Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1625/19.6T8CBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: SÍLVIA PIRES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
CULPA DO LESADO
CULPAS CONCORRENTES
RESPONSABILIDADE PELO RISCO
DANO DA PERDA DA VIDA
DANOS SOFRIDOS PELO CÔNJUGE E FILHOS DO LESADO
Data do Acordão: 06/13/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 35.º, 1; 44, 1 E 2 E 60.º, 2, B), DO CÓDIGO DA ESTRADA
ARTIGOS 494.º; 496.º, 2 E 4; 503.º, 3; 534.º; 570.º, 1 E 2 E 804.º A 806.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I. A lei admite que uma responsabilidade que é baseada apenas numa presunção de culpa, não existindo a prova de factos que confirmem o raciocínio presuntivo, como sucede neste caso, relativamente ao condutor do veículo automóvel, possa ser ilidida através da prova de que um comportamento culposo do lesado foi causal do acidente, tendo sido essa a estratégia seguida pela Ré Seguradora.
II. Aceitando-se no nosso direito que a condução de um veículo por conta de outrem é criadora de maiores riscos para a segurança nas estradas e que denuncia uma maior disponibilidade de recursos, num eventual litígio, sobrecarregou-se o ónus probatório da posição deste tipo de condutores, favorecendo-se os lesados.
III. O afastamento da responsabilidade destes condutores deve, assim, resultar da prova de uma ausência de culpa, a qual poderá resultar da prova da suficiência causal da conduta culposa do lesado.
IV. Subsistindo dúvidas não esclarecidas sobre uma eventual concausalidade na eclosão do evento danoso, a presunção de culpa não se deve considerar totalmente ilidida, permanecendo operante, embora debilitada pelo contributo culposo do lesado, justificando-se a adoção de uma solução concursal, nos termos do art.º 570º, n.º 1, do C. Civil.
V. Assim, no presente caso, deve considerar-se que a conduta culposa do condutor do ciclomotor lesado é concausal com a presunção de culpa que incide sobre o condutor do veículo automóvel, que não se mostra totalmente ilidida, importando, por isso, nos termos do art.º 570º, n.º 1, do C. Civil, determinar a proporção da responsabilidade a atribuir ao lesante, pela qual responde a Ré seguradora, por força do contrato de seguro celebrado.
Decisão Texto Integral:
Relatora: Sílvia Pires
Adjuntos: Henrique Antunes
                Cristina Neves


Autores: AA
               BB

Ré: Fidelidade Companhia de Seguros, S.A.

                                                 *

  Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra
Os Autores e a sua mãe, CC propuseram ação declarativa com processo comum, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhes a indemnização global de € 228.000,00, acrescida de juros de mora desde a citação da Ré.
Alegaram que o seu pai e marido, respetivamente, faleceu na sequência de um acidente de viação imputável ao condutor de um veículo seguro na Ré.

Contestou a Ré, alegando que o acidente se deveu a culpa da vítima e impugnando alguns dos danos alegados e sua valoração.
Concluiu pela improcedência da ação.

Os Autores corrigiram pontualmente a petição inicial a convite do tribunal.

Foi realizada a audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou improcedente a ação, absolvendo a Ré do pedido formulado, tendo-se consignado que não se vislumbra má fé de qualquer das partes.

                                                 *

Os Autores e a sua mãe interpuseram recurso desta decisão, formulando as seguintes conclusões:
1. O Tribunal da 1ª Instância, salvo o devido respeito, errou de forma notória e evidente no julgamento da matéria de facto, dando factos como provados, quando há elementos factuais objetivos que os colocam totalmente em causa.
2. Desde logo, a matéria de facto constante do ponto 3º dos factos dados como provados, que jamais deveria ter sido dada como provada.
3. Naquele ponto, o Tribunal deu como provado que “o condutor do ciclomotor de matrícula ..-DU-.. executou a mudança de direção obliquamente na direção do portão da moradia, para onde se dirigia, de forma imprevisível e brusca”.
4. Todavia, no ponto anterior, nº 2, o Tribunal dá como provado que o condutor do ciclomotor “após descrever uma curva que se desenhava à sua esquerda a que se seguia uma reta de mais de 100 metros e de ter percorrido nessa reta cerca de 40 metros em sentido ascendente foi-se aproximando do eixo da via, sinalizando a sua intenção de virar à esquerda para entrar no portão que dá acesso ao logradouro da sua casa de habitação”.
5. E no ponto nº 4 dá como provado que o ciclomotor “foi colhido pelo veículo que circulava em sentido contrário, já dentro do aglomerado urbano da vila de ..., na parte lateral direita, junto ao pousa-pés, projetando-o para a valeta direita da estrada, considerando o sentido de marcha do veículo ligeiro de mercadorias onde ficou imobilizado e consciente”.
6. E, ainda, no ponto 7º, foi dado como provado que “o acidente verificou-se dentro da malha urbana da vila de ..., onde a velocidade é limitada a 40Km/Hora, após essa placa indicativa e num local onde a velocidade máxima permitida é de 40 KM/Hora, conforme placa existente logo a seguir à placa sinalizadora da vila, considerando o sentido de marcha do veículo ..-NJ-..”.
7. No ponto 8º o Tribunal deu como assente que “a estrada no local encontrava-se em bom estado de conservação e tem uma largura de seis metros, sendo que fazia bom tempo, havia boa luminosidade e o piso estava completamente seco”.
8. E nos pontos 9º e 10º deu como provado que não existiam rastos de travagem por parte do condutor do veículo Peugeot e no sentido de marcha seguido pelo ciclomotor, não circulava qualquer veículo no momento em que ocorreu o acidente.
9. Ora, entendem os Recorrentes, que matéria de facto dada como provada no ponto 3º dos factos dados como provados, deve ser dado como não provado, porquanto se baseou apenas no depoimento, pouco credível e contraditório, do condutor do veículo que embateu no ciclomotor e provocou a queda do falecido na valeta, situada na margem a direita da faixa de rodagem por onde circulava o veículo atropelante.
10. Em primeiro lugar, porque a localização dos danos na carrinha, que embateu no poisa-pés do pendura do ciclomotor, se situa no para-choques na parte frontal direita da carrinha, considerando o seu sentido de marcha ...-..., e, por essa razão não coincidem com a versão relatada pelo condutor.
11. Para além disso, a coincidência da existência do buraco nessa zona e dos danos no poisa-pés do pendura do ciclomotor, existente na parte lateral direita, nas proximidades da traseira, revelados pelas fotos contantes dos autos, e que o Tribunal, e as partes, não puserem em causa e que foram confirmados pelas testemunhas DD, perito da Seguradora, pela testemunha EE, pela testemunha FF e até pelo próprio condutor do veículo, que sinalizou o embate e o dano dele proveniente no lado direito do veículo que conduzia, no sentido ...-..., também não coincidem, de todo, com a versão relatada pelo condutor ao Tribunal.
12. Por outro lado, porque a matéria de facto dada como provada e vertida no ponto 4º dos FACTOS PROVADOS, refere, inequivocamente, que o ciclomotor foi colhido pelo veículo que circulava em sentido contrário, já dentro do aglomerado urbano da vila de ..., na parte lateral direita, junta ao poisa-pés do pendura, projetando-o para a valeta direita, considerando o sentido da marcha do veículo ligeiro de mercadorias, onde o seu condutor ficou imobilizado e consciente.
13. Ora, como o poisa-pés se destina ao pendura do condutor, tal significa que o ciclomotor estava preparado para transportar o condutor e outra pessoa, como se observa pelas fotos juntas aos autos, situando-se na parte lateral, mais próxima da traseira do dito veículo.
14. Acresce que, é o próprio condutor que, nas declarações prestadas
em audiência de julgamento refere que, conforme se transcreve
“(…) vinha em sentido contrário ao senhor da motorizada, eu avistei o senhor da mota e ele vinha encostado ao centro da faixa de rodagem a uma velocidade moderada, ele vinha devagar. E vinha a olhar, eu fiquei com a ideia que ele estava a olhar para umas pessoas que estavam do outro lado da rua numa casa lá em cima. E eu pensei o senhor viu-me eu vou passar e ele está a aguardar que eu passe para fazer a transversão, para... como é que eu hei de dizer, ele queria cortar para o lado, para o lado contrário da estrada, ou seja, ia-me cortar a minha passagem. Mas eu fiquei com a ideia que ele me viu e que estava a aguardar que eu passasse por ele para ele fazer, então, a mudança de direção, entrava lá para o portão dele ou o que seja, para a casa. No entanto, o senhor, de repente, cortou à minha frente e eu não tive, não consegui parar, pronto. Não tive reação, não deu para parar.” (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:07:29).
15. Referindo, ainda, que o senhor da motorizada ia muito devagar ao centro da via, sem o pisca ligado e não estava parado e que ficou com a ideia de que ele queria virar à esquerda, porque estava ao centro da estrada a olhar para o outro lado (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:09:41 a 00:11:07).
16. Para depois dizer o contrário e confirmar, quando instado pelo mandatário dos Autores, que, afinal, a motorizada tinha o pisca ligado (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:13:45 a 00:14:01) e que “ (…) o embate foi na estrada.” (Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:14:14)..
17. Refere o dito condutor do veículo ligeiro de mercadorias que quando o ciclomotor iniciou a mudança de direção a distância “(…) não eram mais de 10, 15 m.” (Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:15:58).
18. Retificando, de seguida, referindo que era muito menos que isso e que não chegava a 10m (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:16:12 a 00:16:18).
19. Confirmou, o mesmo condutor, a instâncias do mandatário dos Autores, que vinha na sua mão de trânsito, encostado à direita e que “ (…) a mota ficou logo em frente ao carro, não deve ter fugido mais de 1 m (…) e que (…) ficou praticamente à frente do carro. O senhor ficou, também não ficou, ficou logo ao lado, ficou na valeta. Só que a mota como vinha na perpendicular, talvez seja por isso que o senhor tenha caído mais para valeta.” (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:18:37 a 00:18:49).
20. Mais confirmou que não vinha nenhum carro em sentido contrário (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:20:22) e ainda, que bateu com a carrinha “(…) talvez um palmo à direita do centro” “Com a frente do veículo.” E “Com o para-choques (…).” (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minutos 00:21:02, 00:21:30 e 00:21:35).
21. E que, quando avistou o veículo “(…) não vinha a mais de 50 km/h.” (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:23:42). Mas que não sabia se, naquele local havia limite de velocidade ou qual era, efetivamente, esse limite (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:23:51).
22. Confirmando que foi ele que bateu e que viu que a grelha do carro “(…) tinha lá uma marcazinha onde bateu (…) (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:24:44).
23. Perante tudo o que se acaba de descrever, não se compreende, como é que o Tribunal considerou credível o depoimento desta testemunha, se as contradições existentes no mesmo são notórias, evidentes e diversificadas, e são desmentidas de forma total pela localização dos danos comprovados pelas diversas fotografias, juntas pela própria Ré, pelo Sr. Perito da Seguradora e testemunhas que estiveram no local logo após acidente e cujo depoimento é escrito na motivação da decisão de facto, pelo próprio Tribunal.
24. Em primeiro lugar, pelas declarações prestadas pelo condutor do veículo que embateu no ciclomotor do sinistrado falecido, ficamos sem saber se a mudança de direção foi feita de forma perpendicular ou oblíqua.
25. Por um lado, porque nessa altura, ou seja, no dia do acidente e uns dias depois, quando a mente e memória ainda estavam bem frescas, nunca o condutor referiu que o ciclomotorista mudou de direção de forma oblíqua.
26. Por outro, porque só no dia em que foi ouvido pelo Tribunal (ou seja, mais de 6 anos após o acidente), é que veio fazer tal afirmação, em contradição com a descrição, que começou inicialmente por fazer perante o Tribunal.
27. Aliás, é o próprio Tribunal que, em 2º dos factos dados como provados, dá como provado que o condutor do ciclomotor, após descrever uma curva que se desenhava à sua esquerda, percorreu cerca de 40 metros em sentido ascendente e foi-se aproximando do eixo da via, sinalizando a sua intenção de virar à esquerda, para entrar no portão que dá acesso ao logradouro da sua casa de habitação.
28. A versão veiculada pelo depoimento da testemunha EE, cuja credibilidade não foi posta em causa pelo Tribunal, foi de que o veículo que provocou o embate circulava muito próximo da berma da estrada e que viu a carrinha, já parada e o corpo já no ar em queda, ficando este na valeta, a carrinha, em frente ao portão e a mota, de rastos, à beirinha da estrada, acrescentado que o corpo ficou cerca de dois metros à frente do carro, na valeta que confina com o alcatrão (cfr. Faixa 20220106103627_2823068_2870705.wma, Minuto 00:13:25 a 00:16:23). Referindo, ainda, que a mota foi atingida no “poisa pés” do “pendura”, do lado direito e a carrinha tinha um buraco sobre o lado direito do para-choques à frente (cfr. Faixa 20220106103627_2823068_2870705.wma, Minuto 00:18:52 a 00:19:07).
29. Versão essa, descrita pelo próprio no Tribunal, sob a epígrafe “motivação da decisão de facto”, na Sentença recorrida a fls. 6.
30. Como é, inclusive, a fls. 7 da Sentença, reproduzido o depoimento da testemunha FF, filha do autor BB, neta do falecido, que esteve no local, quando o avô já estava numa maca.
31. A referida testemunha (FF) disse que os Autores fizeram medições da via e afirmou que do portão de entrada, onde terá ocorrido o acidente, à curva do lado do ..., distam 90 metros e à curva do lado de ..., 40 metros, e que neste espaço é possível avistar a faixa de rodagem em toda a sua extensão (cfr. fls. 7 da Sentença recorrida).
32. O Tribunal, na Sentença recorrida, nunca colocou em causa a credibilidade nem desta testemunha, nem da testemunha EE. No entanto, no que concerne às concretas circunstâncias do embate, valorou apenas o depoimento do condutor da carrinha, considerando não haver contradições no mesmo, quando é manifesto, como já foi supra referido, que há notórias contradições em todo o seu depoimento.
33. Desde logo, ao referir que avistou um veículo motorizado que se aproximava do centro da via, no sentido oposto, sem o pisca ligado. No entanto, ao ser confrontado com as declarações feitas ao militar da G.N.R no local do acidente, admitiu que o ciclomotorista trazia o pisca esquerdo ligado.
34. Idêntica afirmação fez ao averiguador da Seguradora, DD, em 28/03/2016, ou seja, que circulava no sentido ...- ..., e no sentido contrário, encostado ao eixo da via, circulava um ciclomotor que trazia sinal com pisca da esquerda, e quando estava perto do mesmo, este muda bruscamente para a esquerda, provavelmente para se dirigir para a sua residência, tendo ocorrido o embate, mais sobre a direita do veículo que conduzia e lateral direita do ciclomotor.
35. Para além disso, é muito estranho que, tal como já se acentuou, a testemunha não desse conta de sinais estradais bem visíveis (conforme referiu), antes do local do acidente, ou seja, a Placa indicativa da entrada na Vila de ..., seguida da placa limitativa de velocidade de 40km/hora, bem como, foi possível ver pelo Tribunal, na inspeção ao local, uma outra placa, muito próxima desta, com o sinal triangular de perigos vários, com ponto de exclamação.
36. Só não daria conta desses sinais se fosse completamente desatento e distraído da sua condução, como certamente aconteceu.
37. Para depois ainda admitir que o condutor do motociclo seguia muito devagar, mas que nunca parou junto ao eixo da via. Não se recordando se ele ligou o pisca, mas admitindo esse facto como provável e que o embate se deu quando ele já estava no meio da sua faixa de rodagem.
38. E que o condutor do motociclo cortou a estrada obliquamente, apesar de ter referido, anteriormente, em Tribunal, que tinha sido perpendicularmente.
39. Assim, é bom de ver, que não pode dar-se como provado que o condutor do ciclomotor se atravessou obliquamente à frente da carrinha que embateu no poisa pés do pendura. Até porque, é próprio condutor que admite, a instâncias do mandatário dos Autores, que “a mota como vinha na perpendicular, talvez seja por isso que o senhor tenha caído mais para valeta.” (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:18:49).
40. Também não é possível admitir que é credível uma tese de súbita mudança de direção do condutor do motociclo, quando é o próprio condutor da carrinha que diz que o ciclomotorista vinha em sentido ascendente e contrário, muito devagar e com o pisca esquerdo ligado e que ele conduzia a sua carrinha na sua mão de trânsito, próximo da berma direita.
41. Aliás, a curva que o condutor da carrinha descreveu, como ele confirmou, é ligeira, com boa visibilidade, como as várias fotos juntas aos autos demonstram, permitindo a quem circulasse no sentido ... – ..., ter uma visibilidade ampla e alongada, como até o próprio Tribunal confirmou no local.
42. Por outro lado, o acidente ocorreu numa localidade, onde o limite máximo de velocidade é de 40km/hora, onde existem moradias com entradas para a estrada de um lado e do outro.
43. Impõe-se, por isso, a todos os condutores, a máxima cautela e prudência na condução, naquelas condições.
44. No caso concreto, apercebendo-se o condutor da carrinha que o ciclomotor circulava junto ao eixo da via, devagar, para virar à sua esquerda, conforme confirmado pelo mesmo, com uma antecedência suficiente para reduzir a sua velocidade, se estivesse atento e conduzisse com prudência, estava em perfeitas condições de imobilizar imediatamente o seu veículo, caso o ciclomotor tentasse atravessar a parte da estrada onde ele circulava.
45. Ora, o condutor da carrinha, começa por dizer que o viu o ciclomotorista a longa distância, para depois dizer que ele atravessa a estrada, a 10/15 metros da sua carinha, para depois referir, contrariamente, que afinal seriam menos de dez metros.
46. Referindo ainda que travou, mas que não deixou rastos de travagem, demonstrando que não travou a fundo, ou na totalidade, o que nas circunstâncias que o mesmo descreveu, se impunha, e era possível, se a velocidade a que circulava fosse reduzida se se circulasse atentamente.
47. Como se deu como provado na douta Sentença de que se recorre, que o piso da estrada estava completamente seco, é óbvio que qualquer travagem mais funda deixaria marcas visíveis na estrada (rastos de travagem).
48. Não era de todo imprevisível, nas condições relatadas pelo condutor da carrinha, que o ciclomotorista, não pudesse virar à esquerda, tanto mais que havia um portão, e o próprio admite que pensava que o condutor do ciclomotor ia mudar de direção, para entrar em casa (cfr. Faixa 0220106160809_2823068_2870705.wma, Minuto 00:07:29).
49. Perante todo este cenário, é mais que evidente, que a tese defendida pelo condutor da carrinha, não pode ter o mais pequeno suporte de verdade, estando totalmente ferida da credibilidade que o Tribunal lhe quis dar.
50. Aliás, porque se a viragem à esquerda do ciclomotorista fosse súbita, é óbvio, que os danos da carrinha/mancha/furo não podiam situar-se no lado direito da mesma, como as fotos, as testemunhas e o próprio referiram, considerando o seu sentido de marcha.
51. Ora, ficou provado que os danos do motociclo situavam-se no lado direito do mesmo, próximo da traseira, através do depoimento das testemunhas EE, DD, FF, neta do falecido a até do depoimento do próprio condutor (ao admitir que os danos na carrinha se situavam do lado direito, considerando o seu sentido de macha) e ainda pelas várias fotos constantes dos documentos juntos pela Ré, Seguradora e pelo perito averiguador.
52. E também, resultou dos mesmos meios de prova, que os danos de embate no ciclomotor, localizavam-se no poisa-pés do pendura, equipamento esse, que é utilizado pelo ou pela acompanhante do condutor do ciclomotor e que se situa na sua lateral direita, mais sobre a traseira do ciclomotor.
53. Ora, se a dinâmica do acidente fosse aquela que é descrita pelo condutor da carrinha em causa nos autos, os danos no mesmo veículo teriam que se localizar na frente, do lado esquerdo do dito veículo, considerando o seu sentido de marcha, e na lateral direita do ciclomotor, na parte mais avançada. O que não aconteceu.
54. A testemunha EE, no seu depoimento, diz claramente, que o sogro lhe transmitiu, na Unidade de Cuidados Continuados, que o ciclomotor já estava com a frente totalmente na serventia, quando foi embatido pelo veículo no poisa-pés do pendura. E que a explicação dada pelo sogro é de que viu a carrinha a descrever a curva ligeira, localizada muito mais acima, e atravessou na convicção de que tinha tempo de entrar na serventia de casa, sem risco algum.
55. E, aliás, é esta a única versão lógica e possível do sucedido.
56. Da matéria dada como provada e, especialmente, de tudo o que se acaba de expor, é evidente que os pontos 3º,5º e 26º da matéria de facto dada como não provada devem ser dados como provados. E que o ponto 31º da matéria de facto dada como não provada encontra-se em clara contradição com os pontos 23º e 25º da matéria de facto dada como provada. Isto porque:
57. Perante a localização dos danos no para-choques direito da carrinha e na parte lateral direita traseira, junto ao poisa-pés, do ciclomotor, a única conclusão a que se poderia chegar, e a mais lógica, era que o ciclomotor, quando ocorreu o embate, já se encontrava com a frente dentro da serventia, junto ao portão, e que a carrinha lhe bateu na parte traseira, projetando-o para a valeta.
58. Isto porque, se a versão dada como provada na Sentença, descrita pelo condutor, pudesse colher efeito, os danos do ciclomotor teriam que ser visíveis na parte lateral direita, sob a frente, e na Carrinha, no para-choques esquerdo. E não são, como é possível verificar pela prova documental junta e pela versão relatada pelas várias testemunhas.
59. Assim, deveria ter sido dado como provado o ponto 3º dos factos dados como não provados, ou seja, que o embate se deu quando “já se encontrava com a frente do velocípede na entrada do dito portão (com a roda da frente na serventia particular) ”.
60. Para além disso, é evidente que o condutor da carrinha não tomou as devidas precauções, circulando com a cautela necessária, como se impunha no caso concreto, para poder parar imediatamente.
61. Em primeiro lugar, porque é o próprio que admite, perante o Tribunal, que não sabia se, naquele local havia limite de velocidade ou qual era, efetivamente, esse limite. O que revela que nem se quer reparou na placa indicativa de localidade que se encontrava no local, nem nos sinais existentes no mesmo, com indicação de perigos vários e limite máximo de velocidade (40 km/h), circulando com falta de cuidado e desatento.
62. Se circulasse com a precaução que era devida, teria mais que tempo para reduzir a velocidade, e conseguir travar imediatamente, se fosse necessário.
63. Mas se a versão do condutor pudesse ter alguma coerência, se circulasse com a prudência que se impõe a um condutor médio, sempre teria a possibilidade, ainda, de contornar o obstáculo, pela sua esquerda, numa manobra de recurso, porquanto não havia, conforme referido pelo mesmo, outros veículos a circular em sentido contrário (como, aliás, foi dado como provado em 10º dos factos provados).
64. Pelo que, deveria ter sido dado como provado, que o condutor do veículo ligeiro, “não tomou as devidas precauções de forma a circular com a cautela necessária e a velocidade adequada de forma a evitar o acidente e a sustar a marcha de imediato”, em clara violação do Código da Estrada.
65. No que concerne ao facto dado como não provado no ponto 26º, a testemunha EE, no seu depoimento, diz claramente, que o sogro lhe transmitiu, na Unidade de Cuidados Continuados, que viu a carrinha a descrever a curva ligeira, localizada muito mais acima, e atravessou na convicção de que tinha tempo de entrar na serventia de casa, sem risco algum (cfr. Faixa 20220106103627_2823068_2870705.wma, Minutos 00:51:26 a 00:52:00, Minutos 00:53:08 a 00:54:06 e Minutos 00:54:20 a 00:55:07).
66. O Tribunal, apesar de nunca ter posto em causa, na Sentença recorrida, a credibilidade desta testemunha, considerou, impercetivelmente, como não provado, o facto descrito em 26º, que foi relatado por aquela, no seu depoimento, de forma verdadeira e credível.
67. Relativamente, ao facto dado como não provado sob o ponto 31º, não se percebe como é que o Tribunal o dá como não provado, se, anteriormente, nos factos dados como provados considera, em 23º e 25º que “antes do acidente, o sinistrado era uma pessoa perfeitamente autónoma, deslocando-se praticamente todos os dias para o centro da vila de ... para conviver com amigos e familiares” e que “era um homem bem-disposto, trabalhador e cheio de alegria de viver”.
68. Então se o falecido tinha todas essas características descritas na matéria de facto dada como provada, reveladoras da forma alegre positiva de encarar a sua existência, é óbvio que, para ele, a vida tinha um valor elevadíssimo.
69. Tendo isto em conta, se o Tribunal tivesse dado como não provado o facto 3º dos factos dados como provados e como provados os factos 3º, 5º, 26º e 31º dos factos dados como não provados, como deveria, conforme supra se demonstrou, só poderíamos chegar a uma conclusão: o condutor do veículo ligeiro teve culpa exclusiva na produção do embate ocorrido, constituindo-se na obrigação de indemnizar, nos termos dos art.ºs 483º e 487º do Código Civil, quer em sede patrimonial, quer em sede não patrimonial (art.º 496º do mesmo diploma legal).
70. Para além disso, essa culpa evidente, presume-se, nos termos do art.º 503º, nº3 do CC, uma vez que a primeira parte desse art.º estabelece uma presunção de culpa do condutor do veículo por conta de outrem pelos danos que causar (Assento do STJ 1/83 de 14/04/1983), pelo facto do mesmo, causador do acidente, prestar serviços por conta e risco, e sob a direção, de uma empresa ligada ao Grupo A... (conforme, aliás, foi dado como provado na sentença em 5º e 12º dos factos dados como provados).
71. Mesmo que assim não fosse, numa hipótese remota e meramente académica, admitindo-se que, não se podia determinar a dinâmica concreta do acidente, de forma a poder-se atribuir a culpa efetiva ao condutor do veículo ligeiro, deveria ter-se recorrido ao regime da responsabilidade pelo risco, tal como é definido no art.º 506º do CC, na medida em que o embate ocorreu por motivos ligados à circulação rodoviária, incluídos no próprio risco dessa circulação.
72. Devendo, nessa hipótese remota, a responsabilidade ser repartida entre o condutor do motociclo e o condutor do veículo ligeiro, em proporções, no entanto, claramente distintas.
Isto porque, devemos ter em conta, que veículo ligeiro automóvel contribuiu, necessariamente, com maior proporção de risco, para a produção do acidente, dado o seu maior volume, peso e dimensão, características que aumentam, claramente, o risco deste veículo, relativamente ao risco representado pelo motociclo. Mesmo que fosse este, em ultima ratio, o entendimento a seguir, deveria a Ré Seguradora ter sido condenada a indemnizar os herdeiros do falecido, na respetiva proporção do risco produzido pelo veículo segurado, sendo fixada num valor nunca inferior a 70% (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Proc. 326/17.4T8GRD.C1, de 05/11/2019).
73. Assim, a Sentença recorrida violou, entre outros, os art.ºs 27º e 28º do Código da Estrada, os nºs 1 e 2 do art.º 483º, os nºs 1 e 2 do art.º 487º, o nº1 do art.º 495º, o art.º 496º e os nºs 1 e 3 do art.º 503º, o nº1 do art.º 501º e o art.º 506º, todos do Código Civil.
TERMOS em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida e fixando-se a indemnização, a pagar pela Ré, em conformidade com os pedidos formulados pelos Autores.          

A Ré apresentou resposta, concluindo pela seguinte forma:
A) A matéria de facto – único fundamento do recurso – está devidamente fundamentada, quer nas conclusões que extraiu dos documentos quer na inspecção ao local quer na convicção firmada nos depoimentos testemunhais, não havendo razão para que seja alterada.
B) Quando está devidamente fundamentada a razão da credibilidade de uma testemunha, o recurso com base na matéria de facto extraída do depoimento dessa testemunha, é até insindicável, por estar no domínio das livre convicção do juiz. O que é sindicável é a decisão que assenta em testemunho não credível porque infundado ou porque inquina a prudente e livre convicção, não já quando o juiz fundamenta a razão da credibilidade.
C) Os AA, porque a sentença não os condenou, como foi pedido, em litigantes de má-fé, devem agora ser condenados, suprindo a omissão ou oficiosamente, se assim melhor se entender.
D) Condenados como litigantes de má-fé porque juntaram um documento falso e que foi junto como justificativo da matéria alegada na PI.
E) Condenados como litigantes de má-fé ainda porque não explicaram a falsificação, o autor da falsificação e o modo como foi obtido e junto ao processo.
F) Condenados como litigantes de má-fé porque, depois das conclusões D e E), interpuseram o presente recurso.
G) A gravidade da litigância de má-fé impõe que se aplique a multa, a taxa sancionatória excecional e a indemnização à Ré, nos montantes que se julguem dissuasores, como exemplo e, simultaneamente, equânimes.
H) Foi violado o 542 do CPC.

Entretanto, faleceu a mãe dos Autores, tendo estes sido habilitados, como seus sucessores, para ocuparem a sua posição nesta ação.

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1. Do objeto do recurso
A Ré, na resposta às alegações, sem que tenham ampliado o objeto do recurso, pediram que os Autores sejam condenados em multa e indemnização, por litigância de má-fé, por, na 1.ª instância, terem junto um documento alegadamente falsificado e por terem recorrido da sentença proferida, apesar desse seu comportamento processual.
Quanto ao comportamento processual dos Autores na 1.ª instância, a sentença recorrida já proferiu decisão, tendo a Ré dela recorrido, pelo que a mesma transitou em julgado, não podendo ser apreciada nesta instância de recurso, pelo que apenas resta a apreciação da alegada má-fé pela interposição do recurso.
Considerando que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas nas alegações questões a apreciar são as seguintes:
- Deve ser alterado o resultado da prova, relativamente ao facto provado n.º 3 e aos factos não provados n.º 3, 5. 26 e 31?
- O condutor do veículo automóvel é o responsável pelo acidente?
- A Ré seguradora deve sempre responder pela responsabilidade pelo risco, nos termos do art.º 503º, n.º 1, do C. Civil?
- Os Autores devem ser condenados por litigância de má-fé, por terem interposto recurso da sentença proferida na 1.ª instância?

*

2. Os factos
2.1. Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto
Os Autores discordam do julgamento como provado do facto n.º 3 e dos não provados sob os n.º 3, 5, 26, e 31, pretendendo que, após reapreciação dos meios de prova que identificam os mesmos, sejam alterados.
O facto provado n.º 3 é o seguinte:
3º O condutor do ciclomotor de matrícula ..-DU-.. executou a mudança de direção obliquamente na direção do portão da moradia para onde se dirigia de forma imprevisível e brusca.
Os Autores discordam que a mudança de direção do ciclomotor tenha sido efetuada de forma oblíqua, imprevisível e brusca.
A prova deste facto assentou essencialmente no depoimento de GG, condutor do veículo segurado pela Ré, o que foi justificado na sentença recorrida nos seguintes termos:
GG, disse que prestava serviço para a A... e o veículo estava em leasing ao serviço da A..., estava a regressar de prestação de um serviço, referiu que seguia em direção a ..., que no sítio do acidente existe uma ligeira curva, seguia em sentido contrario à motorizada, avistou o senhor da mota, [quando saiu da curva avistou mas não consegue precisar a distância, ele seguia muito devagar ao centro da via], deu-lhe ideia que ele estava a olhar, pensou que ele estava a aguardar que o depoente passasse, ele queria virar à esquerda [porque ele estava ao centro da estrada a olhar para as pessoas que estavam do lado esquerdo considerando o sentido em que ele seguia], no entanto de repente ele cortou à sua frente e “não teve reação, não deu para parar”. O condutor do motociclo seguia muito devagar, mas nunca parou junto do eixo da via. Não se recorda se ele ligou pisca, mas admite esse facto como provável. O embate deu-se quando ele já estava no meio da sua faixa de rodagem. O condutor do motociclo cortou a estrada obliquamente. Ainda chegou a travar, mas não deixou qualquer rasto de travagem. A moto ficou logo em frente ao carro. A vítima ficou logo ao lado na valeta. O depoente seguia na sua mão de trânsito e não seguia outro veículo em sentido contrário. O embate deu-se a um palmo do centro para o lado esquerdo (estando na posição de frente para o veículo). Seguia a não mais de 50Km/hora [“eu não vinha a mais de 50 km/hora”].
Porque o considerou credível, o tribunal valorou este depoimento no que concerne às concretas circunstâncias que terão determinado o embate.
Sendo o único a tal respeito, importa dizer porquê.
 Primeiro tratou-se de um depoimento sem quaisquer contradições em si mesmo.
Logo na ocasião do acidente o condutor GG descreveu assim o acidente ao militar da GNR3: “circulava na Estrada Nacional ...44 no sentido ... – ... e, ao chegar ao local do acidente avistei um veículo motorizado que estava no centro da via no sentido oposto e com o pisca esquerdo, ao aproximar-se do veículo motorizado, este subitamente muda de direcção. Neste momento já estava muito próximo do outro veículo, travando, ainda assim, não conseguiu evitar o embate”. E disse ao averiguador da seguradora em 28/3/2016: “circulava no sentido ...-..., no sentido contrário, encostado ao eixo da via, circulava um ciclomotor que trazia sinal com pisca da esquerda, e quando estou perto do mesmo, este muda bruscamente para a esquerda, provavelmente para se dirigir a sua residência, tendo ocorrido o embate entre a frente, mais sobre a direita do veículo que eu conduzia e a lateral direita do ciclomotor, tendo este sido projectado para o chão com o seu condutor. Não houve testemunhas e chamei de imediato o 112, tendo vindo a ambulância de ... e GNR d .... Não sofri qualquer dano corporal nem material pessoal”4.
Isto significa que a testemunha manteve basicamente a mesma versão dos factos sem contradições.
E foi sincero. O que transpareceu do já referido. Mas também da sua atitude: foi confrontado, no final do seu depoimento, com o facto de a vítima ter falecido. Disse que nem sabia que a vítima tinha falecido. Pareceu-nos perturbado genuinamente até porque tentou não manifestar a sua emoção.
Por último os elementos do processo confirmam o teor deste depoimento. Foram escassos os danos materiais quer no ciclomotor na zona do pousa-pés do lado direito (cf. fotografias de fls. 220-21) quer no veículo seguro (cf. fotografias de fls. 236 vs-39). Foi reduzida a projeção do ciclomotor atenta a posição final do veículo seguro e do ciclomotor após o acidente, de acordo com as medições constantes do auto de participação do acidente (cf. fls. 297 vs. E 298). Além disso, atentando na existência de uma vala situada na berma da faixa de rodagem no sentido ...-... (seguido pelo veículo seguro), imediatamente antes do provável local do embate (fotografias fls. 297), é dinamicamente impossível que o embate tenha ocorrido na versão trazida pelos autores no art.º 3º do seu articulado, uma vez que tal implicaria que o veículo seguro não podia ter avançado por cima da vala.
Apesar dos Autores pretenderem nas suas alegações descredibilizar o depoimento do condutor do veículo automóvel, apontando algumas contradições de pormenor, atento o seu conteúdo e o modo como foi prestado não há razões para divergir da credibilidade que lhe foi conferida pela sentença recorrida, relativamente aos factos que foram considerados provados.
Quanto ao conteúdo do facto n.º 3 são apenas questionadas três caraterísticas da manobra de mudança de direção efetuada pelo ciclomotor dele contantes. Aí se diz que a manobra foi feita com uma trajetória oblíqua e de modo imprevisível e brusco.
Relativamente à trajetória oblíqua, o depoimento do condutor do veículo automóvel é confirmado pelo local onde no croquis elaborado pela G.N.R. se situa o ponto de embate entre os dois veículos – antes da entrada para o portão que dá acesso ao logradouro da sua casa de habitação, onde o condutor do ciclomotor pretendia entrar – o que revela que a manobra não foi efetuada numa trajetória perpendicular ao eixo da via, mas sim, seguindo um trajeto oblíquo.
Já no que respeita à caraterização dessa manobra como imprevisível e brusca, tendo-se provado que o ciclomotor, na reta onde seguia, se foi aproximando do eixo da via, sinalizando a sua intenção de virar à esquerda para entrar no portão que dá acesso ao logradouro da sua casa de habitação, no que foi avistado pelo condutor do veículo automóvel, os dois adjetivos utilizados não são compatíveis com tais preparativos denunciadores da sua intenção de realizar a manobra de mudança de direção, pelo que têm razão os Autores, devendo essa adjetivação ser eliminada da matéria de facto provada, transitando para a matéria não provada.
O facto não provado n.º 3 tem a seguinte redação:
Quando já se encontrava com a frente do velocípede na entrada do dito portão (com a roda da frente na serventia particular). 
Este posicionamento reporta-se ao ciclomotor (não um velocípede) interveniente no acidente e ao momento em que ocorreu o embate com o veículo automóvel.
Sobre este posicionamento apenas depôs, como testemunha presencial, o condutor do veículo automóvel que referiu que o embate se deu quando o ciclomotor já estava no meio da sua (do veículo automóvel) faixa de rodagem, e noutro momento do seu depoimento que se deu a um palmo do centro para o lado esquerdo (atento o sentido de macha do veículo automóvel).
Apesar de estar provado que o ciclomotor foi embatido na zona do pousa-pés, que no croquis elaborado pela GNR a hemifaixa da via por onde transitava o veículo automóvel mede cerca de 3 metros de largura e que a distância da berma direita, atento o sentido de marcha do veículo automóvel, à parte da frente deste, após o embate, era de 0,90 cm, revelando a foto do veículo automóvel junta aos autos danos na parte direita da grelha, o que indicia que, quando o embate ocorreu a roda da frente do ciclomotor já se encontraria perto da berma direita, não é possível, contudo, concluir que ela já se encontrava na serventia que dá acesso ao portão da casa de habitação do Autor, pelo que tal facto deve permanecer entre os factos não provados.
 O facto não provado n.º 5 tem a seguinte redação:
O condutor do veículo ligeiro supra referido, não tomou as devidas precauções de forma a circular com a cautela necessária e a velocidade adequada de forma a evitar o acidente e a sustar a marcha de imediato.
 Após a inclusão desta referência na lista dos factos não provados, na sentença recorrida acrescentou-se a seguinte anotação entre parênteses retos: para o caso de se entender que tem algum conteúdo fáctico.
Efetivamente aquela referência não tem um conteúdo fáctico, sendo um conjunto de conclusões jurídicas, pelo que deve ser eliminada da lista dos factos não provados, sem que possa transitar para a lista dos factos provados, atenta a ausência de um qualquer conteúdo fáctico.
O facto não provado n.º 26 tem a seguinte redação:
Tendo relatado a familiares e amigos, com algumas dificuldades de expressão, uma vez que também foi afetado na fala, as circunstâncias em que ocorreu o acidente, que o viria a vitimar.
Este facto reporta-se à narração do acidente pelo condutor do ciclomotor a familiares e amigos.
Na sentença recorrida refere-se genericamente que a não demonstração dos factos incluídos na lista dos não provados, resultou da ausência de prova suficiente ou consistente sobre a matéria atinente aos mesmos, bem como da prova feita em sentido inverso.
Os Autores defendem que este facto deve transitar para os factos provados uma vez que a testemunha EE, no seu depoimento, diz claramente, que o sogro lhe transmitiu, na Unidade de Cuidados Continuados, que viu a carrinha a descrever a curva ligeira, localizada muito mais acima, e atravessou na convicção de que tinha tempo de entrar na serventia de casa, sem risco algum.
Este facto é totalmente inócuo para a decisão da causa, pelo que não deve constar quer da lista dos factos não provados, quer da lista dos factos provados.
O facto não provado n.º 31 tem a seguinte redação:
Tendo a vida para ele um valor elevadíssimo.
Reporta-se ao condutor do ciclomotor.
Alegam os Autores que a não demonstração deste facto é contraditória com a prova de que antes do acidente, o sinistrado era uma pessoa perfeitamente autónoma, deslocando-se praticamente todos os dias para o centro da vila de ... para conviver com amigos e familiares - facto provado n.º 23 - e de que era um homem bem disposto, trabalhador e cheio de alegria de viver.
A prova destes factos não significa necessariamente uma valorização da vida superlativa, pelo que não se verifica a contradição apontada, devendo manter-se o facto na lista dos factos não provados.
Em síntese, procede apenas em parte a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, e, em consequência, decide-se:
- o facto provado n.º 3 passa a ter a seguinte redação
- O condutor do ciclomotor de matrícula ..-DU-.. executou a mudança de direção obliquamente na direção do portão da moradia para onde se dirigia.
- eliminam-se da lista dos fatos não provados o facto n.º 5 e 26.
No demais indefere-se a impugnação deduzida.

                                                 *

Encontram-se, assim provados neste processo os seguintes factos:
1º No pretérito dia 11 de Março de 2016, o sinistrado AA (cônjuge marido da 1ª Autora e pai dos 2ºs e 3ºs Autores) circulava com o seu ciclomotor de matrícula ..-DU-.., na Estrada Nacional ...44 (no sentido ...-...), quando, ao KM 1, sofreu um acidente de viação [art1pi].
2º Após descrever uma curva que se desenhava à sua esquerda a que se seguia uma reta de mais de 100 metros e de ter percorrido nessa reta cerca de 40 metros em sentido ascendente foi-se aproximando do eixo da via, sinalizando a sua intenção de virar à esquerda para entrar no portão que dá acesso ao logradouro da sua casa de habitação [art2pi].
3º O condutor do ciclomotor de matrícula ..-DU-.. executou a mudança de direção obliquamente na direção do portão da moradia para onde se dirigia [art15cont alterado].
4º Foi colhido pelo veículo que circulava em sentido contrário, já dentro do aglomerado urbano da vila de ..., na parte lateral direita, junto ao pousa-pé, projetando-o para a valeta direita da estrada, considerando o sentido de marcha do veículo ligeiro de mercadorias onde ficou imobilizado e consciente [art3pi].
5º O condutor do veículo ligeiro de mercadoria (de seu nome GG conduzia o veículo ligeiro ..-NJ-.. Peugeot Partner pertencente a B... Unipessoal, Lda (com a apólice válida nº ...66 da aqui Ré) [art4pi].
6º Avistou o ciclomotor com o pisca esquerdo ligado [art4pi].
7º O acidente verificou-se dentro da malha urbana da vila de ..., onde a velocidade é limitada a 40Km/Hora, após essa placa indicativa e num local onde a velocidade máxima permitida é de 40 KM/Hora, conforme placa existente logo a seguir à placa sinalizadora da vila, considerando o sentido de marcha do veículo ..-NJ-.. [art6pi].
8º A estrada no local encontrava-se em bom estado de conservação e tem uma largura de seis metros, sendo que fazia bom tempo, havia boa luminosidade e o piso estava completamente seco [art7pi].
9º Não existem rastos de travagem por parte do condutor do veículo Peugeot [art13pi].
10º No sentido de marcha seguida pelo ciclomotor, não circulava qualquer veículo no momento em que ocorreu o acidente [art14pi].
11º A estrada desenha uma curva 40 a 50 metros à frente do veículo ..-NJ-.. [art15pi].
12º O condutor do veículo ligeiro de mercadorias ... ..-NJ-.. prestava serviços por conta de uma empresa ligada ao Grupo A... [art16pi].
13º Em consequência do acidente, o sinistrado AA foi transportado pelo INEM, de imediato para as urgências do Centro Hospitalar ..., onde lhe foi detetada uma contusão medular cervical C3-C4, no contexto de traumatismo vertebro-medular [art17pi].
14º Aquando da observação no serviço de urgência, referiu que tinha dor intensa nos ombros e na região lombar, com sensação de parestesias dos membros superiores e perda de força nos membros inferiores, apresentando-se, porém, consciente e orientado [art18pi].
15º Da observação efetuada e em resultado da lesão apresentava uma situação de tetraparésia com membro superior grau 4 a nível próxima e G2 a nível distal e com membro inferior (flexão coxa): G4 à esquerda e G3 à direita [art19pi].
16º Tendo-se detetado em exames complementares mormente após realização de TAC Cervical - uma fratura do corpo de C2 e da articular de C7 à direito e após Ressonância Magnética uma contusão medular em C3- C4 associada a canal estenótico a esse nível [art20pi].
17º O sinistrado permaneceu internado, 46 dias, num sofrimento físico e psíquico atroz [art21pi].
18º Tendo, findo o internamento, sido transferido para a Unidade de Cuidados Continuados ... no dia 26 de Abril de 2016 [art22pi].
19º Depois do acidente e decorrente das lesões acima descritas, o sinistrado padecia de quadro de tetraparésia, que levou ao desenvolvimento de úlcera de pressão sagrada sobreinfetada; foi traqueostomizado, vindo a desenvolver quadro de infeções com expetoração purulenta; foi algaliado de forma crónica, com posteriores infeções urinárias e episódios de hematúria; todos esses fatores, associados principalmente à sua dependência de terceiros, que o obrigava a permanecer longos períodos de repouso no leito, culminaram com quadro de volvo do sigmóide e infeção generalizada (sépsis) [art24pi].
20º O quadro lesional acima descrito determinou a sépsis e, em consequência desta, vindo a falecer, no dia 29 de Julho de 2018 [art25pi].
21º Durante todo este período de tempo, o sinistrado esteve consciente [art26pi].
22º Tendo em todos esses momentos sentido dores, angústia, assistindo à degradação das suas condições de saúde, teve plena consciência do agravamento do seu estado de saúde, o que lhe provocou não só a ele um enorme sofrimento físico como também psicológico mas também aos aqui Autores um grande desgaste psicológico, uma dor imensa e um enorme abalo moral, quadro esse que foi vivido diariamente por todos eles [art27pi].
23º Antes do acidente, o sinistrado era uma pessoa perfeitamente autónoma, deslocando-se praticamente todos os dias para o centro da vila de ... para conviver com amigos e familiares [art28pi].
24º Apesar de reformado, fazia o “amanho” de alguns terrenos agrícolas [art29pi].
25º Era um homem bem disposto, trabalhador e cheio de alegria de viver [art31pi].
26º Os autores e o falecido eram muito unidos e conviviam assiduamente [art39pi].
27º Os filhos visitaram-no quase diariamente na UCC de ... [art40pi].
28º Os AA. sentiram profundamente a morte da vítima lamentando o sucedido [art41pi].
29º E ainda vivem esse quadro de angústia e sentimento de perda do seu marido e pai [art42pi].
30º O falecido durante o período de vinte e seis meses de internamento, na Unidade de Cuidados Continuados ..., despendeu, a quantia de € 9296,02 [art57e61-f) pi].
31º Tal prestação constituía o suplemento que era devido pelo utente e que a Segurança Social não comparticipava [art58pi].
32º Pelo contrato de seguro titulado pela apólice referida em 4º da Petição Inicial, o proprietário do veículo onde circulava o condutor, com a matrícula transferiu para a aqui Ré a sua responsabilidade civil por danos causados a terceiros emergentes da sua circulação [art49pi].

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3. O direito aplicável
3.1. Da culpa do lesado
No acidente de viação que integra a causa de pedir da presente ação intervieram um ciclomotor pertencente e conduzido pela vítima mortal, AA, marido da primitiva co-autora, CC e pai dos atuais Autores, AA e BB, e um veículo ligeiro de mercadoria, seguro na Ré, pertencente a B... Unipessoal, Limitada, que na altura era conduzido por GG, prestando serviços por conta de uma empresa ligada ao Grupo A....
Quando no aglomerado urbano da vila de ... o condutor do ciclomotor executou uma manobra de mudança de direção para a esquerda para entrar no portão da sua casa de habitação foi embatido na sua parte lateral direita pelo veículo automóvel que circulava em sentido contrário, projetando-o para a valeta direita da estrada, considerando o sentido de marcha do veículo ligeiro de mercadorias.
Uma vez que o condutor do veículo automóvel o fazia por conta de outrem, incide sobre ele uma presunção legal de culpa ilidível - art.º 503º, n.º 3, do C. Civil.
A sentença recorrida entendeu que a Ré Seguradora logrou ilidir esta presunção de culpa, tendo demonstrado que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do condutor do ciclomotor.
Com a interposição deste recurso, os Autores discordam que essa elisão resulte dos factos provados.
É o seguinte o filme do acidente e a descrição do local onde ele ocorreu que resulta da factualidade apurada:
- o condutor do ciclomotor, quando se dirigia para a sua habitação, após descrever uma curva que se desenhava à sua esquerda a que se seguia uma reta de mais de 100 metros e de ter percorrido nessa reta cerca de 40 metros, em sentido ascendente, foi-se aproximando do eixo da via, sinalizando a sua intenção de virar à esquerda para entrar no portão que dá acesso ao logradouro da sua casa de habitação, tendo executado esta manobra de mudança de direção obliquamente na direção do portão;
- quando executava esta manobra, o condutor do ciclomotor foi colhido pelo veículo automóvel que circulava em sentido contrário, na parte lateral direita, junto ao pousa-pé, projetando-o para a valeta direita da estrada, considerando o sentido de marcha do veículo ligeiro de mercadorias onde ficou imobilizado e consciente;
-  o condutor do veículo automóvel havia avistado o ciclomotor com o pisca esquerdo ligado;
- o veículo automóvel não deixou rastos de travagem;
- no sentido de marcha seguida pelo ciclomotor, não circulava qualquer veículo no momento em que ocorreu o acidente;
- o acidente ocorreu dentro da malha urbana da vila de ..., onde a velocidade é limitada a 40Km/Hora, após essa placa indicativa e num local onde a velocidade máxima permitida é de 40 KM/Hora, conforme placa existente logo a seguir à placa sinalizadora da vila, considerando o sentido de marcha do veículo automóvel;
- a estrada no local encontrava-se em bom estado de conservação e tem uma largura de seis metros, sendo que fazia bom tempo, havia boa luminosidade e o piso estava completamente seco;
- a  estrada desenha uma curva 40 a 50 metros à frente do veículo automóvel após o local de embate.
Desta narrativa resulta que o embate entre o ciclomotor e o veículo automóvel teve a sua origem na realização de uma manobra de mudança de direção para a esquerda efetuada pelo condutor do ciclomotor.
Dispõe o art.º 35º, n.º 1, do Código da Estrada:
O condutor só pode efetuar as manobras de (...) mudança de direção ou de via de trânsito, (...) em local e por forma que da sua realização não resulte perigo ou embaraço para o trânsito.
E o art.º 44º, n.º 1 e 2, do mesmo diploma:
1 - O condutor que pretenda mudar de direção para a esquerda deve aproximar-se, com a necessária antecedência e o mais possível, do limite esquerdo da faixa de rodagem ou do eixo desta, consoante a via esteja afeta a um ou a ambos os sentidos de trânsito, e efetuar a manobra de modo a entrar na via que pretende tomar pelo lado destinado ao seu sentido de circulação.
2 - Se tanto na via que vai abandonar como naquela em que vai entrar o trânsito se processa nos dois sentidos, o condutor deve efetuar a manobra de modo a dar a esquerda ao centro de intersecção das duas vias.
E ainda o art.º 60º, n.º 2, b):
Os dispositivos de sinalização luminosa a utilizar pelos condutores são os seguintes:
(...)
Luz de mudança de direção, destinada a indicar aos outros utentes a intenção de mudar de direção;
Apesar de neste caso o condutor do ciclomotor não pretender entrar noutra via de trânsito, mas sim numa serventia de acesso à sua habitação, a exigência destes cuidados é aplicável.
Se é verdade que o condutor do ciclomotor precedeu tal manobra de alguns dos cuidados exigidos pelas regras estradais, dado que estamos perante uma manobra que encerra riscos – acionou o pisca que sinaliza a intenção de realizar essa manobra e aproximou-se do eixo da via – realizou-a com inobservância de outros deveres de cuidado que deveria ter respeitado.
Em primeiro lugar, efetuou a manobra obliquamente e não perpendicularmente ao eixo da via, o que implica que a parte do trajeto de mudança de direção em que cruza a faixa de rodagem contrária seja mais longa e por isso leve mais tempo a percorrer e, em segundo lugar, fê-lo num momento em que se aproximava em sentido contrário um veículo automóvel, cortando-lhe a via de trânsito.
A violação destas regras de cuidado por parte do condutor do ciclomotor faz recair sobre si um juízo de culpa causal do acidente, sendo certo que não existem quaisquer dados que nos permitam censurar o comportamento estradal do condutor do veículo automóvel.
No entanto, há pormenores importantes da realidade que não foram desvendados pela alegação e prova produzida neste processo:
- não sabemos a que velocidade seguia o veículo automóvel.
- não sabemos a que distância se encontrava o veículo automóvel quando o ciclomotor iniciou a manobra de mudança de direção.
- não sabemos em que ponto da hemifaixa de rodagem onde seguia o veículo automóvel ocorreu o embate.
Estes dados eram essenciais para apurarmos se, apesar da realização imprudente da manobra de mudança de direção por parte do condutor do ciclomotor, o condutor do veículo automóvel poderia ter evitado o embate, se tivesse agido com a prudência que é exigida a qualquer condutor, designadamente, reduzindo a velocidade a que seguia ou desviando a trajetória do veículo automóvel para a sua esquerda de forma a permitir que o condutor do ciclomotor completasse a sua manobra - relembre-se que se provou que na altura no sentido de marcha seguida pelo ciclomotor, não circulava naquela estrada qualquer veículo, sendo a estrada no local uma reta, com uma visibilidade de 40 a 50 metros à frente do veículo automóvel.
Temos, pois, uma zona de penumbra no filme do acidente que, se não nos impede de efetuar um juízo de culpa sobre a conduta do condutor do ciclomotor causal do acidente, não nos permite concluir por um juízo de exclusividade dessa culpa como causa do acidente.
A Ré Seguradora procurou ilidir a presunção de culpa que recai sobre o condutor do veículo por si seguro, demonstrando a culpa do lesado.
No entanto, por insuficiência de alegação e prova, apenas logrou demonstrar a existência de uma culpa do lesado causal do acidente, mas não que esse comportamento culposo tenha sido a causa exclusiva do acidente
Dispõe o art.º 570º, n.º 2, do C. Civil:
Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar.
A lei admite que uma responsabilidade que é baseada apenas numa presunção de culpa, não existindo a prova de factos que confirmem o raciocínio presuntivo, como sucede neste caso, relativamente ao condutor do veículo automóvel, possa ser ilidida através da prova de que um comportamento culposo do lesado foi causal do acidente, tendo sido essa a estratégia seguida pela Ré Seguradora.
No entanto, como concluímos, se foi bem sucedida na demonstração da existência de culpa do condutor do ciclomotor na ocorrência do acidente, não logrou a Ré provar que esse comportamento culposo foi a causa exclusiva do acidente.
Será que o transcrito n.º 2, do art.º 570º, do C. Civil, exige a prova dessa exclusividade para que a presunção do art.º 503º, n.º 3, se considere ilidida?
E será adequada uma solução concursal para a hipótese em que o lesante não conseguiu demonstrar a exclusividade causal da conduta culposa do lesado? [1]
O disposto no art.º 570º, n.º 2, do C. Civil, teve origem na redação do art.º 578º, n.º 3. do Anteprojeto de Vaz Serra [2], que justificou a solução de cedência da presunção de culpa face à culpa do lesado, por assim se decidir no direito francês e alemão [3].
Aceitando-se no nosso direito que a condução de um veículo por conta de outrem é criadora de maiores riscos para a segurança nas estradas e que denuncia uma maior disponibilidade de recursos, num eventual litígio, sobrecarregou-se o ónus probatório da posição deste tipo de condutores, favorecendo-se os lesados.
O afastamento da responsabilidade destes condutores deve, assim, resultar da prova de uma ausência de culpa, a qual poderá resultar da prova da suficiência causal da conduta culposa do lesado.
Subsistindo dúvidas não esclarecidas sobre uma eventual concausalidade na eclosão do evento danoso, a presunção de culpa não se deve considerar totalmente ilidida, permanecendo operante, embora debilitada pelo contributo culposo do lesado, justificando-se a adoção de uma solução concursal, nos termos do art.º 570º, n.º 1, do C. Civil.
Como refere Brandão Proença [4], uma solução que não exija ao presuntivamente culpado a prova (pela positiva) de que o dano foi exclusivamente devido à conduta do lesado só pode conceber-se na perspetiva de uma conceção rígida, demasiado voltada para o lesante e indiferente à sua real comparticipação no dano ... A colocação sistemática do n.º 2 do art.º 570.º, a ratio da presunção de culpa e a necessidade sempre reafirmada, de uma adequada tutela dos lesados, conduzem-nos a pensar que a norma só ganha um verdadeiro sentido útil desde que se exija ao presumível culpado a prova, mais ou menos qualificada da exclusividade causal do comportamento “culposo” do lesado.
No mesmo sentido se pronunciou Américo Marcelino [5], para quem só quando os danos forem devidos totalmente a culpa do lesado, por que o seu ato foi a causa adequada e suficiente e única do evento...é que vale o n.º 2, do art.º 570.º; Calvão da Silva [6], para quem será incompatível com o direito comunitário o art.º 570.º, n.º 2, interpretado à letra...mas o art.º 570.º, n.º 2 já não será incompatível com o direito comunitário na interpretação atualista ... se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a culpa (exclusiva, causa única ) do lesado exclui o dever de indemnizar; e Maria de Lurdes Pereira [7], que afirma perentoriamente que o art.º 570.º, n.º 2, do CC deve, pois, ser interpretado no sentido de que a “culpa do lesado” só exclui a responsabilidade do presumido “culpado” pela lesão na medida em que permita ilidir a presunção de culpa, o que sucede apenas quando se demonstra que a conduta “culposa” do lesado foi causa exclusiva da ocorrência.
A necessidade de prova da exclusividade da culpa do lesado ainda se pode extrair da argumentação de Antunes Varela ao pretender afastar a possibilidade de concurso entre responsabilidade pelo risco e culpa do lesado, quando este afirma que a responsabilidade só poderá considerar-se definitivamente excluída quando se provar que houve culpa do lesado e não houve culpa do condutor ou detentor. É nesse sentido que algumas legislações e alguns autores afirmam que a responsabilidade do proprietário e do condutor do veículo é excluída quando a culpa do lesado fora a única causa do acidente, ou quando este for unicamente devido a culpa do lesado [8].
Esta interpretação do disposto no art.º 570º, n.º 2, do C. Civil, também mereceu a adesão expressa no acórdão do S. T. J. de 23.4.2020, proferido no processo 1850/17, relatado por Maria da Graça Trigo [9], onde se dá nota de outros arestos em que igualmente se seguiu esta orientação.
Assim, no presente caso, deve considerar-se que a conduta culposa do condutor do ciclomotor lesado é concausal com a presunção de culpa que incide sobre o condutor do veículo automóvel, que não se mostra totalmente ilidida, importando, por isso, nos termos do art.º 570º, n.º 1, do C. Civil, determinar a proporção da responsabilidade a atribuir ao lesante, pela qual responde a Ré seguradora, por força do contrato de seguro celebrado [10].
Estamos, por um lado, perante uma culpa grave do lesado, dado que infringiu deveres de cuidado essenciais para a realização de uma manobra que comportava elevados riscos para a segurança rodoviária, enquanto a culpa presumida do lesante, embora não comportando, pela sua natureza, graus de medição, respeita apenas à não realização de atos suscetíveis de evitar o embate face à situação de perigo eminente criada pelo incumprimento dos deveres de cuidado por parte do lesado ao realizar a manobra de mudança de direção.
Atenta esta diferença de grau no apuramento das responsabilidades de um e de outro, deve a atribuição das culpas causais do acidente, ser efetuada numa proporção de 75% para o condutor do ciclomotor e de 25% para o condutor do veículo automóvel.

3.2. Dos danos indemnizáveis
Os Autores efetuaram os seguintes pedidos indemnizatórios parcelares:
- Pela perda do direito à vida a quantia de 70.000 €.
- Pelos danos não patrimoniais sofridos pela vítima antes da morte, a quantia de 65.000,00 €.
- Pelos danos não patrimoniais sofridos pela primitiva Autora CC, cônjuge do falecido AA, a quantia de 35.000,00 €.
- Pelos danos não patrimoniais sofridos por cada um dos Autores, AA e BB, filhos de AA, a quantia de 25.000,00 €.
- Pelos danos patrimoniais sofridos pela primitiva Autora, CC, pela perda do rendimento resultantes dos trabalhos agrícolas que o marido realizava, a quantia de 3.000,00 €.
- Pelos danos patrimoniais resultantes do pagamento de vinte e seis mensalidades na Unidade de Cuidados Continuados ..., a quantia de 10.000 €.

3.2.1. Do dano da perda da vida
Nos termos do n.º 2, do art.º 496º, do C. Civil, por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; na falta destes aos irmãos ou sobrinhos que os representem.
É nosso entendimento que este direito à indemnização é um direito pró­prio dos familiares mais próximos da vítima, atribuído por lei, não sendo um direito da vítima que os parentes referidos no art.º 496º, n.º 2, do C. Civil, adquirem por via sucessória [11].
Conforme é jurisprudência pacífica a expressão em conjunto do n.º 2, do art.º 496, º do C. Civil, significa apenas que os filhos não são chamados só na falta do cônjuge, mas sim conjuntamente com ele, não vigorando entre estas duas classes de parentes o princípio do chamamento sucessivo.
Sendo vários os parentes da vítima que integram estas classes, estamos perante a indemnização de um dano comum - a morte do cônjuge e ascendente) com múltiplos titulares, ou seja, perante um crédito com múltiplos credores.
Não resultando de convenção, nem estando imposto na lei um regime de solidariedade ativa, um credor não pode exigir do devedor o pagamento da totali­dade do crédito, mas apenas a parte que nele tem direito – art.º 513º, do C. Civil.
Resultando a aquisição deste direito de indemnização de um direito pró­prio de origem legal e não tendo a lei estabelecido qualquer diferenciação na partici­pação dessa titularidade, o montante da indemnização deve ser atribuído em igual proporção por todos os credores – art.º 534º do C. Civil.
Estando nós perante um dano não patrimonial, o montante da indemnização deve ser fixado segundo um critério de equidade, conforme resulta da 1.ª parte, do n.º 4, do art.º 496º, do Código Civil.
O juízo equitativo que fixa o valor deste tipo de danos, conforme determina aquele preceito, deve ter em consideração as circunstâncias referidas no art.º 494.º, do Código Civil, ou seja, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, assumindo, por razões de igualdade, ainda uma especial relevância, os padrões de indemnização adotados, nos tempos mais próximos, pela jurisprudência, em casos análogos.
Na fixação da indemnização do dano da perda da vida, tendo em consideração que não é o lesado que vai beneficiar da quantia indemnizatória, o valor a atribuir deve refletir uma censura à conduta lesante e sinalizar a importância do bem jurídico supremo violado.
Relativamente à idade e à qualidade de vida da vítima, a sua influência no valor indemnizatório tem vindo a ser questionada, com o pertinente argumento de que estando em causa, a vida em si, como bem absolutamente protegido pela ordem jurídica, ela deve ser uniformemente valorada, em correspondência com a igual dignidade de todas as pessoas. Efetivamente, na impossibilidade desta indemnização ter um efeito compensatório, a dimensão da esperança de vida que cessa perde relevância, não sendo um elemento que deva pesar significativamente no cálculo do valor indemnizatório, importando sim alinha o valor da indemnização pelos valores padronizados mais recentes, com um olhar atento ao fenómeno inflacionista ocorrido nos tempos mais recentes.
Ponderando estes elementos e tendo em consideração o grau de responsabilidade do segurado da Ré na ocorrência do acidente, justifica-se a atribuição de uma indemnização no valor de € 7.500,00, tendo em consideração o valor da moeda à data de hoje, a cada um dos três familiares da vítima, que integram o primeiro escalão elencado no n.º 2, do art.º 496º  - cônjuge e dois filhos -, pelo que, tendo a primitiva Autora, CC, já falecido, a sua parcela indemnizatória deve ser paga pela Ré a ambos os Autores, enquanto seus sucessores.

3.2.2. O sofrimento antes da morte
Relativamente aos danos morais sofridos pela vítima no período que mediou entre o acidente e a sua morte, provou-se o seguinte:
 - O sinistrado permaneceu internado, 46 dias, num sofrimento físico e psíquico atroz, tendo, findo o internamento, sido transferido para a Unidade de Cuidados Continuados ... no dia 26 de Abril de 2016;
- Depois do acidente e decorrente das lesões sofridas, o sinistrado padecia de quadro de tetraparésia, que levou ao desenvolvimento de úlcera de pressão sagrada sobreinfetada;
- Foi traqueostomizado, vindo a desenvolver um quadro de infeções com expetoração purulenta;
- Foi algaliado de forma crónica, com posteriores infeções urinárias e episódios de hematúria;
- Todos esses fatores, associados principalmente à sua dependência de terceiros, que o obrigava a permanecer longos períodos de repouso no leito, culminaram com quadro de volvo do sigmóide e infeção generalizada (sépsis);
- O quadro lesional acima descrito determinou a sépsis e, em consequência desta, vindo a falecer, no dia 29 de Julho de 2018.
- Durante todo este período de tempo, o sinistrado esteve consciente, tendo em todos esses momentos sentido dores, angústia, assistindo à degradação das suas condições de saúde;
- Teve plena consciência do agravamento do seu estado de saúde, o que lhe provocou não só a ele um enorme sofrimento físico como também psicológico.
Atento este quadro de grande sofrimento físico e psicológico  muito prolongado, o valor indemnizatório peticionado, atento o disposto nos art.º 496º, n.º 1, e 494º, ambos do Código Civil, e tendo como referência os padrões de indemnização adotados, nos tempos mais próximos, pela jurisprudência, em casos de sofrimento nos momentos que antecedem a morte, tendo em consideração, por um lado, a particularidade deste sofrimento se ter prolongado durante um largo período de tempo, e, por outro lado, o grau de responsabilidade do segurado da Ré, na ocorrência do acidente, num juízo equitativo, deve atribuir-se uma indemnização a ser paga a ambos os Autores enquanto sucessores não só do seu pai, mas também da sua mãe, € 20.000,00, tendo em consideração o valor da moeda à data de hoje, a pagar a ambos os Autores, os filhos da vítima, enquanto sucessores dos seus pais.

3.2.3. Os danos morais sofridos pelo cônjuge e filhos do lesado
Relativamente aos danos morais sofridos pela primitiva Autora, CC, cônjuge do lesado, e pelos filhos daquele, os Autores AA e BB, provou-se que durante todo o longo período que antecedeu a morte de AA padeceram um grande desgaste psicológico, uma dor imensa e um enorme abalo moral, quadro esse que foi vivido diariamente, o qual deve ser compensado, atenta a doutrina do AUJ n.º 6/2014, de 16.01.2014 [12]  que decidiu que os art.ºs 483.º, n.º 1, e 496.º do Código Civil devem ser interpretados no sentido de abrangerem os danos não patrimoniais, particularmente graves, sofridos por cônjuge de vítima sobrevivente, atingida de modo particularmente grave.
Também se provou que aqueles sentiram profundamente a morte da vítima, tendo vivido até à sua própria morte um quadro de angústia e sentimento de perda, o que exige a compensação destes danos morais nos art.º 496º, n.º 2 e 4, do Código Civil.
Atenta a gravidade dos sofrimentos psicológicos sofridos, deve a indemnização a pagar pela seguradora, atento o grau de responsabilidade do condutor do veículo nela seguro, num juízo equitativo, fixar-se em € 10.000,00, a pagar a ambos os Autores, enquanto sucessores da sua mãe, e em € 10.000,00 para cada um dos Autores, pelos danos próprios, tendo em consideração o valor da moeda à data de hoje.

3.2.4. A perda dos rendimentos dos trabalhos agrícolas
Os Autores pedem uma indemnização pelos danos patrimoniais sofridos pela sua mãe em resultado da perda do rendimento que a vítima auferia dos trabalhos agrícolas por ela realizados, no valor de 3.000,00 €.
Provou-se apenas que apesar de reformado a vítima fazia o “amanho” de alguns terrenos agrícolas.
Não se provou que daí retirasse qualquer rendimento, pelo que, está prejudicada a apreciação da indemnizabilidade do prejuízo invocado.

3.2.5. As despesas hospitalares
Os Autores pretendem ainda ser indemnizados do pagamento de vinte e seis mensalidades na Unidade de Cuidados Continuados ..., que somaram a quantia de € 10.000,00.
Provou-se que o falecido durante o período de vinte e seis meses de internamento, na Unidade de Cuidados Continuados ..., despendeu, a quantia de € 9.296,02.
Os Autores na qualidade de sucessores do falecido e da sua mãe, têm direito a que lhes seja pago pela Ré ¼ desta quantia, atento o grau de responsabilidade do condutor do veículo seguro na Ré na ocorrência do acidente, nos termos dos art.ºs 562º e 564º do Código Civil, ou seja € 2.324,05.

3.2.7. Juros de mora
Tendo em consideração o disposto, nos art.º 804º, 80.º e 806.º do C. Civil a Ré está obrigada a pagar juros de mora sobre todas estas quantias, até à sua liquidação, à taxa definida por lei, desde a data da prolação deste acórdão relativamente às indemnizações por danos não patrimoniais, e, relativamente à indemnização pelo dano patrimonial, desde a data da citação da Ré.

3.2.8. Da soma das indemnizações
Procedendo à soma de todas as quantias indemnizatórias acima fixadas deve a Ré ser condenada:
- a pagar a ambos os Autores, solidariamente, € 39.824,05 (€ 7.500,00 + € 20.000,00 + € 10.000,00 + € 2.324,05);
- a pagar a cada um dos Autores a quantia de € 17.500,00 (€ 7.500,00 + 10.000,00);
- juros de mora sobre estas quantias, até seu integral pagamento, à taxa definida por lei, desde a data da prolação deste acórdão, com exceção dos juros relativos à indemnização por danos patrimoniais no valor de € 2.324,05, a pagar a ambos os Autores, em que os juros de mora devem ser calculados desde a data da citação da Ré.

3.3. Da litigância de má-fé
A Ré pediu que os Autores fossem condenados como litigantes de má fé por terem interposto recurso para o Tribunal da Relação, apesar de terem junto um documento falsificado na 1.ª instância - o croquis do acidente - , sem que ainda tenham dado qualquer explicação para essa adulteração do documento.
No recurso interposto, os Autores não pretenderam fazer valer o documento que a Ré arguiu de falso, pelo que não se verifica a razão pela qual a Ré pretende estender para a fase de recurso a causa da invocada má-fé, devendo, por isso, ser indeferido o seu pedido.

                                                 *
Decisão
Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso interposto pelos Autores e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, julgando-se parcialmente procedente a ação e, em consequência condena-se a Rá a pagar aos Autores as seguintes quantias:
- solidariamente, a ambos os Autores, € 39.824,05;
- a cada um dos Autores € 17.500,00;
- juros de mora, à taxa definida por lei, sobre estas quantias, até seu integral pagamento, desde a data da prolação deste acórdão, com exceção da indemnização por danos patrimoniais, de € 2.324,05, a pagar a ambos os Autores, em que a contagem dos juros se iniciou na data de citação da Ré.
Indefere-se o pedido de condenação dos Autores, por litigância de má fé na fase de recurso.

                                       *
Custas da ação e do recurso pela Ré, na proporção de 25%, e pelos Autores, na proporção de 75%.

                                       *
                                                                               13.6.2023







[1] Este tipo de interrogações foram formuladas por Brandão Proença em A conduta do lesado como pressuposto e critério da imputação do dano extracontratual, Almedina, 1997, p. 465.

[2] B.M.J. n.º 100, pág. 133.

[3] Conculpabilidade do prejudicado, B.M.J. n.º 86, p. 167, nota 67.
  Dando nota da discussão, na altura, no direito francês, Brandão Proença, ob. cit., p. 463-464.

[4] Ob. cit., p. 90-491.
  O mesmo autor sustenta igual interpretação do disposto no n.º 2, do art.º 570.º, do C. Civil, em Comentário ao Código Civil. Direito das obrigações. Das obrigações em geral. Universidade Católica Editora, 2018, p. 580.

[5] Em A concorrência do culpa efetiva com a culpa presumida, Portugal Judiciário, Ano IV, n.º 42, p. 19 e seg.

[6] Em Concorrência entre risco do veículo e facto do lesado: o virar da página? na R.L.J., Ano 137, n.º 3946, p. 59.

[7] Em Direito da responsabilidade civil. A obrigação de indemnizar, AAFDL, 2021, p. 555.

[8] Das Obrigações em Geral, vol. I, Almedina, 10.ª ed., reimpressão de 2020, p. 677, nota 2.

[9] Acessível em ECLI.

[10] Sobre o modo de funcionamento desta responsabilidade concursal em que a culpa presumida não comporta graus, Brandão Proença, ob. cit., p. 492.
[11] Neste sentido, PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil anotado, vol. I, pág. 500, 4ª ed., Coimbra Editora, ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, vol. I, pág. 608-614, 10ª ed., Almedina, 2000, e na R.L.J., Ano 123, pág. 189 e seg., PEREIRA COELHO, Direito das Sucessões. Lições ao curso de 1973-1974, pág. 167-180, ed. pol. de 1992, RABINDRANATH CAPELO DE SOUSA, Lições de direito das sucessões, vol. I, pág. 292-305, 3ª ed., Coimbra Editora, 1990, HEINRICH HÖRSTER e EVA SÓNIA MOREIRA DA SILVA, in A parte geral do Código Civil Português – Teoria geral do direito civil, pág. 329, 2.ª ed., Almedina, 2019, RIBEIRO DE FARIA, in Direito das obrigações, vol. I, pág. 493-494, ed. de 1990, da Almedina, LEITE DE CAMPOS, A indemnização do dano de morte, B.F.D.U.C., vol. L, pág. 247 e seg., e A vida, a morte e a sua indemnização, no B.M.J. n.º 365, pág. 5 e seg., DELFIM MAYA DE LUCENA, em Danos não patrimoniais, pág. 57-72, ed. de 1985, Almedina, PEDRO BRANQUINHO FERREIRA DIAS, in O dano moral na doutrina e na jurisprudência, pág. 53-54, ed. de 2001, Almedina, EDUARDO DOS SANTOS, in Direito das Sucessões, pág. 54-60, ed. da A.A.F.D.L., 2002, RUI ATAÍDE, Direito das Obrigações, vol. I, pág. 416, Gestlegal, 2022, sendo esta também a orientação dominante na jurisprudência.
      Interpretando este preceito no sentido de que este direito é adquirido por via sucessória pelos herdeiros da vítima, VAZ SERRA, na R.L.J., Ano 103, pág. 166 e seg., Ano 105, pág. 53 e seg., e Ano 107, pág. 137 e seg., INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, Direito das sucessões. Noções fundamen­tais, pág. 73-77, 4ª ed., Coimbra Editora, 1980, MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil Português, vol. II, tomo III, pág. 520-521, Almedina, 2010, MENEZES LEITÃO, Direito das obrigações, vol. I, pág. 307-308, 10.ª ed., Almedina, 2013, CARVALHO FERNANDES, Lições de direito das sucessões, pág. 63-64, Quid iuris, 1999, e MAFALDA MIRANDA BARBOSA, Lições de Responsabilidade Civil, pág. 307-312, Principia, 2017.

[12] Publicado no Diário da República 1.ª Série, n.º 98, de 22.05.2014.