Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1534/09.7TBACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JAIME FERREIRA
Descritores: ACÇÃO ESPECIAL
CUMPRIMENTO
OBRIGAÇÃO PECUNIÁRIA
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA
FORÇA EXECUTIVA
Data do Acordão: 07/14/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: ALCOBAÇA – 2º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 2º DO ANEXO AO DL Nº 269/98, DE 1/09; ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA Nº 7/2009; ARTº 781º CC.
Sumário: I – Numa acção declarativa de condenação, com processo especial destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior à alçada da Relação, nos termos do art. 1° do DL n° 269/98, de 01/09, na redacção que lhe foi dada pelo DL n° 107/2005, de 01/07, dispõe o artº 2º do anexo respectivo que “se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de decisão condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou que o pedido seja manifestamente improcedente”.

II - Pronunciando-se sobre a interpretação deste dispositivo, vária jurisprudência tem defendido que, nestes casos, apenas se poderá deixar de conferir força executiva à petição, para além da verificação evidente de excepções dilatórias, quando a falta de fundamento do pedido for manifesta, por falta absoluta de fundamento legal.

III - Pelo Acórdão do STJ nº 7/2009, de 29/03/2009, foi uniformizada a jurisprudência no sentido de que “no contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao art. 781.º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados”.

IV - Assim sendo, afigura-se ser manifesta a improcedência parcial da petição inicial, quando o Autor reclama do Réu o pagamento de juros remuneratórios relativos às prestações de mútuo oneroso não vencidas.

Decisão Texto Integral:             Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:


I

            No Tribunal Judicial da Comarca de Alcobaça, a sociedade denominada de “A....”, com sede na ...., instaurou contra B..., residente na ..., a presente acção declarativa de condenação, com processo especial destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior à alçada da Relação, nos termos do art. 1° do DL n° 269/98, de 01/09, na redacção que lhe foi dada pelo DL n° 107/2005, de 01/07, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a importância de € 4.758,45 acrescida de € 1.156,33 de juros vencidos até 07-07-2009 e de € 46,25 de imposto de selo sobre estes juros e, ainda, os juros que, sobre a dita quantia de               € 4.758,45, se vencerem, à taxa anual de 19,58%, desde 08-07-2009 até integral pagamento, bem como o imposto de selo que, à referida taxa de 4%, sobre estes juros recair.

Para o efeito alegou, muito em resumo, que, no exercício da sua actividade comercial, concedeu ao Réu, por contrato constante de documento particular datado de 16-09-2004, crédito directo, sob a forma de um contrato de mútuo, no valor de              € 10.250,00, com destino, segundo informação do Réu, à aquisição de um automóvel, devendo a importância do crédito, dos juros, da comissão de gestão e demais despesas serem pagos, nos termos acordados, em 60 prestações mensais e sucessivas, juros esses à taxa nominal de 15,58% ao ano.

Que o Réu deixou de pagar as prestações referidas, a partir da 43ª prestação, inclusive (vencida em 10/04/2008), vencendo-se então todas as restantes, conforme expressamente fora acordado entre as partes, ascendendo o seu débito a € 4.758,45.

            Que instado o R. pelo Autor para pagar a importância em débito e juros respectivos, bem como o imposto de selo incidente sobre os juros, o Réu não o fez, razão da propositura da presente acção.


II

            O Réu foi regularmente citado, mas não apresentou qualquer contestação.

 


III

            Foi então proferido despacho saneador-sentença, no qual foi reconhecida a regularidade processual seguida, tendo sido proferida decisão a julgar parcialmente procedente a presente acção, com a condenação do Réu a pagar ao A. a quantia que se vier a liquidar em ulterior liquidação, correspondente às prestações vencidas e não pagas, relativas apenas ao capital mutuado, acrescidas dos respectivos juros de mora à taxa convencionada de 19,58%, desde 10/04/2008, bem como do correspondente imposto de selo, até efectivo e integral pagamento; e absolvendo o R. do demais peticionado.  

            Para assim decidir, o Tribunal a quo considerou que se está perante um contrato de crédito ao consumo, sob a forma de mútuo, tal como está definido nos artºs 2º, nº 1, al. a), do Dec.Lei nº 359/91, de 21/09, e 1142º do CC, e que tendo ocorrido fundamento para o imediato vencimento do total das prestações ainda em débito, nos termos do artº 781º do CC, pelo que o R. está obrigado a restituir à A. o capital mutuado e ainda em dívida, mas já no que tange à obrigação de pagamento de juros remuneratórios pedidos assim não sucede, no entendimento também seguido pelo STJ, no seu Ac. Uniformizador de Jurisprudência de 29/03/2009.


IV

            Dessa sentença interpôs recurso o Autor, recurso que foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

            Nas alegações que apresentou o Apelante concluiu do seguinte modo:

            1ª – Atenta a natureza do processo em causa – processo especial – e o facto de o R. regularmente citado não ter contestado, deveria a sr. Juiz a quo ter de imediato conferido força executiva à petição inicial, não havendo, assim, necessidade sequer de se pronunciar sobre quaisquer outras questões.

            2ª – Aliás, neste sentido se pronunciou o Tr. Rel. de Lisboa, no seu acórdão proferido no proc.º nº 153/08.0TJLSB-L1…

            3ª – Termos em que deve conceder-se provimento ao presente recurso e revogar-se a sentença recorrida, substituindo-a por acórdão que condene o R. na totalidade do pedido.


V

            Não foram apresentadas contra-alegações.

            Nesta Relação foi aceite o recurso interposto e tal como foi admitido em 1ª instância, nada obstando a que se conheça do seu objecto.

            Esse objecto pode resumir-se à questão de se saber se o Tribunal recorrido podia ter-se pronunciado, como o fez (sem aqui se discutir a correcção ou incorrecção da fundamentação aí seguida e respectiva decisão), sobre a matéria de facto que deu como assente e seu enquadramento legal e jurisprudencial, ou se estava simplesmente obrigado a conferir força executiva à p.i., face à não apresentação de contestação pelo R., como defende o Recorrente.

 

            Assim sendo, uma vez que não está em causa a discussão da matéria de facto dada como assente, nos termos do artº 713º, nº 6, do CPC, remete-se para os termos da sentença recorrida quanto à matéria de facto tida como assente.

            Nessa sequência, cumpre, pois, abordar a referida questão que nos é colocada pelo Recorrente:

            É facto que estamos perante uma acção declarativa de condenação, com processo especial destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior à alçada da Relação, nos termos do art. 1° do DL n° 269/98, de 01/09, na redacção que lhe foi dada pelo DL n° 107/2005, de 01/07, dispondo-se no artº 2º do anexo respectivo que “se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de decisão condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou que o pedido seja manifestamente improcedente”.

            Pronunciando-se sobre a interpretação deste dispositivo, vária jurisprudência tem defendido que, nestes casos, apenas se poderá deixar de conferir força executiva à petição, para além da verificação evidente de excepções dilatórias, quando a falta de fundamento do pedido for manifesta, por falta absoluta de fundamento legal, como, aliás, pelo Recorrente foi citada.

            Face ao que importa saber se, nos casos como o dos autos, existe ou não a referida “falta absoluta de fundamento legal”.

            Com todo o respeito pelo entendimento sufragado pelo Recorrente e por algumas decisões jurisprudenciais diversas, afigura-se-nos que, no presente caso, se verifica a referida falta absoluta de fundamento legal, como bem resulta da sentença recorrida e cujos termos aqui damos como reproduzidos, designadamente quando nela se escreve que “…a obrigação do pagamento do capital existe e é líquida, estando apenas a sua amortização deferida nos termos do pagamento das prestações.
Com efeito, ocorrendo, como ocorreu, fundamento de vencimento do total das prestações, previsto no art. 781.º do Código Civil, a totalidade da dívida (de capital) torna-se imediatamente exigível, justamente porque a obrigação, única, embora com cumprimento escalonado, já existia, era líquida e, por via do vencimento antecipado, apenas se tornou imediatamente exigível.

Não se patenteiam, pois, dúvidas, de que o Réu está obrigado a restituir à autora o capital mutuado, ainda em dívida à data do incumprimento, por si, do contrato celebrado.
Já no que tange à obrigação de pagamento, à autora, dos juros remuneratórios incorporados nas prestações vencidas em função do incumprimento do mutuário, assim não sucede.

Este o entendimento fixado pelo Acórdão do STJ, de 29/03/2009, que uniformizou jurisprudência nos seguintes termos: “No contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao art. 781.º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados”.

Com efeito, a dívida de capital não tem paralelismo com a obrigação de juros. Estes estão pré-calculados e incluídos nas prestações com o capital no pressuposto do cumprimento de um programa contratual, que consiste em o mutuário ir liquidando prestações constantes, diluindo e antecipando o pagamento dos juros remuneratórios desde o momento em que passa a dispor do capital. - cfr. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 /03/2007, in CJ/STJ, Ano XXV, Tomo I, p. 153 a 155.
Tal prática não contém a virtualidade de retirar aos juros remuneratórios a sua natureza de frutos civis, nos termos do art. 212.º, 2, do Código Civil, ou seja, juros representativos do preço de utilização do capital, sempre relacionados com o tempo dessa utilização.

Na verdade, o juro é um rendimento do capital em função do tempo e tem natureza retributiva; por isso só nasce à medida e na medida em que o tempo decorre e só se mantém até ao momento do vencimento da obrigação da restituição desse capital.
No caso sub judice, foi acordado entre autora e réu que esta, mês a mês, e até ao termo do contrato, lhe pagaria a prestação de € 272,68, prestação essa que incluía a amortização do capital mutuado, a respectiva remuneração, o imposto de selo sobre esta e o duodécimo do prémio do seguro de vida.

Conforme resulta do citado Ac. Uniformizador de Jurisprudência, a adequada interpretação da cláusula 8.ª das Condições Gerais do contrato, impõe que se tome em consideração o sentido, claro e corrente, das expressões utilizadas, do ponto de vista do normal declaratário, enquadrado no contexto da actividade comercial que lhe subjaz a qual, de tão frequente e publicitada nos dias que correm, é de fácil e instintiva compreensão para o cidadão médio.

Com efeito, quando, no contrato em apreço, se deixa consignado que “a falta de pagamento de uma prestação, na data do respectivo vencimento, implica o imediato vencimento de todas as restantes”, tal só pode significar, quanto ao que as partes anteciparam, acertaram e aceitaram é que, falhando culposamente o pagamento de uma das prestações no montante de € 167,29, ocorre, como consequência imediata, a exigibilidade de todas as restantes prestações relativas à dívida de capital – e não já aos juros de mora remuneratórios inicialmente acordados no pressuposto da vigência normal do contrato e pelo respectivo período temporal acordado.
A natureza distinta da dívida de capital e de juros leva a que “a falta de pagamento dos juros não implica o vencimento imediato da dívida de capital, visto não se tratar de fracções da mesma dívida, mas de dívidas distintas, ainda que estreitamente conexas entre si” (ANTUNES VARELA, in “Das Obrigações em Geral”, Vol. II, 7ª ed., p. 54).
E, de igual forma, o vencimento da totalidade da dívida de capital - resultante da falta de pagamento de prestação fraccionada do mesmo - não implica o vencimento imediato da totalidade dos juros remuneratórios que seriam auferidos com o capital. Considerando que o seu montante varia em função do tempo de duração do mútuo, os juros remuneratórios não estão repartidos em prestações correspondentes a uma obrigação de juros fraccionada. Isto é, ao invés da obrigação de capital mutuado (que reveste a natureza de obrigação de prestação fraccionada), a obrigação de juros tem o seu conteúdo e extensão delimitada em função do tempo (de pagamento do capital), sendo, por isso, uma obrigação de prestação duradoura periódica. Daí que, existindo uma dívida proveniente de mútuo liquidável em prestações nas quais estão incluídos juros remuneratórios, o não pagamento dos juros incluídos nessas prestações não implica o vencimento imediato dos incluídos nas prestações vincendas. Efectivamente, vencida a obrigação de capital, deixa de haver lugar a remuneração pela indisponibilidade do capital. Ou seja: como rendimento financeiro do capital, a obrigação de juros remuneratórios gera-se em função do tempo que vai decorrendo e só se mantém até ao momento da restituição do capital mutuado, atenta a sua natureza retributiva.
Concluindo, com a antecipação resultante da perda do benefício do prazo, determinada pela falta de pagamento de uma das prestações, vencem-se as demais fracções da dívida parcelada, que é a dívida do capital mutuado, e não também o que, incluído nas prestações estipuladas, corresponda a juros remuneratórios (e, como é evidente, a imposto de selo calculado, à taxa legal, sobre esses juros pré-determinados e a prémio de seguro de vida), uma vez que estes, calculados em proporção ao tempo efectivamente decorrido, deixariam de corresponder – sem o decurso daquele tempo – à retribuição que, por definição, constituem.

Com este entendimento não contende o facto de, conforme alega a autora, ser-lhe permitida a capitalização de juros, atento o disposto no art. 560.º, 3, do Código Civil e no art. 5.º, 4, do Decreto-Lei n.º 344/78, de 17/11, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 83/86, de 06/05, pois que, não se vencendo juros remuneratórios, também não há lugar à respectiva capitalização, pelo que a questão nem sequer se coloca.
Pelo que fica dito, importa concluir improceder, nesta sede, o peticionado pela autora e, em consequência, considerar que a mesma apenas tem direito a receber, do mutuário, o montante do capital em dívida à data do incumprimento, a que, naturalmente, acrescerão os juros de mora vencidos, à taxa anual de 19,58%, desde o dia seguinte ao do vencimento da 43.ª prestação – e o imposto de selo respectivo, calculado sobre estes.

Com efeito, de harmonia com o disposto no art. 804.º, 1, do Código Civil, a simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor, sendo que aquele se considera constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido – cfr. nº 2 do mesmo preceito legal”.

            Tal entendimento já foi por nós defendido em várias ocasiões anteriores, como, p. ex., nos nossos acórdãos de 01/04/2009 e de 16/03/2010, proferidos, respectivamente, nas Apelações nº 26195/06.2TVLSB.C1 e 2886/07.9TJLSB.C1, dos quais iremos reproduzir algumas passagens, perfeitamente adequadas ao presente caso, tanto mais que o contrato de mútuo agora em discussão é de 16/09/2004 e na cláusula 8ª, al. b), das “Condições Gerais” anexas ao mesmo apenas consta que “a falta de pagamento de uma prestação na data do respectivo vencimento implica o imediato vencimento de todas as restantes”.

            Donde não fazer qualquer sentido a alusão que o Autor faz na acção e nas suas alegações de recurso a que “as partes, no âmbito da sua liberdade contratual podem convencionar, contudo, regime diferente do que resulta da mera aplicação do princípio definido no artº 781º do C. Civil”, na medida em que aquela referida cláusula é precisamente uma mera reprodução ou aplicação do disposto no referido preceito.

            Assim sendo, passamos, pois as reproduzir as considerações que já anteriormente tivemos ocasião de tecer, conforme supra referido: “O entendimento seguido…de forma predominante na jurisprudência do STJ e das Relações, como bem resulta, p. ex., do Ac. do STJ de 13/01/2005, é o de que: ”O imediato vencimento previsto no artº 781º C. Civ. significa, não o automático vencimento de todas as prestações posteriores à que não foi realizada, mas tão só a imediata exigibilidade destas, não ficando, portanto, o credor dispensado de interpelar o devedor se quiser que este responda pelos danos moratórios das prestações vincendas desde o vencimento da que não foi cumprida (...)”.

            “A interpelação (judicial ou extrajudicial) do devedor pelo credor releva, assim e apenas, para efeitos de contagem dos juros moratórios”.

            “Quanto à exigibilidade imediata de todas as prestações, ela verifica-se logo que uma delas não seja cumprida”.

            “Significa isto, ..., que o A. tem direito a exigir a totalidade das prestações..., mas que, tendo a interpelação da ré ocorrido apenas quando foi citada para a presente acção (artº 805º, nº 1, C. Civ.) os juros moratórios e o imposto de selo sobre os mesmos contar-se-ão: - quanto às prestações vencidas até à citação, sobre cada uma delas e a partir das respectivas datas de vencimento; - quanto às restantes, desde a data da citação da ré“.

            No mesmo sentido também pode-se ver o Ac. STJ de 19/04/2005, proferido no Prc.º nº 05A493, relatado pelo sr. Conselheiro Faria Antunes (in www:dgsi.pt), onde também se escreve: ”os juros remuneratórios são os frutos civis, constituídos por coisas fungíveis que representam o rendimento de uma obrigação de capital, a compensação que o obrigado deve pela utilização temporária de certo capital, sendo o seu montante, em regra, previamente determinado como uma fracção do capital correspondente ao tempo da sua utilização, variando o seu montante em função do valor do capital devido, do tempo durante o qual se mantém a privação deste por parte do credor, e da taxa de remuneração fixada por lei ou estipulada pelas partes”.

            “Os juros remuneratórios são retributivos, são rendimentos do capital em função do tempo em que o credor está privado da utilização do mesmo, constituindo a contraprestação onerosa pela cedência do capital ao longo do tempo, sem o decurso do qual não existe remuneração do capital mutuado”.

            “O artº 781º do C. Civ., segundo o qual se a obrigação puder ser liquidada em... prestações, (implica que) a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas (as demais), é aplicável desde que haja falta de pagamento de qualquer prestação, implicando o vencimento das restantes prestações”.

            “Porém, só quanto ao capital, que não também quanto aos juros incluídos nas demais prestações, visto que quanto a estas não nasceu a prestação de juros com o decurso do tempo, não sendo quanto a estes concebível a perda do benefício do prazo se não existe um prazo e uma inerente obrigação constituída”.

            “O disposto no artº 781º não conduz ao vencimento antecipado de prestações de juros”.

            Veja-se, ainda, o Ac. STJ de 5/06/2007, in C.J.STJ, ano XV, tomo II, pg. 103.

            Também no apontado sentido pode ver-se o Ac. desta Relação de 16/09/2008, proferido na Apelação nº 1747/06.3TJLSB.C1 e disponível em www.trc.pt, onde, mais uma vez, é também autor o mesmo da presente acção, acórdão este onde também se entendeu que “o artº 781º do C. Civ. deve ser interpretado no sentido de o plural do substantivo prestações se reportar única e exclusivamente ao capital mutuado e porque se trata de uma obrigação liquidada fraccionadamente, a lei consagra que a falta de realização de uma das prestações importa o vencimento de todas”.

            “... na falta de pagamento de uma prestação, importa, nos termos do disposto no artº 781º do C. Civ., o vencimento das restantes, o que deve ser interpretado no sentido da sua imediata exigibilidade e não que a data do vencimento passe a ser a da prestação faltosa, daí não se excluir a necessidade de interpelação do devedor dado tratar-se de uma faculdade do credor que a exercerá se assim o entender. Sendo exigível a totalidade da dívida de capital, nos termos do artº 781º do C. Civ., a verdade é que não são exigíveis ipso facto os juros remuneratórios que correspondam a períodos futuros”.

            E porque foi proferido e publicado o referido Acórdão do STJ Uniformizador de Jurisprudência (nº 7/2009), no qual foi consagrada a mesma jurisprudência, numa situação ou processo em que o autor é o mesmo da presente acção, não vemos razões para mudar o referido entendimento, muito pelo contrário.

            Aliás, nesta mesma Relação, muito recentemente, foram proferidos pelo menos dois outros acórdãos com o mesmo entendimento acerca desta mesma questão, nos quais também é Recorrente o mesmo do presente caso, Acórdãos esses com os nºs 682/07.2YXLSB.C1 e 157/09.5TBMIR.C1, ambos de 02/03/2010 e já disponíveis em www.trc.pt

            Donde termos de confirmar o decidido em 1ª instância sobre esta questão, que vai no sentido supra referido.

            Assim sendo, afigura-se ser manifesta a improcedência parcial da petição inicial, quando o Autor reclama do Réu o pagamento de juros remuneratórios relativos às prestações não vencidas, pelo que se entende que bem andou a 1ª instância quando proferiu a decisão que proferiu e se não limitou a conferir força executiva à dita p.i..

            É que também defende Salvador da Costa, in “A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, 5ª ed., pg. 95, segundo interpretamos, quando aí escreve: “a pretensão formulada pelo autor é manifestamente improcedente ou manifestamente inviável porque a lei a não comporta ou porque os factos apurados, face ao direito, a não justificam…As razões de manifesta improcedência derivam, naturalmente, do direito substantivo, que deve, na formulação do respectivo juízo, ser confrontado pelo juiz com a causa de pedir e o pedido envolvidos na acção”.

             E também nos afigura ser o entendimento de Abrantes Geraldes expresso em “Temas da reforma do processo civil”, III vol., 2ª ed., pg. 162, quando aí escreve: “a decisão de rejeição liminar do requerimento inicial deve ser reservada apenas para os casos em que a tese propugnada pelo autor não tenha possibilidades de ser acolhida face à lei em vigor e à interpretação que dela façam a doutrina e a jurisprudência”.

Também esta Relação já anteriormente se pronunciou sobre esta questão, em diversos acórdãos, como é o caso do Recurso de Apelação nº 157/09.5TBMIR.C1 (Secção Cível), cujo acórdão é de 02/03/2010, relatado pelo sr. Desembargador Falcão de Magalhães, onde se defende que “a manifesta improcedência a que alude o artº 2º do Regime Anexo ao Dec. Lei nº 269/98, de 1/09, pode reportar-se a uma parte do pedido, designadamente à matéria dos juros remuneratórios exigidos, devendo, em tal caso, restringir-se, em conformidade com o julgado, a força executiva a conferir à petição. O pedido cujo único suporte legal se estriba em entendimento jurídico ostensivamente contrário àquele que foi acolhido em Acórdão Uniformizador, só pode aspirar à viabilidade se fundado em argumentação que, de forma inovatória, face à fundamentação estruturante desse Acórdão, possibilite, ao julgador que o perfilhe, um juízo de prognose positivo quanto à futura modificação jurisprudencial no sentido desse entendimento. Assim, em princípio, é de considerar manifestamente improcedente, para efeitos de não ser abarcado pela força executiva a conferir à petição, nos termos do mencionado artº 2º, o pedido – ou parte dele – que se encontre alicerçado em entendimento jurídico contrário àquele que foi acolhido em Acórdão Uniformizador de Jurisprudência”. 

No mesmo sentido podem ver-se os Acs. desta Relação proferidos nas Apelações nºs 4993/09.4T2AGD.C1, de 09/02/2010; 1817/09.6TBACB.C1, de 02/03/2010; 682/07.2YXLSB.C1, de 02/03/2010; 174/09, de 09/02/2010; 194/09, de 11/05/2010, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

            Donde a conclusão de que bem andou a 1ª instância ao ter proferido a decisão que proferiu, seguindo e aplicando o entendimento consagrado pelo STJ em Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, e ao não ter usado apenas e tão só da “cominação” prevista no artº 2º do anexo ao do Dec.Lei nº 269/98, de 01/09.

            Pelo que improcede o presente recurso, impondo-se a confirmação da sentença recorrida, o que se decide.


VI

            Decisão:

            Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente o presente recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.