Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2404/22.9T9CLD-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULO GUERRA
Descritores: OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA
CONTACTO FÍSICO NO CONTEXTO DE DISCUSSÃO
NÃO PRONÚNCIA
Data do Acordão: 03/20/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA (JUÍZO DE INSTRUÇÃO CRIMINAL DE LEIRIA – J2)
Texto Integral: N
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: UNANIMIDADE
Legislação Nacional: ARTS. 143º, N.º 1, DO CÓDIGO PENAL.
Sumário:
I- O acto de dar um ou mais toques no ombro do assistente, com quem se está a ter uma acalorada discussão, não exprime, de forma inequívoca, do ponto de vista ético-social, uma agressão no corpo, um “ataque”, um gesto molestador, independentemente do efeito, não se vislumbrando que, à luz da cláusula de adequação social, tal conduta possa ser considerada como típica por relevância, no que tange ao crime do artigo 143º do CP.

II- Face ao princípio da subsidiariedade, vertido no artigo 18º, nº 2, da CRP, sendo o enquadramento penal a última ratio, a ofensa ao corpo ou à saúde prevista na norma do artigo 143º, nº 1, do CP, deve assumir um grau mínimo de gravidade, descortinável segundo uma interpretação do tipo legal à luz do critério de adequação social.
III- A concreta configuração do contacto físico, que apesar de provocado voluntariamente pelo arguido, foi de pequena intensidade e sem consequências assinaladas, impõe que se considere não ser a conduta do mesmo suficiente para preencher materialmente o tipo legal de ofensa à integridade física, dada a insignificância do respectivo grau de ilicitude – ou seja, ao preenchimento aparente do tipo não corresponde, in casu, a concretização do juízo de ilicitude material subjacente à sua formulação.

Decisão Texto Integral:
*
Acordam, em conferência, na 5ª Secção - Criminal - do Tribunal da Relação de Coimbra:

            I - RELATÓRIO
           
             1. O DESPACHO RECORRIDO

Na Instrução requerida pelo arguido AA no Pº 2404/22.9T9CLD no Juízo de Instrução Criminal de Leiria (JUIZ ...) – comarca de Leiria -, por despacho de 30 de Outubro de 2023, foi decidido:  
«a) não pronuncio o arguido AA pela prática dos crimes de sequestro e de ofensa à integridade física simples que lhe foi imputadapelo MinistérioPúblico;
b) não pronuncio o arguido AA pela prática do crime de injúria agravado que lhe foi imputada pelo assistente BB;
c) pronuncio para julgamento em processo comum, com intervenção de Tribunal Singular, o arguido AA, filho de CC e de DD, nascido a ../../1973, natural de ..., residente na Avenida ...., ... ..., pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181º, nº 1, doC. Penal;
d) Fixo oobjectoprocessualdojulgamentonosseguintes termos:
1. No dia 02/05/2022, cerca das11he 30m,quandose encontrava no interior da sede da sociedade denominada C..., Lda., sita na Rua ...., na cidade das ..., o arguido AA iniciou uma discussão com o assistente BB pelo facto de este ter procedido a transferência de valor de conta da empresa, de que amboseramsócios-gerentes.
2. No decurso da referida discussão o arguido dirigiu-se ao assistente, acusando-o de se ter apropriado,indevidamente, de dinheiroda empresa e de a ter roubado, impondo-lhe que o restituísse.
3. E apelidou-o de “palhacito de merda”, “palhaço de merda”, de “cabrão” e de “cabrão do caralho”.
4. Disse-lhe ainda:“não vales nada,caralho”.
5. Ao ser confrontando com essas afirmações, o assistente sentiu-se ofendido na sua honra, consideração e dignidade,pessoal e profissionalmente.
6. No descrito quadro factual, o arguido actuou, sempre de modo livre, voluntário e consciente, bem sabendo que o seucomportamento era proibidoe punido penalmente.
7. E com o propósito, que consumou, de ofender a honra e a consideração do  assistente
PROVA:
POR DECLARAÇÕES: declarações do assistente BB (id. a fls. 76), aprestar em sede deaudiência de julgamento.
DOCUMENTAL:
A) CertidãoPermanentedefls. 16/17;
B) Ficheiro de vídeo constante do suporte digital de fls. 48 (imagens de videovigilância)».


            2. O RECURSO
Inconformado, o assistente BB recorreu deste despacho de não pronúncia, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição):

«1ª Ao decidir como decidiu, não pronunciando o arguido pela prática, como autor material, do crime de ofensa à integridade física simples, nem pronunciando o arguido, quanto ao crime de injúria, com a circunstância agravativa imputada na acusação particular apresentada pelo assistente em 03-04-2023 e acompanhada pelo M.P., o Mmo. JIC incorreu em violação conjunta dos seguintes artigos:
a) Da CRP: artigo 25º, nº 1;
b) Do Cód. Civil: artigo 70º, nº 1;
c) Do CP: artigo 143º, nº 1 e regime da alínea b) do nº 1 do artigo 183º, na sua conjugação com o artigo 181º, nº 1;
d) Do CPP: artigos 283º, nº 2 e 308º, nº 1-1ª parte.
Essa violação decorreu da circunstância de ter interpretado e aplicado tais normativos no sentido de que, à sua luz, os actos comprovadamente perpetrados pelo arguido:
2.1ª Por um lado, não se revestiriam de dignidade penal justificativa da sua pronúncia, quanto ao crime de ofensa à integridade física simples;
2.2ª E, por outro lado, não se encontrariam dotados da exigida suficiente indiciação, quanto à circunstância agravante prevista na citada alínea b) do nº 1 do artigo 183º do CP, por referência ao facto do arguido saber e estar consciente da falsidade da afirmação que dirigiu ao assistente, “acusando-o” de se ter apropriado, indevidamente, de dinheiro da empresa e de a ter roubado, impondo-lhe que o restituísse, conforme alegado, em concreto, nos arts. 29º a 32º da acusação particular.
Deveria tê-los interpretado e aplicado em sentido contrário. Justamente no sentido de que:
3.1ª Quanto ao crime de ofensa à integridade física simples:
3.1.1ª Todo o acervo probatório carreado (com particular destaque para as imagens de videovigilância) evidencia uma intensa e agressiva natureza comportamental/postural do arguido, dirigida, sempre e especialmente, ao assistente, atingindo-o, inquestionavelmente, na sua integridade física, conformemente ao que se encontra descrito na acusação do M.P. e nos arts. 4º a 24 º da acusação do assistente de 01-09-2023;
3.1.2ª A conduta do arguido não se cinge a insignificantes e/ou aceitáveis e/ou justificáveis “toques amistosos” ou a “carinhosas festinhas” no rosto.
3.1.3ª Estamos perante uma verdadeira afronta contra a e intrusão na integridade física do assistente, e não somente na sua dimensão corporal, mas, simultaneamente, na sua dimensão psicológico-emocional, como se encontra demonstrado através: do Grupo de Docs. nº 2 que acompanharam a queixa-crime; e dos Docs. B, C, D, E, F, G, H e I juntos com a acusação e PIC apresentados pelo assistente em 01-09-2023;
3.1.4ª O bem jurídico protegido pelo crime de ofensa à integridade física abrange o “corpo” e/ou a “saúde” da vítima, em que se inclui, naturalmente, quer a “saúde física”, quer a saúde “psicológico-emocional”.
3.1.5ª Estão reunidos os requisitos de suficiência exigidos pelo citados nº 2 do artigo 283º do CPP e pelo 308º, nº 1-1ª parte, para a manutenção da acusação do M.P. de 25-06-2023 e da acusação do assistente apresentada em 01-09-2023, e inerente prolação de despacho de pronúncia pela prática do epigrafado crime, nos exactos termos, de facto e de direito, constantes dessas acusações.
3.2ª Quanto à circunstância agravativa do crime de injúria:
3.2.1ª Não existe no processo qualquer transparente e concludente dado probatório, nem, consequentemente, qualquer facto demonstrado, que permita exonerar o arguido da falsidade da afirmação que produziu e de que, ao fazê-lo, bem sabia dessa falsidade;
3.2.2ª A exclusão do conhecimento, consciência e intencionalidade da propalação da afirmação falsa teria, necessariamente, de assentar na demonstração de que o conteúdo dessa afirmação é verdadeiro, ou, pelo menos, que houvesse uma probabilidade séria, razoável e plausível para a poder reputar como verdadeira, ou próxima da verdade – o que não sucede, in casu.
Na procedência dos fundamentos do presente recurso, apela-se, nesta sede de recurso, à anulação e revogação da decisão instrutória, com a prolação de acórdão, por este Tribunal ad quem, que declare dever ser o arguido pronunciado, como autor material e em concurso efectivo heterogéneo:
4.1ª Pela prática do crime de ofensa à integridade física simples, p.p. no artigo 143º, nº 1 do CP, com os fundamentos de facto e de direito constantes da acusação do M.P. e da acusação deduzida pelo assistente em 01-09-2023, a terem-se por reproduzidos, nos termos do artigo 307º, nº 1-2ª parte do CPP;
4.2ª Pela prática do crime de injúria, p.p. no artigo 181º, nº 1 do CP, e nos termos agravativos, previstos na alínea b) do nº 1 do artigo 183º do CP, que, concretamente, constam expostos no delineamento factual constante dos arts. 29º a 32º da acusação particular deduzida pelo assistente em 03-04-2023, acompanhada pelo M.P., acusações estas que, do mesmo modo, deverão ter-se por reproduzidas, por aplicação do artigo 307º, nº 1-2ª parte do CPP».

            3. O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, opinando que o recurso não merece provimento, defendendo o despacho em 1ª instância.

4. Também respondeu ao recurso o arguido AA, o qual pediu igualmente a sua improcedência.

5. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se neles, corroborando as contra-alegações do Magistrado do Ministério Público de 1ª instância, sendo seu parecer no sentido da negação de provimento ao recurso.

6. Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, doravante CPP, foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419º, nº 3, alínea b) do mesmo diploma.

            II – FUNDAMENTAÇÃO
           
1. Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso

Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso [cfr. artigos 119º, nº 1, 123º, nº 2, 410º, nº 2, alíneas a), b) e c) do CPP, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242, de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271 e de 28.4.1999, in CJ/STJ, Ano VII, Tomo II, pág.193, explicitando-se aqui, de forma exemplificativa, os contributos doutrinários de Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, Universidade Católica Editora, 2015, pág. 335 e Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos Penais, 8.ª ed., 2011, pág. 113].
Assim, é seguro que este tribunal está balizado pelos termos das conclusões formuladas em sede de recurso.
Também o é que são só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respectiva motivação que o tribunal de recurso tem de apreciar - se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringir o objecto do recurso), o Tribunal Superior só conhecerá das que constam das conclusões.
Mas também é grave quando o recorrente apresenta fundamentação nas conclusões que não tratou de modo nenhum na motivação.
Estas conclusões (deduzidas por artigos, nas palavras da lei) não devem trazer nada de novo; os fundamentos têm de estar no corpo motivador e são aqueles e só aqueles que são resumidos nas conclusões.
Assim sendo, são estas as questões a decidir por este Tribunal:
· Há suficiência de indícios da verificação dos pressupostos de que depende a aplicação de uma pena ao arguido pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º do Código Penal, doravante CP, e de um crime de injúria agravado, p. e p. pelos artigos 181º, nº 1 e 183º, nº 1, alínea b) do mesmo CP?
· Se sim, deveria ter sido proferido o competente DESPACHO DE PRONÚNCIA por estas incriminações?

            2. DO DESPACHO RECORRIDO

            2.1. O tribunal a quo proferiu o Despacho de Não Pronúncia, deixando escrito o seguinte: (transcrição, com SISTEMATIZAÇÃO nossa para melhor compreensão):

«I.
Iniciaram-se os presentes autos de instrução a requerimento do arguido AA, a fls. 303 a 310, inconformado com as acusações, pública e particular, contrasi deduzidas:
a) pelo Ministério Público, a fls. 133 a 135, imputando-lhe a prática, como autor material, na forma consumada e em concurso efectivo, de um crime de sequestro, p. e p. pelo artigo 158º, nº 1 e de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo artigo 143º, nº 1,ambosdoC. Penal;
b) pelo assistente BB, a fls. 117 a 126, imputando-lhe a prática, como autor material, de um crime de injúria agravado, p. e p. pelos artigos 181º, nº 1 e183º, nº 1, al. b), ambosdoC. Penal.
Para tantoalegou, em síntese, que não agrediu, insultou ou restringiu a liberdadedo assistente.
Aberta a instrução, interrogou-se o arguido, inquiriram-se duas testemunhas e realizou-se o debateinstrutório.
*
II.
O Tribunalé ocompetente.
Não existem nulidades ou questões prévias ou incidentais de que neste momento cumpraconhecer.
*
 III.
Constituindo a fase da instrução uma fase facultativa do processo penal que visa a comprovaçãojudicialdededuzir acusação ou dearquivar o inquérito, em ordem asubmeter ou não a causa a julgamento (artigo 286º, nºs. 1 e 2, do C. P. Penal, diploma para o qual se deverão considerar remetidasas normaslegais sem outraindicação deproveniência), há que ter presente que o Juiz de Instrução Criminal está aqui limitado, à partida, pela factualidade relativamenteà qualse pediu a instrução(artigo 287º, nºs. 1 e2 e288º, nº 4), sendoorientado noseu procedimentoedecisãopelas razões defacto ede direito invocadas.
Por outro lado, dispõe o artigo 283º, nº 2, aplicável à fase da instrução ex vi do artigo 308º, nº 2, que se consideram suficientes os indícios sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, uma pena ou uma medidade segurança.
Em decorrência de tal disposição, preceitua o nº 1 do último artigo citado que, se, até ao encerramento da instrução, tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, o juiz, por despacho, pronuncia o arguido pelos factos respectivos; caso contrário, proferedespachodenãopronúncia.
Fundando-se o conceito de indícios suficientes na possibilidade razoável de condenação e de aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança, deve considerar-se existirem indícios suficientes para efeitos de prolação do despacho de pronúncia(talqual comoparaa acusação), quando:
·   os elementos de prova, relacionados e conjugados entre si, fizerem pressentir a culpabilidade doagente e produzirem aconvicçãopessoal de condenaçãoposterior; e
·   se conclua, com probabilidade razoável, que esses elementos se manterão em julgamento; ou
·   se pressinta que da ampla discussão da causa em plena audiência de julgamento, para além dos elementosdisponíveis, outrosadvirão nosentido da condenaçãofutura.
*
 IV.
 Feito este intróito, analisemosentão as questõescolocadas nestainstrução.
 A acusação públicatem oseguinteteor:
«(…) 1. No dia 02/05/2022, cerca das11he 30m,quandose encontrava no interior da sede da sociedade denominada C..., Lda., sita na Rua ...., na cidade ..., o arguidoiniciouuma discussão com o assistente BB, relativa a discordância quanto a aspectosorganizacionaise de objectivosrelacionados com a relação contratualestabelecida entre ambosno âmbitoda sociedadeacima identificada.
2. No decurso da referida discussão o arguido desferiu no assistente váriaspalmadas, com a sua mão direita, no ombroesquerdodo assistente e um estalo no lado esquerdodo rosto doassistente.
3. Em virtude dos factos acima descritos o assistente tomou a decisão de sair do local mencionado em 1., tendo nessa ocasião, verbalizado tal decisão ao arguido, a qual o arguido compreendeu.
4. Quandoo assistente se aproximouda zona da porta para poder sair para o exterior do espaço referidoem 1. o arguidodirigiu-se àquele e disse-lheque nãoo deixava passar, barrando-lhe a passagemcom o seucorpo.
5. Enquantodecorriamosfactosreferidosem 4. o assistente repetiu por diversas vezes que pretendia sair dali e o arguido em resposta disse-lhe várias vezes que sairia dali quando o arguido deixasse, tendo mais uma vez usado o seucorpo para impedir o assistente de se ausentar do local, bem sabendo que, atenta a forma como os factos estavam a ser praticados e a configuração do local, o assistente não se conseguia opor à conduta do arguido.
6. Enquanto decorriam os factos relatados em 4. e 5, a dada altura o arguido projectou o seu corpo contra o corpo do assistente e desferiu-lhe um soco, no lado direito do peito, e encostou o seu braçodireitoaotronco doassistente empurrando-oe pressionando-ocontra a parede impedindo-o mais uma vez de prosseguir para o exterior doespaço referidoem 1.
7. Em consequência dosfactosacima descritoso assistente sofreudores.
8. Ao actuar da forma acima descrita o arguido quise conseguiu molestar fisicamente o assistente.
9. Ao actuar da forma acima descrita o arguido quise conseguiu provocar dores físicas e medo no assistente, tendo agindo ainda como propósito concretizadode o privar da sua liberdade de locomoção, obrigando-o a permanecerno interior do localreferidoem 1. e sujeitar-se à conduta do arguido acima descrita enquanto este atentava contra a integridade física do assistente, bem sabendo que ao actuar da forma acima descrita obrigava o assistente, contra a sua vontade a permanecer naquele local, impedindo-o desair dalie evitar ser molestadofísica e psicologicamente pelo arguido.
10. O arguidoagiusemprede forma livre deliberada e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida porLei (…)».
Segundoaacusação particular, nodecursodos factos descritos naacusação pública: o arguido dirigiu-se ao assistente acusando-o: «(…) a) (…) de se ter apropriado, indevidamente, de dinheiroda empresa e de a ter roubado, impondo-lhe que o restituísse;
b) Apelidando-ode “palhacitode merda” e de “palhaçode merda”; de “cabrão”, e de “cabrão do caralho”, igualmente propalando que estava “fodido”;
c) Dizendo-lheque “não valesnada, caralho”.
30º O assistente é pessoa séria e honesta, pautando a sua vida por arreigadosvalores, sendo asacusaçõesque o arguidolhedirigiu completamente falsas, estandoeste perfeitamente consciente e conhecedor de talfalsidade.
31º Ao ser confrontandocom essasafirmações, o assistente sentiu-se muito ofendido na sua honra, consideraçãoe dignidade, pessoale profissionalmente.
32º No descrito quadrofactual, o arguidoactuou, sempre:
a) De modo livre, voluntário e consciente, bem sabendo que o seu comportamento era proibidoe punido penalmente;
b) Com o propósito, que consumou,de ofender a honra e a consideraçãodo assistente, estando perfeitamente consciente e conhecedorde quea imputação dofacto supra exposto no art. 29º-a) era eivada de falsidade(…)».
*
Quando os factos ocorreram, no local dos mesmos encontravam-se quatro pessoas: assistente, arguido e as testemunhas EE e FF. Esta última não presenciou osucedido, mantendo-senumaoutrazona, afastada, do estabelecimentoonde os eventos se passaram. Disse ter ouvido vozes alteradas, mas nada reteve de injurioso, pelo que, quanto aos factos essenciais objecto do processo, não pode esclarecer a divergência de versões existente. EE assistiu a parte dos eventos, ao passo que, naturalmente, assistente e arguido assistiram à totalidade dos mesmos.
A prova essencial do processo, porque objectiva, é a que consiste nas imagens de videovigilância do local e que os sujeitos processuais aceitam como representativa da ocorrido. De resto, em sede de instrução, o depoimento de EE e as declarações do arguido assentaram no que resulta de tais imagens, nesse contexto visualizadas. O vídeo junto aos autos não tem som, pelo que não pode esclarecer a questão das injúrias, mas é decisivo quantoao objectodaacusaçãopública.
Peranteo queresultas das imagens, nãopode dizer-se categoricamente quearguido, assistente ou a testemunhaRuiColumbanotenhammentidoou falseadoconscientemente a verdade. É, todavia, notório que a descrição que fazem dos eventos é claramente tendenciosa. O assistente hiperboliza meros toques no seu corpo como sendo agressões, assim como impedimentos de segundos à sua passagem como privações de liberdade de se locomover ou constrangimento violento a essa movimentação. O arguido e o seu irmão, a testemunha EE, negam evidente atitude agressiva do primeiro, intervenção enérgica do segundo para impedir concretização dessa agressividade, assim como negam evidente obstáculo à marcha do assistente quando este tenta sair da sala onde se encontrava em direcçãoà saída doestabelecimento.
Do ficheiro de vídeo junto aos autos (cuja compartimentação em imagens estáticas adultera o sentido dos eventos) resulta que o arguido se dirigiu à sala onde o assistente se encontravacercadas 11:35 horasde02/05/2022(oregistodahorano vídeo refere10:35 horas por falta de actualização da “hora de verão”). No espaço de uns segundos (às 11:35 horas), o arguido toca com a sua mão, algumas vezes, no ombro do assistente e, uma vez, na cara do mesmo. Das imagens decorre estarem em causa toques leves, sem fazerem o assistente mover-se, recuar ou encolher-se. Três minutos mais tarde, às 11:38 horas, enquanto AA impede oarguidodese aproximar doassistente, este dirige-se para o exterior da sala onde se encontrava, vendo-se impedido de prosseguir por estarem os dois primeiros a ocupar o corredor logo a seguir à saída daquela sala. O assistente encontra espaço para passar, altura em que o arguido, ainda contido fisicamente pelo irmão, encosta o punho fechado ao peito do assistente. Não se vislumbra qualquer movimento de agressão ou de aplicação de força relevante, não demonstrando o assistente qualquer esgar de dor, movimento de recuo ou de reação a golpe. Dois segundos depois, o assistente encontra espaço para passar, uma vez que EE logrou afastar o arguido do caminho daquele. Maisà frente, noespaço deum merosegundo, oarguido volta a colocar-se à frente do caminhodoassistente, voltando a ser afastado por EE.
Como reconhecido em sede de debate instrutório, não se mostra indiciada a prática de crime de sequestro. O próprio assistente qualificou a conduta do arguido, aquando da queixa, como integradora de crime de coacção e não se sequestro. Porém, optou por acompanhar a acusação pública também no que toca à qualificação jurídica dos factos (cfr. fls. 161 a 170), pelo que se estranha que pretenda agora “repristinar” qualificação jurídica quemanifestamente “deixou cair”.
Em qualquer caso, o que resulta fortemente indiciado, nomeadamente do vídeo junto aos autos, é que o arguido pretendeu manter a discussão, ao passo que o assistente pretendia sair da sala em que se encontrava. O arguido, nesse afã de continuar a discussão, aborda sistematicamente o assistente de forma agressiva e acaba por impedir este de passar no corredor. Esse impedimento dura meros segundos, não podendo concluir-se existir privação de liberdade de locomoção ou constrangimento a permanecer imobiliza que mereça acolhimento no quadro da previsão legal dos crimes de sequestro ou de coacção. Nem se indicia sequer que o arguido visasse tais objectivos. O que se indicia é que o arguido pretendia continuar a discutir (a propósito de uma transferência ordenada pelo assistente de conta da sociedade de que ambos eram gerentes para conta pessoal), “arremetendo” em direcção ao assistente, sem intenção específica de afectar a liberdade de locomoção do deste. Os meros segundos em que o assistente viu impedida ou dificultada a sua passagem no corredor nãotêm relevância criminal.
Quanto à imputada ofensa à integridade física, há que aceitar que qualquer toque indesejado no corpo de alguém pode configurar, em abstracto, uma ofensa à integridade física do visado. Porém, meros toques, insusceptíveis de provocar dor ou lesões, não devem ser elevados à dignidade da tipificação penal, sob pena de alargamento insustentável da tutela penal.
Daí que, em casoscomo opresente, em queexistem merostoques no corpo de terceiro, critérios de adequação social legitimam que se considere não terem os mesmos relevância típica no quadro do tipo legal do crime de ofensa à integridade física simples.
Assim:
«(…) Para preencher o tipo objectivo do crimede ofensa à integridade física é admissível qualquer meiode ofender o corpo oua saúdedesde que se verifique,comoresultado,a lesão docorpo ou da saúde de alguém comalguma expressão ou significado,isto é, é necessário que o dano produzido pela acção doagenteseja juridicamenteapreciável. (…) Não adquiremdignidade penal, sob o ponto de vista do bem jurídico tutelado, as situações em que ocorre ausência de consequências da agressão ou em que estas sejam insignificantes (…)» – Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 24/05/2023;
«(…) As lesões insignificantes estão excluídas do tipo de crime do artigo 143º do Código Penal (…)» – Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 09/10/2012;
«(…) Étipicamente irrelevante o facto de o menor ser agarrado no braçopela arguida, pois tal nãoimplica necessariamente que o mesmo seja prejudicado no seubem-estarfísico e, menos ainda, que a haver afetaçãodo seubem-estara mesma tivesse ocorrido deforma não insignificante (…)» – Acórdão doTribunalda Relação de Évora de 21/05/2013;
«(…) Em face do princípio da subsidiariedade vertido no artigo18º, 2, da Constituição da República Portuguesa, sendo o enquadramentopenala ultima ratio, a ofensa ao corpo ou à saúde prevista na norma do artigo 143º, 1, do Código Penal, deve assumir um grau mínimo de gravidade, descortinávelsegundo uma interpretação dotipo legalà luz docritériode adequação social (…)» – Acórdãodo Tribunalda Relação deLisboa de06/06/2023;
«(…) Aslesões insignificantesestarãoexcluídasdo crime de ofensa à integridade física. O direito à integridade física é o direito à intangibilidade docorpo humano,que é intocável, nãopodendo ser atingido,afectado,intervencionado ouinvadidoporqualquer forma sem o consentimento do seu titular, independentemente de serem ou não causadas lesões ou dor. O direito à integridade física abrange, assim, o direito a não ser tocado no seu corpo. (…) Nem todos os actos invasivos da integridade física de outrem enquadrarão o tipo legal de crime ora em análise, exigindo-se ao funcionamento da tutela jurídico-penal a significância do acto no que concerne ao seu resultado ofensivo. (…) Essa significância terá de ser aferidaem funçãodo desvalorsocial e ético que o acto em concreto encerra, avaliado objectivamente, de harmonia com os padrões sociais comummente aceites, pois que, sendo a tutela penal restringida à protecção dos bens jurídicos fundamentais, qualquer conduta que atinja a integridadecorporalde outremsó será enquadrável no tipo legal de crime de ofensa à integridadefísica quando seja ético-socialmente rejeitada, censurada e reprovada. (…)» – Acórdão doTribunalda Relação de Lisboade 06/07/2023;
«(…) Face ao princípio da subsidiariedade, vertido no art.18, nº2, da C.R.P., sendo o enquadramento penala última ratio, a ofensa aocorpo ouà saúde prevista na norma doart.143, nº1, do Código Penal, deve assumir um grau mínimo de gravidade, descortinável segundo uma  interpretação dotipo legalà luz docritério da adequação social. (…)» – Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboade 12/04/20116;
«(…) Conforme entendimento da doutrina e da jurisprudência das Relações, as lesões insignificantes estarão excluídas do referido tipo legal, tendo em conta que os tipos penais não são neutros mas antes exprimem já, e de uma forma global, um sentido social de desvalor. (…)» – Acórdão doTribunalda Relação do Portode 28/04/20217.
Os toques do arguido no ombro e na cara do assistente ou o encostar do punho ao peito deste não são socialmente considerados como agressões e não têm a significância exigida pela tutela penal da conduta. Indicia-se que o assistente se mostrava exaltado e agressivo, mas não que os contactos que teve com o corpo do assistente configurassem agressões, sendo até excessivo tratar como “chapadas” os toques retratados ou soco o mero encostar do punho.
Assim, no que toca aos crimes de natureza pública, entendo impor-se a prolação de despachode nãopronúncia.
Quanto aos crimes de injúria, a questão é diversa.
Na verdade, nesta parte, as imagens de videovigilância nada podem esclarecer, não sendo decisivo que as testemunhas EE e FF refiram não terem ouvido palavras insultuosas dirigidas pelo arguido ao assistente, uma vez que tal poderia ter ocorrido sem que as testemunhas o tivessem ouvido. O assistente sustenta a sua versão dos eventos, o arguido nega-a. A mera negação do arguido não pode servir para abalar a suficiência indiciária da acusação particular, acompanhada pelo Ministério Público, sob pena de se inviabilizar a submissão a julgamento de todas as situações não suportadas em outro meio de prova para além do testemunhodoqueixosoquandooarguidose limitea negar a práticados factos. Tanto mais quanto a função da instrução é, para o que aqui interessa, a comprovação judicial da acusação particular em ordem a submeter ou não a causa a julgamento e tal implica que se atente aos indícios que suportaram tal acusação. Neste caso e nesta parte, a acusação particular fundou-sena versão do assistente, queoarguido optou por nem sequer contrariar no inquérito, remetendo-se ao silêncio – cfr. fls. 98. Suportada a acusação particular em indícios suficientes, merecendo o acompanhamento do Ministério Público, não pode soçobrar perante mera negação do arguido em fase de instrução, sem qualquer fundamento para considerar preponderante tal negação  sobre a  versão trazida aos autos pelo assistente.
No entanto, considero não se indiciar suficientemente a factualidade integradora da agravação da injúria, isto é, de que o arguido imputou ao assistente ter-se apropriado indevidamente da dinheiro da empresa, sabendo que tal era falso. Indicia-se que o assistente efectuou tal transferência, inexistindo indiciação que permita avaliar se tal comportamento era legítimo ou não, pelo que não pode considerar-se suficientemente indiciada a circunstância agravativa da calúnia.
Assim, face ao exposto, importa proferir despacho de não pronúncia do arguido quanto aos crimes de sequestro e de ofensa à integridade física simples e de pronúncia quantoao crimedeinjúria, com aindicada alteração – artigo 308º, nº 1, doC. P. Penal.
Previamente, delimitar-se-á a factualidade constante da acusação que se considera não suficientementeindiciada.
*
Assim:
FACTOSNÃO SUFICIENTEMENTEINDICIADOS

1) A discussão ocorrida no dia 02/05/2022, entreassistenteearguido, nointerior da sede da sociedade C..., Lda., sita na Rua ...., na cidade das ..., foi relativa a discordância quanto a aspectos organizacionais e de objectivos relacionados com a relação contratual estabelecida entre ambos no âmbito da sociedade acimaidentificada.
2) Quando o assistente se aproximou da zona da porta para poder sair para o exterior do espaçoreferido em 1. oarguido dirigiu-se àquelee disse-lhe que não o deixava passar, barrando-lhea passagem com oseu corpo.
3) O assistente repetiu por diversas vezes que pretendia sair dali e o arguido em resposta disse-lhe várias vezes que só sairia dali quando o arguido deixasse, tendo mais uma vez usado o seu corpo para impedir o assistente de se ausentar do local, bem sabendo que, atenta a forma como os factos estavam a ser praticados e a configuração do local, o assistente não se conseguia opor à condutadoarguido.
4) A dada altura o arguido projectou o seu corpo contra o corpo do assistente e desferiu-lhe um soco, no lado direito do peito, e encostou o seu braço direito ao tronco do assistente empurrando-o e pressionando-o contra a parede impedindo-omaisumavez de prosseguir para o exterior do espaçoreferido em 1.
5) Em consequênciadosfactosacimadescritoso assistente sofreu dores.
6) Ao actuar da forma acima descrita o arguido quis e conseguiu molestar fisicamenteoassistente.
7) Ao actuar da forma acima descrita o arguido quis e conseguiu provocar dores físicas e medo no assistente, tendo agindo ainda com o propósito concretizado de o privar da sua liberdade de locomoção, obrigando-o a permanecer no interior do local referidoem 1. esujeitar-se à condutadoarguido acimadescrita enquanto este atentava contra a integridade física do assistente, bem sabendo que ao actuar da forma acima descrita obrigava o assistente, contra a sua vontade a permanecer naquele local, impedindo-o de sair dali e evitar ser molestadofísica e psicologicamentepeloarguido.
*


VI.
Assim, face a todoo exposto:

a) não pronuncio o arguido AA pela prática dos crimes de sequestro e de ofensa à integridade física simples que lhe foi imputadapelo MinistérioPúblico;
b) não pronuncio o arguido AA pela prática do crime de injúria agravado que lhe foi imputada pelo assistente BB;
c) pronuncio para julgamento em processo comum, com intervenção de Tribunal Singular, o arguido AA, filho de CC e de DD, nascido a ../../1973, natural de ..., residente na Avenida ...., ... ..., pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181º, nº 1, doC. Penal;
d) Fixo oobjectoprocessualdojulgamentonosseguintes termos:

1. No dia 02/05/2022, cerca das11he 30m,quandose encontrava no interior da sede da sociedade denominada C..., Lda., sita na Rua ...., na ... GG,o arguido AA iniciou uma discussão com o assistente BB pelofacto de este ter procedido a transferência de valor de conta da empresa, de que amboseramsócios-gerentes.
2. No decurso da referida discussão o arguido dirigiu-se aoassistente acusando-o de se ter apropriado,indevidamente, de dinheiroda empresa e de a ter roubado, impondo-lhe que o restituísse.
3. Eapelidou-ode “palhacitode merda”, “palhaço demerda”, de“cabrão” e de “cabrão do caralho”.
4. Disse-lhe ainda:“nãovalesnada,caralho”.
5. Ao ser confrontando comessasafirmações, o assistente sentiu-se ofendido na sua honra, consideração e dignidade,pessoal e profissionalmente.
6. No descrito quadro factual, o arguido actuou, sempre de modo livre, voluntário e consciente, bem sabendo que o seucomportamento era proibidoe punido penalmente.
7. Ecom o propósito, que consumou, deofender a honra e a consideraçãodo assistente.
        *
PROVA:
POR DECLARAÇÕES: declarações do assistente BB (id. a fls. 76), aprestar em sede deaudiência de julgamento.
DOCUMENTAL:
A) CertidãoPermanentedefls. 16/17;
B) Ficheiro de vídeo constante do suporte digital de fls. 48 (imagens de videovigilância).
*
O arguido aguardará os ulteriores termos processuais sujeito a termo de identidade e residência(prestado a fls. 97).
*
Sem custas.
*
Notifique, proceda ao registo da decisão instrutória no livro próprio e, oportunamente, remeta os autos à distribuição para julgamento (Juízo Local Criminal ...)».


3. APRECIAÇÃO DO RECURSO

            (…)
         
            3.1.2. O Mº JIC ..., in casu, não estando em sede de julgamento mas de Instrução, entendeu não pronunciar o arguido que tinha sido acusado pelo MP de:
· um crime de sequestro p. e p. pelo artigo 158º do CP,
· um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º do CP, estes em concurso efectivo.
            Também o assistente deduziu acusação particular contra o arguido, «sem prejuízo dos demais ilícitos criminais que deverão ser objecto de acusação a deduzir pelo MP», pela prática de um crime de injúria agravado, p. e p. pelos artigos 181º e 183º, nº 1, alínea b) do CP, acusação essa que foi acompanhada pelo MP apenas na parte do crime de injúria (mas sem aludir à agravação do artigo 183º - cfr. fls 63).
            De facto, após a instrução, foi proferido o despacho recorrido, o qual:
            - pronunciou o arguido pela prática de um crime de injúria (simples), p. e p. pelo artigo181º, nº 1 do CP;
            - não pronunciou o arguido pela prática de:
· um crime de sequestro, p. e p. pelo artigo 158º do CP,
· um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º do CP,
· um crime de injúria agravado, p. e p. pelos artigos 181º e 183º, nº 1, alínea b) do CP.
            No fundo, e na lógica do despacho recorrido, não se descobriu uma probabilidade, pelo menos, razoável, de uma futura condenação do arguido, em sede de julgamento, pelos factos e incriminação que lhe são imputados pelo MP e pelo assistente nas respectivas acusações, razão pela qual profere um justificado Despacho de não pronúncia.
            Decidiu assim o JIC ..., colocando de parte a questão do sequestro, definitivamente caída face ao teor do recurso que se analisa:
· Não se indicia que o arguido tenha agredido o corpo o assistente, tendo apenas existido toques leves sem fazerem este último recuar, mover-se ou encolher-se, não se vislumbrando nas imagens de videovigilância do local qualquer de agressão ou de aplicação de força relevante;
· Entende o JIC que meros toques, insusceptíveis de provocar dores ou lesões,  não devem ser elevados à dignidade da tipificação penal do artigo 143º do CP – os toques do arguido no ombro e na cara do assistente ou o encostar do punho ao peito deste não são socialmente considerados como agressões e não têm a significância exigida pela tutela penal da conduta;
· Indicia-se que o assistente se mostrava exaltado e agressivo, mas não que os contactos que teve com o corpo do assistente configurassem agressões, sendo até excessivo tratar como “chapadas” os toques retratados ou soco o mero encostar do punho.
· Quanto ao crime de injúria agravada, não se indica suficientemente a factualidade integradora da agravação da injúria, isto é, de que o arguido imputou ao assistente ter-se apropriado indevidamente de dinheiro da empresa, sabendo que tal era falso;
· Indicia-se que o assistente efectuou tal transferência, inexistindo indiciação que permita avaliar se tal comportamento era legítimo ou não, pelo que não pode considerar-se suficientemente indiciada a circunstância agravativa da calúnia.
            Recorre o assistente, pretendendo repristinar apenas o crime de ofensa à integridade física (deixa cair o sequestro, portanto) e o crime de injúria agravado.
           
            3.1.3. Uma palavra sobre a estrutura dogmático-penal dos delitos em causa.
Comecemos pelo artigo 143º do CP.
O arguido encontrava-se acusado pelo MP pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo normativo do artigo 143º, nº1, do CP, que dispõe: «Quem ofender o corpo ou saúde de outra pessoa é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa».
O bem jurídico protegido é a integridade física que pode ser atingida por uma ofensa no corpo ou na saúde independentemente da dor ou do sofrimento causados, da gravidade dos efeitos ou da sua duração e é eminentemente pessoal cometendo um crime de ofensa à integridade física por cada pessoa que seja ofendida.
A saúde encontra-se definida pela OMS como um complexo de bem-estar físico, psíquico e moral, e por ofensa no corpo deve entender-se toda a perturbação ilícita da integridade corporal morfológica ou do funcionamento normal do organismo ou das suas funções psíquicas, todo o maltrato através do qual a vítima é prejudicada no seu bem-estar físico de forma não insignificante.
O preenchimento do tipo objectivo do crime em questão basta-se com qualquer forma de ação voluntariamente dirigida à ofensa da integridade física de outrem, ainda que não tenham sido determinados dias de doença ou incapacidade para o trabalho (neste sentido veja-se, entre outros, o Ac. R.L. de 26.06.90, CJ.,III, p. 171, e Ac. R.E. de 10.10.89, BMJ 390-486), acrescendo que não é necessária a demonstração de danos, podendo verificar-se a realização deste tipo de crime mesmo que o ofendido não sofra, por via da agressão, qualquer lesão corporal visível (cfr. acórdão de fixação de jurisprudência de 18 de Dezembro de 1991, D.R., Série I-A).
Na verdade, o respectivo elemento objetivo do tipo não se concretiza em facto susceptível de causar no corpo e/ou na saúde de outrem uma ofensa, mas antes em facto que se traduza em lesão efectiva no corpo e/ou na saúde de outrem.
Ou seja, o elemento objectivo do tipo apenas se mostra preenchido se tiver lugar a produção de dano em resultado da conduta do arguido, podendo então afirmar-se que é objectivamente subsumível na previsão típica do artigo 143º, nº 1, do CP, a acção que constitua causa adequada a produzir no corpo ou na saúde de outrem uma alteração ou uma perturbação da integridade corporal, do bem-estar físico, da morfologia ou do normal funcionamento do organismo, com o que se dá o devido destaque à imputação objectiva do resultado à conduta do agente, mas nada mais que isso.
Para o preenchimento deste crime exige-se ainda a verificação de um dolo de dano ou de resultado, enquanto conhecimento e vontade de realização de determinado resultado reportado ao tipo objectivo, em qualquer das suas modalidades previstas no artigo 14° do CP.
(…)

3.1.4. Com este pano de fundo, diremos que só assiste razão ao tribunal ao não pronunciar este arguido que, por muito exaltado que se tenha mostrado (e nós vimos as imagens do vídeo), nunca agrediu o corpo ou a saúde do assistente, muito embora o pudesse ter feito caso não houvesse a intervenção salvífica de seu irmão EE (note-se que o crime do artigo 143º do CP não é punível a título de tentativa – cfr. conjugação dos artigos 23º, nº 1 e 143º do CP).
            No fundo, bem ajuizou o tribunal de ... ao concluir que inexistem indícios seguros capazes de suportar uma condenação do arguido em julgamento com base nestes dois ilícitos típicos.
            O que vimos no vídeo foi apenas um arguido exaltado, entrando no gabinete do assistente, muitas vezes de dedo em riste na direcção do assistente, desarrumando papéis que estavam em cima da secretária deste último, batendo com a palma da mão – ou com a mão fechada, não é perceptível - numa mesa ali existente e tentando investir contra o BB, nunca o conseguindo consumar por intervenção do irmão EE que sempre os separa.
            O único toque que se vê no vídeo é um toque – ou melhor, dois pequenos toques seguidos - no ombro esquerdo do BB (10[1]:35:45), não conseguindo este tribunal visualizar qualquer estalo na cara deste, qualquer soco na face do BB, nem qualquer contacto entre ambos aquando da saída do BB do seu gabinete.
            Os testemunhos ouvidos em instrução nada mais adiantaram (cfr. acta de fls 96-101), restando, pois, as versões contraditórias do assistente e do arguido.
            E aqui chegados teremos de invocar dúvidas sérias a decidir em favor do arguido, face ao que vimos no vídeo em causa.
*
            Quanto ao crime do artigo 143º do CP, restará a questão de avaliar se devemos valorizar os toques no ombro do assistente como sendo actos de agressão ao corpo e à saúde do assistente.
            E aqui respondemos negativamente.
            Também nós não vimos no acto visualizado qualquer relevo típico para a subsunção ao crime do artigo 143º do CP.
            Ofensa à integridade física, que normalmente designamos agressão, é o crime praticado por quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa.
            Por ofensa ao corpo entende-se todo o maltrato através do qual a vítima é prejudicada no seu bem-estar físico de uma forma não insignificante.
            Por ofensa à saúde deve considerar-se toda a acção que ponha em causa o normal funcionamento das funções corporais da vítima, prejudicando-a.
            É de considerar como lesão da saúde, em primeiro lugar, a criação ou intensificação de um estado de doença, seja através de uma infecção, do contágio de uma doença sexualmente transmissível, ou por qualquer outra via.
            Já sabemos que não precisamos de hematomas ou lesões visíveis para estarmos perante uma agressão típica.
            Recorramos ao aresto da Relação de Lisboa, datado de 12/4/2011 (Pº 3705/08.4TDLSB.L1-5):
            «Trata-se da tutela do bem jurídico “integridade física da pessoa humana”, obedecendo ao comando constitucional do artigo 25º, nº 1, da Constituição da República: a integridade moral e física das pessoas é inviolável.
            No que concerne ao tipo objectivo, escreve Paula Ribeiro de Faria (Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo I, pág. 205):
            “A lei distingue duas modalidades de realização do tipo: a) ofensas no corpo e b) ofensas na saúde. Muitas das vezes haverá coincidência entre estas duas formas de realização do tipo; assim será, por exemplo, quando o agente, espetando uma seringa no braço da sua vítima, lhe causa uma infecção. Mas não necessariamente. Casos há em que existe uma lesão no corpo sem que concomitantemente haja lesão da saúde. Pense-se na controvertida agressão à bofetada (leve) sobre uma pessoa, sem qualquer sofrimento ou incapacidade para o trabalho, e que parte da jurisprudência (Ac. da RL de 26-6-90, CJ XV-III 172) tinha, à luz da versão anterior do art. 142º, como integrando o tipo legal de injúrias. Outra foi, no entanto, a última palavra do STJ, que fixou jurisprudência sobre esta matéria no Ac. de 18-12-91, qualificando o dito comportamento como ofensa corporal. Por outra banda, poderá haver lesões da saúde que não configuram ofensas no corpo, pois que inclusivamente aumentam o bem-estar do lesado (será o caso da administração de estupefacientes). Pode aqui recorrer-se à impressiva imagem, utilizada por ESER, de dois círculos que se cruzam embora mantenham a sua autonomia.
            O tipo legal do art. 143º fica preenchido mediante a verificação de qualquer ofensa no corpo ou na saúde, independentemente da dor ou sofrimento causados (aliás estamos perante uma ofensa no corpo mesmo quando a vítima, mercê da ingestão em excesso de bebidas alcoólicas, não se encontra em condições de sentir qualquer dor), ou de uma eventual incapacidade para o trabalho (o legislador penal não exige um número mínimo de dias de doença ou de impossibilidade para o trabalho, cf. LEAL-HENRIQUES/SIMAS SANTOS 136).
            Não relevam para aqui os meios empregues pelo agressor, ou a duração da agressão, se bem que, como é evidente, todas estas circunstâncias sejam de ter em conta pelo juiz, nos termos do art. 71º, para determinação da medida da pena (…)”.
            Admite-se que, em face do princípio da subsidiariedade, vertido no artigo 18º, nº 2, da CRP, sendo o enquadramento penal a ultima ratio, a ofensa ao corpo ou à saúde prevista na norma do artigo 143º, nº 1, do Código Penal, deve assumir um grau mínimo de gravidade, descortinável segundo uma interpretação do tipo legal à luz do critério de adequação social.
            As condutas atípicas, em virtude da cláusula de adequação social, advêm muitas vezes de uma certa intimidade ou proximidade corporal entre as pessoas, considerando-se aceites e toleradas, não assumindo relevância suficiente para serem consideradas lesões na integridade física enquanto tal.
            Porém, não constitui condição da relevância típica a provocação de dor ou mal-estar corporal, incapacidade da vítima para o trabalho, aleijão ou marca física.
             Nada legitima uma interpretação do conteúdo constitucional do direito à integridade pessoal, concretamente na sua componente de direito à integridade física, em termos de apenas abranger a protecção contra um determinado grau de ofensas corporais, designadamente as que tenham por efeito a provocação de uma lesão ou de incapacidade para o trabalho (cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional, nº 226/2000, de 5 de Abril de 2000, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt).
             O Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 18 de Dezembro de 1991, publicado no Diário da República, Série I-A, nº 33, de 8 de Fevereiro de 1992, fixou a seguinte jurisprudência:
             “Integra o crime do artigo 142º do Código Penal a agressão voluntária e consciente, cometida à bofetada sobre uma pessoa, ainda que esta não sofra, por via disso, lesão, dor ou incapacidade para o trabalho”.
             A questão da dor, sua existência e intensidade, como a questão das lesões ou da incapacidade para o trabalho, não são questões de tipicidade no que concerne à ofensa à integridade física simples, pelo que qualquer acto comportamental voluntário e injustificado, atentatório da incolumidade corporal de terceira pessoa, verificados os demais legais pressupostos, fará incorrer o respectivo agente em responsabilidade criminal, independentemente da maior ou menor extensão objectiva da respectiva ofensa e das resultantes consequências».
            Olhando para o nosso caso, o acto de dar um ou toques no ombro do assistente, com quem se está a ter uma acalorada discussão, não exprime, a nosso ver, de forma inequívoca, do ponto de vista ético-social, uma agressão no corpo, um “ataque”, um gesto molestador, independentemente do efeito.
             E não vislumbramos, salvo melhor opinião, que, à luz da cláusula de adequação social, tal conduta possa ser considerada como típica por relevância.
            A concreta configuração do contacto físico que, apesar de provocado voluntariamente pelo arguido, foi de pequena intensidade e sem consequências assinaladas, impõe que se considere não ser a conduta do mesmo suficiente para preencher materialmente o tipo legal de ofensa à integridade física, dada a insignificância do respectivo grau de ilicitude – ou seja, ao preenchimento aparente do tipo não corresponde, in casu, a concretização do juízo de ilicitude material subjacente à sua formulação.
            Também o aresto da Relação de Évora, datado de 23/2/2021 (Pº 145/18.0GCSSB.E1), nos dá luz neste nosso caso:
            «Assim entendidas, as causas de atipicidade penal são uma parte negativa de qualquer tipo penal, podendo considerar-se como tal, sem exaustividade, o princípio da insignificância, a tolerância social, alguns casos de adequação social, certos casos de consentimento não plenamente válido ou a inexigibilidade penal geral – cfr L.Peña, est. cit. p. 120.
            De entre estas circunstâncias importa-nos no caso concreto o princípio da insignificância, que Luzón Peña diz ter sido concebido por Roxin como causa de atipicidade, e que também se designa como casos de ilícito bagatela.
             Significa o princípio da insignificância que não podem ser penalmente típicas ações que apesar de, em princípio, encaixarem numa descrição típica e de conterem algum desvalor jurídico, ou seja, que não se encontrem justificadas e não sejam plenamente lícitas, apesar disso no caso concreto o seu grau de ilicitude é mínimo, insignificante: porque, de acordo com o seu caráter fragmentário, as condutas penalmente típicas só devem ser constituídas por ações que sejam gravemente antijurídicas, não por factos cuja gravidade seja insignificante. O princípio da insignificância, conclui L. Peña, significa uma restrição tácita dos tipos que, no entanto, só opera quando numa conduta típica que, em princípio, é suficientemente grave, podem encaixar-se casos concretos cujo desvalor seja insignificante, o que pode suceder por ser mínimo o desvalor objetivo do facto ou do resultado ou também por ser mínimo o desvalor subjetivo da ação».
            Transpondo tais considerações para o caso aqui em análise, reconhece-se que a situação de facto dos autos não é coincidente com aquela que foi ali avaliada (ter o arguido desferido um empurrão no peito de agente da autoridade quando este se colocou à sua frente).
            Tem, pois, de admitir-se que uma “chapada”, embora “leve”, tem inevitavelmente um maior desvalor.
            Ainda assim, não resultando propriamente, provada a dimensão dessa dita leveza da chapada, a motivação decisória permite aquilatar de que se tratou de um mero “enxota moscas”, na expressão usada por quem a presenciou e, como tal, valorada pelo Tribunal, levando, pois, a inferir que até foi muito leve.
            Entende-se, então, perante todos os apontados factores, de tolerar e aceitar que se verifica, na conduta da recorrente, falta de significado bastante para configurar afectação da integridade física da ofendida, que mereça a dignidade intrínseca ao bem jurídico protegido e justifique a intervenção do direito penal.
            Não se revela concretizado o juízo de ilicitude material subjacente ao tipo legal, motivo por que a sua conduta, ainda que não lícita, não impõe, dada a sua insignificância nos termos descritos, que se considere que incorreu no crime de ofensa à integridade física simples, por que foi condenada».
            Diremos que, no nosso caso, ainda temos muito menos do que a «chapada leve» discutida no aresto de Évora.
            Também outro aresto de Évora (Pº 74/09.9GBGLG.E1), datado de 21/5/2013, nos vem dizer que:
            «É tipicamente irrelevante o facto de o menor ser agarrado no braço pela arguida, pois tal não implica necessariamente que o mesmo seja prejudicado no seu bem-estar físico e, menos ainda, que a haver afetação do seu bem-estar a mesma tivesse ocorrido de forma não insignificante».
            Não há, pois, para nós também, qualquer tipicidade na factualidade dada por indiciada.
*
            (…)

3.1.5. Aqui chegados, e não olvidando que o Juiz de Instrução, aquando da prolação do despacho de pronúncia ou não pronúncia, deve ter presente na valoração da prova o princípio in dubio pro reo, em função das provas trazidas aos autos e da insuficiência de indícios demonstrada, não é de considerar como razoavelmente provável a futura condenação deste arguido em sede de julgamento penal pelas incriminações legais pressupostas pelo assistente (o crime do artigo 143º e a injúria agravada).
Ou seja:
No caso do arguido, sendo de admitir como muito mais provável a absolvição penal do que a sua condenação (com base nas incriminações defendidas pelo assistente), impunha-se, de facto, a prolação de despacho de não pronúncia relativamente às mesmas, não se reconhecendo a violação pelo Mº JIC de qualquer das normas mencionada pelo assistente nas conclusões da motivação do seu recurso.

3.2. Razão pela qual só resta confirmar o despacho recorrido e negar provimento ao recurso.

3.3. Diremos em sumário:
1. O acto de dar um ou toques no ombro do assistente, com quem se está a ter uma acalorada discussão, não exprime, de forma inequívoca, do ponto de vista ético-social, uma agressão no corpo, um “ataque”, um gesto molestador, independentemente do efeito, não se vislumbrando que, à luz da cláusula de adequação social, tal conduta possa ser considerada como típica por relevância, no que tange ao crime do artigo 143º do CP.
2. Face ao princípio da subsidiariedade, vertido no artigo 18º, nº 2, da CRP, sendo o enquadramento penal a última ratio, a ofensa ao corpo ou à saúde prevista na norma do artigo 143º, nº 1, do CP, deve assumir um grau mínimo de gravidade, descortinável segundo uma interpretação do tipo legal à luz do critério de adequação social.
3. A concreta configuração do contacto físico, que apesar de provocado voluntariamente pelo arguido, foi de pequena intensidade e sem consequências assinaladas, impõe que se considere não ser a conduta do mesmo suficiente para preencher materialmente o tipo legal de ofensa à integridade física, dada a insignificância do respectivo grau de ilicitude – ou seja, ao preenchimento aparente do tipo não corresponde, in casu, a concretização do juízo de ilicitude material subjacente à sua formulação.

            III – DISPOSITIVO       

            Em face do exposto, acordam os Juízes da 5ª Secção - Criminal - deste Tribunal da Relação em: 
· em negar provimento ao recurso interposto pelo assistente BB, e, em consequência, manter na íntegra o despacho de não pronúncia do arguido AA quanto aos crimes p. e p. pelos artigos 143º e 181º/183º, nº 1, alínea b) do CP.

Custas pelo assistente [artigo 515º, nº 1, alínea b) do CPP], fixando em 4 UCs a taxa de justiça (tabela III anexa ao RCP).
Comunique de imediato o teor deste acórdão à 1ª instância, com nota de não trânsito em julgado.

                                        Coimbra, 20 de Março de 2024
(Consigna-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário, sendo ainda revisto pelo segundo e pelo terceiro – artigo 94º, nº 2, do CPP -, com assinaturas electrónicas apostas na página, nos termos do artº 19º da Portaria 280/2013, de 26/8, revista pela Portaria 267/2018, de 20/09)
Relator: Paulo Guerra
Adjunto: Isabel Valongo
Adjunto: Alcina da Costa Ribeiro



[1] Leia-se «11» pois a hora não está actualizada.