e depoimentos testemunhais) que extravasam enormemente o âmbito não apenas daquela localização temporal como também da própria matéria factual em causa. O objecto da discussão não é inteligível, com prejuízo para o R. e para o tribunal. Falta aqui, pois, a indicação da decisão a proferir e por isso deve ser rejeitado o recurso nesta parte (al. c) do n.º1 do art. 640º citado).

- factos 13 a 23, 25 e 26 – quanto a estes, os AA. não imputam erro de avaliação à decisão factual proferida, pretendendo antes que sejam aqueles factos suprimidos do elenco dos factos provados por se tratar de matéria factual «(in)idónea[15] e inócua». O CPC não compreende esta modalidade de impugnação da matéria de facto. O que bem se compreende pois em tal actuação não está em causa qualquer censura dirigida ao juízo probatório da sentença e por isso ela não corresponde a autêntica impugnação. A própria natureza deste fundamento do recurso torna inviável o cumprimento dos pressupostos legais da impugnação. A rejeição poderia justificar assim por argumento de maioria de razão face ao regime de impugnação (se não se admite impugnação incompleta, a solução será mais reforçada para a falta de verdadeira impugnação). Ou, se mesmo assim se assimilasse a actuação a uma forma de impugnação, faltaria o interesse em agir (necessidade ou utilidade do recurso nesta parte) ou, ao menos[16], a legitimidade para recorrer (pressuposto aflorado no art. 629º n.º1 («desfavorável») e vertido no 631º n.º1 e 2 do CPC) pois, sendo os factos inócuos, nenhum prejuízo deles advém para os recorrentes. A sua discussão constituiria uma perfeita inutilidade pois, sendo inócuos, não se iriam reflectir na decisão sobre o mérito do litígio[17].

De outro lado, estando os factos dados por provados, e não havendo invocação de deficiente decisão sobre eles, o eventual relevo de tais factos em sede de recurso transfere-se para o domínio da aplicação do direito, momento no qual duas possibilidades alternativas ocorrem i. tais factos foram irrelevantes («inócuos») para a decisão de mérito, e nada há a avaliar (ou a censurar), ou ii. tais factos (ou alguns deles) foram usados mas não têm o valor que lhes foi atribuído no preenchimento da norma jurídica aplicada, e existe erro de subsunção, jurídico, e não factual (erro, aliás, no caso não invocado). De qualquer modo, também por esta via se verifica o infundado da requerida «impugnação» de facto (já que nesta hipótese seria justificada a impugnação do mérito jurídico, não factual, da decisão).

Justifica-se, pois, rejeitar o recurso nesta parte (por aplicação extensiva do art. 640º n.º1 do CPC).

- facto 27 da sentença: os AA. indicam expressamente a decisão pretendida (fls. 60 e 72 [18]), mas não indicam qualquer meio de prova. Limitam-se a tecer considerações gerais sem indicar que meios de prova sustentam a impugnação. Impõe-se a rejeição (al. b) do n.º1 do art. 640º). 

- alíneas dos factos não provados – os AA. indicam qual a decisão pretendida obter, indicando que os factos contidos em tais alíneas devem ser tidos por provados (fls. 60 e 72) (com alguns lapsos quanto à al. a), não determinantes - de mais a mais pela interligação existente entre ela e a al. b) dos factos não provados).

- als. a) e b) – as alíneas têm a seguinte redacção: 

a) Por causa da remoção levada a cabo em 26 de Julho de 2019 a A... Unipessoal Lda. deixou de ter receitas e capacidade para mensalmente assegurar as suas obrigações.

e

b) E por causa disso foi forçada a fechar as instalações e a suspender a exploração do bar, já que a sua facturação passou a ser inferior em média ao valor de € 1.250,00 que constituíam os encargos médios que tinha com o espaço.

Estas alíneas não têm autonomia recíproca.

A primeira parte de cada uma das duas alíneas sobrepõe-se: consistem na alegação da causa do encerramento [remetendo a al. b) para a al. a)].

A segunda parte também: na al. a) refere-se em termos (demasiado) genéricos a desproporção entre receitas e despesas; na al. b) essa alegação genérica é concretizada, dizendo-se, em termos simples, que as despesas mensais médias ascendiam a 1.250 euros, e que as receitas mensais eram inferiores a 1.250 euros. É este o sentido factual da alegação.

Impõe-se assim avaliar em conjunto as duas proposições, que redundam em termos fatuais em verificar se: Por causa da remoção levada a cabo em 26 de Julho de 2019, a facturação da A... Unipessoal Lda. passou a ser inferior em média a € 1.250,00 que constituíam os encargos médios que tinha com o espaço e por isso fechou as instalações, suspendendo a exploração do bar.

Os AA. cumpriram, em termos suficientes, o ónus imposto pela al. a) do n.º2 do art. 640º citado.

Quanto ao mérito da impugnação, e analisando os elementos de prova indicados pelos A., verifica-se que:

- FF («representante legal» da A. A... Lda.), em declarações de parte, afirmou que a sociedade tinha encargos mas não os quantificou; e que não conseguia pagar as rendas porque fechou o estabelecimento, e não que fechou porque não conseguia receitas bastantes, ou sequer por ter perdido a esplanada. Aliás, logo no início das suas declarações afirma que rescindiu o contrato (de exploração do bar) por causa do covid (e não por causa da perda da esplanada).

- DD, testemunha (que vive em união de facto com FF), respondeu apenas «não» a perguntas sugestivas e genéricas [«Ele podia, ele conseguia manter, sem ter rentabilidade, os encargos que tinha de assumir todos os meses e, em cada prazo ajustado?», ou « A empresa tinha rentabilidade, que permitisse solver esses encargos, daí para diante?»] – na primeira resposta, e após dizer «não», perdeu-se em confusa explanação sobre a necessidade de reestruturar o espaço por se ter perdido a esplanada[19], sem relevo para o ponto concreto que ora se discute; na segunda resposta, o «não» foi singelo. Não é viável valorar probatoriamente tais respostas nesses termos. De qualquer modo, a «pergunta formulada e respondida» sustentava que não havia receitas bastantes para suportar os encargos, já não que não tinha receitas bastantes por a sociedade ter ficado sem a esplanada.

- GG, testemunha, respondeu usando generalizações sem qualquer base concreta (v.g. que a esplanada, era um fator determinante para o funcionamento do estabelecimento, que a não existência da esplanada colocava em risco a viabilidade económica do estabelecimento; ou que a esplanada foi construída, não só mas também para colmatar um menor facturamento que se fazia sentir no Verão; e que sem a esplanada tornava-se inviável a abertura do bar[20]); estas afirmações genéricas não são elucidativas nem esclarecedores e, ainda, mostram-se vocacionadas apenas para um lapso temporal limitado (o verão).

Ou seja, destes depoimentos, nos momentos enunciados ou em outros, não se retira, como é evidente, a demonstração da matéria impugnada. Nem tal decorre de outros meios de prova, mormente de documento junto com a PI, não explicitado, que contém valores mensais mas cuja origem e significado se ignora.

Não se assim verifica fundamento para alterar a matéria de facto fixada.

- al. c), com a seguinte redacção: «desde Julho de 2019 a R. passou a fazer circular pelo logradouro do prédio dos primeiros AA. do lado do rio, pessoas, como se tratasse de espaço público e contra a vontade de tais AA.»

Foram cumpridos suficientemente os ónus inerentes à impugnação.

A alegação teria um interesse marginal, quanto à, na perspectiva dos AA., utilização (ocupação ilegítima) de espaço pertencente aos primeiros AA.. Expurgada a alegação de menções excessivas ou indevidas (a destruição, nunca revelada, é coisa diferente da remoção; a referência «como se (se) tratasse de espaço público» constitui um juízo valorativo e tendencioso, atendendo ao objecto do processo), resta o uso do espaço correspondente ao invocado logradouro e a oposição dos AA. a esse uso.

As declarações de parte de FF, tal como indicadas, mas também tal como mais extensamente prestadas (e ouvidas), não confirmam a alegação (nunca se referem à situação após a remoção, assim como não reportam a oposição alegada). As fotografias colhidas na inspecção ao local não comprovam mais do que o que consta descrito em 11 dos factos provados, devidamente articulado com o descrito em 12 e 24 dos factos provados.

Donde não poder proceder esta pretensão.

- al. d), com a seguinte redacção: «E desde aquela data os AA. estão impedidos de usar o logradouro que é seu e onde se encontrava implantada a esplanada».

Os AA. indicam como meios de prova os «documentos constantes dos autos» e os «depoimentos das testemunhas rectro (sic) alegados». Tal não cumpre, manifestamente, o ónus de indicação dos concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, o que justifica a rejeição do recurso (al. b) do n.º1 do art. 640º citado). De qualquer modo, e para além da formulação demasiado genérica, nunca se poderia discutir na matéria de facto se o logradouro «é seu» (dos AA.) por tal corresponder ao objecto jurídico da acção.

- al e), com a seguinte redacção: «Os primeiros AA. por causa dos actos de remoção da esplanada vivenciaram uma situação de angústia e ansiedade temendo perder rendimento e verem depreciado o seu prédio».

            Os AA. omitiram por completo a indicação dos meios de prova relevantes. Nas alegações, passam da alínea d) para a f), sem se referirem a esta alínea e) (fls. 49-50). Nas conclusões também não consta a referência a qualquer meio de prova (embora a omissão da alegação correspondente também impedisse que se atendesse ás conclusões). Impõe-se assim a rejeição do recurso nesta parte (art. 640º n.º1 al. b) do CPC).

- al. f) , com a seguinte redacção: «Por causa dos actos de remoção da esplanada a A... ficou com uma imagem perante os seus clientes muito negativa».

Os AA. cumprem minimamente os ónus impostos no que toca às declarações a aos depoimentos que individualizam. A menção genérica aos «registos fotográficos, rectro mencionados» e às «declarações, do então, presidente da CM...» não corresponde a tais ónus mas admite-se que valerão as demais menções circunstanciadas, sendo estas menções genéricas adicionais ineficazes. Sucede, e quanto ao mérito, que os meios de prova indicados, ou outros constantes do processo (acedidos), não suportam de todo a asserção em causa (como da mera leitura das transcrições feitas se verifica). E da intervenção desmanteladora também se não infere tal matéria (ficando por saber se existia e qual era a percepção geral das pessoas sobre a sociedade). Para além das dificuldades que a referência a uma imagem «negativa» coloca do ponto de vista do objecto factual da indagação (parecendo que a alegação se tende a esgotar num juízo valorativo de factos não alegados e ignorados).

- al. g) , com a seguinte redacção: «A A... por causa dos actos de remoção sente-se abatida e psicologicamente afectada».

Também aqui se admite que foram cumpridos em parte os ónus derivados da al. b) do n.º1 e da al. a) do n.º2 do art. 640º, por referência às declarações de parte cujas passagens indica (e transcreve). No mais, os meios de prova que indica não cumprem este ónus mas não impedem a avaliação com base naquele cumprimento suficiente.

Quanto ao mérito, a alegação assenta, salvo o devido respeito, num equívoco, ignorando que a pessoa colectiva, ficção imaterial sem conteúdo psicológico próprio, não se pode sentir «chocada, indignada, abatida e psicologicamente afectada[21]». Trata-se de afectações «apenas susceptíveis de serem sentidas pelas pessoas humanas». O gerente, pessoa física, pode sentir isto; a sociedade não; mas o que o gerente sente e aquilo que se imputa à sociedade são coisas diferentes (como aliás, durante as declarações do representante da A. foi feito sentir pelo Mmo. Juiz que presidiu à audiência). A questão coloca-se, neste ponto, num domínio factual, que não convoca a discussão atinente à atribuição, ou não, às pessoas colectivas (e, de entre estas, às sociedades comerciais) de certos direitos de personalidade ou de uma «esfera imaterial» ligada a interesses da pessoa colectiva. O que parece seguro é que ninguém aceita a subjectivização radical da pessoa colectiva, equiparando-a à pessoa singular nestes aspectos, ou atribuindo-lhe o sentir do seu representante geral. Por isso que não seria possível afirmar aquela matéria – que os elementos probatórios também, mesmo numa perspectiva radical, não sustentavam.

- por fim, os AA. pretendem ainda, aparentemente, ver aditada matéria alegada na PI e na réplica e que não foi objecto de avaliação. Sucede que nesta parte se limitam a indicar a matéria em causa sem indicarem qualquer meio de prova que sustente o apuramento desses factos. O que impõe a rejeição do recurso (al. b) do n.º1 do art. 640º do CPC).

7. Assim, mantém-se a matéria factual constante da sentença proferida.

IV. Não devendo ser introduzidas alterações na matéria de facto, remete-se nesta parte para os termos da decisão da 1ª instância (art. 663º n.º6 do CPC).

V. 1. O prédio em causa, após o óbito do A. AA, passou a integrar o património indiviso formado a partir da meação conjugal da primeira A. e do acervo hereditário titulado pelos herdeiros de AA (a primeira A. e o A. habilitado CC). A fixação da propriedade que em tal património se integra, afirmada na sentença recorrida, não foi impugnada, constituindo assim um «dado transitado».

Partindo dele, o litígio passa pela fixação da titularidade do logradouro que integrou aquele prédio e, por essa via, pela avaliação do acordo (protocolo) de cedência do logradouro do prédio dos AA. ao R., que condiciona aquela titularidade.

A existência de tal acordo de cedência (do logradouro, para ser integrado no domínio público do Município) está demonstrada, atentos os termos dos factos provados.

Analisa-se num acto de disposição autónomo (e externo a procedimento administrativo típico, definido por lei), pelo qual um particular cede uma parcela de terreno (parte de um prédio de que é proprietário) ao Município, a fim de ser integrado no domínio público municipal (passeio pedonal ribeirinho), ficando o Município sujeito a obrigações próprias (obrigou-se a autorizar a ocupação de parte do espaço público com uma esplanada).

Este acordo foi reduzido a escrito sem formalidades adicionais.

O problema radica, em primeira linha, na suficiência da forma que tal acto reveste (documento particular), o que depende da fixação da exacta natureza de tal acordo.

No sentido da suficiência da forma, afirma-se que «a aquisição ou submissão de um bem aos fins do domínio público [utilidade pública]» não se sujeita ao regime do CC, que vale apenas para as relações jurídico-privadas, «sendo que as coisas que se encontram no domínio público se consideram fora do comércio jurídico-privado», dizendo-se ainda que «a atribuição do caráter dominial de um imóvel pode fundar-se designadamente na simples afetação à utilidade pública». Invoca-se ainda a "dicatio ad patriam", figura de origem italiana que «consiste basicamente em uma pessoa ceder para uso público (designadamente para fins de "strade vicinal" [caminhos vicinais]) bens da sua propriedade, o que é considerado como um meio de aquisição da coisa para o domínio público e uma perda para o "tradens"»[22].

Em sentido diverso (embora não exactamente para esta situação), dizia-se que aquele tipo de cedência constitui um negócio civil (em regra qualificado como doação), sujeito por isso às exigências de forma do direito civil, mormente quanto à forma.

2. Entende-se que a primeira solução se mostra mais conforme à verdadeira natureza do acto e aos valores em causa, os quais subtraem o acordo ao crivo de forma que vale para as relações jurídico-privadas. Pese embora a entidade pública não intervenha revestida de autoridade pública, e o acto ainda se baseie na autonomia privada (na liberdade de conformação dos interesses próprios e de disposição dos bens), a circunstância de se pretender, com o acordo, retirar a coisa do domínio privado, passando a integrá-la, ipso facto (i. é, por efeito do acordo), no domínio público, com imediata afectação, também vinculativa, ao uso da comunidade (afectação ao uso comum como deriva da integração numa obra de requalificação urbana e se revela pelo uso concreto que, na sequência do acordo, lhe foi dado pelo R.) atribui-lhe um carácter próprio, tributário desta finalidade especial. Na verdade, e de um lado, a finalidade precípua do acordo tende a opor-se à atribuição de um carácter privado comum ao acordo: se este visa, embora por mecanismo particular e sem corresponder a mecanismo legal público típico (v.g. expropriação), transpor logo o bem para um domínio público que, por definição, se opõe ao domínio privado-particular, conhecendo regras próprias e distintas, parece que o acordo também não deve ficar subordinado estritamente a regras civis privadas, quanto à sua forma. De outro lado, efeito do acordo é a imediata sujeição do bem às regras do domínio público e, assim, aquele fica logo retirado do comércio jurídico-privado (tornando-se indisponível, impenhorável e imprescritível, no que se manifesta a sua «extracomercialidade de direito privado» - art. 18º a 20º do DL 280/2007, de 07.08, e art. 202º n.º2 do C) - valendo o próprio acordo como acto da administração de sujeição a esse regime, o qual se admite valer como forma de afectação [é certo que o art. 14º daquele DL 280/2007 diz que os imóveis do domínio público são os classificados pela Constituição ou por lei, individualmente ou mediante a identificação por tipos, mas esta indicação continua a faltar, valendo os critérios tradicionais; sendo também que do art. 16º n.º1 do mesmo DL ainda resulta que o interesse público subjacente ao estatuto da dominialidade (pública) de um imóvel pode decorrer da sua natureza, como no caso da afectação a caminho público, como ocorre aqui]. Esta afectação imediata é desajustada à fisionomia e valoração formal dos negócios jurídico-privados. Pretender sujeitar o acordo a regras formais que lidam com a disposição de bens integrados no domínio privado (comércio jurídico privatístico, marcado pela satisfação de interesses individuais) quando o acordo visa justamente excluir o bem do domínio privado (sujeitando-o a regime oposto, onde predominam a indisponibilidade do bem e a sua afectação a interesses públicos), mostra-se incongruente. Ou seja, a intencionalidade subjacente ao acordo, nestas duas perspectivas, dá-lhe uma fisionomia própria, atípica, não reconduzível a mecanismo civil comum e às respectivas exigências de forma.

3. As razões determinantes da forma civil, múltiplas[23], não são precisas. Pode, porém, aceitar-se que têm como pano de fundo um arranjo privatístico de interesses tendencialmente antagónicos, no sentido de que cada parte procura primordialmente a satisfação de interesses próprios ou que por alguma razão lhe interessa sustentar (a relação paritária traduzida no encontro de vontades parte de interesses tendencialmente antagónicos, com cada parte a procurar maximizar a sua posição). O que não vale quando se visa justamente excluir a coisa do âmbito do comércio jurídico, em que o escopo do acordo é contrário ao mercantilismo funcional do tráfico privado, e quando a contraparte do disponente é uma entidade pública, que deve, por inerência constitucional, operar a prossecução do interesse público (e não a prossecução de interesses individualistas, próprios), sendo depositária de maior confiança. O que, também por esta via, sublinha a autonomia do acordo de cedência, que deixou de corresponder à fisionomia civil comum.

Por outro lado, entende-se relevarem na forma especialmente razões ligadas à publicidade, ponderação e prova. Neste tipo de cedência, a publicidade da transmissão alcança-se pela própria afectação pública da coisa («a publicidade do bem resulta de este fornecer uma utilidade à colectividade pública»), com o uso público, que também indicia a cedência (a prova). A ponderação não vai afectada com a forma adoptada, sendo ainda por ela suficientemente ressalvada. Assim, existem razões para as razões da forma não serem, neste domínio, impressivas.

4. A exacta qualificação do acordo face aos cânones civis torna-se, assim, não determinante. Quer se veja aqui uma doação [marcada pela intenção de beneficiar o domínio público, através da atribuição realizada a favor do R. – e ainda que a doação seja modal, em que a prestação a cargo do R. não constitui o equivalente sinalagmático da atribuição patrimonial que lhe é feita mas apenas um encargo], quer se considere que existe um acordo de troca entre uma coisa (com atribuição real) e uma prestação de facto [entrega/disponibilização do espaço para ocupação com a esplanada, embora também esteja co-envolvida uma autorização entendida enquanto concessão da «faculdade de intromissão na esfera jurídica do autorizante» - dada a formulação usada no acordo («contrapartida») e, em paralelo, a aparente ausência de uma intenção de beneficiar, com espontaneidade, e assim de um espírito de liberalidade, já que se procura obter um benefício específico], sempre as exigências de forma civis seriam de postergar.

5. A aquisição e a afectação (ao domínio púbico) da coisa diferenciam-se entre si. Mas a acentuação desta afectação, que pode derivar logo do acordo de aquisição e até o preceder (como parece ter ocorrido no caso, dados os termos do acordo: cláusula 2), tem o mérito de sublinhar a autonomia funcional e teleológica do acto face ao regime civil comum, quanto à forma dos actos.

6. Autonomia esta que tem, segundo se julga, alguma manifestação legal, mormente quanto à forma de certos actos aquisitivos de bens destinados ao domínio publico.

Assim com o regime jurídico da urbanização e edificação (DL 555/99, de 16.12), na medida em que prevê formas próprias de titulação dos actos de cedência, prevendo a aquisição por força do próprio alvará ou através de instrumento notarial próprio (art. 44º n.º3); e em que o alvará, constituindo um acto administrativo, envolve a completa postergação das formas civis, e o instrumento notarial é, ao menos numa primeira avaliação, forma mais ampla que a escritura pública por também abranger o instrumento notarial avulso[24]. Este quadro tende, assim, a apontar no sentido de que o legislador reconhece que estes actos aquisitivos não se identificam inteiramente com negócios privatísticos, sujeitos por natureza às suas exigências formais, sendo as formas, em grande medida próprias[25], criadas por via legal própria – o que de certo modo foi ainda sublinhado pela revogação do n.º1 do art. 80º do CNotariado (que continha uma exigência genérica de forma para a generalidade dos contratos reais).

No regime das expropriações, quanto às aquisições por acordo entre expropriante e interessados, também se prevê o auto, lavrado por notário privativo[26] ou funcionário designado para o efeito pela própria entidade adquirente (art. 36º n.º1 al. b) do CE), como forma de titular a aquisição, o que parece envolver o reconhecimento legal de que os actos de disposição em causa se situam num espaço sujeito a regras específicas, desvalorizando as regras de forma civis (ainda que aquele auto se submeta aos requisitos notariais comuns).

7. Estas especificidades legais quanto à forma podem ver-se como mera adaptação do regime civil (para actos de outro modo sujeitos àquele regime) ou como regime específico para actos a que o regime civil se não ajusta com propriedade. Pelo já exposto, será esta segunda possibilidade que se tende a aceitar.

Não se trata de proceder a uma redução do âmbito das regras de forma civis mas de colocar o acto de cedência fora do seu âmbito normativo. Se a regra, na forma, é a liberdade, a imposição de forma constitui excepção. As regras normativas referidas seriam expressão desta distinção (e não mera modificação de outras normas excepcionais civis, que impõem certa forma). E o acordo de cedência não estaria condicionado por exigências de forma.

8. A invocação da dicatio ad patriam não é directamente determinante. Tratando-se de figura criada jurisprudencialmente em Itália, com ela admite-se a criação de servidões de uso público sobre bens privados, a partir da colocação voluntária pelo proprietário (ainda que sem intenção de criar um vínculo público, e independentemente da sua motivação), com carácter de continuidade, de um bem à disposição da colectividade, sujeitando-o ao uso correlativo, sem que ocorra um acto negocial ou ablatório[27]. Diferencia-se do acordo de cedência quer por se basear num acto de tolerância, do titular, não translativo, quer por não conduzir à aquisição da propriedade mas à criação de uma servidão pública de uso. A figura está mais próxima das situações de «intangibilidade da obra pública» (assente em ocupação sem título de coisa privada). Sem embargo, não deixa de constituir manifestação da autonomia dos valores, ditando soluções diferenciadas face ás que resultariam das regras de direito privado, mormente sancionando aquisições não documentadas. Valores que, como exposto, se afastam dos que motivam as regras formais civis e justificam soluções singulares.

9. Sendo assim, considera-se inexistir vício formal oponível ao acordo de cedência. Nem foi trazido ao recurso outro vício, nem se vislumbra a existência de vício de conhecimento oficioso. Donde dever tal acordo valer.

10. As pretensões dos AA. trazidas ao recurso dependiam do reconhecimento da sua propriedade sobre o logradouro (cedido) do prédio. Seria a lesão dessa propriedade que em primeira linha sustentava a ilicitude da conduta do R.. Inexistindo vício de forma na cedência realizada, e integrando-se o logradouro no domínio público, falece o fundamento das pretensões dos AA..

Do mesmo modo, falece o fundamento para discutirem os termos do pedido reconvencional acolhido, cujo acolhimento se mostra fundado no acordo de cedência.

Improcede, pois, o recurso.

11. As custas correm pelos AA. (art. 527º n.º1 do CPC).

V. Pelo exposto, decide-se:

- indeferir a requerida obtenção e junção de documento;

- rejeitar o recurso nos pontos supra enunciados;

- julgar improcedente o recurso no demais.

Custas pelos AA..

Notifique-se.

Sumário (da responsabilidade do relator - art. 663º n.º7 do CPC):

(…).

            Datado e assinado electronicamente

Redigido sem apelo ao Acordo Ortográfico.





[1] A superveniência vem ainda genericamente referida no art. 662º n.º1 do CPC.
[2] V. por todos o Ac. do STJ proc. 296/19.4T8ESP.P1.S1 (3w.dgsi.pt), com indicações doutrinais, a que se podem aditar Henrique Antunes, Recurso de apelação e controlo da decisão da questão de facto, Estudos em Comemoração dos 100 Anos do Tribunal da Relação de Coimbra, Almedina 2018, pág. 80 no sentido da inadmissibilidade legal do convite (embora com reservas face ao direito constitucional a um processo equitativo), e, no sentido oposto, L. Freitas, R. Mendes e I. Alexandre, CPC Anotado, vol. 3º, Almedina 2022, pág. 95 e 99 (também com outras indicações).
[3] V. Ac. do STJ proc. 20592/16.1 T8SNT.L1.S1 (3w.dgsi.pt), que se seguiu de perto.
[4] V. A. Abrantes Geraldes, Recursos em processo civil, Almedina 2022, pág. 197, 198, 201 e nota 348 e 202 nota 350, L. Freitas, R. Mendes e I. Alexandre, CPC Anotado cit., pág. 97 a 99, Ac. do STJ proc. 10300/18.8T8SNT.L1.S1, proc. 824/11.3TTLRS.L1.S1, proc. 326/14.6TTCBR.C1.S1, proc. 157/12.8TUGMR.G1.S1, proc. 299/05, proc. 29/12.6TBFAF.G1.S1, proc. 233/09, proc. 1572/12, proc. 449/410, proc. 1060/07 (3w.dgsi.pt).
[5] V. Acs. do STJ proc. 7430/17.7T8LRS.L1.S1, proc. 294/08.3TBTND.C3.S1 ou proc. 3683/16.6T8CBR.C1.S2 (3w.dgsi.pt).
[6] Aqui como afloramento de princípio geral, com alcance diferente do que foi usado em sede de avaliação da inadmissibilidade do aperfeiçoamento.
[7] Assim, Henrique Antunes, Recurso …cit., pág. 81 e Ac. do STJ proc. 2184/20.2T8VRL.G1.S1 (3w.dgsi.pt).
[8] Embora se deixe dito que se considera que o documento subjacente à matéria descrita em 9 não seria um documento autêntico pois não cabe na competência certificadora do município a matéria em causa, nele descrita.
[9] Que impedissem a atribuição de valor probatório a certo meio de prova, impusessem a utilização de certo meio de prova ou impedissem a utilização de certo meio de prova contra outro com valor probatório superior.
[10] E não a sua falsidade (o que se compreende pois esta supõe o estabelecimento da genuinidade que os AA. pretenderam excluir) – falsidade cujo ónus da prova cabia, aliás, aos AA..
[11] Assim, Acs. do STJ proc. 2294/12.0TVLSB.L1.S1, ou do TRL proc. 785/06.0YXLSB.L1-6 (3w.dgsi.pt); contra M. Teixeira de Sousa, em anotação no blog do IPCC.
[12] O que pode levar, adicionalmente, a supor (ou a exigir) que exista prova produzida em julgamento que complemente o documento.
[13] Como ocorreu no caso avaliado, sem censura, pelo STJ no proc. 212/13.7TBMCD.G1.S1 in 3w.dgsi.pt.
[14] O declarante CC vem, na acta respetiva, identificado como HH (na sequência do requerimento que antecede a sua audição); identificou-se pessoalmente, porém, como CC (como também consta da sentença de habilitação); existe pois lapso manifesto na acta.
[15] Existe manifesto lapso na redacção adoptada na alegação (pretendia-se notoriamente negar a idoneidade).
[16] Sobretudo para quem não reconheça autonomia ao interesse em agir, inserindo-o na avaliação da legitimidade.
[17] A inutilidade dos factos impugnados para a decisão tem sido considerada obstáculo ao recurso mesmo quando existe verdadeira impugnação da matéria de facto - v. Henrique Antunes, Recurso … cit., pág. 100, A. Geraldes, Recursos … cit., pág. 334 nota 526 in fine, ou Ac. do TRC proc. 3713/16.1T8LRA (3w.dgsi.pt).
[18] Eventualmente com lapso, quando substituem o nome «remoção» pelo nome «renovação».
[19] Menções não reproduzidas na alegação dos AA. quando transcrevem parcialmente o depoimento.
[20] Menção que a transcrição dos AA. não traduz.
[21] Para além da vacuidade desta última afirmação, sem conteúdo preciso.
[22] V. Acs. do TRG proc. 1500/05-2 e do TRC proc. 1786/14.0TBVIS.C1 (3w.dgsi.pt).
[23] Correntemente, invocam-se a imposição de maior reflexão; garantia de maior certeza quanto ao negócio e seus termos; separação face à fase pré-contratual; dar publicidade; e facilitar a prova; razões estas que são objecto de crítica por parte de Menezes Cordeiro, que identifica mais de uma dezena de fundamentos (Tratado de Direito Civil, II, pág. 174).
[24] O qual é ainda um documento público mas não é uma escritura pública (art. 35º n.º2 e 36º n.º1 e 3 do CNot).
[25] E como a forma notarial é reservada para os casos em que inexiste acto (administrativo) permissivo da operação (basta a comunicação prévia – art. 34º n.º2 do referido diploma) e em que não é possível, por isso, conter o acto de disposição no acto permissivo, a transmissão «administrativa» parece até ser preferencial.
[26] A figura do notário privativo terá sido eliminada (pese embora continue prevista no art. 3º n.º1 al. b) do CNot., foram eliminadas as regras específicas que se lhe referiam: art. 58º do DL 247/87 e art. 68º n.º2 al. b) da Lei 169/99).
[27] Sobre a figura, podem ver-se textos jurisprudenciais e doutrinais em https://www.diritto.it.