Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1163/13.0T3AVR.P1.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE FRANÇA
Descritores: IMPUGNAÇÃO DE PERFILHAÇÃO
SENTENÇA
ALIMENTOS JÁ PRESTADOS
PROCESSO PENAL
VIOLAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE ALIMENTOS
SUFICIÊNCIA DO PROCESSO PENAL
QUESTÃO PREJUDICIAL
Data do Acordão: 03/11/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: BAIXO VOUGA (JUÍZO DE MÉDIA INSTÂNCIA CRIMINAL DE AVEIRO, JUIZ 2)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA, PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTS. 7.º DO CPP; ART. 250.º DO CP
Sumário: I - Se a sentença de impugnação de perfilhação, no que concerne aos seus efeitos pessoais e aos demais efeitos patrimoniais (nomeadamente no que concerne à obrigação de alimentos), opera extunc, relativamente aos alimentos já prestados e aos entretanto vencidos o efeito é meramente ex nunc, ficando, deste modo, em qualquer caso, excluída a possibilidade de o impugnante obter a restituição das quantias entregues a títulos de prestações alimentícias.

II - Consequentemente, a repercussão da acção de impugnação de perfilhação no procedimento criminal relativo a crime de violação da obrigação de alimentos, p. e p. pelo art. 250.º, n.ºs 1 e 2, do CP, não se reveste da essencialidade exigida pelo artigo 7.º para que seja declarada a suspensão do processo penal.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

Nos autos de processo comum (singular) que sob o nº 1163/13.0T3AVR, correram termos pelo Juízo de Média Instância Criminal de Aveiro, Juiz 2, da Comarca do Baixo Vouga, foi o arguido A..., submetido a julgamento, acusado pela autoria material e na forma consumada, de um crime de violação da obrigação de alimentos, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 30º nº 2 e 250º nºs 1 e 2 do Código Penal.

Efectuado o julgamento, viria a ser proferida sentença condenando o arguido numa pena de 6 (seis) meses de prisão, cuja execução foi suspensa por 12 meses, sujeita às seguintes condições:

- Liquidar no prazo desses 12 (doze) meses pelo menos 35% do valor das prestações de alimentos vencidas e não pagas desde o mês de Dezembro de 2004 a Maio de 2014, acrescida das atualizações, no valor global de 4.827,75 €, por qualquer forma de satisfação civil de um crédito, disso documentando os autos.

- Retomar imediatamente o pagamento das prestações de alimentos vincendas ou requerer qualquer incidente tendente à sua alteração.

Na contestação à acusação, que apresentou, o arguido, entre o mais, requereu a suspensão da instância criminal até ser proferida decisão numa acção de anulação de perfilhação em que figura como A. e o menor B... e a sua mãe C... figuram como R.; assim, alega, «a acção de anulação da perfilhação atendendo à particularidade e à sensibilidade dos valores que estão em causa, deverá ser decidida previamente ao processo, uma vez que a decisão daquela acção pode afectar ou prejudicar o julgamento nos presentes autos, ou seja, pode destruir o fundamento ou a razão de ser da matéria que se discute no presente processo».

Sobre este requerimento recaiu despacho, proferido na acta da sessão do julgamento, ocorrida no dia 26/5/2014, do seguinte teor:

«O processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e nele devem-se resolver tendencialmente todas as questões que interessam à boa decisão da causa.

O arguido veio requerer a suspensão do presente processo com fundamento na pendência no Tribunal de Família e Menores de Aveiro de uma acção de anulação da perfilhação relativamente ao menor a que o presente processo diz respeito.

Contudo, tal acção, salvo o devido respeito, não constitui impedimento para o início da presente audiência nem constitui uma sua causa prévia a resolver nos termos do artº 7º, 2, do CPP, uma vez que o tipo de crime pelo qual o arguido vem acusado mostra-se suficientemente indiciado nos termos documentados no processo e ainda na sentença judicial de regulação do exercício das responsabilidades parentais que majorou a obrigação de alimentos que o arguido vem acusado de incumprir. Posto isto, e independentemente da sorte que venha a conhecer aquela outra acção, a mesma irreleva por ora para o presente processo e nessa decorrência indefiro a requerida suspensão deste processo

Inconformado, o arguido interpôs recurso desta decisão intercalar, motivando e concluindo nos seguintes termos:

- O arguido requereu a suspensão do processo, nos termos do artº 272º do CPC, por entender que a decisão de anulação de perfilhação que tinha intentado junto do Tribunal de Família e Menores de Aveiro poderia prejudicar ou afectar o julgamento nos presentes autos.

- Por despacho datado de 26 de Maio de 2014, o tribunal a quo decidiu indeferir a requerida suspensão, alegando sumariamente que a acção de perfilhação «… não constitui impedimento para o início da presente audiência nem constitui uma sua causa prévia a resolver nos termos do artº 7º, 2, do CPP, uma vez que o tipo de crime pelo qual o arguido vem acusado mostra-se suficientemente indiciado nos termos documentados no processo e ainda na sentença judicial de regulação do exercício das responsabilidades parentais que majorou a obrigação de alimentos que o arguido vem acusado de incumprir…».

- O recorrente não se conforma com o referido despacho por considerar incorrectamente decidida a suspensão do processo.

- Na verdade, o arguido intentou no juízo de Família e Menores de Aveiro uma acção de anulação de perfilhação que corre os seus termos sob o nº 196/14.4TGAVR, onde são réus o menor B... e a sua mãe C... .

- Entende o recorrente que esta acção considerando a particularidade e a sensibilidade dos valores em causa, deveria ser decidida previamente ao presente processo crime, uma vez que a decisão daquela acção poderia afectar ou prejudicar a decisão nos presentes autos.

- Para o recorrente estão reunidos os pressupostos para que o tribunal a quo tivesse decidido pela aplicação do instituto previsto no artº 272º do CPC, ordenando a suspensão deste processo até decisão na sobredita acção de Anulação de Perfilhação.

- Na verdade, na sequência daquela previsão legal, uma causa está dependente de outra já proposta quando a decisão desta possa afectar e prejudicar o julgamento da primeira, ou seja, que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial possa interferir e influenciar a causa dependente.

- Neste sentido, dúvidas não parece existirem de que as acções de que falamos estão intrinsecamente ligadas por um nexo de prejudicialidade, motivo pelo qual, deveria ter sido suspensa a instância na causa dependente (o processo crime) até ser conhecida a decisão da causa prejudicial (a acção de anulação de perfilhação).

- Pelo que o desfecho daquela acção poderia influenciar a decisão do tribunal a quo nem que seja no que diz respeito à medida da pena, o que bem se compreende, pois esta poderia variar em função da correspondência ou não do vínculo biológico entre o arguido e o menor.

- O que não acabou por acontecer, uma vez que decidiu não suspender os presentes autos.

- Ao decidir desta forma, o tribunal violou os artºs 20º (acesso ao direito) e o artº 32º (garantias do processo criminal) da CRP.

- Ao ver negada a suspensão o arguido viu prejudicada a sua defesa, na medida em que não pode fazer-se valer da decisão da outra acção como eventual meio de defesa nesta.

- Pretendemos com isto dizer que o arguido viu-se impedido de ver considerado e valorado na sentença a questão da paternidade, que cremos determinante para a decisão do processo crime, quanto mais não seja, relativamente à questão da determinação da pena e da sua medida concreta.

- Conclui pedindo que, na procedência do recurso, o processo seja remetido para a 1ª instância por forma a que o tribunal recorrido profira novo despacho ordenando a suspensão do processo nos termos por ele pretendidos.

O Ex.mo juiz recorrido proferiu despacho, sustentando a sua decisão, mais adiantando não vislumbrar qualquer violação dos invocados princípios constitucionais.

Respondeu o MP em primeira instância, concluindo pelo não provimento do recurso, até porque nenhuma das normas constitucionais invocadas foi violada.

Também inconformado relativamente à sua condenação, interpôs recurso da sentença, motivando e concluindo nos seguintes termos:

Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia:

- Não atendeu o tribunal a quo à situação económica concreta e futura do arguido, ou seja, no processo de determinação concreta da pena pelo crime de violação de obrigação de alimentos, a suspensão da pena de prisão nos termos do artº 51º, 1, a), do CP, obrigatoriamente condicionada ao cumprimento de duas injunções, a saber: - a obrigação de liquidar no prazo de doze meses pelo menos 35% do valor das prestações de alimentos vencidas e não pagas, acrescida das atualizações, no valor global de 4.827,75 €, e ainda retomar imediatamente o pagamento das prestações de alimentos vincendas, reclamam um juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação dessa condição legal por parte do arguido.

- A falta desse juízo implica necessariamente a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

- A suspensão da execução da pena de prisão condicionada àquelas injunções reclama um juízo de prognose de razoabilidade, acerca da satisfação da sua condição legal por parte do arguido.

- Dos factos dados como provados pelo tribunal a quo nãos e vislumbra uma ponderação adequada relativamente à situação económica do arguido.

- Na verdade, o arguido, apesar de possuir património imobiliário, e um carro do ano de 2001, de per si, não gera rendimento. Tanto mais que parte dele não é da sua propriedade plena, além de que, atendendo à situação económica que o país atravessa a todos os níveis, não permitem que o arguido os consiga alienar/arrendar ou dispor dele de outra forma legalmente admissível e assim permitir-lhe cumprir com as injunções impostas pelo tribunal, condição sine qua non para a suspensão da pena de prisão.

- Por outro lado, o arguido encontra-se actualmente sem auferir qualquer rendimento, não recebendo, há pelo menos 22 meses, subsídio de desemprego.

- Daqui facilmente se depreende que é impossível ao arguido conseguir pagar as mensalidades que se forem vencendo e ainda o pagamento da quantia de 4.827,75 no período de um ano.

- Salvo melhor entendimento, o tribunal ao tomar conhecimento da situação económica do arguido deveria, desde logo, optar por uma condição que fosse realizável pelo mesmo.

- O mesmo é dizer que para o cumprimento da condição suspensiva nos valores sobreditos não pode o tribunal deixar de aferir da real capacidade económica e financeira do arguido para pagar.

- O tribunal a quo violou a previsão do artº 51º, 2, do CP, que obriga a que «os deveres impostos não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não for razoavelmente de lhe exigir», sendo que tal situação só seria devidamente aferida se o tribunal a quo ponderasse devidamente a real situação financeira do arguido, o que não aconteceu.

- Diga-se ainda que, se no momento da decisão, o arguido não tiver solvabilidade económica para cumprir com as injunções que suspendem a aplicação da pena de prisão, deve o tribunal ponderar entre a redução dos valores a pagar (uma vez que, in casu, o prazo máximo da suspensão seria de 12 meses) ou afastar de imediato a pena de prisão e optar por uma pena não privativa da liberdade.

- O artº 71º, 2, d), do CP obriga, necessariamente, a que o tribunal atenda devidamente à situação económica do arguido na determinação da medida concreta da pena.

- Sublinhamos, novamente, que a razoabilidade da condição terá necessariamente de ser avaliada e ponderada a montante, uma vez que tem implicações ao nível da suspensão da pena de prisão e prazo de pagamento.

- Não o fazendo, o tribunal a quo violou o artº 51º, 2, do CP e nessa medida a sentença recorrida é nula nos termos da al. c) do nº 1, do artº 379º do CPP.

Da escolha da pena em clara violação do artº 70ºdo CP:

- No seguimento do que acaba de ser dito, entende a defesa que o tribunal a quo deveria ter optado pela aplicação de uma pena de multa em detrimento de uma pena privativa da liberdade, ainda que suspensa na sua execução e com as vicissitudes já mencionadas.

- Justificamos esta nossa posição pelo facto de não serem conhecidos antecedentes criminais aos arguido e pelo facto de o mesmo ter admitido não ter pago algumas prestações de alimentos, ou seja, confessou parcialmente.

- Foi a primeira vez que o arguido esteve nesta qualidade em tribunal, pelo que a aplicação de uma pena de multa cumpriria em pleno as finalidades de prevenção geral e especial, previstas no artº 40º do CP. Não o fazendo, o tribunal a quo violou o artº 70º do mesmo diploma, ao optar pela pena de prisão.

- Dúvidas não subsistem de que o tribunal deveria de facto ter optado pela aplicação de uma pena de multa e mesmo nessa, teria de atender devidamente à situação económica e pessoal do arguido.

Conclui pela procedência do recurso.

Também a este recurso respondeu o MP em primeira instância, concluindo pelo não provimento do recurso.

Nesta Relação, a Ex.ma PGA, operou remissão para o parecer que fora elaborado pelo colega, aquando a passagem do processo pelo Tribunal da Relação do Porto, o qual conclui pelo não provimento de ambos os recursos.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

FACTOS PROVADOS:

2.1.1. A... e C... tiveram um relacionamento amoroso e são os pais de B... , estudante, nascido a 08.01.1998.

2.1.2. Em 4 de Novembro de 2004, no processo de regulação do exercício do poder paternal nº 654/03.6TMAVR que correu termos no Juízo de Família e Menores de Aveiro, por sentença transitada em julgado, foi regulado o exercício do então poder paternal e o arguido condenado, para além do mais, a pagar a quantia mensal de 100 € a título de alimentos devidos ao seu filho, até ao dia 10 de cada mês, anualmente atualizados em 5 € no mês de Janeiro de cada ano e com inicio em 2006.

2.1.3. O arguido nunca liquidou qualquer quantia a título de prestação de alimentos devido a este seu filho no âmbito do processo referido em 2.1.2..

Encontrando-se, assim, em dívida, a prestação de alimentos de Dezembro 2004: 100 €; ano de 2005: 1200 € (12 x 100 €); ano de 2006: 1260 € (12 x 105 €); ano de 2007: 1320 € (12 x 110 €); ano de 2008: 1380 € (12 x 115 €); ano de 2009: 1440 € (12 x 120 €); ano de 2010: 1500 € (12 x 125 €); ano de 2011: 1560 € (12 x 130 €); ano de 2012: 1620 € (12 x 135 €); ano de 2013: 1680€ (12 x 140 €).

2.1.4. O arguido tinha conhecimento de que estava obrigado a prestar alimentos ao seu filho e no prazo de dois meses seguintes ao respetivo vencimento optou por não liquidar de forma voluntária aquelas prestações de alimentos vencidas, não obstante saber que a isso estava legalmente obrigado e que tinha globalmente condições materiais para o fazer.

2.1.5. Agindo sempre de modo livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.

(mais se provou ainda que:)

2.1.6. As prestações de alimentos vencidos no ano de 2014 e no valor de 725,00 € (=5 meses x 145,00 €) não se mostram por si liquidados.

2.1.7. O arguido solicitou por apenso ao processo identificado em 2.1.2. a alteração do exercício das responsabilidades parentais no tocante ao regime de visitas ao seu filho, que foi realizado por acordo homologado por sentença de 31 de Maio de 2005 transitada em julgado e que se encontra melhor documentado a fls.30 e 31 dos autos.

2.1.8. A mãe do menor instaurou execução especial por alimentos que correu termos por apenso com a letra B ao processo apontado em 2.1.2. e contra o arguido que ali ocupava a posição de executado, para pagamento das prestações de alimentos vencidas e não pagas desde a regulação das responsabilidades parentais e 08.05.2005 no valor global de 2.264,49 €.

2.1.9. O arguido tem participado em seu nome no Serviço de Finanças Aveiro 1:

- 1/3 do prédio rústico inscrito na matriz urbana de (... ) sobre o artigo 529;

- Propriedade plena do prédio rústico inscrito na matriz urbana de (... ) sobre o artigo 913;

- Os prédios urbanos inscritos na mesma matriz urbana sobre os artigos 38, 426 - 1/6 da fração R/c D – e 426 – 1/6 do R/c E.

2.1.10. A última vez que apresentou uma declaração de rendimentos em território nacional foi no ano de 2006 (IRS), mas é proprietário de um Mercedes-Benz do ano de 2001.

2.1.11. O arguido é casado e vive com a sua esposa que é secretária e em casa própria;

Tem para além do B... um outro filho com 9 anos de idade para o qual despende 105,00 € por mês a título de alimentos;

A sua esposa tem dois filhos com 16 e 18 anos de idade que não residem consigo e não dependem financeiramente de si.

Pagam empréstimo bancário pela aquisição de casa própria em valor não apurado.

Diz-se desempregado há cerca de 3 anos e que apenas auferiu subsídio de desemprego nos primeiros 14 meses.

Tem o 11.º ano de escolaridade e começou a trabalhar em 1986.

Quando o seu filho nasceu mostrava-se emigrado de forma intermitente em França e mais tarde, em data não concretamente apurada, regressou a Portugal, onde até meados de Agosto de 2006, pelo menos, trabalhou como camionista de veículos pesados por conta das firmas D... , Lda., E... , Lda., e F... , Lda., respetivamente com sedes em Mira, Ílhavo e Soure.

Em meados de 2007 e durante cerca de 3 anos trabalhou como camionista por conta da firma de direito espanhol Transportes Beriain, com sede em Pamplona, Navarra, Espanha, auferindo em média 1.500.00 € por mês.

2.1.12. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais.

*

2.2. Factos não provados

2.2.1. Que o arguido não tenha tido disponibilidade económica e financeira para honrar a prestação de alimentos a que se mostrava obrigado.

2.2.2. Tenha entregue, mais do que uma vez, em numerário, à queixosa, a quantia de 40.000$00 a 50.000$00 por conta dos alimentos que se iam vencendo.

I – O RECURSO INTERCALAR.

       Neste recurso, como já atrás fizemos referência, o que está em causa é o apuramento da existência de uma relação de prejudicialidade entre a acção de anulação de perfilhação e a presente acção.

       Como vimos já, na contestação à acusação, que apresentou, o arguido, entre o mais, requereu a suspensão da instância criminal até ser proferida decisão numa acção de anulação de perfilhação em que figura como A. e o menor B... e a sua mãe C... figuram como RR.; assim, alega, «a acção de anulação da perfilhação atendendo à particularidade e à sensibilidade dos valores que estão em causa, deverá ser decidida previamente ao processo, uma vez que a decisão daquela acção pode afectar ou prejudicar o julgamento nos presentes autos, ou seja, pode destruir o fundamento ou a razão de ser da matéria que se discute no presente processo».

       Sobre este requerimento recaiu despacho, proferido na acta da sessão do julgamento, ocorrida no dia 26/5/2014, do seguinte teor:

«O processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e nele devem-se resolver tendencialmente todas as questões que interessam à boa decisão da causa.

O arguido veio requerer a suspensão do presente processo com fundamento na pendência no Tribunal de Família e Menores de Aveiro de uma acção de anulação da perfilhação relativamente ao menor a que o presente processo diz respeito.

Contudo, tal acção, salvo o devido respeito, não constitui impedimento para o início da presente audiência nem constitui uma sua causa prévia a resolver nos termos do artº 7º, 2, do CPP, uma vez que o tipo de crime pelo qual o arguido vem acusado mostra-se suficientemente indiciado nos termos documentados no processo e ainda na sentença judicial de regulação do exercício das responsabilidades parentais que majorou a obrigação de alimentos que o arguido vem acusado de incumprir. Posto isto, e independentemente da sorte que venha a conhecer aquela outra acção, a mesma irreleva por ora para o presente processo e nessa decorrência indefiro a requerida suspensão deste processo

       Consagra o artº 7º, 1, do CPP, o princípio da suficiência do processo penal, ao estatuir que «o processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e nele se resolvem todas as questões que interessam à decisão da causa». Ou seja, a regra é a da promoção imediata do processo, sem necessidade de fazer actuar qualquer outra jurisdição, a fim de, nela, se conhecer de questões essenciais à determinação do preenchimento dos elementos típicos; no processo penal se conhecerá, por regra, de todas essas questões.

       Excepcionalmente, o nº 2 da norma em causa permite que o tribunal suspenda o processo quando «para se conhecer da existência de um crime, for necessário julgar qualquer questão não penal que não possa ser convenientemente resolvida no processo penal».

       À partida, essa parece ser a situação descrita nos presentes autos, em que, como pretende o recorrente, se tornará necessário conhecer a decisão a proferir naquela acção de impugnação de perfilhação para uma boa decisão da causa. Só aparentemente assim será. Com efeito, não nos parece existir a pretendida prejudicialidade dessa causa civil, já que a sua decisão não é relevante em termos de conhecimento da existência de um crime. Com efeito, nos termos da previsão legal, v.g. do artº 250º, 1 e 2, do CP, o que se exige para o preenchimento típico é a prática reiterada consistente no não cumprimento da obrigação de alimentos no prazo de 2 meses seguintes ao vencimento, por quem esteja legalmente obrigado a prestá-los e em condições de o fazer. No momento da prática dos factos, que recordemos, se traduz num crime permanente e que perdura já desde Fevereiro de 2005 (2 meses após o vencimento da prestação de Dez./2004), é indubitável que o arguido se encontrava obrigado a prestar alimentos ao seu filho, por força da regulação do exercício do respectivo poder paternal, operado na acção nº 654/03.6TMAVR. Assim sendo para esses efeitos não importa averiguar da sorte da acção de impugnação de perfilhação, já que os elementos constantes do processo são suficientes para a integração do crime e das suas circunstâncias.

       É verdade, que, como diz o recorrente, se mais não for, o desfecho desse processo anulatório poderá ter algumas repercussões no presente, no que se reporta à questão da determinação do tipo e da medida da pena. Mas, como vimos já, a existência da prejudicialidade deve ser vista em termos de essencialidade; sem a decisão dessa causa, o processo crime não poderá prosseguir, já que ela se mostra necessária à averiguação da existência do próprio crime. E não é esse, seguramente, o caso que nos ocupa.

       Vem a propósito citar a jurisprudência referida pelo Ex.mo PGA, no seu douto parecer, v.g. o ac. do TRG de 25/1/2006, proc. 2498/05-2, disponível em www.dgsi, segundo o qual:

«1. O trânsito em julgado da sentença que julgue procedente o pedido de impugnação de paternidade, maternidade ou perfilhação faz cessar a obrigação de alimentos já que, desta maneira, o carecido perde o ‘status’ de filho relativamente ao outrora obrigado;

2. Todavia, fica naturalmente excluída a possibilidade de o impugnante pedir a restituição das quantias entregues (ao progenitor com guarda, para custear as despesas com aquele) pois que a sentença produz efeitos exnunc

       Muito embora a sentença em causa, no que concerne aos seus efeitos pessoais e aos demais efeitos patrimoniais, opere extunc, o certo é que relativamente aos alimentos já prestados e aos entretanto vencidos, esse efeito é meramente exnunc.

       Pretende o recorrente que ao ser indeferida a sua pretensão suspensiva viu serem-lhe obliterados direitos de consagração constitucional, como sejam os garantidos nos artºs 20º (acesso ao direito) e 32º (garantias do processo criminal), ambos da CRP. Não obstante essa sua alegação, o certo é que o recorrente não concretizou de que modo se mostra prejudicada a sua garantia constitucional de acesso ao direito, até porque, como refere o Ex.mo Juiz recorrido, no seu despacho de sustentação, o arguido litiga «numa instância civil e noutra criminal, a propósito da mesma questão conexa e sem que lhe tenha sido denegada justiça em nenhuma das duas instâncias». No que se refere à violação de qualquer garantia do processo criminal, com consagração constitucional, refere o recorrente que «ao ver negada a suspensão o arguido viu prejudicada a sua defesa, na medida em que não pode fazer-se valer da outra acção como meio de defesa nesta». Mas, vimos já que a repercussão da decisão a proferir na acção pretensamente prejudicial sobre o procedimento criminal não se reveste da essencialidade que a própria lei exige, razão pela qual, revestindo-se de mero interesse circunstancial, está arredada daquela garantia constitucional.

       Assim sendo, bem andou o Ex.mo juiz recorrido ao indeferir o requerimento em causa.

       Termos em que improcedem as conclusões formuladas a propósito desde recurso intercalar.

II – O RECURSO DA SENTENÇA FINAL

       Relativamente à sentença final, analisadas as conclusões formuladas pelo recorrente, vislumbramos que são, essencialmente, duas as questões por ele colocadas à nossa apreciação:

1. a pretensa nulidade da sentença, por omissão de pronúncia em virtude de o tribunal recorrido não ter tomado em consideração a situação económica concreta, presente e futura do arguido, no processo de determinação da pena concreta a aplicar; e

2. ter-lhe sido aplicada uma pena de prisão, em lugar de uma pena de multa, apesar de não ter antecedentes criminais e de a pena de multa salvaguardar as finalidades da punição e as razões de prevenção geral e especial.

1. A nulidade da sentença, por omissão de pronúncia.

       Dispõe o artº 379º, 1, c), do CPP, que a sentença é nula «quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…)» Por seu lado, estatui o artº 51º, 2, do CP, que «os deveres impostos [à suspensão da execução da pena de prisão] não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir».

       Cremos, no entanto, que mais do que arguir a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, o que faz o recorrente é arguir a sua nulidade por falta de fundamentação; com efeito, o que ressalta das conclusões que formula é que o tribunal recorrido terá conhecido de questão que enumera –sujeição da suspensão da execução da pena de prisão a deveres – sem ter fundamentado devidamente essa sua operação, traduzida no que refere ser a falta de um «juízo de prognose de razoabilidade».

       Dispõe, a propósito, o artº 374º, 2, do CP, que a fundamentação da sentença «consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal», sob pena de nulidade de tal peça (artº 379º, 1, a)).

       O dever de fundamentar as decisões judiciais tem por objectivo a salvaguarda do exercício democrático do direito de defesa, consagrado no artº 32º da CRP (que, por sua vez, é uma emanação do dever de fundamentação das decisões dos tribunais – artº 205º). Reflexamente, este dever prende-se com a necessidade de tornar as sentenças em peças que, só por si, tornam explícita e compreensível a reacção da sociedade perante um ‘pedaço ou retalho de vida’ que por violar gravemente os princípios dirigentes da organização em sociedade é elevado à categoria de crime, merecedor de uma pena. Ou seja, a sentença há-de explicar-se por si mesma, o seu texto há-de ser de tal modo claro que demonstre qual a sequência lógica seguida, quais os raciocínios efectuados, quais as regras da experiência ou do senso comum a que foi lançada mão. Não quer isto dizer que essa obrigação seja exigente ao ponto de tornar inviável a sua observância concreta; o dever de fundamentar não obriga a explicar a análise a que se procedeu, o raciocínio efectuado, o juízo feito, ponto por ponto, bastando-se com a indicação das mesmas segundo uma visão global e compreensiva, indicando-as de um modo tanto quanto possível completo, ainda que sucinto, no dizer da lei. O que há-de resultar necessariamente da sentença será a indicação das razões pelas quais, existindo duas ou mais vias, se optou por uma em concreto. Muito embora a fundamentação da sentença, neste pormenor, não seja tão explícita como se pode exigir, cremos no entanto que, de forma suficiente fundamentou a razão pela qual condicionou a suspensão da execução da pena nos termos em que o fez.

       Respigando da sentença, foi aí dito: «O arguido sempre teve condições para satisfazer os alimentos devidos pois durante o período em causa sempre trabalhou auferindo um salário acima da média nacional e cerca de três vezes o vencimento mínimo obrigatório (3x 485,00 €), pelo que tinha, e tem, propriedades imobiliárias e mobiliárias sujeitas a registo de que não se socorreu para prover às necessidades do filho. Portanto se não pagou atempadamente as prestações de alimentos vencidas durante todos estes anos foi porque não o pretendeu fazer (…)». E mais adiante: «O seu comportamento e atitude desculpabilizante em sede de julgamento é revelador da sua indiferença pela obrigação de providenciar pelo pagamento de alimentos ao filho menor, obrigação que vem violando há vários anos não obstante tenha tido condições para quase sempre a cumprir e quando não teve (se é que tal aconteceu) nada fez para alterar ou justificar esse situação de incumprimento, estando atualmente e segundo diz desempregado, mas ainda assim na posse de património que pode ser reafectado ao gozo ou satisfação das necessidades alimentares do filho

       Ou seja, na sentença, nos locais citados e passim são feitas referências que, globalmente, não podem deixar de se considerar fundamentadoras não só da aplicação do instituto da suspensão da execução da pena, como também, ainda que imperfeitamente, temos de o reconhecer, da sua submissão a condições.    Coisa diversa será a análise do mérito da decisão, assunto que deixamos para o ponto seguinte da nossa análise.

       Por isso, não ocorre no caso a apontada nulidade da sentença, seja por omissão de pronúncia, seja por falta de fundamentação, cominadas, respectivamente, no artº 379º, 1, c) e a) do CP ou violação da garantia constitucional do artº 32º, 1, da CRP.

2. A questão da opção entre as alternativas penas de multa e de prisão.

       Entende o recorrente que, sendo o crime de violação da obrigação de alimentos previsto no artigo 250.º n.º 1 e 2 do Código Penal punível com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias se deveria ter optado por uma pena desta natureza não detentiva. Alega, a seu favor, uma confissão parcial que terá feito e, por outro lado, o seu estatuto de delinquente primário.

       De concreto, e a este propósito, foi dito na sentença o seguinte:

«De acordo com o disposto no art.70.º do Código Penal o Tribunal só deve optar pela pena não privativa da liberdade se esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, mormente que seja suficiente para satisfazer as exigências de prevenção do crime que o caso concreto suscita e para promover a recuperação social do delinquente. — cfr. art. 40° do Código Penal.

E no caso em apreço constata-se, por um lado, que o arguido não tem antecedentes criminais, mas por outro que são elevadas as exigências de prevenção geral positiva neste tipo de crime.

Ora, atendendo a que o arguido não mostrou em julgamento a mínima consciência do desvalor e gravidade da sua conduta, julgamos que só a aplicação de uma pena de prisão se mostra adequada a punir os factos por si cometidos e satisfazer as finalidades da punição, em especial de prevenção especial, pois que de outra forma o arguido continuará a ignorar a obrigação natural e legal de que é sujeito passivo em relação ao seu filho B... .

O seu comportamento e atitude desculpabilizante em sede de julgamento é revelador da sua indiferença pela obrigação de providenciar pelo pagamento de alimentos ao filho menor, obrigação que vem violando há vários anos não obstante tenha tido condições para quase sempre a cumprir e quando não teve (se é que tal aconteceu) nada fez para alterar ou justificar esse situação de incumprimento, estando atualmente e segundo diz desempregado, mas ainda assim na posse de património que pode ser reafectado ao gozo ou satisfação das necessidades alimentares do filho.

Nesta decorrência apenas a pena de prisão se mostra adequada a satisfazer as exigências de prevenção geral de integração e as evidentes exigências no caso de prevenção especial de socialização

     Como ao caso cabem penas alternativas, privativa e não privativa da liberdade, «o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição» (artº 70º do CP). Como daqui se vê, verificados estes pressupostos de prevenção e de repressão do crime, o tribunal está vinculado a dar preferência à pena não detentiva. Isso vale como princípio. No caso concreto o Tribunal deu preferência fundamentada à primeira (pena de prisão), uma vez que as exigências de prevenção e de reprovação são prementes.

     A este propósito, a sentença recorrida acentuou, por um lado, o largo período de tempo por que perdurou a omissão ilícita do arguido (quase 10 anos) e, por outro, a sua personalidade, traduzida em alguma indiferença perante as suas obrigações parentais.

     É aqui de alguma pertinência evocar a jurisprudência deste TRC, no seguimento do que fez o Ex.mo PGA no seu douto parecer, constante do ac. de 29/9/2010, proc.462/06.2TATMR, pesquisado in www.dgsi, assim traçada:

«Na violação da obrigação de alimentos sendo um crime contra a família (um dos pilares da nossa sociedade), não tendo o arguido consciencializado o mal do crime, não manifestando qualquer arrependimento, tratando-se de situação prolongada no tempo, revelando grande indiferença no cumprimento da obrigação em causa, é de aplicar pena detentiva

     Esta jurisprudência assenta que nem uma luva ao nosso caso concreto, sendo que justifica a opção pela alternativa pena de prisão em detrimento da pena de multa; são assim menorizadas as circunstâncias invocadas pelo recorrente, quais sejam as da confissão parcial (que aliás não ocorreu, por ter sido julgada inverificado em 2.2.2, na sentença) e o seu estatuto de primodelinquente.

     A tudo isto acrescem as invocadas necessidades de prevenção geral, dada a natureza dos interesses em causa, protegidos pela incriminação.

     Por isso, não merece censura a sentença ao optar pela alternativa pena de prisão.

Na primeira parte das suas conclusões, muito embora o recorrente ponha o acento tónico na questão formal da nulidade da sentença por omissão de pronúncia, que já apreciámos, não é menos certo que também põe em causa a sua substância, ao invocar que, para subordinar a suspensão da pena de prisão ao cumprimento de obrigações, o tribunal recorrido deveria ter procedido a «um juízo de prognose de razoabilidade acerca da satisfação da sua condição legal por parte do arguido».
       O artº 50º, 1, do CP dispõe que «o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição».
     Como escreveu Landrove (apud Carlos Suárez-Mira Rodrigues e outros, in ‘Manual de Derecho Penal. Tomo I., Parte General’, 2ª ed., pag. 446) mediante esta figura «o condenado fica dispensado da execução da pena prevista na sentença, mas debaixo da ameaça de que, se não cumpre determinadas condições durante um tempo especificamente assinalado, terá lugar a execução suspensa.»

       Para avaliar se no caso deverá aplicar-se essa medida de protecção do arguido, tendo em vista a sua reinserção social, teremos em conta as circunstâncias atinentes à sua personalidade, às suas condições de vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e as circunstâncias deste.

       O tribunal recorrido entendeu suspender a execução da prisão, por acreditar que o juízo de prognose referido favorecia o recorrente. No entanto, sujeitou essa suspensão ao cumprimento de duas condições, a saber:

«- Liquidar no prazo desses 12 (doze) meses pelo menos 35% do valor das prestações de alimentos vencidas e não pagas desde o mês de Dezembro de 2004 a Maio de 2014, acrescida das atualizações, no valor global de 4.827,75 €, por qualquer forma de satisfação civil de um crédito, disso documentando os autos.

- Retomar imediatamente o pagamento das prestações de alimentos vincendas ou requerer qualquer incidente tendente à sua alteração.»

     Dispõe o artº 51º, 1, do CP, que «a suspensão da execução da pena de prisão pode ser subordinada ao cumprimento de deveres impostos ao condenado e destinados a reparar o mal do crime (…)»; todavia, como limite, impõe no seu nº 2 que «os deveres impostos não podem em caso algum representar para o condenado obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir».

Daqui resulta que para além da sua vertente pedagógica, a suspensão condicionada tem também uma outra vertente, qual seja a de reparação do dano causado; todavia, o limite inultrapassável dessa condição é a sua exequibilidade por parte do condenado. Ou seja, não será de sujeitar a suspensão da execução da prisão a uma condição que se anteveja de impossível ou, pelo menos, de muito difícil cumprimento.

     No caso concreto não se apurou que o recorrente tenha qualquer fonte de rendimento, antes pelo contrário, de forma inconcludente, deu-se como provado que ele se diz (?!) desempregado; apurou-se que tem bens imóveis inscritos no registo predial (ou pelo menos fracções dos mesmos) e que é proprietário de um automóvel Mercedes do ano de 2001; que é casado e vive com a mulher em casa própria, pagando empréstimo bancário de valor não apurado; que paga 105 euros mensais de alimentos a um outro filho.

     Ou seja, do que acaba de se referir resulta que o arguido não possui, ou pelo menos não lhe são conhecidos, proventos imediatos que lhe permitam fazer face à satisfação da condição aposta à suspensão da execução da prisão; nem parece que sejam imediatamente (no prazo de um ano) convertíveis em liquidez os imóveis e outro património que possui. Por isso, deve a questão do pagamento das pensões em dívida ser relegada para os competentes meios executivos, por se não afigurar curial obrigar o arguido a fazê-lo no presente processo crime, face à falta de prova de existência de liquidez da sua parte. Do mesmo modo, o segundo segmento da condição, de retomar imediatamente o pagamento das prestações de alimentos vincendas, se nos afigura redundante, já que não o fazendo, e verificados os demais pressupostos de que depende o preenchimento do tipo de crime da previsão do artº 250º do CP, o arguido voltará a reiterar na prática criminosa, assim praticando novo crime, por que poderá ser novamente punido.

     Termos em que se acorda em:

- Negar provimento ao recurso intercalar;

- Conceder parcial provimento ao recurso interposto da sentença final, revogando-a apenas na parte em que apôs duas condições à suspensão da execução da prisão, no mais a confirmando.

Sem tributação.

Coimbra,11 de Março de 2015

 

(Jorge França - relator)

(Fernanda Ventura - adjunta)